Não gosto de usar citações. Em primeiro lugar, porque atrapalham a cadência do texto e, de brinde, conferem-lhe um mofo escusado. Em segundo lugar, porque pretendem demonstrar uma erudição que, dado que qualquer pateta consegue catar frases na internet, não deslumbra ninguém. Em terceiro lugar, porque é uma maneira fácil de uma pessoa trocar a origem da frase, espalhar-se ao comprido e exibir uma ignorância de alto calibre. Há dias, uma “jornalista” que escreve num jornal extinto atribuiu o “Proletários de todo o mundo, uni-vos…” a Lenine. Além de o texto não ser bem assim (“todos os países” em vez de “todo o mundo”), o autor também não é bem esse. A pobre “jornalista”, que conviveu anos com um famoso trafulha sem suspeitar das trafulhices, tem lata, mas não tem jeito nem sorte.

Serve o maçador intróito para justificar o recurso a uma citação na presente crónica e, enfim, ajudá-la a arrancar: “O poder corrompe, o poder absoluto corrompe absolutamente”. A autoria é evidentemente de Engels – estou a brincar: é de Lord Acton. E a citação está incompleta: o poder corrompe, o poder absoluto corrompe absolutamente e a rapaziada do PS já nasce corrompida. Na opinião de Lord Acton, e na prática dos partidos comuns, a corrupção é uma decorrência. No Partido Socialista parece ser critério de admissão, ou pelo menos de progressão na carreira.

Na semana anterior, a trapalhada com uns protectores “antifumo” que afinal não protegiam vivalma levou à descoberta de que a empresa que os vendeu à Protecção Civil pelo dobro ou o triplo do preço de mercado pertence ao marido de uma autarca do PS. Isto inaugurou a caça aos contratos entre familiares de socialistas e o Estado. E o que se apanhou constituiu um choque, um choque, claro, para quem andava cego ou vive na Tasmânia. O filho de um secretário de Estado possui 20% de uma firma de serração de madeira que serra para câmaras municipais e tal. Duas empresas do pai do ministro das Infraestruturas (aquele Pedro que manda nas “bases” e, consta, no dr. Costa) mantêm uma relação próspera com os dinheiros públicos, não apurei em que ramo. O marido da ministra da Justiça, que é advogado, emite pareceres, decerto vitais para a pátria, para diversos ministérios. E empresas do pai, da mãe, do irmão e da própria ministra da Cultura (juro, ou juram os noticiários) celebraram contratos com o Estado. Etc. Acho que a busca seria abreviada se se invertesse o objectivo e se procurasse apenas os socialistas que não embarcam nas negociatas. Ficaríamos com uma lista pequenina, idêntica à das “Lendas Desportivas Judaicas” do filme “Aeroplano” (nova citação, mas despretensiosa e logo aceitável). Ou até sem lista nenhuma.

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