A guerra da Ucrânia, a política externa agressiva russa e a realização pelo Kremlin de manobras militares de grande envergadura voltam a tornar actual a questão de se a União Europeia deve ou não criar as suas forças armadas.

Nos últimos dias, Vladimir Putin deu ordem aos seus generais para realizarem manobras em numerosas regiões do país entre 16 e 21 de Março, nomeadamente junto às fronteiras com países da UE. No terreno estão 38 mil militares, 3 360 armamentos de diferentes tipos, 41 navios de guerra, 15 submarinos, 110 aviões e helicópteros.

Recentemente, Jean Claude Juncker, Presidente da União Europeia, defendeu a ideia de criação, a médio ou longo prazo, de Forças Armadas da UE. Moscovo já pediu explicações a Bruxelas sobre essa proposta. Até porque, ao anunciar a sua proposta, Juncker salientou, entre outras coisas, que “o exército comum europeu mostrará à Rússia que tencionamos defender a sério os valores da União Europeia”.

“Gostaríamos de compreender de que se trata, porque, nos últimos 30 anos, os políticos europeus, a diferentes níveis, abordaram esse tema. É difícil adivinhar o que Juncker quis dizer”, Alexei Mechkov, vice-ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia.

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Não obstante Juncker ter mencionado a Rússia como adversário directo dessa nova força militar, a reacção de Moscovo foi calma, não se fez acompanhar de propaganda histérica como tem sido hábito nos últimos tempos.

Esta aparente reacção calma parece dever-se ao facto de alguns políticos em Moscovo esperarem que a criação do exército europeu conduza à divisão e enfraquecimento da Organização do Tratado da Aliança Atlântica, sonho há muito alimentado pelo Kremlin.

Alexei Gromyko, director do Instituto da Europa da Academia das Ciências da Rússia, considera que são muitos os peritos russos neste campo que apoiam a “integração militar da UE”.

“A realizar-se o cenário do restabelecimento da concepção da parceria estratégica [da Rússia] com a UE e a ideia da grande Europa: “de Lisboa a Vladivostok”, sem dúvida que será vantajoso para Moscovo que a União Europeia aumente a sua identidade”, declara o filho do antigo chefe da diplomacia soviética Andrei Gromyko.

Por outro lado, ele reconhece que “no Ocidente, isso poderá ser visto como uma tentativa de cavar um fosso entre os países europeus e a NATO”.

Esta última apreensão está bem patente nas declarações de alguns dirigentes de países da Velha Europa, que já fizeram parte do “campo socialista” dominado pela União Soviética e olham com muita apreensão para a actual política externa russa, considerando que um dos seus principais objectivos consiste em afastar a UE dos Estados Unidos.

Gregorz Schetyna, ministro dos Negócios Estrangeiros da Polónia, considerou a proposta de Junckers “uma ideia extremamente arriscada”, apelando ao reforço da NATO.

“Na Letónia, o importante é ser membro da NATO e conseguir atingir 2% do PIB precisamente para as necessidades da Aliança”, defende Laimdota Straujuma, primeira-ministra letã.

Tendo em conta a situação de guerra da Ucrânia, que se pode agravar a qualquer momento, esta não parece ser a melhor oportunidade para discutir se a UE precisa ou não de forças armadas próprias, a não ser que se queira enfraquecer a Aliança Atlântica. Talvez fosse mais frutífero elaborar políticas coordenadas e únicas face à Rússia nos mais diversos sectores: diplomático, político, económico e securitário.

P.S. As manobras militares russas acima citadas realizam-se precisamente na semana em que Moscovo celebra o primeiro aniversário da anexação da Crimeia, durante o qual Vladimir Putin ameaçou recorrer a todos os meios para “defender a soberania da Rússia” e ter colocado em prontidão as armas nucleares quando invadiu a Ucrânia.