De crise em crise até à vitória final
“Turistas, chegou a vossa hora; emigrantes ficam e vocês vão embora”.
“Enterrar os senhorios com combustíveis fósseis”.
…Estes são alguns dos slogans entoados na manifestação dita pela habitação que teve lugar ontem em Lisboa. Por estranho que possa parecer estas frases não suscitaram os habituais avisos sobre a xenofobia ou o discurso de ódio.
Cavalgar as crises tornou-se uma forma de a esquerda impor a sua agenda e transformar o socialismo em inevitabilidade. Neste momento, em Portugal, podemos morrer por falta de assistência médica, andar com os nossos filhos e netos em busca de uma urgência hospitalar ou de uma escola com professores mas tudo isso arrisca ficar reduzido a um rodapé nas notícias porque a crise, a crise que oficialmente existe é a da habitação.
O que está a acontecer nos hospitais, escolas ou tribunais já quase não é assunto, apesar da imensa gravidade de algumas situações pela prosaica razão de que já não há privado algum para combater nessas crises. E, não menos importante, porque a degradação desses serviços públicos resulta da forma como são geridos por essa máquina estatal a que agora se quer acrescentar o sector da habitação.
Sejamos claros e honestos: a única causa que interessa à extrema-esquerda, e por consequência a única que existe, é aquela que lhe permite atacar os privados, o mercado, a liberdade de escolha, e que faz crescer o aparelho de Estado. A habitação é o pretexto para se reivindicar abaixamento e congelamento das rendas, a estatização do sector, o fim do alojamento local, dos despejos, das desocupações e das demolições de clandestinos e intimidar quem trabalha no imobiliário. Enfim, se isto for aplicado o resultado será um parque habitacional semelhante ao de Cuba. Nada que preocupe os experts em crises porque quando os seus objectivos forem conseguidos eles logo partirão para outro assunto. Ou seja rapidamente descobrem outra crise.
Não, não é natural nem é bom
“É natural que a extrema-direita não seja acolhida” declarou Mariana Mortágua, transformada em dona da rua quando confrontada com o facto de os três deputados do Chega que compareceram na manifestação em Lisboa terem tido de sair antes do previsto e escoltados pela polícia.
Desde Novembro de 1975 que a direita em Portugal tem vergonha de ir para a rua. Na verdade, mesmo no Verão de 75, para que tal acontecesse em Lisboa foi necessário que a esquerda caucionasse esse gesto, o que aconteceu quando Mário Soares se pôs à frente das manifestações. A norte do Tejo o caso era outro e na falta de enquadramento progressista os manifestantes foram automaticamente rotulados como reaccionários, logo condenados a uma espécie de ostracismo. Ao longo das décadas seguintes, a direita habituou-se a sair de casa apenas nas campanhas eleitorais. Fora isso espera e cogita. O problema é que esse ensimesmamento está a contribuir para a sua irrelevância política, em que, mesmo quando ganha, não está legitimada para exercer o poder. (Revejam-se as imagens da manifestação convocada pelo PP espanhol no passado fim-de-semana e percebe-se melhor do que falo.) Por cá, ao velho medo de ficar mal na fotografia juntou agora à direita o medo de que o Chega apareça. André Ventura tem falhado as suas convocatórias da maior manifestação de sempre, mas, se ainda não tinha percebido, ontem ficou devidamente esclarecido acerca do enorme potencial de manter o Chega nos eventos de rua, independentemente de quem os convoca.
A violência é aquilo que o activista quiser
“A violência que é partir uma montra não é minimamente comparável com uma pessoa a viver numa tenda.” Diz Diogo Faro, activista do movimento Casa é um Direito, que entre outras reivindicações pretende que, até 2025, dependamos a 100% de eletricidade renovável. Mas não é uma renovável qualquer: tem de ser baseada na comunidade e controlada democraticamente que é como quem diz controlada pelos activistas.
Não sei o que é mais revelador, se o eufemismo usado para não destacar o ataque ao vidro da montra da agência imobiliária se a definição de Diogo Faro dessa espécie de regulação da violência pelos activistas. Viver numa tenda é violento? Sim. Então parte-se a montra duma agência imobiliária à martelada. Os activismos e os activistas estão a impor-nos pela via das crises e das catástrofes anunciadas um modelo de sociedade brutal e retrógrado.
PS. Marcelo promulgou. Acredita que vai colocar pressão sobre o Governo colocando-se ao lado dos manifestantes. Depois veremos.