Não sei que resultado vamos ter no domingo. Mas sei uma coisa: seja qual for o resultado, as coisas já mudaram. Como é que sei? Por esta razão: se as coisas não tivessem mudado, não teria havido eleições. Costa, Catarina e Jerónimo não decidiram simplesmente ser mauzinhos uns para os outros. Apenas perceberam que o seu reino já está a deixar de ser deste mundo. Primeiro, porque o dinheiro barato que lhes permitiu evitar reformas à custa da dívida pública está a chegar ao fim; segundo, porque é claro que o actual caminho só leva o país a um lugar: o de mais pobre da UE. Por isso, o PRR nem sequer foi tema desta campanha: com o país como está, todos sabemos que esses fundos vão ter o mesmo efeito que um copo de água despejado no Saara. Foi isto que desfez a geringonça. No domingo, até pode refazer-se. Mas o seu tempo acabou. Eles podem não olhar para cima, como no filme da Netflix, mas sabem.

A esquerda é acusada de falar como se houvesse uma árvore de dinheiro. Mas nos últimos anos, houve mesmo: estava nos bancos centrais, sempre a fabricar moeda a pretexto desta ou daquela crise. Em Dezembro, porém, a taxa de inflação nos EUA chegou ao valor mais alto desde há 40 anos. Sim, é possível viver de dinheiro mágico durante algum tempo, mas não durante todo o tempo. A partir daqui, a ilusão da geringonça só pode ruir, porque a consequência de uma economia estagnada e de um Estado inviável, com juros altos, já não será apenas o doce resvalar na hierarquia da riqueza europeia, mas apertos mais sérios.

É isso que Costa, Catarina e Jerónimo sabem, e não dizem. Mas não são só eles. A direita também não o diz. Quando António Costa clamou que era um risco confiar poupanças aos mercados de capitais, ninguém lhe lembrou que era ainda mais arriscado confiar contribuições a um Estado que, nos vinte anos deste século, já faliu uma vez. Mas a direita entrou nestas eleições como a esquerda nas eleições de 2015, só disponível para falar de “devolução de rendimentos”, desta vez sob a forma de reduções de impostos. O debate eleitoral foi simultaneamente o mais animado e o mais pobre de sempre. Em 2011, ainda se falou da reforma do Estado. Este ano, nem os novos partidos perturbaram a autocomplacência. Ninguém substituiu o Dr. Medina Carreira, a última pessoa a fazer contas e a discutir coisas incómodas.

Estou portanto a dizer que os votos de domingo não têm importância? Não. Vamos votar porque tudo mudou, e é porque tudo mudou que é fundamental votar para mudar de governo. O país precisa de reformas. A direita agora não as propôs, mas poderá fazê-las, ao contrário da esquerda, que não as propõe nem nunca as fará. É por isso que talvez seja aconselhável dispensar calculismos. Olhem para cima antes de votar. Não é inteligente deixar o PS no poder, para o comprometer no desengano da sua governação: primeiro, porque os problemas se tornarão piores; segundo, porque sair do governo só deixará os socialistas escapar às responsabilidades se quem vier a seguir o consentir. Também não será inteligente formar um governo supostamente alternativo na dependência dos votos socialistas, dando ao PS poder de veto sobre reformas. Ao país, neste momento, convém uma maioria à direita do PS. Não uma maioria qualquer, mas uma maioria reformista em que sejam fortes – não apenas em deputados, mas em votação — partidos que não suscitem ao PS expectativas de acordo ou de cumplicidade, e que além disso justifiquem confiança como parceiros de um governo estável. Falei em “partidos”, no plural. De facto, nessas duas condições há apenas um: o CDS de Francisco Rodrigues dos Santos.

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