Comecemos pelo mantra politicamente correto. O Islão é uma religião de paz e amor, que inspira a amizade, a entreajuda, a clemência, a generosidade e mais umas quinhentas coisas cheias de flores e querubins imaginários à sua volta. E depois há umas pessoas ruins, só por triste acaso muçulmanas, que se entregam às mais variadas formas de violência, num arco abrangente que vai de cotoveladas no nariz da amantíssima mulher até ataques terroristas que ceifam civis, passando por escravizar sexualmente mulheres ditas infiéis e decapitar voluntários de organizações humanitárias.

É assim, não é? Não é. Cada vez mais desconfio do contrário. Que o Islão é uma religião amante da violência e dos maus tratos aos mais fracos (desde logo, os não muçulmanos indefesos no meio de muçulmanos), enquanto a maioria dos muçulmanos é, essa sim e sobretudo quando não religiosamente atiçada, gente pacífica que não retira grande prazer de matar desconhecidos ou violentar terceiros. (A natureza humana tem contas a prestar de atos muito questionáveis, mas apesar de tudo a psicopatia não é um mal generalizado.)

Nós é que no Ocidente, de tão histéricos que ficamos com a necessidade de não merecermos os epítetos de racistas ou intolerantes, teimamos em fingir que as religiões são todas moralmente equivalentes. Peguemos na índia, por exemplo, onde há religiões para todos os palatos. Temos os jainas – que não podem sequer ser agricultores para não matarem os germes da terra – e temos os sikh – que são com frequência guerreiros e propensos a pegar em armas para se defenderem do que veem como ataques à sua religião. (Lembram-se de Indira Gandhi?) Só um tolo pode pretender que os sikhs são tão pacíficos e respeitadores de todas as formas de vida como os jainas.

Mas na iluminada Europa nada disso interessa. Os casamentos com crianças sancionados pelo Islão não têm nada a ver com o facto de Maomé se ter entregue a essa boa prática. O Corão recomenda decapitar infiéis e o ISIS é-lhe obediente, mas que tem isso a ver com a religião muçulmana? Os clérigos muçulmanos com frequência incitam à violência e ao ódio contra os ocidentais, aplaudem ataques terroristas, usam as mesquitas e as madraças para radicalizarem jovens e os tornarem em terroristas wannabe? Ora fica evidente que qualquer religioso muçulmano só prega o afeto universal por toda a espécie humana, animal e vegetal.

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E foi certamente também por este azar estranhamente reincidente de o Islão (paz e amor, etc., não esquecer nunca) ter religiosos dados à violência que, quando surgiram as notícias das cotoveladas que o xeique Davir Munir terá dado à sua mulher, logo vi pelo twitter lembretes de que a violência doméstica não escolhe religião. E é verdade, não escolhe. Mas também é verdade que o prestimoso Islão aprova que um marido dê um corretivo à esposa endiabrada se esta for desobediente e o marido já a tiver avisado da sua má conduta por duas vezes (que magnânimos).

Trago este caso de David Munir – que passa por moderado islâmico (e o drama é que deve ser mesmo moderado) – e as reações que fui apanhando porque é o costume por cá quando se trata de amarrotar e rasgar em pedacinhos os direitos humanos das mulheres das comunidades muçulmanas que residem na Europa. (Que é um daqueles assuntos que me põem sempre em modo sikh.)

Os jornais praticamente não noticiaram que a mulher do mais conhecido religioso muçulmano do país chegou às urgências do hospital com o rosto todo ensanguentado e queixando-se do marido. Já o xeique afirmou que a mulher é bipolar (vá lá, não foi contra uma porta nem escorregou numas escadas) e disse tratar-se de uma questão pessoal. Ora não é. Independentemente do que diga o Islão, a violência doméstica é um crime público em Portugal, não assunto conjugal.

Mas estas curiosas características das comunidades islâmicas residentes na Europa são com frequência vistas assim, coisas de gente estranha e exótica a quem não podemos pedir que se porte como os civilizados europeus. E se os exóticos transgridem, em vez de serem punidos criminalmente (como os outros cidadãos e residentes), deixamo-los sossegados, que não se espera mais de tal gente do que barbárie. Sobretudo, não vale a pena estender a proteção das leis dos países europeus a estas criaturas do deserto, é melhor entenderem-se entre si como lá nas grutas ou nas tendas dos seus países de origem.

Por isso há uns anos tivemos uma juíza alemã que recusou um divórcio a uma mulher muçulmana, também vítima de violência doméstica, apesar de a lei alemã o permitir. Para esta lunática germânica, o que devia reger a vida daquele casal habitante da Alemanha era o Corão e não as leis alemãs. Londres está transformado num centro europeu de mutilação genital feminina e nunca houve qualquer acusação e prisão pela prática desse crime contra mulheres e meninas. O anterior Arcebispo da Cantuária – com a perturbante falta de compaixão que não raras vezes os religiosos, os católicos incluídos, exibem – propôs que a sharia regesse as comunidades islâmicas britânicas. As mulheres, evidentemente, seriam as vítimas diletas de tão oportuna ideia.

Para mim, estes defensores destes guetos da idade das trevas onde as mulheres muçulmanas viveriam aprisionadas (no meio da Europa) são opositores ativos dos direitos humanos e da liberdade das mulheres (todas). Preparemo-nos. Eu já estou à procura da nova Emmeline Pankhurst.