O Não ganhou na Escócia, com cerca de 55% dos votos . Boas notícias para o Reino Unido e para a Europa. O processo de dissolução de um dos seus principais países seria a última coisa que a União Europeia precisava agora. O resultado do referendo, contudo, não mata a questão da independência da Escócia para os próximos 50 anos. Para isso, teria sido necessário uma vitória do Não com pelo menos 60%.

O resultado do referendo também não é o fim, mas o início de um processo constitucional que pode mudar profundamente o Reino Unido. As energias políticas vão agora concentrar-se nas negociações para devolver mais poderes para a Escócia. Não será um processo fácil. Salmond irá pedir mais do que Cameron está preparado para dar. E o jogo político entre os dois poderá ser decisivo para o futuro da Escócia. Cameron vai utilizar a devolução para conseguir o que não alcançou com o referendo e matar a questão para as próximas três, quatro gerações. Salmond tentará mostrar que a devolução será insuficiente e mais tarde ou mais cedo será necessário regressar às urnas.

Mais importante, as outras nações do Reino Unido vão igualmente pedir mais poder. E o processo de devolução de poder para o País de Gales e para a Irlanda do Norte irá começar brevemente. Mas o futuro de Inglaterra será a questão central. O debate de resto já começou. Começa a surgir um consenso acerca de duas questões. Se as outras nações vão receber mais poder, a Inglaterra não pode ficar fora do processo. O segundo consenso diz respeito à necessidade de limitar (ou excluir) a participação de deputados escoceses em Westminster nas decisões sobre assuntos ingleses. Quanto ao modo de aplicar estas ideias, há muitas dúvidas e haverá certamente divergências entre os principais partidos. O Ukip será um factor de instabilidade e irá afectar os Conservadores. Farage já defendeu um parlamento inglês. E esta, desconfio, será a maior e mais complicada das questões.

O futuro constitucional do Reino Unido poderá tornar-se igualmente um dos grandes temas das eleições de 2015. O Partido Conservador, cada vez mais um partido inglês, poderá ser beneficiado se se tornar no partido que mais poderes quer devolver aos ingleses. Ironicamente, o partido unionista poderá transformar-se no partido da devolução e beneficiar eleitoralmente dessa mudança.

A política escocesa poderá tornar-se mais interessante. A nação está dividida e não é fácil ver Salmond a liderar a reconciliação nacional. Poderá tentar recuperar legitimidade política, indo para eleições antecipadas (previstas para 2016), para reforçar a sua posição. Mas também poderá sair enfraquecido politicamente deste processo. A intervenção de Gordon Brown na campanha foi decisiva, com um dos melhores e mais poderosos discursos da sua (longa) carreira política (como apontou aqui José Manuel Fernandes). Há quem deseje a sua candidatura à frente dos trabalhistas escoceses nas próximas eleições regionais. Há mesmo quem acredite que é o único que pode derrotar Salmond. O que não deixaria de ser extraordinário e absolutamente inesperado.

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