Ricardo Robles é um grande empresário imobiliário. Atendendo ao retorno dos seus investimentos, será mesmo a sua principal actividade, sendo a política uma ocupação secundária. Grosso modo, Robles investiu cerca de um milhão de Euros (entre aquisição e obras de recuperação de um prédio) e, passados cerca de quatro anos, o seu activo vale mais 500 por cento, 5 milhões de Euros, do que o investimento original. Esta valorização é um recorde em termos empresariais. Por exemplo, Américo Amorim e Belmiro de Azevedo, a quem o Bloco de Esquerda recusou a devida homenagem no parlamento, nunca terão multiplicado um investimento por 500 por cento em quatro anos durante as suas vidas empresariais.

Mesmo fora das nossas fronteiras, bancos de investimento como a Goldman Sachs (um dos alvos preferidos do Bloco) muito raramente conseguirá 500 por cento em quatro anos de retorno dos seus investimentos. O mesmo se poderá dizer dos outros grandes bancos de investimento, como a Morgan Stanley, o J.P. Morgan, o HSBC ou o Barclays. Os hedges funds de maior sucesso, considerados como os grandes especuladores pelas esquerdas europeias, terão um ano extraordinário se conseguirem 20 por cento de retornos dos seus investimentos. Em anos absolutamente excepcionais, chegarão aos 30, eventualmente 40 por cento. No melhor dos casos, em quatro anos, terão 160 por cento de retornos. Muito longe dos retornos do especulador imobiliário, Ricardo Robles.

Nada tenho contra a capacidade de multiplicar investimentos de uma forma inteligente. Foi o que Robles fez. Aqueles que investem no imobiliário sabem que dá trabalho o que fez Robles. Seguir com atenção os leilões das instituições do Estado, colocar a oferta certa e ganhar a aposta não é fácil. Não é por acaso que os competidores de Robles para a compra do prédio em Alfama eram profissionais do sector do imobiliário. Nada disto aconteceu por caso. Robles seguiu, com sucesso, uma estratégia de investimento. Adquiriu um prédio por um preço baixo, numa zona de Lisboa valorizada pelo turismo, recuperou-o, e colocou-o à venda numa multinacional de sucesso, a imobiliária Christie’s.

A questão aqui não é o investimento de Robles. O problema é o discurso do seu partido sobre os investimentos imobiliários e os empresários de sucesso. Podemos imaginar o autarca de Lisboa e membro do Bloco, o camarada Robles, a conversar com o empresário Robles. “Como podes dizer em público o oposto do que faço na minha vida empresarial?”, diz o empresário Robles. “Mas tenho todo o direito de tentar ganhar dinheiro. Não fiz nada de illegal.”, responde o camarada Robles. “Além disso”, continua o camarada Robles, “para progredir no partido, para ser cabeçade lista em Lisboa, preciso de fazer esse discurso.” “Ainda bem que a militância no Bloco não me impede de aproveitar boas oportunidades de investimento, de beneficiar da bolha imobiliária em Lisboa e de ganhar dinheiro”, conclui Robles o empresário.

Embora esteja na vida política há pouco tempo, Robles já aprendeu que o comportamento não é o mais importante, mas sim o que se torna público. Tudo corria bem até a notícia do seu investimento ter sido publicada por um jornal. Depois, vieram as habituais desculpas, que não convencem ninguém e o argumento espantoso de que nada fizera de ilegal. Eis a judicialização da política pelos políticos. Os políticos, pela natureza das suas funções públicas, devem prestar contas que vão muito além da legalidade dos seus actos. O comportamento e os argumentos de Robles são bons exemplos de como o Bloco olha para a política e a sociedade.

Para o Bloco, a desigualdade entre eles, as classes dirigentes do partido, e os outros, os portugueses em geral, é o princípio geral da política. Para eles, os privilégios. Para os outros, as regras, impostas pelos privilegiados. Eles são os grandes educadores, que sabem o que é melhor para todos. Mas o “melhor” não se aplica aos pioneiros, à vanguarda, às elites do Bloco. O caso de Robles é ainda mais relevante politicamente porque neste momento é o militante do Bloco com mais poder executivo. É ele que dá a maioria absoluta a Fernando Medina na autarquia de Lisboa. Olhem para o Robles e vejam o que será o Bloco no poder, se chegar ao governo com o PS.

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