Os golden parachutes são acordos estabelecidos entre a empresa e os seus altos quadros, nos quais se estabelecem determinadas condições vantajosas caso ocorra a cessação antecipada das suas funções.

Estes golden parachutes – tendo por referência uma aterragem suave – nasceram e ganharam força nos anos 80 nas grandes empresas cotadas norte americanas como ferramenta de atração e retenção de quadros de topo. Mais tarde, acabaram por generalizar-se e chegar à Europa (e, naturalmente, também a Portugal).

Nestes mercados dinâmicos, estas condições serviram, portanto, como forma de “amortecer a queda” e garantir aos altos quadros uma “almofada” retributiva ou compensatória.

Os problemas começaram a surgir essencialmente por duas ordens de razão:

  • Os valores estabelecidos, sob a forma de indemnização, foram acordados entre a empresa e o alto quadro, o que significa que não existiu, por regra, o escrutínio dos acionistas;

  • Não é em vão que estas condições foram apelidadas de “douradas”. É que, nas contratações de altos quadros, e de forma a salvaguardar a sua posição, foram acordadas e estabelecidas cláusulas de compensações verdadeiramente principescas, nas situações de cessação do contrato.

Não pretendemos, nos limites deste artigo, esgotar o assunto, o que seria uma pretensão ingénua. No entanto, tentaremos explicitar os aspetos que nos parecem fundamentais para uma compreensível aproximação à temática focando essencialmente a nossa análise no âmbito societário e laboral.

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De facto, os golden parachutes prosperaram e atingiram valores elevadíssimos – recordemos o exemplo do ex-CEO do desaparecido Lehman Brothers, o qual, em caso de cessação, tinha acordado o pagamento de 24 milhões. Em Portugal, o caso mais mediático surgiu na sequência de uma cláusula alegadamente desta natureza presente no contrato de um membro do conselho de administração do BCP.

Esta crescente preocupação e inquietação levou o legislador português a intervir nesta matéria e a limitar o valor destas indemnizações. Repare-se que, entre nós, o Código das Sociedades Comerciais (artigo 403.º, n.º 5) apenas prevê indemnizações cujo pagamento corresponda ao valor devido até ao final do mandato de um gestor afastado sem justa causa. Pelo que, neste âmbito, a licitude deste tipo de indemnizações pode ser questionada.

Isto não significa, contudo, que não se arranjem alternativas, as quais passam, em alguns casos, por disfarçá-las de cláusulas anti-concorrenciais ou esquemas complementares de pensões de reforma que excedam os valores de remuneração.

Por outro lado, o Código do Trabalho mantém a tradição, que já vem da velhinha LCCT, de adversidade relativamente aos chamados “golden parachutes” no âmbito laboral. Complementarmente, a nossa jurisprudência também já se pronunciou sobre a validade destas cláusulas.

O tema foi tratado focando essencialmente três aspetos:

  • Primeiro: a estipulação de condições laborais goza, por regra, de ampla liberdade e autonomia das partes. Sem prejuízo, existem, ainda assim, determinados limites – isto é. em determinadas matérias, a vontade das partes está condicionada à lei;

  • Segundo: a determinação dos valores e critérios de indemnização, em caso de cessação de contratos de trabalhos, podem ser regulados por instrumento de regulamentação coletiva;

  • Terceiro: a disposição legal que não permite que os contratos de trabalho afastem disposições do Código de Trabalho, quando se trate de norma que admita o seu afastamento por instrumento de regulamentação coletiva. É este o caso!

A verdade é que a nossa jurisprudência tratou o tema e, ao que parece, não teve grandes dúvidas, uma vez que a resposta foi cristalina: não é possível às Partes negociar valores de indemnização ou critérios para a sua determinação diferentes dos legalmente previstos.

De forma a ajudar a compreender melhor o teor decisório, veja-se que, num dos acórdãos, foi decidido que é proibido todo e qualquer convénio individual prévio que estipule o valor da compensação a atribuir em caso de despedimento coletivo.

A fundamentação decorre de estarmos num processo de desvinculação coletivo em que, além dos interesses individuais, há que considerar igualmente a posição relativa de cada um dos demais trabalhadores abrangidos pelo mesmo processo.

De modo que, consentir que algum deles o iniciasse numa posição de vantagem relativa, seria acolher uma diferenciação de tratamento que colidiria com outros valores juridicamente protegidos, entre os quais, e desde logo, o da igualdade entre os próprios trabalhadores visados nesse processo.

Ou seja, a imperatividade da lei, não protege, pois, e apenas, diretamente, os interesses de cada um dos trabalhadores a despedir, mas garante também esses interesses de modo reflexo, ao assegurar um processo equitativo e transparente para todos eles, ou pelo menos, para todos os potenciais beneficiários de um mesmo instrumento de regulamentação coletiva. Daí que, deste ponto de vista, tenha o Tribunal entendido que o comando que resulta da lei é a imperatividade do regime.

De facto, existiu um período em que estas cláusulas perderam alguma força. Contudo, muito recentemente, temos verificado que vão surgindo novamente com maior regularidade, o que fará certamente com que, a breve trecho, se volte a discutir a validade destas cláusulas.

Em jeito de aviso à navegação, resta-nos avisar a “tripulação” que nem sempre tudo que reluz é ouro!