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"The Morning Show". Um caos televisivo milionário? Sim, por favor

Este artigo tem mais de 1 ano

Jennifer Aniston e Reese Witherspoon veem-se no meio de uma intriga entre as câmaras. Mentiras, favores, privilégios e ambições num texto que subiu de nível. A nova temporada está na Apple TV+.

Alex Levy (Jennifer Aniston) está de novo no topo, escândalo após escândalo. A questão é: em 10 episódios, o que pode acontecer a esta estrela da TV matutina?
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Alex Levy (Jennifer Aniston) está de novo no topo, escândalo após escândalo. A questão é: em 10 episódios, o que pode acontecer a esta estrela da TV matutina?

Erin Simkin

Alex Levy (Jennifer Aniston) está de novo no topo, escândalo após escândalo. A questão é: em 10 episódios, o que pode acontecer a esta estrela da TV matutina?

Erin Simkin

Se “Sucession” tivesse tido um filho fora do casamento, ele aparecia agora, pronto para reclamar parte da herança. Esse filho chama-se “The Morning Show” e consegue, na terceira temporada, transformar-se numa corrida contra o tempo alucinante e num jogo de poder mais complexo do que qualquer regra de xadrez.

“The Morning Show” já não é a mesma série que se estreou em 2019 — e que deu à Apple TV+ um lugar legítimo na mesa dos grandes do streaming. Ou melhor, é e não é. A história começou nos bastidores de um programa matinal da televisão norte-americana, onde um dos apresentadores aproveitava o seu estatuto para assediar e abusar das colegas mulheres. O ambiente tóxico e os privilégios só reservados para alguns continuam a ser um dos temas da série, mas a produção que tem Jennifer Aniston e Reese Witherspoon a liderar o elenco evoluiu para muito mais do que isso. A prova está disponível a partir desta quarta-feira, 13 de setembro, quando os novos episódios começam a ficar disponíveis.

Estamos em março de 2022, num cenário de pós-pandemia que ainda influencia muito a vida das personagens. A televisão teve de se reinventar, a UBA gastou um balúrdio num serviço de streaming que ninguém sabe se terá vida longa, Alex Levy (Jennifer Aniston) está de novo no topo após ter sobrevivido aos escândalos de Mitch Kessler (o incrível Steve Carell que agora apenas faz breves aparições) e a uma debilitante Covid-19 que partilhou em direto com os espectadores. Ela quer ter algo a dizer sobre o futuro da empresa, quer um lugar nas reuniões de direção, mas Cory Ellison (Billy Crudup), o CEO, está demasiado distraído com um possível negócio com o multimilionário Paul Marks (Jon Hamm) para ter tempo para lhe dar sequer atenção.

[o trailer da nova temporada de “The Morning Show”:]

Portanto, a história recomeça mergulhada num caos de bastidores onde é preciso urgentemente muitos milhões de dólares para garantir a sobrevivência de uma empresa com mais de 80 anos. Toda a gente tem esqueletos no armário, toda a gente tem as mãos sujas por uma qualquer troca de favores. À frente das câmaras, em contrapartida, tudo está lindo e maravilhoso. O programa tem novos apresentadores, Yanko Flores (Nestor Carbonell), promovido dos segmentos da meteorologia a figura principal, e Chris Hunter (Nicole Beharie), uma campeã olímpica transformada em pivot televisiva. Alex vai aparecendo de vez em quando, aproveitando o estatuto que tem para se dedicar igualmente a outros projetos. Quando a Bradley Jakson (Witherspoon), está fora do formato após ter conseguido um lugar no bloco noticioso da noite. Está aqui o primeiro problema da nova temporada de “The Morning Show”: Witherspoon está praticamente desaparecida nos primeiros episódios, relegada para um segundo plano que não faz qualquer sentido. A série dá mais tempo de antena a novas personagens, como Chris, que embora tenham arcos narrativos relevantes (como questões raciais e de representatividade), não nos dizem grande coisa. É como se tivéssemos comprado um bilhete de teatro para ver uma peça com uma estrela de Hollywood e, azar dos azares, apanhássemos a sessão com o ator substituto. Não foi isso que pagámos, não é isso que queremos ver.

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Percebemos mais para a frente porque é que Bradley Jackson deixou o lugar de co-apresentadora do “The Morning Show” e porque é que a sua relação com Laura Peterson (Julianna Margulies) ruiu, mas o arranque desta personagem é fraco e só é parcialmente corrigido ao longo da temporada. Witherspoon nunca chega a recuperar a relevância de outros tempos, mesmo que a sua principal função continue a ser investigar e denunciar situações abusivas.

Segundo problema da série: a pandemia. Há um episódio inteiro, feito em modo flashback, que nos suga de volta a uma experiência tão surreal que, por vezes, ainda parece difícil de acreditar que nos aconteceu. Será que queremos voltar a esse momento? Será que temos capacidade para gerir as emoções que essas memórias nos desencadeiam? Será que temos distanciamento suficiente? E, mais importante, queremos? A minha resposta é não. Percebo que, a partir do momento em que os guionistas escolheram incluir a atualidade, e não seguir apenas a via fictícia, tivessem de incluir a pandemia, mas já vimos a catástrofe na última temporada, nós próprios vivemos as catástrofes nas nossas vidas, está bom, não queremos remexer mais nisso para já. Ainda não é o momento de nos deitarmos no divã da terapia. Este episódio específico serve para contextualizar o ponto em que as personagens estão atualmente — e cumpre essa função — mas as constantes referências à pandemia no resto dos episódios são irrelevantes.

Terceiro problema de “The Morning Show”: o facto de querer incluir todos os temas relevantes da atualidade. O direito ao aborto, a guerra na Ucrânia, os distúrbios no Capitólio, as discriminações laborais em relação às mulheres e em relação às mulheres de cor. Querem um tema? Qualquer um? Está lá. Por vezes a história dispersa-se e parte em demasiadas direções, sobretudo porque para cobrir tudo isto é preciso dar mais espaço a personagens secundárias (voltamos ao mesmo), que até podem ser interessantes mas, não para nos roubarem tempo com os protagonistas. É o caso da produtora Mia Jordan (Karen Pittman) e dos telefonemas com o fotojornalista perdido no meio da Ucrânia. Em contrapartida, Chip Black (Mark Duplass) continua mal-aproveitado. O produtor de longa data de Alex, que a venera e a salva sempre que é preciso, parece um cãozinho amestrado mas nós sabemos que há ali muito mais para mostrar. E ele mostra, só que bastante para a frente.

Contas feitas (mais milhão, menos milhão), o regresso a esta série é para fazer sem pestanejar. O elenco é perfeito, o texto está cada vez melhor, o ritmo é intenso e a incerteza sobre para que lado vai pender a balança aguenta a jornada até ao fim

Erin Simkin

Apesar de tudo isto, “The Morning Show” tem uma curva crescente ao longo dos dez novos episódios e consegue agarrar-nos, sobretudo com a história da venda/não-venda da UBA. Jon Hamm entra em cena como Paul Marks (mais uma personagem nova), um multimilionário que quer fazer viagens ao espaço e, nos tempos livres, está a pensar gastar uns trocos (uns quantos mil milhões) numa empresa de media. Começa por parecer ser o salvador — aliás, é Cory que vai atrás dele para fazer o negócio acontecer —, para acabar por revelar uma faceta bem mais complexa e obscura. Pelo meio, desenvolve uma relação pessoal com Alex que, ao tornar-se pública, descredibiliza por completo o que ela tem conseguido. Como lhe diz Cory, passa a ser “apenas a namorada de”. É irónico que uma carreira inteira possa perder o mérito num estalar de dedos e por motivos que nada têm a ver com os profissionais. E mais irónico é o facto de corresponder totalmente à realidade. Nisso, “The Morning Show” também tem mérito: os temas que foca não são para ali atirados à toa. As histórias têm relevância e sentido e os diálogos parecem ter subido um patamar. Quase todas as cenas partilhadas por Alex e Cory são um jogo de pingue-pongue de palavras brilhantes. Hipnotizados por estes dois, só conseguimos respirar no final. A temporada é deles, sem qualquer dúvida.

Billy Crudup já tinha demonstrado ser um dos melhores do elenco (ou possivelmente o melhor) e está mais do que confirmado este ano. Cory Ellison é um homem implacável, não tem problemas em passar a perna a quem for preciso para conseguir o negócio de que precisa mas, ao mesmo tempo, é o primeiro a atirar-se para a frente de um autocarro para salvar alguém de quem gosta. É um homem profundamente sozinho, pessoal e profissionalmente, é sarcástico e por vezes um robot, mas tem um lado humano que nos faz criar uma empatia muito forte com a personagem.

Está guardado para o penúltimo capítulo um dos episódios mais alucinantes que vão ver este ano na televisão — ao lado de “Fishes”, da segunda temporada de “The Bear”, arrisco-me já a fazer previsões do final de 2023, porque este estará na lista de certeza. Sem spoilers, só é permitido dizer que é uma montanha-russa de golpe atrás de golpe, pessoal, profissional, vale tudo. É eletrificante e o motivo pelo qual passamos tantas horas em frente do ecrã. É para ver pequenas pérolas, escondidas no meio de uma temporada, que de repente explodem e mudam o jogo. Até a banda sonora deste episódio, com violinos a ditarem o compasso, nos remete para as mudanças de direção mais inesperadas de “Succession”. De repente, podíamos ver sair do elevador qualquer um dos elementos da família Roy, preparados para dizer “fuck off” e atirar uns milhões para cima da mesa.

Contas feitas (mais milhão, menos milhão), o regresso a esta série é para fazer sem pestanejar. O elenco é perfeito, o texto está cada vez melhor, o ritmo é intenso e a incerteza sobre para que lado vai pender a balança aguenta a jornada até ao fim.

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