A liderança é fundamental para promover uma cultura de excelência na gestão dos clientes, onde o foco deverá estar na experiência do cliente com as nossas soluções, produtos e equipas. Para isto é fundamental desenvolver uma estratégia onde o cliente é o ponto central em todo o processo de produção, entrega, implementação. Aqui a venda não é o fim do processo, mas sim o início de uma relação duradoura onde todos ganham e o sucesso é partilhado entre todos os intervenientes.

Existe um cliente em cada um de nós

Todos somos clientes em alguma altura da vida, em algum local ou situação, e aquilo que nos faz decidir por algo passa por uma variedade de factores complexos tais como a qualidade, preço, a relação entre estes dois, a sua proposta de valor, o que geramos ou perdemos através desse produto ou serviço, aquilo que nos permite atingir e como se alinha ou adequa com os nossos propósitos ou objetivos, com as nossas necessidades e problemas a resolver. Também aqui estão incluídos muitos dos fatores culturais, sociais, emocionais e psicológicos, onde a perceção de algo é feita de uma forma bastante mais subjectiva.

Apesar de tudo isto, há algo que é determinante e que nos faz desejar, repetir ou mesmo anular praticamente todo o nosso consumo de alguma coisa e isso tem a ver com a experiência que tivemos enquanto clientes em algum momento do tempo. A experiência que tivemos com alguma marca, determinado produto ou serviço fica na nossa memória para sempre, quer as lembranças que são muito positivas mas sobretudo as que são as mais negativas. Quem não se lembra daquela vez que se comprou algum produto que só lhe deu problemas ou um serviço que não cumpriu com as expetativas, ou quando tentámos falar com a empresa sem sucesso, não havendo contactos ou não tendo o acompanhamento esperado. Por outro lado, também nunca mais vamos esquecer aquela comida deliciosa num restaurante ou a experiência que tivemos numa viagem ou hotel, ou mesmo aquele produto cujo valor acabou por revelar-se sendo bem maior que o investimento efetuado e do qual falamos maravilhas.

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Como clientes, a experiência que temos em todos os momentos, desde que pensamos em comprar até depois de efectuada a compra, é fundamental e determina se voltamos a repetir o mesmo, a acrescentar ainda algo mais ou a anularmos de todo futuras interações.

A experiência de cliente

Segundo a Harvard Business Review, experiência do cliente é a resposta subjetiva que os clientes têm ao contato direto ou indireto com uma empresa, abrangendo todos os aspectos de uma solução, produto ou serviço: desde o atendimento ao cliente, publicidade, embalagem, recursos, facilidade de uso, confiança. A experiência do cliente é moldada pelas expectativas dos clientes, que refletem em grande parte experiências anteriores, sendo a soma total de como os clientes se envolvem com a empresa e marca, não apenas em num momento do tempo, mas ao longo de todo o ciclo da jornada de cliente. Para além desta definição geral, acrescentam-se ainda mais especificidades na experiência do cliente dependendo de cada sector, indústria ou área.

Para além disso, a nossa experiência de cliente é contagiante e muitas pessoas fazem questão de a partilhar, sobretudo num mundo atual onde as redes sociais criaram um canal transparente onde é possível avaliar, recomendar ou desaconselhar algo muito facilmente. Muitos negócios são construídos à base da partilha das nossas experiências como clientes, muitas empresas têm a experiência de cliente como modelo de negócio e muitas outras usam-na como marketing e fator promocional. Atualmente todos podemos influenciar de alguma forma ou outra as decisões de consumo do nosso grupo de amigos, família, conhecidos ou da comunidade até, através do que partilhamos a nível social, quer pessoalmente quer através das plataformas existentes.  Muitos de nós procuram também a informação sobre a experiência de outros, quem nunca perguntou qual o melhor restaurante de uma cidade onde está de férias ou o melhor produto para um determinado uso, quer a amigos, quer através da pesquisa nas plataformas de informação. O chamado Word Of Mouth ou Passa Palavra sempre foi e continua a ser um dos melhores meios de promoção desde tempos longínquos até à atualidade.

A nível empresarial, este fator de partilha de experiências de outros clientes, mais que motivador da decisão de compra, é muitas vezes condição indispensável para a realização do negócio. As empresas têm noção da importância dos seus clientes conhecerem o sucesso de outros clientes com as suas soluções e cada vez mais assistimos à promoção de Casos de Estudo, que provam como a empresa ajudou os seus clientes demonstrando casos com resultados reais. Aliás, esta é uma ferramenta usada muitas vezes a nível de marketing em conjunto com participação de empresas e clientes em conferências ou eventos, criando uma parceria que demonstra uma experiência de cliente de tal forma fantástica ao ponto de o cliente estar disposto a usar o seu tempo e imagem para ajudar a promover os produtos ou serviços de outra empresa com os quais está extremamente satisfeito, partilhando assim a sua experiência de utilização e o sucesso que obteve com os mesmos através de vários meios de comunicação. Isto constitui o pináculo da fidelização de clientes, sendo a chamada Customer Advocacy, que vai para além da satisfação de clientes para um envolvimento muito maior, no qual os clientes proactivamente promovem uma marca, produto ou serviço.

Boas práticas na gestão da experiência de clientes

Ao longo da minha vida reuni alguns princípios que, para mim, são fundamentais para gerir clientes e dão a confiança que estou a fazer o melhor, criando um sentido de propósito para mim, para a equipa e para a organização.

1.Calce os sapatos do seu cliente
Todos os sapatos são diferentes, pois são usados por pessoas diferentes onde o caminho que fazem em nada é igual ou o sítio onde querem chegar também é completamente oposto. Calçarmos os sapatos dos nossos clientes significa a capacidade de conseguirmos transportar-nos para o lugar do nosso cliente e pensarmos como se fossemos mesmo o cliente. Ou seja, trata-se de conhecermos o nosso cliente o melhor que pudermos, melhor que ninguém, com toda a sua história, os seus objetivos e necessidades. Em sumario, quanto mais informação tivermos sobre os nossos clientes, maior a facilidade em direcionar e alinharmos as nossas soluções aos seus objetivos.

2.Faça do sucesso do seu cliente o seu sucesso
Só temos sucesso quando os nossos clientes têm sucesso, é tão simples quanto isso. A partilha de objetivos, de resultados que se pretendem atingir ou de problemas que os nossos clientes querem resolver, devem estar sempre presentes como métricas a atingir e que são parte determinante da experiência do cliente. É fundamental conversarmos som os clientes sobre o que é sucesso para eles, quais os desafios que têm, os seus planos futuros, onde é que podemos ajudar através das nossas soluções, só assim podemos também evoluir e muitas vezes desenvolver soluções à medida ou inovar nos nossos produtos ou serviços para obter novos e melhores resultados, que por sua vez beneficiam quer a nossa empresa, quer o cliente.

3.Confiança é mais que fundamental
A confiança é extremamente importante na relação com os clientes e ganhar esta confiança demora tempo, sendo que perdê-la pode demorar uns poucos segundos apenas. Existem muitos livros escritos sobre este tema, cada vez mais o termo Trusted Advisor ou Consultor de Confiança é usado no mundo empresarial como a visão do que todos nós devemos ser para o cliente. E a razão de tudo isto advém do facto de que quando confiamos voltamos, recomendamos, investimos tempo ou parte do nosso rendimento em algo, pois sabemos que, através das experiências ou interações anteriores que tivemos ou que alguém que confiamos teve, obtivemos resultados positivos ou sucesso. Noutros casos, mesmo que não tenha corrido bem tivemos o comprometimento e apoio para resolver as situações rapidamente, o que transforma a experiência para algo que é percecionado como positivo e por sua vez reconstrói a experiência. Em suma, experiência do cliente e confiança andam de mãos dadas e só podem existir juntas.

4.Transparência como chave para a confiança
Quanto mais transparentes formos no nosso local de trabalho, com as funcionalidades do nosso produto, as especificidades dos nossos serviços, a viabilidade da solução, o que está ou não incluído na proposta ou contrato, bem como o âmbito e possibilidades, mais os nossos clientes terão as expetativas alinhadas e saberão o que esperar. Ser transparente também significa muitas vezes partilhar que são os primeiros clientes que estão a experienciar o nosso produto ou serviço e que contamos também com o seu feedback para implementar melhorias. Por último e não menos importante, se há algo que não sabemos quando questionados pelos clientes, não vale a pena inventar, é usar a transparência de novo e simplesmente respondermos que não temos essa informação e vamos investigar, voltando com uma resposta, simples não é?

5.Seja a primeira pessoa a testar os seus produtos, serviços
O conhecimento profundo e antecipado das nossas soluções permite antever as possibilidades de sucesso, os pontos fortes, os problemas e os pontos de melhoria onde teremos de nos focar. É uma questão de sermos proactivos experienciarmos em primeira mão o que os nossos clientes sentem. Quer investigue e aprenda sobre a oferta de produtos e serviços, quer os utilize em primeira mão, o feedback é fundamental e deverá fazer parte de um processo de empresa para as equipas de produto incorporarem em futuras versões ou serviços. Esta experiência pode ser também utilizada para perceber melhor aquilo a que o cliente se refere quando fala do seu produto, podendo aqui muitas vezes ganhar credibilidade e aumentar a confiança do cliente partilhando conhecimento.

6.Saia fora da caixa
Muitas vezes há situações onde os clientes partilham preocupações com áreas da empresa que não são as nossas, onde pouca ou nenhuma influência temos na questão em si. Isto não significa que possamos pensar que não é o nosso problema ou a nossa função, muito pelo contrário, a responsabilidade com os nossos clientes é partilhada entre todos, todos temos um papel decisivo. Nestes casos devemos ir mais além e sair da nossa caixa, o que significa por exemplo colocar o cliente em contacto com a respetiva área, ser a ponte, reportar internamente ou escalar alguma situação partilhando o feedback do cliente e direcionando para o respetivo grupo. Acredite que se vai sentir melhor e ainda vai ganhar mais networking conhecendo outras áreas da empresa. Ah e claro, já falei da experiência do cliente?

7.O mundo é o limite
Muitas vezes ouvimos as expressões “Sempre foi assim” ou “É impossível” ou “Nunca ninguém fez”, o que confesso que me causa alguma confusão. Para mim, o mundo é o limite e isto quer dizer que não devemos limitar-nos a padrões estabelecidos, a convenções sobre o que é, o que deve ou não deve ser. Ao trabalharmos com os clientes tem de haver algo em mente que é o foco no cliente, nos seus objetivos. Isto muitas vezes implica que o que fazíamos ou como fazíamos pode não ser o mais correto, ou que o que o cliente pretende atingir não é possível agora com as funcionalidades atuais, no entanto no futuro com desenvolvimentos adicionais ou soluções à medida podemos chegar lá. Só assim podemos crescer como pessoas, como empresa, questionando, inovando e transformando para fazermos ada vez melhor e irmos onde nunca ninguém foi.

O papel da Liderança na Experiência de Cliente

Para além do nível individual na gestão de clientes é necessária consistência na entrega do produto ou serviço, garantindo que, independentemente da pessoa ou área da empresa que trata com o cliente, a experiência do cliente é a mesma e de preferência excelente. Aqui, a liderança é fundamental para promover a experiência do cliente através da sensibilização e adopção de instrumentos que permitam criar uma cultura de foco e responsabilização no sucesso do cliente. Numa primeira instância a própria estratégia global da empresa deverá ter a experiência dos seus clientes como pilar ou objetivo a atingir e para a qual deverão ser alinhadas as iniciativas, processos, medidas e métricas. A partir daí a execução e monitorização será fundamental para garantir a existência de dados que revelem a experiência dos nossos clientes bem como a criação de planos de melhoria continua, que serão trabalhados sobre essas mesmas métricas.

Neste modelo empresarial recomendo assim algumas boas práticas a incluir, que poderão contribuir para esta cultura de foco no cliente:

1.Embaixadores ou representantes internos do cliente
O objetivo desta função é ser porta-voz do cliente, alguém que conhece tão bem o cliente que quase é confundido com o próprio cliente, quer internamente na sua empresa, quer externamente na empresa do cliente. Esta pessoa deverá ser o ponto de contacto principal sobre todos os temas relacionados com o cliente, quer internos, quer externos e deverá estar englobado num grupo mais vasto constituído por todas as pessoas que, de alguma forma, colaboram com esse cliente, formando assim uma chamada equipa de cliente, por onde deverá passar todo o planeamento e estratégia da gestão deste cliente.

2.Jornada do cliente
Trata-se simplesmente de mapear o caminho que o cliente percorre desde o início da interação até ao pós-venda com o objetivo de tornar esse caminho o mais simples e maravilhoso, que constitua uma excelente experiência de cliente. Poderá ser complementado com os chamados Caos de Uso onde contemplamos possíveis cenários de interação e respetivos caminhos ou processos a seguir para os mesmos. Desta forma conseguimos não só calçar os sapatos do cliente, antecipar possíveis desafios e iterativamente melhorar a experiência do cliente.

3.Performance e Reconhecimento
A criação de grupos responsáveis pelo cliente, por si só, poderá não ser suficiente para elevar a cultura de foco no cliente, é importante que todos as pessoas da empresa partilhem esta responsabilidade e vejam na sua função um propósito fundamental de ajudar o cliente, indo mais além do que é esperado das suas tarefas. A nível corporativo a performance é um fator que contribui para foco no cliente quando é baseada na responsabilização do atingimento de sucesso do cliente e em dados ou feedback que comprovam e ênfase nos resultados atingidos. Poderão questionar as funções que não estão diretamente ligadas ao cliente, no entanto mesmo aqui existe espaço para alinhar com objetivos gerais da empresa e possibilidade de colaborar ou ir além da sua rotina para apoiar a empresa, co uma pergunta tão simples como esta “ Como é que podemos ajudar mais os nossos clientes?”

4.Controlo de métricas de experiência de clientes
Esta é uma área extremamente estudada e para a qual existem já vários standards de mercado, os quais consistem em questionários de satisfação para os clientes onde a experiência passada, atual e antecipação de experiência futura permitem contribuir para obter uma fotografia do estado atual e de grau previsibilidade de consumo futuro, ou mesmo ainda de recomendação numa escala a avaliar. Pode fazer parte destes questionários a possibilidade de voltar a usar o produto/serviço outra vez e se o recomenda a outras pessoas. Um exemplo são os casos dos questionários de CSAT que mede os níveis de satisfação do cliente, bem como os questionários que usam o Net Promoter Score que constitui uma medida da satisfação, lealdade do cliente e de probabilidade de recomendação a outros. Estes questionários deverão ser enviados em certos pontos do tempo ou após determinadas interações com os clientes, sendo de elevada importância a sua análise e inclusão no plano de melhoria continuo.

5.Poder de Decisão descentralizado ou partilhado
Já alguma vez ouviu uma expressão do género “As regras são estas” ou “Na minha função não tenho poder para poder ajudar neste caso” ou mesmo “Não podemos devolver ou reembolsar” quando precisou de apoio? Ou por outro lado experienciou situações onde os colaboradores foram mais alem para ajudar, tendo por exemplo capacidade de decisão de uma devolução ou reembolso até determinado montante, ou mesmo de direcionarem internamente o escalamento de uma questão? Penso que a sua experiência de cliente melhorou na segunda opção, certo? A partilha da responsabilidade do foco na cliente deverá ser acompanhada de alguma descentralização do poder de decisão de forma que todos os colaboradores tenham oportunidade de ajudar os clientes de uma forma possível e ainda assim controlada

6.Propósito ou Missão
O propósito ou missão da empresa deverá ser conhecido e no qual o foco ao cliente esteja incluído, de forma a que os colaboradores se sintam motivados a fazer o melhor pelos outros, quer pelos seus colegas, quer pelos seus clientes e até porque não a contribuir para um mundo melhor. Como conta a história, um pedreiro quando questionado o que estava a fazer não respondeu que estava a partir pedras, mas sim a construir uma catedral.

7.Valorização e Bem-estar dos colaboradores
Sem os clientes uma empresa não tem lucro, mas sem as suas pessoas uma empresa não existe. É cada vez mais fundamental garantir uma cultura de relacionamento amigável e positivo, onde as pessoas são valorizadas, reconhecidas e criada uma cultura de bem-estar onde as pessoas se sentem bem e como tal também são motivadas a contribuir para o bem-estar dos outros, onde os clientes estão obviamente incluídos.

A experiência de cliente como lição de vida

Durante a minha carreira tive a oportunidade de trabalhar com muitos clientes que são grandes empresas nos mais variados setores de atividade, sendo considerada por muitos como fazendo parte da sua equipa, estando sempre disponível para contacto, quer fosse para ajudar a resolver problemas ou para aconselhar sobre a próxima solução a implementar. Em alguns casos tive também o privilégio de contar com os meus clientes para coapresentar e assim partilhar a sua experiência de cliente com outros, e ainda muitas vezes estabelecendo o contacto entre os clientes de forma que pudessem conversar abertamente entre eles sobre a sua experiência ou mesmo explorar ideias juntos. À medida que os anos avançaram, tornou-se fundamental para mim passar o meu conhecimento e ajudar a desenvolver equipas que trabalham com clientes todos os dias, também promovendo o sentido de missão para com o cliente, o foco na sua experiência, para que por sua vez obtenham excelentes resultados, que tenham clientes muito satisfeitos e assim passem também a outros o testemunho.

Para mim, a experiência de cliente não se traduz apenas como parte do meu trabalho no mundo empresarial ou de clientes, trata-se de ajudar pessoas, de fazer algo melhor, de tornar o mundo melhor, num sitio onde trabalhamos em equipa e onde todos ganham e têm sucesso, onde aprendemos, ensinamos, partilhamos e inovamos, numa descoberta constante de experiências fantásticas. E venham mais, obrigada!

Observador associa-se à comunidade PortugueseWomeninTech para dar voz às mulheres que compõe o ecossistema tecnológico português. O artigo representa a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da comunidade.