O economista João Borges Assunção considera que o ajustamento estrutural incluído na proposta orçamental “não parece ser suficiente para a trajetória de consolidação de que Portugal precisa”, até porque “há uma série de efeitos pontuais” que dificilmente serão contabilizados.

Em entrevista à Lusa, João Borges Assunção referiu-se em concreto aos dividendos do Banco de Portugal, às poupanças com juros e com as Parcerias Público-Privadas (PPP) e à garantia do BPP, e admitiu que “estes efeitos podem existir todos” só que “dificilmente podem ser considerados como medidas de política orçamental, e isso é uma fragilidade”.

Questionado sobre se antecipa que Bruxelas terá um entendimento diferente do que são ou não são medidas estruturais, o professor da Universidade Católica Portuguesa disse que se trata de “uma dimensão processual”.

“Se o Governo conseguir argumentar que contabilisticamente [as medidas] contam de determinada maneira e se Bruxelas for obrigada a aceitar isso pelas regras jurídico-contabilísticas do Programa de Estabilidade e Crescimento, certamente aceitará”, afirmou.

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Mas, para Borges Assunção, “isso não significa que esteja a aceitar o espírito, porque o espírito do tratado é que países com défice e dívida muito grande, como é o caso de Portugal, precisam de fazer um ajustamento grande para se colocarem numa boa trajetória e este orçamento não está a tomar essas medidas de dimensão grande, mesmo que haja esses efeitos”.

João Borges Assunção considera ainda que “a principal fragilidade” da proposta de orçamento para 2017 é “a consolidação das finanças públicas” e garantir que as exigências europeias de ajustamento orçamental são cumpridas.

“Penso que a principal fragilidade volta sempre ao mesmo tema, que é o da consolidação das finanças públicas e [saber] se há ou não medidas estruturais que reduzam o défice, em termos estruturais, na dimensão que Portugal precisa e que está subjacente ao tratado orçamental”, defendeu.

Para cumprir a recomendação do Conselho, no âmbito do Procedimento dos Défices Excessivos a que Portugal está sujeito por continuar com um défice acima de 3% do PIB, o país tem de realizar um ajustamento estrutural de 0,6 pontos percentuais do Produto Interno Bruto (PIB).

Na opinião de Borges Assunção, “olhando para as medidas estruturais como elas normalmente são consideradas, na melhor das hipóteses parece haver uma espécie de variação neutra, ou seja, o aumento de despesa nova é mais ou menos igual ao aumento de receita nova”.

Isto significa que “o resto da melhoria do défice vem de efeitos que até podem existir mas que não são efeitos propriamente de política orçamental”, explicou o responsável pelo Núcleo de Estudos de Conjuntura da Economia Portuguesa (NECEP).
Sublinhando que a estratégia do Orçamento do Estado para 2017 (OE2017) é “bastante melhor do que a do OE2016, porque esse aumentava a despesa muito mais do que aumentava as receitas”, Borges Assunção entende que a proposta orçamental do próximo ano “não parece ser isso” e “é um orçamento mais neutro no plano orçamental, o que é bom comparativamente, é bastante mais prudente”.