Num país onde a política deveria ser um veículo para o progresso e aprimoramento da sociedade, Portugal enfrenta um dilema cada vez mais evidente: a cegueira ideológica que impermeabiliza as discussões políticas e impede o surgimento da inovação e soluções eficazes para os desafios que enfrentamos. Este fenómeno é amplificado pela tendência das pessoas em fixarem-se unilateralmente à ideologia partidária em detrimento do diálogo convergente.

Em vez da promoção de um ambiente de debate saudável, em contexto de assembleia ou fora do parlamento, onde diferentes perspetivas e propostas são consideradas com imparcialidade, muitos intervenientes políticos têm adotado uma mentalidade de confronto constante, fruto da cultura de clubite partidária cimentada nas últimas décadas. O foco está mais centrado em reprovar as ideias apresentadas pelos partidos adversários do que em avaliar o seu mérito intrínseco. Esta abordagem estreita e unipartidária tem alimentado um ciclo de estagnação política, a nível nacional e autárquico, onde o interesse comum é frequentemente descurado em prol dos interesses partidários e agendas pessoais.

O resultado é uma polarização crescente e uma incapacidade de alcançar consensos que permitam avançar com políticas que beneficiem a sociedade como um todo. Em vez da procura de soluções pragmáticas que possam resolver problemas reais através de dados e consulta especializada, as discussões frequentemente degeneram em batalhas ideológicas que todas as semanas podemos assistir em qualquer estação televisiva, onde o objetivo transversal é a derrota, se não a humilhação, do homólogo político adversário.

É igualmente relevante destacar a transformação da imagem do indivíduo que procura o consenso em ambiente politicamente correto, no contexto volátil que se observa na atualidade. Com frequência, a busca por acordos e o exercício da boa prática dialogante são percecionados como posturas brandas e pouco assertivas, o que contrasta com a rigidez e a inflexibilidade valorizadas nos dias de hoje para alcançar sucesso nos degraus da Assembleia da República ou pelas galopantes subidas pelas juventudes e fileiras partidárias, pelo menos em termos pessoais.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Esta dinâmica é aplicável a qualquer tendência partidária, quer se situe na direita ou na esquerda, no espectro conservador ou liberal, independentemente da sua postura ser proativa ou reativa. Frequentemente, todos os grupos políticos compartilham o mesmo objetivo teórico, o bem-estar geral da população, divergindo apenas nos métodos considerados credíveis para alcançar a solução pretendida. A mesquinhez representa o fator mais abrangente entre todos os intervenientes da liga política, sendo não apenas injustamente tolerada e mal arbitrada, mas também excessivamente recompensada para aqueles que a praticam.

Como anteriormente aludido, no âmbito da esfera política profissional, é comum observarmos a reprovação e a abstenção de medidas com as quais um partido ou indivíduo concorda essencialmente, mas que não foram originalmente concebidas pelos próprios. Frequentemente estas medidas são posteriormente recicladas pelo mesmo partido que as reprovou, eventualmente sendo aceites e reapropriadas como suas.

Esta mentalidade estreita é especialmente preocupante quando se considera que muitas vezes as melhores soluções podem surgir através do criticismo construtivo objetivo. Ideias inovadoras e eficazes podem vir de qualquer identidade ideológica, e é essencial estar aberto a considerá-las, independentemente da sua origem partidária. No entanto, o apego rígido às ideologias impede essa abertura, criando uma barreira à inovação e ao progresso.

Para romper com esse ciclo de estagnação, é crucial promover uma cultura política baseada no diálogo construtivo e na colaboração entre diferentes setores da sociedade. Isso requer um esforço consciente para deixar de lado as lealdades partidárias em prol do bem comum. Os cidadãos devem estar dispostos a considerar ideias de todos os quadrantes políticos, avaliando-as com base no seu mérito e potencial para resolver os problemas do país, onde a comunicação social tem o papel nuclear de veicular a informação de forma imparcial, educando e elucidando, combatendo a iliteracia nos diversos tópicos de interesse nacional.

Adicionalmente, os líderes políticos têm a responsabilidade de promover um ambiente onde o colóquio saudável seja incentivado e respeitado. Isso significa abandonar a retórica divisiva em favor de uma abordagem mais inclusiva e colaborativa. Somente através do reconhecimento mútuo e do compromisso comum com o bem-estar da nação é que Portugal poderá superar os desafios que enfrenta e construir um futuro mais próspero para todos os seus cidadãos, sobretudo num governo minoritário.

A ironia reside no facto de que a própria essência de um texto como este possa ser, também ela, antagónica e contrária à natureza do clima atualmente vivenciado no contexto político em Portugal.