A crise da dívida nos países europeus com o seu mais recente episódio agudo, a Grécia, tem sido uma fonte inesgotável de profecias, comentários, críticas e defesas sobre a moeda única e o seu futuro.

A última acha na fogueira veio do Presidente francês François Hollande, que escreveu num artigo de opinião por altura do 90º aniversário do ex-presidente da Comissão Europeia Jacques Delors, que a França estaria pronta avançar para uma integração Europeia reforçada juntamente com os restantes cinco países fundadores da Comunidade Europeia de Carvão e do Aço. A ideia seria de que a Europa precisa de maior coordenação de políticas e de mais legitimidade democrática o que seria assegurado por um governo económico comum, um orçamento próprio e um parlamento com mais poderes.

A maior surpresa foi que, depois de Hollande ter sido o salvador do euro como o conhecemos ao apoiar o Governo grego na redação da última proposta de reformas, esta ideia de uma nova velocidade de integração europeia excluiria a maioria dos países da zona euro. Hollande implicitamente assume assim que as vantagens de avançar mais rapidamente com a integração monetária superam as desvantagens de criar uma terceira velocidade de integração Europeia com todas as complexidades que isso traria em termos de relações políticas e económicas entre países que teriam ainda assim a mesma moeda.

A motivação económica para uma maior coordenação de políticas económicas não é grande novidade. A realidade é que a zona euro não era à partida uma zona monetária ótima, e continua a não o ser. Robert Mundell, que recebeu um prémio Nobel pelo seu trabalho nesta área, argumentava que uma zona monetária ótima necessitava de quatro fatores importantes:

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  • Semelhança dos ciclo económicos para a política monetária comum ser mais eficiente a alisar os ciclos
  • Mobilidade dos fatores de produção, nomeadamente do trabalho, para permitir um ajustamento em caso de choque assimétrico (recessão limitada a um país ou a um grupo de países).
  • Diversificação das exportações, para reduzir a incidência dos choques assimétricos
  • Grau de abertura da economia elevado para os benefícios de integrar uma zona monetária serem superiores aos custos associados à perda do ajustamento por via da taxa de câmbio

Treze anos depois do início da União Monetária Europeia, muitos destes critérios continuam a não ser cumpridos, pelo menos não na totalidade. Os ciclos económicos que não eram muito diferentes até há poucos anos divergiram de forma significativa durante a crise financeira devido a respostas de política económica e a estruturas económicas diferenciadas. Em alguns países, onde se encontra Portugal, o grau de abertura da economia manteve-se relativamente baixo, o que limitou os benefícios da integração. No entanto, o critério que a Europa estará porventura mais longe de atingir é o da mobilidade laboral. Vários países da zona euro têm legislações laborais extraordinariamente inflexíveis e uma mobilidade baixíssima, enquanto a nível regional a mobilidade é limitada pela barreira linguística.

O erro dos detratores da moeda única é argumentarem que estas limitações tornam a zona euro um colete-de-forças que só traz problemas. Mas esquecem-se das vantagens que o euro trouxe em termos de qualidade de vida por via do aumento da liquidez nos mercados financeiros, da redução dos custos das transações de bens e de serviços e do acesso a produtos e serviços que seriam impensáveis para os cidadãos de países que teriam moedas mais fracas fora da zona euro.

O erro dos defensores do euro é acharem que a zona euro se constrói em cinco dias. O processo de integração monetária ainda está na primeira infância e será necessário fazer vários ajustamentos à governação da Zona Euro até acertar num regime que seja suficientemente resistente aos choques económicos. Por exemplo, os Estados Unidos, demoraram aproximadamente 150 anos até serem considerados uma zona monetária ótima, entre 1788, quando o Congresso se tornou responsável por emitir moeda exclusivamente para todos os estados, e a década de 1930, quando várias mudanças institucionais (nomeadamente garantias de depósitos a nível federal ou transferências federais para a proteção do desemprego) permitiram finalmente estabilizar a política monetária. Pelo meio ficou uma guerra civil que originou temporariamente três regiões monetárias diferentes, vários choques assimétricos que conduziram a disputas políticas e de política monetária e crises financeiras regionais.

A construção de uma zona euro mais forte vai necessitar de uma vontade política inabalável durante décadas que permita a construção de uma zona com maior flexibilidade económica a nível nacional e regional. Hollande propõe começar este caminho alienando a maioria dos países da zona euro e ignorando os problemas económicos na sua própria casa. Seria um péssimo começo para os desafios que se adivinham.