Mauricio Botton Carasso, de 85 anos, e a mulher, Charlotte Botton, estão em Lisboa para anunciar a criação do Botton-Champalimaud Pancreatic Center, um centro de investigação dedicado ao tratamento e investigação do cancro do pâncreas. O casal Botton doou 50 milhões de euros à Fundação Champalimaud para financiar o centro que ficará junto às atuais instalações do Centro Champalimaud para o Desconhecido, em Lisboa.

Está previsto que o novo centro seja inaugurado no dia 5 de outubro de 2020, precisamente 10 anos depois da inauguração do Centro Champalimaud. O centro, que albergará 200 pessoas, vai manter as linhas arquitetónicas do edifício original, porque a construção de um edifício contíguo estava prevista desde o início da criação daquele espaço. Charles Correa, o arquiteto indiano que projetou o edifício principal — e que morreu em 2015 —, deixou esquiços preparados que servirão de base ao novo edifício.

Da fortuna avaliada em 550 milhões de euros, Mauricio Botton Carasso, doará 50 milhões de euros para contribuir para o desenvolvimento da investigação do cancro do pâncreas, um dos cancros mais mortíferos em todo o mundo. Este cancro é difícil de diagnosticar de forma precoce por, normalmente, não apresentar sintomas nas fases iniciais. Os diagnósticos tardios fazem com que a esperança de sobrevivência dos doentes seja reduzida. Estima-se que cerca de 330 mil doentes morram todos os anos com esta doença.

Entre os 100 mais ricos de Espanha, segundo o jornal El Mundo, o neto do fundador da Danone tem vindo a vender a sua participação da Danone Espanha desde 2012, com o grosso da sua participação a ser vendido à multinacional francesa em 2015. Diretor do departamento de investigação, desenvolvimento e controlo de qualidade da Danone Espanha durante cerca de 40 anos, Mauricio Botton Carasso, está agora concentrado no investimento imobiliário. Além disso, têm-se dedicado à produção de azeite da marca La Gramanosa.

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Os judeus sefarditas que se dedicaram à produção de iogurtes

A família de Isaac Carasso, avô de Mauricio Botton Carasso, vivia em Espanha, mas a perseguição aos judeus durante a inquisição, no final do século XV, obrigou-os a fugir para Salónica, na altura parte do Império Otomano. Foi aqui que, muito anos depois — nos anos 1870 —, nasceu Isaac Carasso Nehama.

Em 1912, Salónica tornou-se parte da Grécia, como resultado da Guerra dos Balcãs. Foi nesta cidade que ficou sedeado um governo provisório de apoio aos Aliados (Reino Unido e França) durante a I Guerra Mundial, um apoio que era contrário à vontade do rei Constantino I. Ainda durante a I Guerra Mundial, Salónica ardeu quase completamente, deixando a população, maioritariamente judia, sem casas nem meios de subsistência. Foi neste período, depois da Guerra dos Balcãs, e pouco tempo depois de ter nascido Daniel, que a família Carasso fugiu de regresso a Espanha, para Barcelona.

“Ser judeu sefardita equivale a ser portador do medo”, escreveu Manuel Mira Candel, que dedicou um livro à história da família Carasso, a “família de sefarditas espanhóis que sobreviveu a seis guerras” — “El olivo que no ardió en Salónica”, da editora La Esfera de los Livros.

Nesta novela histórica, Isaac Carasso conta histórias ao seu filho Daniel, nascido em 1905 em Salónica. Conta-lhe a história de um pastor de ovelhas que já não tinha onde guardar o leite e que por isso matou duas ovelhas para usar as peles como recipiente. Qual não terá sido o espanto do pastor quando no dia seguinte encontrou o líquido branco como o leite, mas denso, ácido e de sabor amargo. A culpa era de uma bactéria que fermentava o leite e o “transformava numa espécie de elixir da eternidade” — a Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus, que vive no intestino dos mamíferos.

O escritor e jornalista descreve Isaac Carasso como um homem que “iniciou a transformação dos hábitos alimentares a partir do terceiro piso de uma casa na rua dos Anjos de Barcelona [Carrer dels Àngels de Barcelona]”, um homem que procurou as velhas fórmulas do jaurt búlgaro — o iogurte na sua forma mais pura —, um homem que “tinha partilhado com o Nobel Ilya Metchnikoff [também judeu] o sonho de prolongar a vida”.

Aos 103 anos, Daniel Carasso ainda comemorou os 90 anos da empresa Danone — AFP PHOTO JACQUES DEMARTHON

Quando já vivia em Barcelona, na década de 1910, Isaac Carasso reparou que muitas crianças espanholas sofriam de infeções intestinais, conta a página da Danone Portugal. É aí que tem a ideia de usar um produto conhecido nos Balcãs pelos seus benefícios para a saúde: o iogurte (jaurt). Em 1919, lança a marca Danone, inspirada no nome carinhoso que usava com o seu filho: Dánon. O jovem Dánon estudou economia em Marselha (França) e bacteriologia no Instituto Pasteur, em Paris. Em 1929, fundou a Sociedade Pariense do Iogurte Danone e inaugurou o primeiro ponto de venda em Paris.

Mas a fuga faz parte da vida dos sefarditas e a vida dos judeus tem sido marcada por perseguições. E a II Guerra Mundial trouxe novas razões para o medo. Daniel (ou Dánon), o filho mais velho de Isaac, fugiu para os Estados Unidos. Flora morreu numa câmara de gás em Auschwitz, em 1944. Mas Juana, mãe de Mauricio Carasso, conseguiu salvar-se a si e a dois sobrinhos.

Também no espírito dos judeus está a capacidade de luta e Daniel Carasso, mesmo exilado nos Estados Unidos, não deixou morrer o sonho do iogurte. Em 1941, Daniel e a mulher mudaram-se para Nova Iorque, e foi aí que viu um anúncio no jornal: “Vende-se comércio de iogurtes”. Daniel Carasso comprou a pequena loja grega que produzia 100 a 200 iogurtes por dia e criou a Dannon Milk Products Inc., em 1942.

Daniel Carasso conseguiu voltar a França em 1951, onde morreu já com 103. Foi a partir da capital francesa e à frente do negócio da família que desenvolveu a marca Danone e que tornou popular o consumo de iogurtes.

A Danone chegou a Portugal em 1989, depois do grupo ter comprado 70% do capital da Iophil – Produtora de Iogurtes, fundada pela família Gomes Filipe, em 1979. No ano seguinte lançou a marca Danone no país.