A recente demissão de Pedro Passos Coelho (PPS) da liderança do PSD, provocada pela convergência aberta ou disfarçada de todos os outros partidos, incluindo o CDS, seu aliado no governo de 2011-2015, bem como pelo batalhão de «barões» do PSD que se lhe opuseram sistematicamente durante o seu período de governação com o apoio maciço da «comunicação social», tal demissão está a demonstrar aquilo que era de temer.
Afastado finalmente Passos Coelho da cena partidária e dos trombones dos «media», torna-se de novo evidente o inflexível controlo estatal que os partidos parlamentares têm exercido sobre o país, desde 1976, por turnos ou em coligação. Apesar de esses partidos mal representarem metade dos eleitores nas últimas legislativas, as consequências dessa «ditadura» estão hoje à vista, das quais a manipulação clientelar do Estado é a mais manifesta e onerosa para o país.
Essa «ditadura partidária» está infelizmente para durar. A actual campanha para a substituição de Passos Coelho à frente do PSD, depois da fuga do CDS aos compromissos que foi obrigado a assumir durante o resgate financeiro, tem empurrado para a frente o candidato escolhido de há muito pelos chamados «barões» do PSD, desde o pelouro semanal da «Quadratura do Círculo» até ao anterior presidente da República, Cavaco Silva. Além do antigo presidente da Câmara do Porto, Rui Rio, foi cooptado como seu adversário na corrida à liderança o último móvel da velha mobília do PSD, a saber, Santana Lopes. Este último, apesar das memórias que deve despertar nos militantes mais idosos, não tem credibilidade política e, além de ter estado mancomunado até agora com o actual tri-governo de esquerda, não possui equipa nem programa para fazer mais do que vãs promessas nas quais ninguém de olhos abertos acreditará. Também não é de supor que ele seja do agrado do presidente da República. Não creio, portanto, que tenha quaisquer «chances».
Resta Rui Rio, acerca de quem nos lembramos o que dizia o actual primeiro-ministro, então um dos protagonistas da dita «Quadratura do Círculo», quando andava a congeminar o seu governo futuro: «Ah, ainda se o líder do PSD fosse Rui Rio…». Pois bem, é isso que pode perfilar-se em breve. Rui Rio, de quem, fora da cidade do Porto, cujas ideias ninguém conhece, excepto porventura a sua recente preocupação em repetir que «não é de direita», interiorizando a censura do «politicamente correcto», que excomungou qualquer alusão à «direita» mas que não tenho a certeza que seja do agrado de muitos eleitores do PSD…
É lícito, pois, perguntarmos a nós próprios para que servirá a sua liderança nas legislativas que se realizarão em 2019, se não for antes. Será para substituir o BE e o PCP como aliado do governo ou, mais provavelmente, para fazer medo ao BE e ao PCP de que o actual primeiro-ministro os substitua pelo PSD, e já agora – por que não – juntamente com o CDS? Com efeito, ao contrário do que os «media» têm propalado, nada indica por ora que o PS venha a obter maioria absoluta nas legislativas daqui até 2019 e não é evidente que o CDS se prestasse a servir de muleta ao governo sem a companhia do PSD.
Rui Rio apresentar-se-á, portanto, como o candidato alternativo e, em caso provável de derrota, poderá surgir como o número dois de um novo «bloco central», o qual não serviria para permitir ao país fazer a melhor coisa que tinha pela frente em meados da década de ’80 – isto é, aderir à então CEE, hoje UE – mas sim para dividir com o PS os despojos do orçamento de Estado… Perante uma perspectiva destas, o mais provável é a abstenção maciça com que os eleitores portugueses têm presenteado os partidos de serviço!
Mais importante do que isso, com partidos como o PS e o PSD actuais, uma solução do tipo «bloco central» seria seguramente a prova de que, sem a pressão da falência iminente e sem a coragem de PPC para lidar com ela minimamente como fez, levando a economia a retomar o crescimento após a saída da «troika», a continuação da «ditadura» das máquinas partidárias significará que nunca mais se verão as reformas iniciadas por ele e que o PS e aliados posteriormente «reverteram», ao mesmo tempo que aumentavam a dívida do Estado. Os exemplos, num momento particularmente favorável da conjuntura económica internacional como aquele que estamos a atravessar, estão aí para demonstrar a incapacidade do clientelismo de Estado para modernizar o país.
A «ditadura dos partidos» interpretada pelo PS e o PSD, com a cumplicidade activa dos partidos mais pequenos, tem como contrapartida inevitável e já palpável o abandono das reformas exigidas pela modernização do país. É ver o que se prepara ao mais alto nível internacional perante a necessidade de prevenir as próximas crises que o recente crescimento económico não está a acautelar, em especial nas sociedades do Sul da Europa, como Portugal.