1 A julgar pela gestão desastrosa da pandemia em Portugal, pode concluir-se que já é tempo de passar não só um atestado de incompetência aos nossos governantes, mas também de total inconsciência a um número significativo de “cidadões”.

Desta vez, Portugal ocupa o primeiro lugar do mundo pela pior das razões: pelo número de infectados e mortos devido à pandemia, situação que só pode ser surpreendente para quem tem andado distraído nos últimos meses.

Ainda antes do Natal e do Ano Novo já era mais do que previsível o aumento brusco do número de infectados e mortos devido à Covid-19 se fossem “suavizadas” as medidas de combate à pandemia, mas o Governo e o Presidente decidiram não quebrar a tradição e ser mais “tolerantes” nessa altura. Isto, a despeito da opinião dos especialistas da área da saúde. O resultado foi aquilo a que chamei de “populismo criminoso”. Ficou mais uma vez claro, que não vale tudo para ganhar pontos na luta política e eleitoral e que os bons governantes são aqueles que não temem tomar medidas impopulares, mas eficazes.

Esta política populista poderá reflectir-se de forma desastrosa nos resultados das eleições presidenciais. Os nossos políticos tiveram muito tempo, já que a pandemia dura há quase um ano, para considerar a possibilidade de adiamento do escrutínio. É verdade que isso daria muito trabalho, pois exigiria a revisão da Constituição, etc., etc., mas tudo poderá ser agora ainda mais difícil ou perigoso.

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A campanha eleitoral mais parece o Carnaval. Não pelo uso de máscaras, mas pela “chegada” de “ciganos feitos à pressão, pela moda do batom vermelho e pelos testes à Covid-19 feitos ao Presidente/candidato: até pareceu um semáforo a piscar com os resultados negativos e o positivo.

O mais provável é que a abstenção atinja níveis nunca vistos e isso não se deverá ao grande número de vítimas da pandemia. O medo e o cansaço político poderão ter forte influência. Por conseguinte, o novo Presidente, caso vença à primeira volta, terá uma base de apoio bastante fragilizada, o que não reforça a democracia.

Por isso, é preciso começar a pensar já no que fazer quando a pandemia estiver controlada. Um dos primeiros passos a dar será demitir o actual Governo e convocar eleições legislativas para que os Portugueses julguem a forma como a luta contra a pandemia foi gerida. Se estiverem contentes com o trabalho de António Costa, Eduardo Cabrita, Marta Temido, etc., poderão dar maioria absoluta ao executivo socialista.

(Aliás, isso pode e deve ser feito durante a pandemia se o Governo continuar a dar sinais de clara incompetência).

Mas nesta análise não posso deixar de me debruçar sobre o comportamento dos Portugueses, principalmente daqueles a quem chamaria “cidadões”. Estes já deram provas de que, infelizmente, são numerosos e acham que as leis, mesmo numa situação de emergência, não são para cumprir. Um exemplo degradante é o número de máscaras atiradas para os jardins e passeios.

Ao violarem as mais elementares regras de segurança sanitária, os “cidadões” não só colocam em perigo a sua saúde, mas também a dos cidadãos. E, além disso, contribuem para sobrecarregar os hospitais.

Há muito que ficou claro que os apelos à cidadania caiem em saco roto e só resta um meio real de chamar os “cidadões” à razão: multas, multas e multas pesadas.

Os números de multas revelados pela polícia mostram que as forças da ordem ainda perdem tempo com a pedagogia.

E não me venham acusar de querer impor ditaduras, regimes autoritários, etc. Se estamos em estado de guerra, os infractores são traidores. E a guerra poderia não ter começado se as pessoas simplesmente se respeitassem umas às outras.

2 A detenção do opositor russo Alexey Navalny não constituiu surpresa para ninguém, mas foi caricata e ridícula a forma como foi feita.

Vladimir Putin e a sua corte repetem insistentemente que Navalny não representa ninguém na Rússia, que é uma criação da CIA norte-americana para desestabilizar o seu regime. Por isso, o czar diz não ter medo de uma pessoa que, para ele, não tem nome nem apelido.

Contudo, a recepção ao opositor mostra que esse discurso tem cada vez menos a ver com a realidade. Quando as autoridades russas viram que centenas de pessoas se reuniram no aeroporto de Vnukovo, onde devia aterrar o avião com o “paciente de Berlim” (um dos epítetos do Kremlin para Navalny), cercaram o edifício com polícia de choque e as detenções começaram. Isto também era expectável.

Mas Putin foi mais longe no campo da luta contra um “opositor insignificante” e mandou desviar o avião para o aeroporto de Sheremetevo, situado a umas dezenas de quilómetros do primeiro. Além disso, a polícia montou barreiras para dificultar o movimento dos opositores.

Seguindo a lógica putinista, estávamos a assistir ao combate contra uma mosca, utilizando os mísseis supersónicos tão publicitados pela propaganda russa.

Detido na zona de controlo de passaportes, Navalny foi levado para uma esquadra de polícia dos arredores de Moscovo e, no dia seguinte, contra todas as normais processuais, foi aí julgado por uma juíza chamada ao local para o efeito. As paredes da “sala de audiências” da esquadra de polícia estavam decoradas com retratos de antigos dirigentes dos órgãos de segurança da União Soviética, entre eles Guenrich Yagoda, um dos mais conhecidos carrascos do estalinismo. Como só alguns “órgãos de informação” leais ao poder estiveram na sala, não se sabe se o retrato desse carrasco estaria acompanhado dos de Iajov ou Béria.

Navalny foi condenado a 30 dias de prisão, mas as condenações não se ficarão por aqui. Isso significa que Putin tem medo, e cada vez mais, à medida que a paranóia do poder absoluto se apodera dele. E, como é sabido, o medo não é bom conselheiro.