De um lado, temos quem defenda populisticamente todas as pessoas oriundas de bairros problemáticos como vítimas de um sistema opressor, sem espaço para responsabilidade individual. Do outro, há quem defenda, de forma igualmente populista, todas as forças policiais como infalíveis, agentes do bem, que agem sempre de acordo com a lei e para a proteção da sociedade. No entanto, tanto uma visão quanto a outra estão longe de refletir a complexidade e a realidade..

Parece-me francamente óbvio que tanto nas forças policiais como nos bairros marginalizados existem pessoas boas e más. O que falta, frequentemente, é a ponderação e o tempo necessário para apurar os factos antes de saltarmos para conclusões simplistas. Não é difícil cair na tentação de emitir juízos de valor imediatos, influenciados por ideologias extremistas e populistas que, em vez de promoverem o diálogo, contribuem para uma divisão crescente na nossa sociedade.

O filósofo Michael Oakeshott refletiu sobre as diferenças essenciais entre a esquerda e a direita, observando que a principal diferença reside no facto de que as pessoas de esquerda tendem a acreditar que todos os seres humanos são mais iguais do que diferentes, enquanto as pessoas de direita tendem a acreditar que todos os seres humanos são mais diferentes do que iguais. Este pensamento serve de base para compreendermos a raiz de muitos dos debates atuais e o problema começa sempre na palavra “todos”. A esquerda valoriza a igualdade e, muitas vezes, o coletivo, enquanto a direita tende a enfatizar as diferenças e o indivíduo. De que lado estamos? Podemos estar dois dois? Eu pelo menos, estou!

Como liberal, pragmática, humanista e moderada, aquilo em que acredito verdadeiramente é que a realidade está no equilíbrio. Nem todas as pessoas são iguais, nem todas são totalmente diferentes. E, acima de tudo, a bondade e a maldade não são apanágio exclusivo de uma classe social, profissional, de um grupo étnico ou de uma qualquer minoria. Existem polícias que agem com integridade e há outros que falham. Da mesma forma que, nos bairros desfavorecidos, há quem trabalhe arduamente para sair de um ciclo de pobreza, e há também quem recorra à violência e ao crime. Somos todos seres humanos. Logo, imperfeitos, na nossa natureza.

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Nos casos específico de Odair e do Tiago o essencial é resistir à tentação de extremar posições e sobretudo saber manter o bom-senso. Na qualidade de cidadã e contribuinte exijo ao Estado, acima de tudo, que execute em todos os casos as devidas  investigações rigorosas e transparente. Só com todos os factos em cima da mesa é possível realizarem-se as análises justas e equilibradas. Apurar responsabilidades e construir os juízos de valor.

O perigo dos dias de hoje reside desta – cada vez maior e mais preocupante – polarização, na criação de narrativas simplistas que só perpetuam a desconfiança entre comunidades e instituições.

A morte de Odair e o incêndio que colocou o Tiago no hospital são tragédias, mas as escaladas de falta de noção só agravam a situação. As manifestações violentas mostram que há feridas profundas na sociedade que precisam de ser tratadas, mas o populismo não é a resposta.

Há pessoas boas e más em todos os lados. E, enquanto cidadãos, devemos manter a nossa postura de busca pela verdade, pelo equilíbrio, e pela justiça, sem nos deixarmos cair na armadilha de extremismos que só fragmentam ainda mais a sociedade. E, já agora, vamos exigir  às classes políticas que combatam, com eficácia, todos os seus abutres! Podem só, por favor, manter o bom-senso?