O dia começou às sete da manhã com “um agujerito en el cielo”, que se fez ouvir através da coluna-candeeiro, pré-anunciando o momento memorável que vai invadir os ouvidos de muitas centenas de pessoas na nossa querida cidade invicta no Nos Primavera Sound com James Blake e Rosalía.
Se repararmos a música está em toda a parte nas nossas vidas, fundindo-se até já inclusive no nosso mobiliário.
O homem desde sempre teve a preocupação de ligar a sua alma a esta arte como forma de expressão, terapia e comunicação com o seu entorno.
A vida seria igual sem música e sem sons?
Quantos de nós não conseguiríamos escrever o “nosso último currículo” na Terra, através de uma ou de várias playlists?
Dei por mim noutro dia a fazer isso naturalmente numa plataforma de streaming, enquanto editava as músicas que escolho para acordar todas as manhãs.
Gosto que os primeiros minutos das minhas manhãs sejam acompanhados por sons como por exemplo os dos Hang Massive que ao fundirem os sons da natureza permitem-me abandonar de forma suave o mundo dos sonhos em que o corpo havia adormecido durante a noite.
Já os minutos seguintes acompanham muitas vezes músicas como a Passenger de Iggy Pop, porque o dia pede energia e eu gosto de energizar as primeiras tarefas da manhã até pisar o tapete da rua.
Quantos não saberíamos atribuir canções às pessoas que compuseram a partitura das nossas décadas de vida?
Quantos não fazem aliás uma dinâmica semelhante a esta nos seus casamentos?
E quantos não gostariam de a fazer nos seus funerais, para que desta forma a vida se pudesse celebrar sobre a morte, perpetuando a história daquele corpo que se esvaziou de tudo para seguir em viagem a outra hipotética dimensão?
A nossa experiência com a música justifica a história dos gémeos Espanhóis Juan e Ignacio García Castello que criaram a associação sem fins lucrativos “música en vena” com o objectivo de humanizar os internamentos hospitalares através da música.
Ambos acreditam que perante o ambiente hostil e de dor que impera pela doença dentro de um hospital, a música pode enganar os sentidos dos doentes e dos seus familiares eliminando da memória o cheiro hostil a desinfectante, o toque áspero dos lençóis azuis e as paredes brancas pintadas de dor e sofrimento.
Foram assim realizados nos últimos 6 anos através deste projecto na comunidade de Madrid, mais de 2200 micro-concertos para um total de 44.000 pacientes.
Os profissionais de saúde daquela comunidade ao aperceberem-se do efeito positivo da música nos pacientes decidiram comprovar que a música ajuda nos processos curativos, tendo um efeito semelhante a algumas drogas no cérebro, facto aliás já comprovado por alguns outros estudos. Nasceu assim o projecto “Músicos Internos Residentes” que através do método científico recolhe os registos correspondentes às mudanças fisiológicas medíveis e objectivas que se verificam nos pacientes. O estudo pretende comprovar que a música tem influência nos processos de cura.
Acredito nesta medicina integrativa que se faz valer do método científico para comprovar estas verdades que são tantas vezes verdades de”rua” sem qualquer estirpe de evidência.
Outra experiência interessante que nos demonstra que existem sons que curam é a do médico oncologista, autor do livro “sons que curam” Mitchell Gaynor.
Este oncologista utiliza a terapia de som das Taças Tibetanas nos seus pacientes. É fantástico verificar como o corpo reage e abandona o medo e o stress através de determinados tipos música dentro daquela que é a perspectiva científica que nos conta como a música incrementa o sistema imunitário pode ser incrementado até 15% através de uma sobreprodução de interleucina-1.
Mitchell verificou como o som das taças tibetanas faz a pressão arterial diminuir e como ondas cerebrais se modificam para alfa e teta, as designadas “ondas do estado de relaxamento”.
A música afecta-nos a alma e o espírito mas antes disso tudo afecta as nossas células, os nossos tecidos, os nossos órgãos e por fim os nossos sentidos.
Talvez pudéssemos viver sem ela, mas não seria definitivamente a mesma coisa…