Afinal a NATO não está em ‘morte cerebral’. Celebrou na semana passado os 70 anos, felizmente em Londres, sob a inquestionável autoridade moral da Rainha. Reafirmou o seu compromisso fundador para com a defesa do Ocidente liberal e democrático. Denunciou as ameaças subversivas da Rússia e da China. E até reiterou o compromisso dos estados-membros de cumprirem o prometido contributo de 2% do PIB para a Aliança comum.
São sem dúvida excelentes notícias. Fundamentalmente, marginalizaram as tentativas de separar a Europa da América, a pretexto do inegável carácter errático do actual inquilino da Casa Branca. Mas essas tentativas não devem ser menosprezadas — pelo contrário, devem ser abertamente desafiadas e enfaticamente condenadas.
A Aliança Atlântica não se funda em acordos ou desacordos momentâneos entre os inquilinos que exercem temporariamente o poder em cada uma das democracias euro-atlânticas. Funda-se no crucial compromisso euro-atlântico para com o Ocidente. Daí decorre o crucial compromisso de enfrentar em comum qualquer ameaça a qualquer um dos estados-membros.
É crucial recordar estes princípios quando o comunismo chinês tem em curso uma política expansionista mundial — comparável ao, ou talvez ainda mais agressiva do que o expansionismo soviético dos tempos da Guerra Fria. Como têm sublinhado inúmeros analistas académicos independentes, a estratégia chinesa não visa promover revoluções comunistas (como visava a soviética). A sua estratégia assenta naquilo que é agora designado por “captura das elites” — através de um gigantesco plano de investimento à escala mundial e de um gigantesco plano de corrupção a ele associado.
A revista “The Economist” vem dando semanalmente conta deste gigantesco plano corruptor. O Parlamento britânico tem actualmente em curso um inquérito sobre este tema, sobretudo no âmbito das universidades no Reino Unido. E a estratégia de corrupção chinesa está hoje conclusivamente diagnosticada na Austrália e na Nova Zelândia.
Tal como nos tempos da Guerra Fria com a União Soviética, temos hoje entre nós os habituais ‘idiotas úteis’ (uma expressão clássica recentemente recordada, a outro propósito, pelo ex-eurodeputado socialista Francisco Assis), além dos habituais ‘pedintes de mão estendida’.
Sobre os ‘pedintes de mão estendida’ não há muito de novo a dizer. São os habituais dependentes de subsídios, em regra críticos do chamado ‘capitalismo’. Como não sabem viver com base na preferência livre dos consumidores numa economia descentralizada, procuram sempre a protecção do estado. Se o estado for a ditadura comunista chinesa, tanto melhor: os ‘pedintes de mão estendida’ já estão a elogiar sem vergonha na praça pública ocidental a chamada ‘eficiência’ dos comunistas que lhes pagam o subsídio (ou a que eles aspiram que lhe venha a ser pago). Por outras palavras, quanto mais dependentes do estado forem as economias ocidentais, mais elas serão vulneráveis ao plano de corrupção global dos comunistas chineses.
Algo mais tem de ser dito, no entanto, acerca dos actuais ‘idiotas úteis’. O seu argumento é aparentemente mais sofisticado. Consiste basicamente em dizer que não existe uma ameaça global do comunismo chinês — mas apenas uma rivalidade entre duas super-potências, os EUA e a China. Nessa rivalidade, a Europa deveria permanecer autónoma e equidistante. Nesta perspectiva, condenar o expansionismo comunista chinês seria uma manifestação de subserviência relativamente ao ‘imperialismo americano’.
Deve ser recordado que também esta linguagem não é nova. Foi amplamente repetida durante a guerra fria para tentar separar a Europa da América e para tentar evitar a denúncia do imperialismo comunista soviético. Foi também usada e abusada entre nós durante o PREC — em 1974/75 e ainda bastante depois. Até que Mário Soares pôs fim a esses delírios em nome da ‘esquerda’ e reiterou sem hesitações a aliança de Portugal com a NATO e com a América. Foi então chamado ‘o homem dos americanos’. Ao que ele respondeu com clássico sentido de humor: ‘Com muito gosto!’
Não nos enganemos. Estamos a assistir a uma gigantesca ofensiva global do comunismo chinês. Perante essa ofensiva, o reforço da NATO é hoje ainda mais crucial do que foi no passado — como sublinhou certeiramente a Chanceler alemã, Angela Merkel. A ideia de separar agora a Europa da América seria simplesmente suicida.
A razão é simples e pode ser recordada nas palavras tocantes de Winston Churchill em Paris, em 1936, quando denunciava a ameaça nazi e comunista contra o Ocidente:
“Como podemos nós, criados e educados num clima de liberdade, tolerar ser amordaçados e silenciados; ter espiões, bisbilhoteiros e delatores a cada esquina; deixar que até as nossas conversas privadas sejam escutadas e usadas contra nós pela polícia secreta e todos os seus agentes e sequazes; ser detidos e levados para a prisão sem julgamento; ou ser julgados por tribunais políticos ou partidários por crimes até então desconhecidos do direito civil? […] Pois eu afirmo que devemos fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para não termos de nos submeter a tal opressão!”
Em suma, como também disse Churchill, desta feita no Parlamento britânico, a 4 de Junho de 1940:
“We shall never surrender!”