Irra, já desisti de contar os casos e casinhos revelados, só nas últimas semanas, na política caseira. Enfim, “caseira” é como quem diz, porque na verdade a política portuguesa parece-me mais de supermercado do que caseira. As semelhanças com uma grande superfície são óbvias. Bastará mencionar que o supermercado tem uma quantidade enorme de enlatados, da mesma forma que a política portuguesa cria uma quantidade enorme de entalados. É quase igual.

Mas dizia eu logo após ter logrado começar uma crónica por “irra” – já não ter paciência para manter registo da catrefada de polémicas de cariz venal na política portuguesa. Para enorme alegria minha, ontem, como que enviada dos céus para me resgatar deste enfado, surgiu uma polémica de cariz religioso na política portuguesa. Quer dizer, sejamos rigorosos. Trata-se de uma polémica de cariz religioso-político-alguém-vai-encher-se-à-conta-desta-brincadeira.

E a brincadeira de que falo é o palco, aliás, o “altar-palco”, onde o Papa Francisco vai presidir à missa final da Jornada Mundial da Juventude. Este altar-palco vai custar 4,2 milhões de euros. Sim, sim. Quatro vírgula dois milhões de euros. Por um palco. Quer dizer um altar-palco. Se calhar é a parte do altar que encarece o altar-palco. Vai-se a ver e o palco custa para aí 17 euros, e os remanescentes 4 milhões, 199 mil, 983 euros são para o altar. Pode ser. Que eu não percebo nada de religiosidades. E menos ainda de bricolage. Digamos que eu seria dos tipos menos indicados para chamarem à liça aquando da crucificação de Cristo:

Um romano: Tu, vai pregar o Cristo à cruz.

Eu: Hum… Qual deles é o Cristo?

O romano: Como assim? É aquele ali, pá. Vai pregá-lo à cruz.

Eu: O quê? Mas mesmo com pregos e martelo e assim? Não há uma fita cola, uma UHU? Não creio que seja boa ideia. Vou acabar com os dedos em chaga.

Outro romano: Desculpe, não pude evitar ouvir a conversa e constatei não ser nada evidente o meu amigo possuir qualquer serventia. Não quer preencher esta ficha de inscrição no Partidum Socialistis?

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Bom, mas esta polémica em torno do palco do Papa surpreendeu-me, porque eu sou do tempo em que o gadget papal que mais atenções atraía era o Papamóvel. Vculo especialmente fabricado para a locomoção do Papa durante as aparições públicas. E também alcunha de um bicho da madeira tramado que vivia em casa da minha avó e que, sem ajuda de demais bicharada, deglutiu uma cómoda. O Papamóvel ainda se entende que seja caro. Afinal tem de ser um veículo que combina a performance de um Batmóvel, para conseguir fugir a eventuais atentados, com as características técnicas da viatura dos Caça-Fantasmas, para poder transportar em condições de segurança o Espírito Santo. Que suponho seja uma espécie de fantasma, ou assim. Já tinha referido não perceber muito disto da religião?

O que eu sei é que alguém vai papar à pala dos 4,2 milhões que custará o palco onde o Papa presidirá à Jornada Mundial da Juventude. Facto que proporciona um engraçado trava-línguas, não há dúvida, mas um trava-línguas que sabe a pouco. Uma vez que aquilo de que precisávamos mesmo era de um trava-custos.

Resta-nos esperar que o orçamento para a construção do altar-palco não derrape como o custo das obras no Hospital Militar de Belém, estimadas em 750 mil euros e que acabaram por custar 3,2 milhões. Olha, se calhar o problema é mesmo este. Nós estimamos tão bem os custos das obras, que eles, com tanta estima, com tanto apreço, acabam por crescer sem parança.