Quem já está fartinho de Black Fridays diga “fartinho!” Das Black Fridays e das primas com dois dias de separação, as Cyber Mondays. Entre convites à aquisição de pneumáticos com belíssimos descontos e a compra de mais de 20.000 artigos de saúde, beleza e cosmética (não preciso, pois ontem comprei os dois que me faltavam), por estes dias o meu telefone não parou de apitar. É bem provável que, passada a Cyber Monday, venha aí uma Expensive Thursday, quando o telemóvel, de tão requisitado, der a alma ao Criador.

Apesar de tudo, cada nova Black Friday é um ténue vislumbre de sanidade. Como é que, nestes tempos de lunaticidade woke, um dia do ano continua a poder chamar-se Black Friday? Sexta-feira Preta?! É espantoso. Numa época em que não ficar entusiasmado com a ideia de ir para a cama com uma mulher transexual – ou seja, com um homem que se veste de mulher – é transfobia (seja lá isso o que for) como é que continua a haver uma Black Friday? Mas quê, não há problema de ficar no ar a eventual insinuação de que os preços baixam na Black Friday porque mais melanina na pele significa menos dinheiro no bolso? Acho um escândalo, mas tudo bem.

Esta parelha dinheiro-escândalo fez-me lembrar o já-quase-ex-primeiro-ministro António Costa. Isto porque tenho escutado comentadores afirmarem, com frequência, que parte importante do legado de Costa são as contas certas. E são. Só que afirmar que estes governos do PS tiveram contas certas porque até sobrou dinheiro, é o mesmo que dizer que uma família que chega ao fim do mês com dinheiro no bolso porque optou por não comer, não tomar banho, não acender uma luz e não pôr gasolina no carro, levou a cabo uma óptima estratégia de poupança. As contas da família até podem estar certas, mas a esperança de vida do agregado é de quinze dias. E a do país não será muito mais longa.

Quem se propõe resolver tudo isto é Luís Montenegro. Munido do pin que foi de Sá Carneiro, Montenegro esteve fortíssimo no congresso do PSD. Em jeito de aparte, uma dica. Agora que tem o pin, Montenegro que não se ponha a ir buscar demasiada inspiração ao antigo líder do PSD, em particular no que toca a decisões sobre modelos de aeronaves em que se deslocar.

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Bom, mas o que interessa é que, na esperança de ser eleito, Montenegro elegeu Pedro Nuno Santos como adversário na corrida ao cargo de primeiro-ministro. O que acaba por ser curioso, uma vez que o líder do PSD escolheu Pedro Nuno sem que quem decide – os militantes do PS – ainda o tenha feito, trazendo à memória o nunca batido episódio em que Pedro Nuno escolheu a localização do novo aeroporto sem que quem decide – os militantes do PS com interesses na localização da infra-estrutura – o tivesse feito. Comunicação impensada essa que é a razão pela qual Pedro Nuno Santos é conhecido, por todos os portugueses, como o anunciador precoce.

Anunciador precoce que tem usado a táctica de instigar nos portugueses medo do PSD, por causa dos tempos da troika. A ver se percebi a lógica. Portanto, a governação de sucessivos executivos socialistas vem e deixa os portugueses a esvaírem-se em impostos; nisto chega um governo do PSD para estancar a sangria e desinfectar a ferida; e Pedro Nuno Santos sugere que os portugueses temam quem os vem acudir, porque o Betadine arde um bocado. Enfim, imagino que seja uma forma de ver as coisas. Se uma pessoa for o Stevie Wonder.

E tudo isto seria motivo de forte preocupação, não fosse irmos todos falecer muito em breve. Outra vez. Desta feita, e de novo segundo o profeta António Guterres, o Armagedão chegará sob a forma do maior iceberg do mundo, que está agora em movimento depois de três décadas parado, naquilo a que o Homem do Pântano apelida de “aceleração completamente devastadora”. Eu até ficava preocupado com o avançar de tanto gelo na nossa direcção, mas acho que vou antes preparar uma caipirinha maior.