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© Hugo Amaral/Observador

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14 temas inevitáveis para o ano político (e eleitoral)

Prepare-se: goste ou não de política, vem aí um ano cheio de eleições, de incógnitas, de riscos. Mas também de argumentos que vão definir o futuro do país. Eis um guia, para o orientar na discussão.

Três eleições marcadas, com cenários para todos os gostos – e para muitos riscos; um grande banco à venda e uma empresa pública a privatizar; impostos e medidas de austeridade a rever (ou não); caminho a fazer (ainda) para consolidar as contas. Dois modelos diferentes para fazer crescer o país, muitos caminhos à escolha, mas cheios de limitações.

Preparado? Sim, o ano de 2015 vai ser político. Deixámos-lhe aqui um guia prático, para se poder preparar para a discussão que aí vem. Vamos a isto?

A nova economia: privatizações 

Vai ser o tema com que o ano arranca, com um pretexto importante: até 14 de janeiro o Governo vai negociar com os sindicatos o caderno de encargos para a privatização da TAP, um negócio onde o objetivo é vender 66% da transportadora aérea portuguesa. O acordo não será fácil, já que os sindicatos se opõem à venda. E no plano político a divisão é igualmente notória: o PS admite apenas a venda de 49%, mantendo o Estado o controlo da empresa, a restante esquerda nem quer ouvir falar do tema.

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Com este mote, o tema da nova economia vai prosseguir ano fora. Vai haver discussão sobre os candidatos à TAP e sobre o vencedor (se desta for de vez), depois sobre a EGF (Empresa Geral de Fomento), que foi já entregue à Mota-Engil, num processo contestado pelos concorrentes espanhóis e por várias autarquias (que foram para tribunal). Como haverá polémica garantida – e interessante – sobre a concessão da Carris, Metro de Lisboa e STCP a privados – ou às autarquias, porque a Câmara de Lisboa de António Costa continua nesta corrida, o que faz dela uma das mais interessantes etapas políticas do ano de 2015.

Mais central, porém, será a dupla questão do Novo Banco e da PT. O Banco de Portugal quer vender o banco que resultou da queda do BES até junho, mas a solução e o preço não serão indiferentes à discussão política. O Governo pôs todas as cartas num lema (não haver dinheiro dos impostos) e só uma venda pelo menos perto dos 4,9 mil milhões postos pelo Fundo de Resolução no banco evitarão uma contestação forte à opção que teve pelo menos o aval do Governo.

No que respeita à PT, o caso será marcante na divisão ideológica entre Passos Coelho e António Costa. Passos disse na mensagem de Natal que deseja uma sociedade “em que não haja privilégios nas mãos de um pequeno grupo com prejuízo para todos” – numa crítica indireta aos tempos de intervenção direta do Estado, com apoio num pequeno grupo de grandes empresas. À nova economia, livre como costuma dizer Passos, o PS contrapõe, no caso da operadora de telecomunicações, que o Estado defenda a empresa, admitindo até uma participação da CGD na empresa para que exista uma palavra no seu futuro.

A PT tem, já em janeiro, uma decisão nas mãos: aceitar ou não passar a PT Portugal para as mãos da francesa Altice. Aceitando como parece provável, qualquer processo de reestruturação interna será aproveitado pelos socialistas para criticar a ‘não posição’ do Governo no processo.

No fim de tudo isto, juntar-se-á na campanha o resultado do fim da golden share na PT, assim como das outras privatizações realizadas por este Governo, da ANA aos CTT. Pano para mangas.

Uma sobretaxa medida ao trimestre

Foi ao mesmo tempo uma manobra para garantir o desejo do CDS e uma decisão com olhos nas eleições – mas com risco: o Governo decidiu que a sobretaxa no IRS baixará em 2016, mas só se a receita fiscal crescer acima do estimado no Orçamento. A partir de abril, a cada trimestre, os portugueses passarão a receber em casa uma estimativa: que as contas do Estado estiverem a correr bem, aguça-se o apetite para o próximo ano – e a oposição começará a clamar o eleitoralismo da direita; Se não, começam as críticas ao Executivo – e este a defender-se com o rigor que o país terá de manter.

No meio do risco, o Executivo conta com um trunfo: como ligou a redução de impostos à apresentação de todo o tipo de faturas, conta ter mais um aumento de despesas a sair da economia paralela e a entrar na máquina do fisco.

Na discussão da reforma do IRS, António Costa arriscou: disse que teria “todo o prazer” em devolver os impostos aos portugueses. Mas alguns socialistas não deixaram de criticar a medida, por condicionar a margem de manobra do próximo Governo. Os socialistas farão do aumento de impostos de 2013 uma clara bandeira contra a “austeridade excessiva” que apontam a este Governo, mas terão ainda de medir até onde ir na sua redução, quando apresentarem o seu programa de Governo.

As medidas temporárias (ou de crise)

Encaixando na questão dos impostos, há muitas mais medidas temporárias que vão entrar pelo ano e pela campanha dentro. Começam por exemplo no IVA na restauração, que o CDS chegou a fazer cavalo de batalha dentro do Governo, mas que acabou por nunca baixar dos 23%. Mas continuam passando pelos inevitáveis cortes nos salários do Estado e nas pensões, que Passos já disse pretender repor 20% ao ano, ao contrário de Costa, que disse (sem se comprometer muito) preferir uma devolução já em 2016.

Há ainda os feriados, que o PS quer recuperar mas o PSD não – e o CDS espera antecipar, pelo menos no que respeita ao 1 de dezembro. E muitas outras pequenas medidas, como as 40 horas de trabalho no Estado (que Costa contestou em Lisboa).

Em tudo isto, o mais importante será o subcontexto: até que ponto uns e outros candidatos consideram ser possível voltar a um tempo de “normalidade”, até que ponto se deve puxar pela economia interna mais dependente do consumo. E até que ponto isso é possível fazer sem voltar a disparar o défice – e sem fazer crescer de novo a curva da dívida pública.

Investimento. Qual?

Durante estes três anos e meio de ‘passismo’, foi uma das rúbricas onde mais se cortou para atingir os objetivos orçamentais. O investimento é tema caro ao novo líder do PS, que não teme falar também da importância do investimento público para fazer crescer a economia. Costa ainda não tem planos desenhados, mas o Governo de Passos tem alguns: está no terreno, para começar, um plano de investimentos, por exemplo, nos portos e rodovias (sobretudo reparações e melhoramentos), espalhados um pouco pelo país. Mas é um plano gradual e muito assente nos fundos comunitários, que agora têm um novo plano.

O tema dos fundos europeus foi um dos primeiros que Costa agarrou quando chegou a líder do PS. Envolveu-se numa discussão com Miguel Poiares Maduro, embrulhando-se numa argumentação técnica sobre se devia estar mais dinheiro previsto para 2015. É provável, portanto, que a dicussão se prolongue pela campanha- não só na quantidade, mas também no tipo de investimentos que o Estado pode fazer nos próximos quatro anos.

O início da aplicação dos novos fundos será também escrutinado ao limite.

A desigualdade (e o desemprego)

Mais um tema que ficou evidente nos discursos de Natal dos dois líderes: Costa atacando o Governo foi falta de sensibilidade social, por ter “empobrecido” o país – na terminologia que os socialistas mais usam, desde os tempos de Seguro. Passos respondeu dois dias depois, sublinhando sempre as medidas que tomou tendo em vista proteger os mais pobres das medidas mais duras.

Exemplos? “As políticas ativas de emprego para dar as oportunidades que os nossos jovens; as isenções nas taxas moderadoras; aos aumentos anuais das pensões mais baixas”. Não chega, gritarão os socialistas, com Costa à cabeça a criticar uma medida, por exemplo, que aí vem e que promete polémica: o limite às pensões sociais recebidas por uma família.

Nas contas finais, o PS e a esquerda vão puxar pelos milhões a menos que estão em medidas como o Rendimento Social de Inserção, pelos números ainda altos do desemprego, pela emigração de muitos portugueses. Passos e Portas, por seu lado, vão apontar para o aumento dos empregos criados, pelos impostos que muitos portugueses não pagam. Mas sobretudo apontarão os estudos que dizem que Portugal foi dos que mais políticas redistributivas aplicou nestes anos (o nome técnico é coeficiente de Gini, que diz que em 2013 houve clara recuperação neste campo). O PS terá outra resposta pronta: que foi o TC a proteger mais quem teve os cortes. E aí a discussão será mais política do que numérica.

As heranças. Duas

O tema inevitável de todas as campanhas (e de cada legislatura nos últimos 15 anos) terá desta vez argumentos cruzados – e um elemento imprevisto pelo meio. 

O PS usará de todos os argumentos para falar da herança de Passos. Aos seus olhos, um país mais pobre, não muito mais competitivo, com uma dívida mais alta que ainda não começou a descer. O PSD e o CDS farão o que têm feito até aqui: acusar os socialistas de quererem voltar ao passado e de não terem aprendido com as consequências das políticas de estímulos públicos à economia: “É muito importante proteger o que já conseguimos juntos, com grande esforço e sacrifício. Não queremos deitar tudo a perder”, vincou Passos na sua última intervenção do ano.

O elemento imprevisto foi a prisão de José Sócrates. Até ao final deste ano, a direita não se cansou de falar do ex-primeiro-ministro, usando-o como trunfo para fazer tremer o eleitorado do centro e da direita. Mas subitamente, falar de Sócrates passou a ser equivalente a falar da sua prisão e das suspeitas que o envolvem.

A tradicional separação entre justiça e política abriu um espaço em branco, que a direita tentará ultrapassar falando do mesmo sem falar do inominável. Para o PS, claro, a questão é a inversa: Costa apareceu exorcizando o fantasma, mas agora impôs o mais rigoroso silêncio sobre o tema Sócrates. A evolução do caso judicial terá, nisto, também uma influência decisiva nos dois discursos.

Começando os tabus: Reformar o Estado?

Em 2011, quando foi eleito, o Governo PSD/CDS fez do tema uma distintiva bandeira eleitoral: a despesa pública tinha que ser reduzida, o Estado tinha de se adequar às possibilidades do país, para deixar o setor privado crescer. Três anos e meio passados, a direita mantém argumentos (houve alguma compressão de despesa, algumas mudanças estruturais), mas perdeu espaço de manobra.

O célebre Guião da Reforma do Estado, que Paulo Portas apresentou em 2013, em raros pontos saiu do papel; no último orçamento, a ministra das Finanças admitiu que para reduzir mais a despesa seria preciso um amplo consenso político (que o PS até aqui recusou); e as principais medidas tomadas acabaram por ser transversais (cortes em salários e pensões) e chumbaram no TC.

Há poucas semanas, Passos Coelho admitiu que a pressão fez com que muitas vezes tivessem sido aplicadas “medidas cegas” para controlar as contas com maior rapidez. Agora, com a entrada no novo ano eleitoral, falta-lhe mostrar que conseguiu chegar a um porto. Mas sobretudo que conseguirá fazer diferente se for reeleito.

Quanto a António Costa, fala da reforma do Estado apenas na perspetiva de o “modernizar” e tornar “mais eficaz”. Resta-lhe também um desafio difícil: convencer os portugueses que não será preciso fazer mais, num contexto ainda muito difícil no que respeita ao equilíbrio das contas, ao tamanho do défice e às suas ambições de reduzir os sacrifícios dos portugueses.

Rever a Constituição?

Neste cenário, até onde irá a direita a pedir uma revisão constitucional, para que o próximo Governo possa fazer o que este não conseguiu? Em tempo de eleições, e quando os discursos se aproximam da “retoma” da economia e do “fim do período de excepcionalidade” (expressão do primeiro-ministro), parece improvável que PSD – e sobretudo os centristas – se aventurem por uma ideia que custou muita popularidade ao atual Executivo e que recupera uma ideia de Passos quando era líder da oposição.

Pelos socialistas, assim como pelos bloquistas e comunistas, já se sabe: não haverá mexidas na Constituição. Pelo menos na direção. Fora dela, António Vitorino já deixou no ar que o pior pesadelo de um futuro Governo socialista pode ser… O TC.

O tema cruza com um outro, de que Passos tem efetivamente falado desde o último chumbo do TC: a sustentabilidade das pensões futuras. Para os sociais-democratas alguma coisa terá mesmo de ser feita para que seja possível pagar as pensões no futuro. Costa disse na campanha das primárias que só admite mexer no sistema com efeitos para a frente – leia-se, sem prejudicar quem já está a receber. E defende que o principal problema no sistema foi introduzido pela recessão em que entrou o país. Talvez este tema, pelo menos, acabe no debate político da próxima campanha.

Que fazer a esta dívida?

Não será fácil a qualquer dos candidatos responder à pergunta. Não para Passos, que até aqui se pode ‘orgulhar’ ‘apenas’ de estabilizar a sua curva nos 130% (120% sem contar com as reservas acumuladas no Tesouro); Não para Costa, que tentou não comprometer o partido com as posições mais frontais que lhe reclamavam uma exigência de renegociação perante Bruxelas.

De todo o modo, a dimensão da dívida pública portuguesa será um dos principais obstáculos à atuação do próximo Governo, assim como foi deste. E, pior, não vem sozinha: é preciso contar ainda com uma dívida privada altíssima, quer a das famílias, quer a das empresas. Tudo junto, torna o caminho da recuperação ainda mais penoso. E que soluções terão os partidos para a dívida das empresas? Uma incógnita para os próximos meses.

...e o resto de que vamos ouvir falar

A coligação será um dos temas do início do ano. Tudo indica que Passos Coelho e Paulo Portas se sentem à mesa a discutir o programa de um próximo Governo (e depois as listas com candidatos a deputados), com algumas linhas vermelhas traçadas (desta vez) por um e outro lado da barricada. O fim provável será, de todo o modo, a primeira coligação pré-eleitoral entre os dois partidos desde 1979. Com os altos e baixos destes anos, os dois líderes poderão pelo menos valer-se de um título: o da primeira coligação que foi até ao fim da legislatura.

Depois, mais à frente, vamos ouvir falar muito de outras coligações possíveis, as de que o PS pode precisar para formar um Governo estável se vencer as legislativas sem maioria absoluta. Costa já deixou claro, no final do congresso do partido, que prefere a rotatividade ao Bloco Central, mas sabe também que à esquerda só o novo, recente e imprevisível Livre (de Rui Tavares) estará disponível. Neste jogo ainda há Rui Rio, mas a eventualidade de Passos perder e Rio se candidatar ao PSD levará sempre alguns meses a concretizar-se, até que os dois se possam sentar a negociar um Governo. Muito tempo para um Governo sob pressão para construir o seu primeiro orçamento.

E as presidenciais também se metem no caminho. Rui Rio é um dos que, à direita, ainda não fugiram ao desafio. A par de Marcelo e Santana. Qualquer que seja o candidato à direita, deve esperar uma decisão do principal candidato à esquerda: Guterres quer ir para o Palácio de Belém ou tenta rumar à liderança da ONU? E sem ele, quem escolhe o PS?

Nessa frente de batalha, contará ainda a célebre expressão de Sá Carneiro: “Um Governo, uma maioria, um Presidente”; ou a de Soares, que recomendava aos portugueses “não meter os ovos todos na mesma cesta”. Depois destes primeiros anos onde os poderes estiveram alinhados, qual das duas opções escolherão os portugueses?

Teremos ainda uma mudança história na Madeira, com a saída de Alberto João Jardim do poder – ainda não se sabendo que consequências isso terá nas eleições regionais antecipadas que já são quase certas. E, por fim, teremos uma história a seguir na Grécia. Sim, na Grécia, que se encaminha para novas eleições, com o Syriza na frente das sondagens e um programa cautelar a caminho. Um teste a tempo, provavelmente, das legislativas em Portugal.

 

 

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