A 17 dias da data marcada para o Brexit, a decisão inédita de passar o controlo das negociações para o parlamento torna mais provável que a saída do Reino Unido da União Europeia não vá acontecer nos próximos tempos, embora nenhum resultado possa ser excluído.

Na prática, o que vai acontecer é que, em vez de, passivamente, analisar e votar (e, até ao momento, invariavelmente, chumbar) propostas de acordo submetidas ao parlamento por Theresa May, irá haver uma série de votos indicativos sobre pontos concretos e modelos específicos, o que poderá ajudar a compor o tipo de acordo que poderia ser aprovado pelos deputados.

O que está, também, a dar algum conforto às bolsas esta terça-feira é que a primeira-ministra deixou claro que nunca seria sua intenção avançar, sem a bênção de uma maioria parlamentar, para um Brexit sem acordo.

Como se poderia esperar, a primeira-ministra, Theresa May lançou um aviso depois da aprovação da emenda que passou o controlo das negociações para o parlamento: a decisão “perturba o equilíbrio entre as nossas instituições democráticas e cria um precedente perigoso, imprevisível, para o futuro”. Mas o maior otimismo nas bolsas, esta manhã, indica que os investidores estão mais confiantes de que o cenário mais disruptivo e incerto — a saída sem acordo — tornou-se, agora, menos provável.

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Referindo-se à tomada de controlo do Brexit por parte dos deputados, um economista do Berenberg Bank defende que “ainda que este desenvolvimento não resolva o impasse, é um passo na direção certa”. Porquê? Porque, embora não se saiba que modelo de Brexit poderia ter maioria no parlamento, acredita-se, pelo menos, que no parlamento britânico existe uma visão maioritária de que a saída sem acordo não é a melhor opção. Além disso, será prevalecente a ideia de que se deve manter uma ligação de proximidade com a União Europeia.

Brexit. Theresa May é derrotada (novamente) e parlamento britânico assume controlo das negociações

O que é que isto irá significar, na prática? Não se sabe, mas existem alguns cenários cujo risco parece ter sido reduzido. Pelo menos temporariamente, Theresa May deixa de poder levar o seu acordo ao parlamento como a única forma de Brexit possível, rejeitando quaisquer iniciativas de outros grupos parlamentares de dar os seus contributos. Depois de muita discussão sobre os vários modelos, é provável que se possa avaliar, exatamente, qual é o apoio parlamentar a modelos como o da contínua pertença à união alfandegária, o chamado modelo Noruega+ ou, até, a possibilidade de um segundo referendo.

O que parece mais certo é que “o Reino Unido não terá alternativa que não seja pedir à UE um longo adiamento para o Brexit, caso o parlamento não consiga produzir uma opção coerente e consensual para a saída da UE”, escreve Kallum Pickering, o economista do Berenberg.

Mas isto significa que o acordo negociado por Theresa May está morto? “Pode não ser bem assim”, diz o economista: “não é impossível que May volte a levar o acordo para uma terceira e definitiva votação”. O economista não exclui que esta nova posição, mais ativa, do parlamento, leve a que os deputados adotem uma visão diferente sobre o que é possível fazer neste processo — eventualmente alterando o sentido de voto de alguns deputados.

Theresa May, por seu lado, “parece ter a autoridade feita em pedaços”, ainda mais depois de três ministros terem pedido a demissão. Foi noticiado que May tinha garantido aos ministros que se demitiria mesmo que o seu acordo fosse votado favoravelmente, “mas é difícil imaginar como é que ela conseguirá permanecer no cargo muito mais tempo, em qualquer cenário”.

Depois de ter dito que o seu acordo era a única forma de conseguir o Brexit, a primeira-ministra garante, agora, que não irá avançar com um Brexit sem acordo sem o respaldo do parlamento. “Embora esta mudança marque uma alteração favorável no discurso de May, cria-se um problema: e se o governo não estiver disposto a dar cumprimento àquilo que o parlamento aprovar, ao mesmo tempo que o parlamento rejeita um Brexit sem acordo?”, pergunta o economista do Berenberg Bank.

Tudo isto reforça a perspetiva de que o Reino Unido possa estar, potencialmente, estar a dirigir-se para um adiamento longo e eleições antecipadas, ou um segundo referendo que resolva este impasse”, conclui o economista.