Se é festa que seja rija. Acrescente-se rigor, a fatiota certa, ou, neste caso de Halloween, a maquilhagem ou máscara ideal. O bando de jokers e bruxas ao nosso lado parece vir em dose dupla, doce ou travessura, Moderat e Dia das Bruxas. Bom, bom era que isto fosse possível de meter no mesmo caldo. Surpresa: e não é que é mesmo? “Moderat is a very dark show”, lê-se entre a multidão. Que arranque o baile.

Esta valsa nada clássica começou em junho, no NOS Primavera Sound, onde fizeram das boas, das melhores. Esta é a versão indoor da coisa, em Lisboa, mais precisamente na LX Factory. Aguarda-se pela euforia que caracteriza o trio, aquela meio dormente, como se esta sala/armazém nos fosse engolir. Mas até quanto a isso estamos calmos, os Moderat nunca o permitiriam. Quando as luzes descem e a eletrónica emerge acabam-se todos os receios, está tudo bem.

Ali, naquela noite, ficamos com a certeza que o verão é estação de ano inteiro, está tudo no som, naquela eletrónica pontiaguda, que vai a todos os cantos da sala de maneira igual. E o que também lhes está no sangue é a marca visual da performance. Moderat é uma daquelas situações em que dizer “eu cá não preciso de ver” não é ideia muito feliz. Mas isto já se sabe, há gostos para tudo. Nós somos dos que recuam para ter campo de visão, para viajar entre jogos de sombras que saem do palco, para tentar encontrar os limites em todos os vultos e formas geométricas aleatórias.

É muito por aí que segue este momento, navegar sem astrolábio, perder o norte por opção. Afinal, sempre foi isso que os Moderat nos ensinaram, e em ano de III – terceiro álbum que editaram no final de março – os alemães continuam a perseguir a sua condição de mestres, a desvendar novos sons através de uma linguagem que se afasta do típico DJ set de techno.

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Aqui, a cabeça baixa, a marcha dos pés condenados, é substituída pela fluidez, movimentos que se vistos sem som podiam vir de uma coreografia de Bollywood ou de uma outra farra do género. Bom, talvez estejamos a exagerar, sabendo que seremos perdoados, até porque o exagero, a julgar pelo tamanho da fila para o bar, faz parte desta noite de Halloween. Ou de Moderat. Agora que chegamos a meio deste serão desfazemos as dúvidas: as bruxas terão que ficar para mais tarde.

Sascha Ring (ou Apparat), Gernot Bronsert e Sebastian Szary (ou Modeselektor) são dos anfitriões mais criativos que conhecemos, nada se dá ao acaso. E quando assim é não dá pedir o livro de reclamações, sabem de cor que uma festa pressupõe altos e baixos, saltos de precipícios e tempo para recuperar das subidas mais duras. Temos disso tudo. O ecrã e as suas projeções, por vezes laser, outras vezes apenas imagens a pedir óculos 3D, só aumentam as possibilidades. Pode até existir quem ache redutor chamar a isto eletrónica ambiental, mas este é só mais um exemplo que os Moderat têm tudo a ver com ambiente, o calor que provocam nesta LX Factory trata de o assegurar. É muito mais que ouvir música, é algo mais sensorial, que provoca arrepios — e nós agradecemos.

Outro dos pressupostos de uma festa séria é que seja cumprida em crescendo, quanto mais nos embrenhamos neste enredo mais queremos. E isso não tem que significar mais peso nem ritmos mais acelerados, é antes uma questão de intensidade. E mais uma vez os Moderat mostram-se peritos. As luzes ganham profundidade, as imagens ficam mais difusas, a estrutura, mesmo para quem gosta de dançar, tem que respeitar etapas que não podem ser queimadas.

Não podemos falar pelos Moderat – se bem que o trio se farta de sublinhar o quanto gosta de passar por Portugal – mas seguramente podemos garantir que se fosse esta multidão a mandar no futuro isto duraria muito mais do que setenta minutos. Aliás, era razão para se ficar por aqui a noite inteira, sem abóboras nem narizes de bruxa. Qual travessura, os Moderat valem mais que guloseimas, muito mais.