As Nações Unidas (ONU) denunciaram, esta quarta-feira, um cenário “profundamente alarmante” de “miséria, repressão, medo, fome e desesperança” na Coreia do Norte, onde assistir a uma série televisiva estrangeira “pode ser punível com a morte”.
Num briefing ao Conselho de Segurança da ONU sobre a situação dos direitos humanos na Coreia do Norte, o alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Türk, alertou para a situação precária que se vive no país, que está a “aprisionar as pessoas num sofrimento absoluto”.
“Hoje, a Coreia do Norte é um país isolado do mundo. Um ambiente sufocante e claustrofóbico, onde a vida é uma luta diária sem esperança”, resumiu.
Entre os vários fatores que contribuíram para essa avaliação, Türk começou por apontar o aprofundamento da repressão ao direito à liberdade de circulação, garantindo que é quase impossível que as pessoas se desloquem sem a permissão do Governo, mesmo quando se encontram em circunstâncias de absoluto desespero ou em perigo de perseguição.
Uma das consequências dessa repressão é que “as famílias divididas ficam ainda mais divididas”, não sendo permitida a reunificação com familiares no exterior, além de que “telefonar ou enviar dinheiro para familiares na Coreia do Norte é agora praticamente impossível”, disse o representante da ONU.
Em segundo lugar, a repressão à liberdade de expressão agravou-se, especialmente como resultado da aplicação de três leis.
Uma delas trata do consumo de meios de comunicação estrangeiros que são considerados “pensamento reacionário”, outra criminaliza o uso de linguagem não condizente com o dialeto de Pyongyang, enquanto uma terceira centra-se em forçar os jovens a “conformarem-se com um estilo de vida socialista”.
“Simplificando, as pessoas na Coreia do Norte correm o risco de morte por simplesmente assistirem ou partilharem uma série de televisão estrangeira”, frisou Volker Türk, referindo a punição prevista na lei norte-coreana.
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Também as condições socioeconómicas de vida no país asiático tornaram-se “insuportavelmente duras”, com o alto comissário particularmente preocupado com a falta de acesso aos alimentos, num momento em que as autoridades estão a “fechar a maioria dos mercados de pequena escala” e a restringir o que pode ser vendido nos restantes.
De acordo com a ONU, quase metade da população sofre de insegurança alimentar, com a emaciação infantil a aumentar em algumas províncias.
O trabalho forçado foi igualmente abordado por Türk, que denunciou condições “muitas vezes fisicamente perigosas, escassez de alimentos e cuidados de saúde, níveis extremos de vigilância, violência física e o confisco de até 90% dos seus salários pelo Estado” de trabalhadores que foram enviados para o estrangeiro.
“Além disso, a detenção arbitrária, a tortura e os maus tratos e a falta de julgamentos justos são táticas de repressão constantes”, assinalou.
O alto comissário para os Direitos Humanos pediu então que seja dada prioridade à responsabilização por estas “violações de longa data, graves e generalizadas”.
Além do apelo dirigido à comunidade internacional, Volker Türk dirigiu-se também a Pyongyang: “Todos os caminhos para sair desta situação começam com uma reviravolta no beco sem saída do isolamento autoimposto: abrir o país, reaproximar-se da comunidade internacional, permitir o contacto entre pessoas, abraçar a cooperação internacional, centrar-se no bem-estar de todas as pessoas”.
A Rússia e a China tentaram impedir que a reunião de hoje fosse realizada, com Pequim a alegar que não cabe ao Conselho de Segurança da ONU abordar questões de direitos humanos e Moscovo a acusar “um pequeno grupo de Estados de usar” o Conselho como uma “ferramenta para promover os seus próprios objetivos geopolíticos”.
Contudo, quer a própria ONU, quer vários países ocidentais, defenderam que os abusos e violações dos direitos humanos por parte da Coreia do Norte estão intrinsecamente ligados às ameaças do regime à paz e à segurança internacionais.
Nesse sentido, a reunião prosseguiu, com o embaixador sul-coreano na ONU, Joonkook Hwang, em nome de 57 Estados-membros, a acusar Pyonyang de “continuar a cometer violações sistemáticas, generalizadas e flagrantes dos direitos humanos”.