O Tribunal de Comércio de Paris ordenou à empresa angolana Unitel que respeite o direito de veto da empresa PT Ventures, detida pela operadora brasileira Oi, sobre qualquer operação de compra e venda que a sociedade angolana participada por Isabel dos Santos deseje realizar.

A decisão da secção de arbitragem internacional que funciona junto daquele tribunal com sede na capital francesa, e que medeia um conflito antigo entre a ex-Portugal Telecom (PT) e a Unitel, vem no seguimento de uma queixa apresentada pela empresa brasileira e poderá colocar em causa o negócio de 140 milhões de euros entre Isabel dos Santos e o BPI para a tomada de controlo do Banco de Fomento Angola (BFA), através da compra de 10% do capital social detido pelo banco português.

Contactada pelo Observador, fonte oficial da Oi confirmou a informação e afirmou:

A PT Ventures não foi informada das negociações relativas à aquisição de uma participação acionária [acionista] adicional no Banco de Fomento de Angola e, conforme previsto em acordo de acionistas, os demais acionistas da Unitel devem manter a PT Ventures informada sobre todos os negócios financeiros e comerciais da Unitel, sendo que qualquer proposta que venha a ser feita em nome da Unitel tem de ser aprovada previamente pelos sócios. A PT Ventures acrescenta que a ação iniciada junto ao Tribunal de Comércio em Paris também impede qualquer nova aquisição acionária pela Unitel, até a decisão final sobre a causa”.

Porque razão uma operadora de telecomunicações brasileira tenta impedir um negócio entre um banco português e a filha do presidente de Angola? Porque a Oi, através da PT Ventures, tem 25% da Unitel, a maior operadora móvel de Angola controlada por Isabel dos Santos e por outros sócios angolanos, por via da fusão efetuada com a ex-PT (que hoje se chama Pharol). E a empresa angolana recusa-se a cumprir o acordo parassocial em vigor, nomeadamente o pagamento dos respetivos dividendos desde 2011. A dívida já supera os 250 milhões de euros.

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É devido ao acordo parassocial assinado entre a ex-PT e a Unitel que a Oi (que tomou a posição da operadora portuguesa) passou a ter direito de veto sobre qualquer operação que seja realizada pela empresa angolana – um direito bastante útil quando Isabel dos Santos quer comprar 10% do BFA por cerca de 140 milhões de euros, tal como comunicado ao mercado pelo BPI a 3 de janeiro. Se essa aquisição se concretizar, Isabel dos Santos passa a controlar o terceiro maior banco angolano em termos de quota de mercado mas o mais lucrativo daquele mercado. Só em 2014 apresentou um lucro de 235 milhões de euros, segundo o Jornal de Negócios.

O Observador confrontou igualmente o BPI com estas informação, mas a posição do banco liderado por Fernando Ulrich – que também ainda não respondeu à proposta de compra da sua segunda maior acionista do banco – foi lacónica: “O BPI não tem comentários a fazer”, afirmou fonte oficial.

A decisão vinda de França

Ao que o Observador apurou, o Tribunal de Comércio de Paris ordenou a 26 de novembro de 2015 que as empresas GeniMercury e Vidatel (acionistas angolanos da Unitel) “se abstenham de tomar qualquer decisão que leve a um acto de gestão ou àlienação de activos”, tal como estipula o acordo parassocial assinado em 2000 entre a Unitel e a então PT, SGPS.

Da mesma forma, o tribunal ordenou igualmente que as três acionistas da operadora de telecomunicações angolana “respeitem o direito de veto” que a Oi herdou da PT sobre qualquer operação de compra e venda da Unitel, por via do mesmo acordo parassocial.

Dessas três sociedades angolanas que controlam a Unitel com 75% do capital social, a Geni e a Mercury estarão ligadas a Isabel dos Santos e à petrolífera Sonangol, enquanto que a Vidatel é uma sociedade offshore com sede na Ilhas Virgens Britânicas, não se conhecendo os seus donos.

As raízes do conflito entre PT/Oi e Unitel

Os brasileiros da Oi herdaram um conflito que existe desde 2009 entre a ex-PT (hoje Pharol) e a Unitel, sendo certo que a posição acionista da operadora portuguesa na sociedade angolana foi adquirida em 2000.

Comecemos por uma pergunta: qual a razão para ser a secção de arbitragem do Tribunal de Comércio de Paris a resolver este diferendo entre a PT/Oi e a Unitel? Porque o acordo parassocial assinado entre as partes fixa em exclusivo a jurisdição na mediação de qualquer conflito na arbitragem internacional daquele tribunal.

O conflito entre a PT e a Unitel remonta a 2007. Tudo terá começado quando a empresa portuguesa criou uma subholding chamada Africatel (que é detida a 75% pela PT Ventures, hoje da Oi) para juntar todas as participações que detinha em empresas africanas e decidiu vender 25% dessa sociedade a um fundo nigeriano chamado Helios. A Unitel alega que essa venda foi feita sem o seu prévio conhecimento e respectiva aprovação, tal como seria imposto pelo acordo parassocial.

A partir daí, a Unitel entrou em mercados onde a operadora nacional tinha interesses como Cabo Verde e São Tomé e Príncipe sem consultar a PT, fez um acordo com a ZON (então concorrente da PT) para criar a marca ZAP (operadora de TV por satélite) em Angola e em Moçambique, obstaculizou a nomeação de administradores representantes da empresa portuguesa e recusou-se a pagar dividendos à ex-PT desde 2011. Daí a queixa da ex-PT, hoje Pharol, no Tribunal de Comércio de Paris.

A Unitel, e a Helios, por seu lado, alegam que a passagem dos ativos da Africatel para a Oi violou os respetivos acordos parassociais que tinham assinado com a PT, visto que alegadamente se verificou uma alteração na estrutura acionista. Por outro lado, as empresas africanas alegam ainda que detinham direitos de preferência sobre as participações da PT. Também estas acusações estão a ser dirimidas em Paris.

Desde que tomou a posição na PT Ventures que a Oi pretende vender a participação que detém na Africatel e resolver os conflitos que existem com a Unitel. Além de ter assumido oficialmente que está vendedora, a operadora iniciou mesmo negociações com Isabel dos Santos para a venda da sua participação de 25% na Unitel por um valor de 1,2 mil milhões de euros, segundo notícias da imprensa brasileira citadas pelo Diário Económico. Acordo esse que colocaria o ponto final em todos os conflitos existentes.