“Positivo”. É assim que Rui Marques, coordenador da Plataforma de Apoio aos Refugiados (PAR), classifica o balanço do acolhimento dos refugiados em Portugal. O país é neste momento o segundo país da União Europeia que recebeu mais pessoas que procuram asilo através do processo de recolocação, ou seja, vindos dos pontos de identificação em Itália e na Grécia. Se, por um lado, há vontade na sociedade civil, a ação do Governo foi essencial para a concretização deste feito, garante a PAR. Já a ACAPO salienta que no último ano o Governo deu provas de uma mudança efetiva face às pessoas com deficiência e a Quercus quer mais proteção ambiental para questões chave como o Plano Nacional de Barragens e a venda do glifosato em Portugal.

A ação governativa levada a cabo pelo executivo de António Costa e o escrutínio e ação legislativa do Parlamento que estarão na quinta-feira em análise no debate do Estado da Nação têm um impacto efetivo no terreno onde trabalham centenas de organizações não-governamentais, um pouco por todo o país. O Observador pediu a três organizações para fazerem o balanço do último ano e definirem as prioridades políticas para o próximo.

Plataforma de Apoio aos Refugiados: Integrar, integrar, integrar

Portugal é atualmente o segundo país que mais recebeu refugiados através da recolocação, um feito que Rui Marques considera que deve orgulhar o país. “Se olharmos para os números em proporção, somos mesmo os que recebemos mais”, afirmou o coordenador desta organização que agrega 120 organizações que voluntariamente cederam alojamento e educação aos refugiados que cheguem a Portugal. Apesar de considerar que o primeiro trimestre do ano foi difícil, devido aos atrasos no programa de recolocação coordenado pela Comissão Europeia com a ajuda dos Estados-membros, Rui Marques sublinha que estes últimos três meses têm sido “muito positivos”.

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“O Governo teve uma posição corajosa e determinada. Tem-se mostrado empenhado em envolver todas as organizações da sociedade civil que queiram ajudar”, garantiu ao Observador, sublinhando que o executivo é sempre o primeiro responsável pelo acolhimento e pela integração de quem pede asilo em Portugal. Há atualmente 445 refugiados em Portugal vindos dos pontos de chegada na Grécia e em Itália, estão distribuídos um pouco por todo o país e depois de um período traumatizante de perda de casa e caminhada para a Europa, Rui Marques avisa que a próxima etapa é crucial.

“Existe um compromisso com o Governo para trabalhar a integração, nomeadamente no que diz respeito ao emprego e à saúde”, indicou o coordenador da PAR. As instituições que apoiam a PAR têm disponibilidade acolhimento até 700 pessoas, mas este número pode ser alargado caso haja necessidade. “Não podemos baixar a guarda”, concluiu.

ACAPO: Tratar a diferença entre iguais

A Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal (ACAPO) representa todos os portugueses sem visão ou com visão muito reduzida e com um membro do Governo nestas condições — a secretária de Estado da Inclusão de Pessoas com Deficiência, Ana Sofia Antunes, é cega e ex-presidente da ACAPO — considera que há uma mudança significativa na atitude do Governo em relação às pessoas com deficiência. “O Governo ter colocado alguém com deficiência à frente de uma secretaria de Estado que antes nem existia, dá-nos confiança e esperança”, afirmou José Augusto Coelho, que integra a direção nacional da ACAPO.

Desde que este Governo chegou ao poder, a ACAPO defende que as pessoas com deficiência passaram a ser mais ouvidas nas decisões que lhe dizem respeito e que tornou mais fácil falar diretamente com os governantes. “Antes pedíamos uma audiência com chefe de serviço de demorava meses até sabermos se seríamos ou não atendidos”, contou José Augusto Coelho ao Observador. Mas as mudanças vão para além desta maior facilidade comunicação. A ACAPO dá destaque à criação dos balcões de atendimento inclusivos, às reduções de 75% nos bilhetes da CP para pessoas com deficiência, a redução do número de alunos em turmas com crianças portadoras de deficiência e ainda as horas de apoio semanal conseguidas para os professores que têm deficiência.

Se estas medidas ajudam a melhorar o dia-a-dia de quem tem deficiência, José Augusto Coelho diz que falta ainda continuar a mudar as mentalidades e investir na inclusão social. “Temos graves problemas de empregabilidade e de inclusão social. As maiores barreiras para as pessoas com deficiência são ainda as mentalidades. Quando falamos de cegos ou são coitadinhos ou são prodígios. E não somos só isso. Somos pessoas com limitações, mas tentamos ultrapassa-las”, afirmou.

Quercus: Uma longa lista de reivindicações à espera de resposta

A Quercus, que há mais de 30 anos se bate pelas questões ambientais em Portugal, já viu passar vários executivos e várias composições da Assembleia da República, ficando com a certeza que os problemas que dizem respeito à preservação da natureza passam de executivo em executivo. João Branco, presidente desta associação, considera que estes problemas “são recorrentes e não passam numa única legislatura”, afirmou ao Observador.

Com sinal positivo, a organização assinala o cancelamento do Parque Eólico de Torre de Moncorvo que iria prejudicar a paisagem da região do Douro Vinhateiro, património da UNESCO. A Quercus chegou mesmo a fazer uma denúncia junto desta organização internacional para que a construção deste parque fosse travada. A decisão de chumbo deste projeto pelo Instituto de Conservação da Natureza e Florestas foi conhecida no início do ano, mas agora a Quercus está preocupada com a pressão dos promotores do investimento e das autarquias, pedindo que não haja nenhuma inversão na posição do Estado português.

Outro ponto de alarme, mas sem resolução até agora, é o Plano Nacional de Barragens. Tanto o Partido Ecologista os Verdes como o Bloco de Esquerda prometeram em campanha o fim das barragens previstas para o Alto Tâmega, mas até agora só foram canceladas barragens cujos investidores já tinham indicado não serem viáveis: Girabolhos e Alvito. “O projeto no Alto Tâmega tem um impacto brutal na região”, lembrou João Branco. Há outras questões em aberto e com urgência ambiental. Uma tem a ver com a chamada lei dos eucaliptos, pois o regime jurídico aplicável às ações de arborização e rearborização que o PS “prometeu revogar”, lembra João Branco, continua como estava. Outro dossiê é a venda e utilização do glifosato em Portugal. E um terceiro relaciona-se com a falta de tratamento das águas residuais, que em junho valeu a Portugal uma multa de três milhões de euros com uma sanção diária de oito mil euros caso a situação não seja corrigida, aplicada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.