Um estudo realizado por cientistas e organizações indígenas apurou que a destruição ambiental da Amazónia é tão complexa que partes da floresta atingiram um ponto de inflexão e podem nunca mais recuperar.

De acordo com o relatório citado pelo The Guardian, o ponto de inflexão não é um cenário futuro, mas uma realidade presente em algumas zonas da região. “O Brasil e a Bolívia concentram 90% de desflorestação e degradação”.

Os cientistas da Rede Amazónica de Informações Socioambientais Georreferenciadas (RAISG) trabalharam em conjunto com a Coordenação de Organizações Indígenas da Bacia Amazónica (Coica) para realizar o estudo intitulado “Amazónia Contra o Relógio”, uma das maiores pesquisas até à data, que abrange nove nações que detêm partes da floresta. Pequenas regiões como Suriname e Guiana Francesa, têm pelo menos metade das suas florestas intactas.

As organizações indígenas representam 511 nações que pedem um pacto global para a proteção permanente de 80% da floresta tropical até 2025.

Alice Guzmán, uma cientista do Equador que coordenou o relatório afirma que a meta da proteção de 80% é um grande desafio, “difícil, mas factível”. São precisas ações urgentes para proteger não só a floresta que se mantém intacta, mas também para restabelecer as terras degradadas para voltar a atingir essa percentagem.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Citada pelo jornal britânico, a cientista afirma: “Tudo depende do apoio das comunidades indígenas e das pessoas que vivem na floresta. Isso e a dívida”. De acordo com Gúzman, a forma mais segura de garantir a preservação do pulmão da terra é fornecer uma proteção estatal à administração das terras por grupos indígenas e remover as lacunas que permitem a entrada de indústria extrativas.

A mesma fonte adianta que a floresta foi designada como área protegida ou território indígena, pelo que apenas 14% da florestação ocorre nesse espaço. Atualmente, cerca de 100 milhões de hectares de terras indígenas estão em disputa pelo reconhecimento governamental.

Guzmán acrescenta ao The Guardian:” Ter os indígenas nos processos de decisões significa contar com o conhecimento de quem mais conhece a floresta. E eles precisam de orçamentos”. As suas terras precisam, desta forma, ser protegidas das indústrias.

A mineração é uma das grandes ameaças a estas áreas protegidas e mais cobiçadas entre os exploradores de pedras preciosas. Grande parte deste processo é clandestino e ilegal, mas em áreas protegidas é legalizada, pelo que os cientistas pediram aos governos que rejeitem todas as categorias de licenças de mineração.

O The Guardian detalha as ameaças da floresta tropical, como por exemplo o petróleo, principalmente no Equador, fonte de 89% do petróleo exportado da região. Estes blocos de exploração cobrem 9,4% da Amazónia e 43% estão em áreas preservadas. No que tange à agricultura, esta atividade é responsável por 84% da desflorestação, pelo que a quantidade de terras destinadas a fins agrícolas triplicaram desde 1985, indica o mesmo relatório. Deste modo, o Brasil é um dos principais exportadores de alimentos do mundo, desde soja, carne de bovino e grãos, faturando biliões de dólares por ano.

O presente estudo recomenda a maior colaboração entre governos regionais, instituições financeiras de nível internacional e empresas de private equity que possuem grande parte da dívida das nações. A pesquisa citada pelo mesmo jornal identifica a América Latina como a região mas endividada do mundo em desenvolvimento e a abolição da dívida em troca de compromissos de preservação seria de extrema importância.

O relatório indica que este grupo de entidades têm uma oportunidade única de perdoar dívidas existentes em troca de acordos para acabar com a extração industrial e promover a proteção de áreas prioritárias. Entre as várias soluções e recomendações apresentadas estão: a suspensão de novas licenças e financiamento aos processos de mineração, petróleo, pecuária, pecuária, barragens, extração de madeira e outras atividades; reimplantar terras queimadas; novos modelos de gestão que permitem um maior reconhecimento dos povos nativos.

O The Guardian adianta que as eleições presidenciais no Brasil são motivo de otimismo, com a possibilidade da derrota de Jair Bolsonaro, que no seu poder contribuiu para o agravamento da desflorestação, frente a Luiz Inácio Lula da Silva, numa tensa disputa, a 2 de outubro.

Presidente brasileiro assina decreto para promover mineração na Amazónia