O primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, pode estar inclinado a apresentar o Orçamento do Estado para 2016 durante os meses de verão. O objetivo é garantir que o próximo Orçamento seja aprovado até ao final da legislatura, o que obrigaria o próximo Executivo a governar com as contas do Partido Popular espanhol. Por cá, Pedro Passos Coelho parece não estar para aí virado e o mais certo é o país começar o ano em gestão orçamental por duodécimos.

A alegada vontade de Rajoy de encurtar os calendários está a ser avançada pelo jornal El País. De acordo com aquele diário espanhol, o primeiro-ministro está determinado em apostar todas as fichas para fazer chegar o Orçamento de 2016 às Cortes espanholas até setembro. Se avançar com esta ideia, deverá conseguir aprová-lo mesmo a tempo das eleições gerais espanholas – que deverão acontecer no final de novembro ou início de dezembro.

Com esta medida extraordinária – que seria inédita na democracia espanhola, como recorda o El País -, Rajoy conseguiria evitar um cenário que, muito provavelmente, o próximo Executivo português terá de enfrentar. É que, com eleições legislativas marcadas para setembro/outubro, o futuro Governo só conseguirá ter um Orçamento pronto e aprovado nos primeiros meses de 2016. O que significa que o país vai começar o ano em gestão por duodécimos.

Tal como explicou o Observador em maio, um orçamento gerido por duodécimos significa que os serviços do Estado não podem gastar mais em cada mês do que 1/12 avos do que foi gasto no ano anterior. O que até pode nem ser assim tão mau para os bolsos dos portugueses: é que muitas das medidas temporárias desenhadas pelo atual Governo podem cair por terra. A questão não é clara e depende da interpretação que o próximo Executivo tiver da lei, mas Pedro Passos Coelho, em entrevista ao Observador, admitiu, desde logo, que o corte nos salários dos funcionários públicos e a sobretaxa de IRS não vão ter efeitos em 2016.

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É precisamente isso que Mariano Rajoy quer evitar. Como recupera o El País, quando José Luis Zapatero deixou o Governo espanhol em dezembro de 2011, sem conseguir fazer aprovar o Orçamento do Estado, com ele caíram algumas propostas para a reforma do sistema de pensões espanhol. Na sexta-feira, Soraya Saenz de Santamaria, a número dois do Governo, em jeito de antecipação do que aí viria, fez questão de lembrar a difícil herança socialista:

“Por não fazerem as coisas no devido tempo, por usarem o taticismo político de ‘convoco [eleições no final da legislatura] e assim não apresento o Orçamento, porque o momento é aquele que é’, não se adotaram decisões que eram necessárias para a Espanha e que tiveram de ser aprovadas pelo Governo em quatro dias”.

Em Portugal, e mesmo perante o mais que provável cenário de gestão orçamental por duodécimos, que poderá criar um buraco de muitos milhões, Passos não parece muito convencido com a solução do seu homólogo espanhol. Até porque se estivesse a pensar numa solução nestes termos já deveria ter tomado passos nesse sentido – as próximas eleições portuguesas vão acontecer antes das espanholas. Contactado pelo Observador, o Ministério das Finanças preferiu não comentar a questão.

A última vez que o país iniciou o ano em gestão por duodécimos foi em 2010, depois da reeleição de José Sócrates. No entanto, nesse ano, não havia medidas extraordinárias de relevo em cima da mesa, pelo que este cenário nunca antes se colocou.

Cavaco Silva, por sua vez, preferiu desvalorizar a questão. Pressionado pela oposição para antecipar as eleições, o Presidente da República lembrou na altura que, em qualquer caso, “Portugal [vai continuar] com um orçamento em vigor – o do ano anterior por duodécimos. E até acrescentou: “Se calhar, até é positivo para um Governo que surja das novas eleições se acalmar e ainda se manter durante algum tempo com as limitações de despesa que venham do passado”.