Estou a pensar explorar um novo caminho profissional, seguramente muito bem sucedido. Até tem possibilidades de internacionalização (verão que sim mais lá em baixo). Vou – digo já, para vos aliviar da curiosidade – escrever um manual de boas maneiras para esta era do ‘tempo novo’ em que novas formas dos cidadãos se relacionarem com o poder (do PS, façam vénias por favor) são necessárias.

E começo pela mais evidente. Pessoas portuguesas: não se pode fazer humor com essa pessoa magnífica que é Sua Excelência o primeiro-ministro, Dr. António Costa (e nada de se lhe dirigirem por menos do que esta fórmula completa). Sua Excelência o primeiro-ministro, Dr. António Costa foi obrigado, a contragosto e com grandes sacrifícios pessoais, a tomar as rédeas do governo de Portugal, entregue até aí a uns celerados de extrema-direita que apanharam os votos dos eleitores à traição em 2011 e outra vez em 2014. Devemos, por isso, usar sempre do mais escrupuloso respeito quando nos referirmos a Sua Excelência o primeiro-ministro, Dr. António Costa. O peso que tem sobre os ombros é gigantesco, o trabalho é hercúleo, pelo que se recomenda – na verdade, exige-se – deferência e gratidão.

Posto isto, devo congratular o twitter por ter suspenso a conta que parodiava Sua Excelência o primeiro-ministro, Dr. António Costa. E os cidadãos conscientes que, presume-se, denunciaram a indecência de haver quem ousasse fazer humor com Sua Excelência o primeiro-pinistro, Dr. António Costa. Bravo, são uns heróis. De facto, os governos com pendor esquerdista radical, como o da geringonça, só se aguentam muito tempo nos casos em que se podem calar os opositores políticos e, preferencialmente, enviá-los para a prisão. Folgo em ver que há quem na nossa boa esquerda não esqueceu a primeira parte desta boa lição.

(Atenção: a conta paródia a Passos Coelho sobreviveu toda a anterior legislatura sem qualquer beliscão. Isto está muito bem, porque se à esquerda se deve reverência agradecida, à direita só se oferece escárnio e ridículo. É a ordem natural das coisas. E, além do mais, as pessoas de direita são umas rústicas que levam a sério a balela da liberdade de expressão e, pobres almas, porventura até acreditam que ridicularizar políticos é uma boa dose de humildade que lhes é servida.)

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No meio de toda esta história tenho a lamentar a conduta do Observador. Este jornal, vá-se lá saber por que razão, decidiu noticiar a suspensão da dita conta que parodiava Sua Excelência o primeiro-ministro, Dr. António Costa. O jornal devia ter estado calado e quieto. Era o que faltava a comunicação social pretender dar notícias que contem verdades. E que permitam às mentes maldosas criar a ideia de que há quem à esquerda não saiba lidar com a liberdade de expressão. Li no twitter vários amantes da liberdade de imprensa justamente zangados com a notícia. Os outros jornais estiveram, regra geral, mais amestrados, noticiando a suspensão a correr, muitos ignorando o incidente (afinal que interesse público tem a informação de comportamentos de tiranetes em potência?) e, sobretudo, informando que o PS institucional e o governo nada tinham a ver com a suspensão. Isto sim é imprensa a escrutinar o poder. Bravo também para eles.

E palmas para Edite Estrela – que mal a conta agora suspensa foi criada embirrou com a utilização da fotografia de Costa (e não me respondeu à pergunta se também havia embirrado com a utilização da fotografia de Passos Coelho na sua conta fictícia; estou certa que sim). E para Francisco Seixas da Costa, que logo a geringonça, ai, enganei-me, o governo de Sua Excelência o primeiro-ministro, Dr. António Costa tomou posse, tratou de propor que se acabasse com o anonimato nas redes sociais. Tudo pessoas que querem evitar que nos desviemos por maus caminhos. Bem hajam.

Não posso passar sem, também, censurar os leitores do Observador que aos milhares partilharam a notícia, e muitos mais milhares que leram e se insurgiram nas redes sociais. São pessoas de má índole que não merecem o desvelo com que Sua Excelência o primeiro-ministro, Dr. António Costa cuida deles. Só me ocorrem as rainhas Mary e Anne de Inglaterra, que depois de roubarem o trono ao irmão ficaram conhecidas por ‘filhas ingratas’.

E por que razão falei eu em internacionalização? Porque na Grécia certamente irei ter sucesso idêntico. O governo desses grandes democratas do Syriza vai fechar canais privados de televisão, reduzindo-os a quatro (número de resto demasiado generoso). Isto, claro, para incentivar a independência da comunicação social face ao poder político. (Se se engasgou com as gargalhadas, é bom que faça alguma penitência, porque pode bem ter dado a ideia perigosa aos demais humanos de que não acredita nas boas intenções de Tsipras e companhia. E se as pessoas se lembram da gritaria que fez quando o governo da Nova Democracia encerrou, devido aos custos, a televisão pública grega – aquela televisão dócil que todo o governo decente mantém e manipula para fins de propaganda – vá ver nos livros do Harry Potter feitiços para apagar a memória.)

Se está a notar por aqui algum padrão, faz bem. Costa avisou que iria seguir a linha do Syriza. Já desancou jornalistas e a conta de twitter que o parodiava foi suspensa, não se sabe denunciada por quem, tendo a conta simétrica de Passos Coelho durado quanto quis. Esperemos as cenas dos próximos capítulos.