Todos vimos: a dança das grandes televisões e jornais de referência à volta do que estava a acontecer, para não verem o que toda a gente via. Não eram tiros, mas “barulhos”. Trump não tinha sido ferido, mas “caído”. Não era um atentado, mas uma “intervenção da segurança”. Foi assim durante demasiado tempo, e o material que ficou divertiu-nos durante o resto da semana. Estamos a falar dos grandes títulos da comunicação social americana, dos que ficaram na história do Watergate ou da guerra do Golfo, dos que estão lá desde o princípio, e que, logo que Trump foi eleito, em 2016, prometeram erradicar as “fake news” e sujeitar qualquer lapso ao mais rigoroso “fact-checking”. Mas postos perante um acontecimento, diante de uma notícia verdadeira, resistiram a ver, não quiseram admitir. Porque poderia beneficiar Trump?

São as mesmas grandes instituições de imprensa que durante meses e anos também não ouviram as gaffes do presidente Biden, nem viram o seu ar perdido. Nos seus noticiários e comentários, o presidente estava como novo, exalava lucidez e energia. Quem dizia o contrário queria envenenar a democracia com mentiras. Foi preciso as sondagens darem Biden como derrotado para, de repente, também os jornalistas e comentadores da grande imprensa reportarem o declínio do presidente e até fazerem coro pela sua desistência. Reparem: não foi a evidência da eventual incapacidade de Biden para desempenhar o cargo que os fez mudar — foi a possibilidade de os políticos que eles favorecem perderem os lugares. Quem quis perceber, percebeu: esta grande comunicação social não se regula pela verdade, mas pelo poder. Eles são a “pós-verdade”.

O problema destes media, que em tempos foram contra-poder, é serem agora pouco mais do que o espelho das classes governantes sociais-democratas e “centristas”. O enviesamento dos media é o enviesamento da elite instalada. Reprovaram, e bem, Trump por negar o resultado da eleição de 2020, mas nunca estranharam que os Democratas negassem o resultado da eleição de 2016, atribuído à manipulação russa. Condenaram, e bem, os tumultos dos “trumpistas” a 6 de Janeiro de 2021 em Washington, mas “compreenderam” os tumultos da extrema-esquerda no Verão de 2020.

A grande história política do nosso tempo não é o “populismo”, mas esta radicalização das elites sociais-democratas e “centristas” no poder. De certo modo, as acusações que fazem aos chamados “populistas” são uma projecção nos adversários do que elas próprias dizem e praticam. É verdade: os movimentos “anti-establishment” são por vezes pouco recomendáveis. O proteccionismo económico é uma má ideia, a indiferença perante Putin seria um desastre para o mundo livre, e a linguagem desbragada nem sempre transmite clareza ou faz justiça. Mas as elites sociais-democratas ou centristas são melhores? Governam Estados crescentemente endividados, que se escusam a reformar, para manter o voto dos dependentes. Estão a submeter a coesão social das nações ocidentais às maiores pressões, através do wokismo e da imigração descontrolada. Denunciam os rivais como “ameaças à democracia”, pouco lhes importando que isso possa ser uma licença para matar. Na Europa, boicotam agora a Hungria por causa da lamentável visita de Viktor Órban a Moscovo, mas durante anos, depois da ocupação russa da Crimeia em 2014, não só foram a Moscovo, mas fizeram negócios com Putin. Quando é que a imprensa rouba um par de horas à sua cruzada contra o “populismo” para examinar este radicalismo cínico de um poder supostamente “moderado” que, para esconder a sua falência, tenta fazer-nos enlouquecer a todos?

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