Angela Merkel é o novo Chamberlain? Quando em Junho de 2019 reuniu com Zelenski, Angela Merkel teve um dos ataques de tremores que então lançavam algumas dúvidas sobre o seu estado de saúde. À luz da presente invasão da Ucrânia quase apetece pensar que as más decisões tomadas pela então chanceler alemã se devem à doença que a afectava nesse ano de 2019. Infelizmente não é assim: quando se analisam as decisões tomadas por Merkel somos obrigados a constatar que existe uma linha constante de desvalorização do risco representado pela crescente dependência alemã e europeia do gás russo logo de Putin, dependência essa para mais acentuada pela decisão de Merkel de encerrar as centrais nucleares alemãs.
Levámos anos a ouvir os considerandos dos nossos vizinhos do norte sobre a forma como no sul nos governamos mal. A mais expressiva dessas apreciações foi proferida pelo ministro holandês Jeroen Dijsselbloem “não se pode gastar todo o dinheiro em copos e mulheres e depois pedir ajuda.” Infelizmente o nosso desgoverno financeiro não se deve aos festivos “copos e mulheres” mas muito mais tristemente à mediocridade da nossa governação. Mas face ao que estamos a viver, cabe perguntar em que pensavam os dirigentes da tão bem governada Alemanha quando não só ignoraram os riscos da crescente dependência energética da Rússia como a promoveram? Ou mais concretamente, em que pensava Angela Merkel quando ignorou e subestimou todas os avisos sobre o risco inerente à cada vez maior dependência energética da Rússia?
O mais constrangedor no caso de Merkel é que o engano se arrastou por anos e anos. Pior, o passar dos anos tornou a chanceler mais imprevidente: Merkel chega ao poder em 2005, o ano em que a Rússia de Putin usa o fornecimento de gás à Ucrânia como forma de castigar este país pela sua aproximação à Europa. Os factos ocorridos durante aquela que ficou conhecida como “guerra do gás” (designação que à luz dos acontecimentos de 2022 tem algo de humor negro!) não foram suficientes para colocar os alemães de sobreaviso, fossem eles o derrotado Schröder que escassas semanas depois de deixar o poder integra o projecto do pipeline Nord Stream (que liga por mar a Rússia à Alemanha) que promovera enquanto chanceler, ou a vitoriosa Angela Merkel que mantém a aposta neste pipeline. Ora a opção por um pipeline que ligasse directamente por mar a Rússia à Alemanha não era politicamente neutra como bem explicavam a Ucrânia e os estados do Báltico: o Nord Stream era especialmente vantajoso para a Rússia que assim se desembaraçava de ter de negociar com os países até ai atravessados pelos pipelines que traziam o gás russo até ao centro da Europa. E a Alemanha o que ganhou com o Nord Stream? Uma dependência crescente da Rússia, dependência que Merkel agravou quando, em 2011, influenciada pelo desastre de Fukushima e quiçá por uma popularidade a baixar, decidiu anunciar o abandono do nuclear pela Alemanha. Das 17 centrais nucleares então existentes na Alemanha responsáveis pela produção de um quarto da energia do país, oito fecharam. Para as restantes foi anunciado um calendário de encerramento até ao final de 2022.
Ambientalmente o resultado desta decisão foi um disparate pois enquanto apregoava metas ambiciosos para a descarbonização, a Alemanha tinha de recorrer mais ao carvão para produzir energia. Já politicamente as consequências foram um desastre que é o mesmo que dizer que foram um brinde para Putin: após o anúncio do abandono do nuclear por parte da Alemanha, o projecto de um novo pipeline — o Nord Stream 2 — a ligar a Rússia à Alemanha tornou-se incontornável. A persistência neste logro manteve-se mesmo quando já não existiam dúvidas sobre as intenções de Moscovo: em 2021, já com tropas russas concentradas na fronteira com a Ucrânia, a Alemanha fechou três das seis centrais nucleares que ainda mantinha em funcionamento: Brockdorf, Emsland e Gröhnde. (Será que fecharão as três que ainda estão em funcionamento e que está previsto fecharem este ano?)
A política de Merkel entre 2005 e 2021 conduziu, em 2022, a Alemanha, e através dela a UE, para uma armadilha quase perfeita: a de ter de sancionar um país, a Rússia, do qual não pode deixar de depender. O paradoxo é tal que a UE financia os dois lados da guerra pois se é verdade que apoia militar e financeiramente a Ucrânia também é verdade que não pode deixar de comprar gás russo, logo continua-se a dar dinheiro a Putin e no caso a dar mais porque os preços sobem. Por fim, as economias e as empresas europeias são as mais afectadas pelas sanções e boicotes contra a Rússia. Pior era quase impossível.
Chamberlain acreditou ter conseguido a paz ao fazer um acordo com Hitler, Merkel acreditou ter neutralizado Putin ao fazer dele um parceiro de negócios. Moral da História: as democracias nunca devem confiar naqueles seus líderes que acham que os outros governantes — particularmente se forem ditadores — estão a dizer aquilo que eles gostavam de ouvir.
O fungagá da bicharada presidencial. A coisa, entendendo-se por coisa o discurso presidencial, ia no jeito hiperbólico do costume “Moçambique tem futuro. Tem futuro em tudo. Moçambique é sempre melhor do que era da última vez. É sempre melhor do que aquilo que se esperava. É sempre melhor do que aquilo em que se confiava. E por isso confia-se sempre em Moçambique…” A ditirâmbica verborreia do presidente português não é propriamente desconhecida em Moçambique mas nada preparara os presentes na cerimónia de inauguração de um empreendimento turístico em Moçambique nem a nós, portugueses, aqui à distância, para o que veio a seguir: “Devemos dar uma escapada até este empreendimento não para a inauguração mas sim um mergulho nas águas. Para o diálogo com elefante. Para uma troca de impressões com a girafa. Para um ou outro momento mais romântico com os pássaros. E para aqueles que são muito marítimos também com os peixes do mar.” Com o novo governo sentando numa maioria absoluta e a presidência da República transformada no fungagá da bicharada é provável que a girafa do zoo lisboeta se torne no interlocutor que resta a Marcelo.
O taxismo. “Bloco quer nova taxa”. Desta vez a nova taxa proposta sobre o BE incide sobre as empresas que lucram com a crise – as eléctricas – e destinar-se-ia a dar “um apoio directo às famílias mais vulneráveis”. Em Portugal o socialismo evoluiu para um estado superior: o taxismo. Um estudo da CIP identificou mais de 4.300 taxas. A imaginação do legislador em matéria de taxas, contribuições, adicionais… é tal que frequentemente as próprias entidades desconhecem as taxas cobradas por si próprias. Inicialmente o taxismo criou taxas sobre todas as actividades e serviços. Agora já vamos nas taxas de nova geração ou seja as taxas sector a sector: criou-se uma taxa para as celuloses com o objectivo não de obter mais receita fiscal mas sim de “defender a floresta”. Outra para os fornecedores de dispositivos médicos que visa subsidiar o SNS. E como esquecer o adicional ao IMI que veio para salvar Segurança Social?.. Esta legitimação das taxas através da apresentação do fim a que se destina é uma das tácticas do taxismo pois naturalmente ninguém quer estar contra as famílias vulneráveis ou a favor da falência da Segurança Social. Logo paga-se a taxa. E depois a outra e mais outra… O resultado é invariavelmente o mesmo: o dinheiro nunca chega. Logo outra taxa tem de ser criada. O taxismo é o socialismo. Dos pobres, claro.