Os indicadores de pobreza do Algarve, mais elevados do que na média do país, estão ligados à “grande dependência” de um “monosetor” económico, defendeu esta segunda-feira uma investigadora envolvida no diagnóstico social do novo Plano de Desenvolvimento Social da região.

O Algarve “tem um Produto Interno Bruto mais elevado do que o país, mas tem o ganho [1.106,30 euros] — salário e outras remunerações, como prémios e diuturnidades — mais baixo do continente [média de 1.294,10 euros]”, afirmou Ana Cardoso, do Centro de Estudos para a Intervenção Social (CESIS).

A investigadora, que falava na sessão de apresentação do Plano de Desenvolvimento Social do Algarve (PDSA), explicou que isso se deve à “forte concentração de trabalhadores no setor do alojamento e hotelaria”, ou seja, à “grande dependência da economia em relação a um setor”.

“Temos praticamente um monosetor, (…) cuja oferta de trabalho é marcada pela sazonalidade, com um forte pendor dos contratos a prazo e do trabalho a tempo parcial”, reforçou.

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Durante um painel de debate, o sociólogo Paulo Pedroso também abordou a questão, frisando que “uma parte dos problemas está escrita no modo como o modelo económico” do Algarve se desenvolveu.

“É evidente que uma região que salta de uma agricultura para uma indústria turística muito marcada pela sazonalidade constrói estruturas sociais que se ressentem disso”, apontou o ex-ministro socialista, defendendo a alteração do modelo económico e a intervenção no mercado de emprego “de um modo que o torne mais justo”.

Além das mais de 10 mil crianças em pobreza extrema, Ana Cardoso destacou as elevadas taxas que o Algarve regista no abandono escolar precoce (19,9% na região e 10,6% no país), na sobrecarga de despesas com habitação (9,1% na região e 5% no país) e na privação material e social (16,4% na região e 13,5% no país) — todas mais altas do que a média nacional ou do continente — para assinalar que o combate à pobreza não pode ser estanque.

“O combate à pobreza não é autónomo de todas as questões mencionadas. Entre todas estas questões, há relações muito estreitas e estas dimensões não podem ser entendidas como dimensões estanques. O combate à pobreza é uma realidade multidimensional e que tem que ver com todos estes aspetos”, realçou a socióloga e investigadora sénior do CESIS.

Como os indicadores de pobreza são construídos a partir do rendimento disponível das famílias, combater a pobreza passa por “aumentar os rendimentos dessas mesmas pessoas”.

“E como o principal rendimento é do trabalho, [é preciso] trabalhar as questões da qualidade do emprego, no sentido de aumentar salários, melhorar os níveis de qualificação da população, tudo isso, são questões absolutamente centrais”, salientou Ana Cardoso, que esteve envolvida na fase de diagnóstico do novo Plano de Desenvolvimento Social do Algarve.

Este projeto da Comunidade Intermunicipal do Algarve (AMAL) será concretizado com 12 programas que pretendem combater problemas sociais específicos.

Pobreza, habitação, imigração, apoio à infância, educação, igualdade de género e violência doméstica, trabalho, economia social, inclusão de pessoas com deficiência, saúde mental, envelhecimento ativo e participação cívica são as áreas focadas, a partir de uma perspetiva supramunicipal.

Segundo o primeiro-secretário da AMAL, Joaquim Brandão Pires, o plano estratégico envolverá um conjunto de investimentos no valor de 450 milhões de euros, também com recurso a fundos comunitários.