Setembro é o mês das chamadas “doenças hemato-oncológicas” – ou, por outras palavras, das doenças malignas do sangue, que podem englobar, entre outras, leucemias, linfomas e mielomas.

Os cancros do sangue têm origem nas células que formam o sangue e o sistema linfático. São tumores raros quando comparados com outros. Em Portugal, o Registo Oncológico Nacional identificou 4.873 cancros do sangue em 2019, para um total de 57.878 casos, representando cerca de 8% de todos os tumores.

Os linfomas não Hodgkin são o cancro do sangue mais frequente, tendo sido diagnosticados 2058 casos em 2019. O mieloma múltiplo é o segundo mais frequente, com 679 casos, seguindo-se as leucemias mielóides e linfóides, em terceiro e quarto lugar, respetivamente.

A exemplo de outros tumores, a sua frequência é maior no sexo masculino e nos indivíduos de idade mais avançada, com um pico de incidência entre os 60 e os 74 anos de idade. Na maioria dos casos não é possível identificar uma causa ou um fator de risco específico, no entanto, é reconhecido que uma exposição a produtos tóxicos de diferentes origens, o excesso de peso, o tabagismo, o álcool ou o sedentarismo, podem contribuir para um maior risco de cancro em geral, incluindo os hematológicos.

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O diagnóstico precoce é fundamental para um tratamento adequado e pode influenciar de forma significativa o prognóstico clínico. Os sintomas do cancro, incluindo os cancros do sangue, são muitas vezes inespecíficos – fadiga, cansaço fácil, perda de apetite, emagrecimento, sudorese noturna, aumento do tamanho dos gânglios, tosse ou febre prolongada, justificam a procura do médico para investigação.

Sendo os casos de cancro do sangue relativamente raros, é muito importante que o seu diagnóstico e tratamento seja feito em centros e por clínicos com experiência. As consultas de Grupo Multidisciplinar são, hoje em dia, uma ferramenta essencial no diagnóstico e tratamento adequado dos casos de cancro e uma garantia de que foram discutidos entre vários especialistas.

Mas como é feito o tratamento dos cancros do sangue? Ao contrário de outros tumores, a cirurgia tem um papel limitado no tratamento desta doença, limita-se na maioria das vezes à realização de biópsias para recolha de amostras de tecido para o diagnóstico. O tratamento dos cancros do sangue depende do tipo – por exemplo, linfoma, mieloma ou leucemia – e baseia-se em tratamentos de quimioterapia, radioterapia, imunoterapia humoral com anticorpos, imunoterapia celular com células CAR T, pequenas moléculas que inibem determinadas enzimas ou ainda o transplante de medula óssea que pode ser do próprio doente (autotransplante) ou de um dador saudável (alotransplante).

Nos últimos anos foi enorme a evolução introduzida quer no diagnóstico, quer no tratamento desta doença. Em relação ao diagnóstico, os centros especializados têm hoje ferramentas que nos ajudam a ter mais certezas e a diagnosticar com mais exatidão os diferentes tipos de cancro. As técnicas de genética molecular permitem a identificação de alterações genéticas que depois nos permitem selecionar o tratamento mais adequado para cada doente, diminuindo os custos, os efeitos colaterais durante o tratamento, aumentando a probabilidade de cura dos doentes.

Os cancros do sangue são doenças que hoje têm um grande potencial de cura. A probabilidade depende do tipo de cancro, do facto de estar localizado ou disseminado e da idade do doente. São dos tumores com maior probabilidade de cura, mesmo quando a doença já não está localizada. Os linfomas de Hodgkin têm uma probabilidade de cura na ordem dos 80% e os não Hodgkin na ordem dos 60 a 70%.

O mieloma múltiplo é provavelmente o cancro do sangue com menor probabilidade de cura, no entanto, mesmo nesta doença tem havido um avanço significativo no seu tratamento. Hoje temos muitos mais medicamentos do que tínhamos num passado recente, o que permite um controlo muito mais eficaz da doença e mesmo que não seja ainda possível uma cura, os doentes conseguem sobreviver cada vez mais tempo e com melhor qualidade de vida.