A política externa de Biden demarca-se da de Obama – pelo menos na retórica – na vontade de enfrentar de forma mais clara a ascensão russa e chinesa e, assim, tentar contrariar a impressão de declínio do poder americano que desde 2008 mina o campo ocidental.

Como previsível, a retórica da administração Biden está a provocar uma reação tanto da parte de Pequim como de Moscovo. China e Rússia mostram-se decididas a testar a determinação da administração americana em usar a força militar na medida necessária de defender os seus interesses e valores.

Tal como na guerra fria, a fronteira oriental da Europa tornou-se o palco da competição entre Moscovo e Washington. O presente ciclo iniciou-se quando no mês passado Biden acusou Putin de assassino, levando à convocação do embaixador russo nos EUA para consultas. À medida que as forças de Alexei Navalny continuam o seu misterioso declínio, Moscovo iniciou manobras militares de larga escala perto da contestada região de Donbass no leste da Ucrânia e no enclave da Transnístria, na fronteira ocidental da Ucrânia. Dmitry Peskov, porta-voz do Kremlin, alertou para a possibilidade de “hostilidades em larga escala”. Mais do que uma invasão na região do Donbass, os analistas falam da possibilidade de a Rússia querer usar o momento presente para controlar militarmente a costa da Ucrânia no Mar Negro, assegurando o acesso da Rússia à Crimeia.

Washington tomou as manobras como um teste de força e enviou forças navais para o Mar Negro. Em paralelo, Biden propôs a Vladimir Putin a realização de uma cimeira, “nos próximos meses”, propondo que esta seja o pontapé de partida para um diálogo estratégico sobre controlo de armas e de segurança. A realizar-se esta seria a primeira cimeira entre Putin e um presidente dos EUA desde a reunião de Helsínquia com Donald Trump em 2018.

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Para evitar o déficit de ação e o excesso de retórica que tem caracterizado a política dos democratas americanos desde 2008, é imperativo para Biden que as respostas às provocações de Putin sejam capazes de mostrar, através de diplomacia e de força militar, que os Estados Unidos se mantêm firmes em face da estratégia expansionista russa. Apesar de o momento presente apresentar mais parecenças com o período da détente do que com o início da guerra fria, será útil lembrar os conselhos de George Kennan, o diplomata que enunciou os princípios da política americana face à União Soviética nos finais dos anos quarenta. Para fazer face às tendências expansionistas russas, Kennan apelou à “aplicação hábil e vigilante de contra-força em pontos geográficos e políticos em constante mudança”.

Estamos, portanto, a testemunhar o redesenhar das relações entre as grandes potências. Que a Europa não aspire a ser uma, é uma sóbria realidade que parece ter sido aceite. Esperemos, contudo, que não desista de se aliar aos Americanos quando está em causa a segurança das suas próprias fronteiras.

Madalena Meyer Resende (no twitter: @ResendeMeyer) é um dos comentadores residentes do Café Europa na Rádio Observador, juntamente com Henrique Burnay, João Diogo Barbosa e Bruno Cardoso Reis. O programa vai para o ar todas as segundas-feiras às 14h00 e às 22h00.

As opiniões aqui expressas apenas vinculam o seu autor.

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