Estamos a dar a aula mais importante das nossas vidas” ecoa a super faixa que os professores da Escola Secundária da Boa Nova, de Leça da Palmeira, transportam nas várias manifestações que têm sido realizadas no Porto e em Lisboa.

Acredito que muitas pessoas, sobretudo os mais jovens, não façam contas à vida do que significa o esforço estoico para andar, há quase três meses, em greve.

Fazer greve tem implicações que mexem no bolso e o tornam cada vez mais leve e vazio, sobretudo no final do mês.

Os professores estão a sacrificar-se, a si e às suas famílias, para exercer o seu direito à greve há meses. Muitos estão a poucos anos da reforma, ou mesmo no limite da mesma, e, mesmo assim, têm feito questão de se deslocar a pensar nas gerações vindouras e no que têm vivido nos últimos anos.

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Ser professor, devemos recordar-nos, não implica apenas picar o ponto e fechar o turno.

O professor nunca fecha o seu turno. O professor é mentor, psicólogo e, nos últimos anos, até se tornou funcionário administrativo.

O professor veste, assim, várias capas, tal como a cebola, e é uma pena que termine sempre em lágrimas e na incerteza sobre o destino do seu futuro.

Muitos professores são inclusivamente pais, maridos, esposas e merecem ter uma vida digna, partilhada e convenientemente organizada.

As manifestações dos últimos dois meses têm sido interessantes porque, se olharmos para as imagens de 2008 e as colocarmos no espelho com as de 2023, poderíamos jurar que nada mudou. E se nada mudou, porque continuamos a ver as mesmas pessoas a negociar em nome dos professores?

De que serviram as manifestações do passado?

Não tenho a menor dúvida de que os professores nos estão, de facto, a dar a maior aula de cidadania das nossas vidas.

Nós somos o povo que prefere ficar no sofá ao invés de ir às urnas em dia de eleições, e somos o povo que prefere ser levado ao limite ao invés de fazer algo para resolver os problemas que aumentam a precariedade de todos os dias.

Olhando para a atitude cívica de cidadãos de outros países, como a França, eu sempre pensei que a passividade portuguesa era um problema intrínseco ao nosso ADN. No entanto, os professores parecem possuir a mutação que nos deve inspirar a ter uma atitude cívica e mais participativa em sociedade.

Não acredito que a verdadeira opinião pública se vire contra os professores em algum momento de toda esta odisseia grevista que estoicamente vivem há meses.

Somos um povo com muitos defeitos, mas somos dos povos mais solidários do mundo e muitos portugueses são encarregados de educação e também já foram alunos.

Por fim, quero dizer aos professores da Boa Nova de Leça da Palmeira que leio notícias. E sei o que viveram recentemente para defender as infraestruturas da sua própria escola.

Continuem a inspirar-nos e a dar, junto dos restantes professores do país, a aula mais importante das vossas vidas.

Uma sociedade livre, evoluída e democrática constrói-se através da luta do povo pelos seus direitos. Nunca teríamos chegado a este ponto da nossa história como país se muitos não tivessem percorrido os quilómetros da liberdade.