Alberto João Jardim recebe o Observador no último dia de campanha na Madeira na casa que era da sua mãe e onde é o seu gabinete, na rua do Quebra-Costas, antes de ir para uma ação em câmara de Lobos. Desta vez não o convencem a aparecer ao lado de Miguel Albuquerque e, menos ainda, de Luís Montenegro, que considera que não devia ter ido à campanha na Madeira. “Não se devia ter aberto essa exceção”, atira. E ainda acrescenta: “Não vai acrescentar nenhum voto”.
Não deixa desperdiça a oportunidade para atacar Pedro Passos Coelho, ao ponto de dizer que António Costa, a quem chama de “esperto”, é “de caras melhor primeiro-ministro do que foi Passos Coelho“. Se um dia o antigo primeiro-ministro quiser voltar à liderança do PSD, não tem dúvidas: “Obviamente que sou oposição a isso”.
Numa entrevista a que chama a Portugal continental “Marrocos de Cima“, Alberto João Jardim diz que Marcelo Rebelo de Sousa já se “devia ir embora“. Quanto ao caso do “decote”, diz que foi “dos momentos mais felizes” do atual Presidente da República. Ataca os “woke” e defende Rubiales no caso do beijo.
“Montenegro não devia ter vindo. Ninguém o conhece”
Estamos com o antigo presidente do Governo Regional…
Permita-me que interrompa. “Ex-presidente”. Antigo dá a impressão que sou uma peça de museu...
Estamos com o ex-presidente do Governo Regional. Fica feita a correção. Há quatro anos esteve com Miguel Albuquerque na Praça do Povo. Na quinta-feira não esteve. Houve alguma razão?
Não. As circunstâncias são diferentes. Há quatro anos as coisas estavam mais tremidas. Era preciso dar um claro sinal de unidade. Hoje, toda a gente sabe que o partido está fortemente unido. Cada um vai para o seu trabalho, mas é preciso ver que a estrela, neste momento, é Miguel Albuquerque. É ele quem tem de ganhar as eleições. Não tenho nada que aparecer. Está tudo bem assim.
Não se vai juntar à última arruada?
Vou para Câmara de Lobos. Mas devo dizer: mesmo que estivesse no Funchal, não iria.
Por alguma razão?
Sempre defendi que as eleições regionais são com os líderes regionais. Nunca veio ninguém do continente às eleições regionais. E tenho dois motivos para estar aborrecido: primeiro, porque é que se abriu esta exceção? Houve líderes nacionais que chegaram a dizer [que vinham] e eu disse: ‘Não, não. Tenha paciência, é um princípio de autonomia’. Até porque se alguns líderes nacionais tivessem vindo, tinha perdido votos. Depois, tenho de estar magoado com a vergonha que é para as autonomias o projeto de revisão constitucional do PSD — tal como os outros projetos. O PSD embarcou no mesmo síndrome colonial dos outros partidos.
Está aborrecido com a vinda de Luís Montenegro à Madeira, portanto.
Não estou, nem deixo de estar aborrecido. Não se devia ter aberto esta exceção. Não era preciso.
Prejudica o PSD-Madeira?
Não vai acrescentar mais nenhum voto. Isso garanto-lhe.
E pode perder?
Não. A maior parte da população da Madeira não conhece Luís Montenegro. Adiante.
Diz que já fez campanha em vários sítios, mas não aparece ao lado de Miguel Albuquerque para não lhe ofuscar a popularidade.
Não é ofuscar. Não sou nenhuma estrela para ofuscar os outros. As eleições têm de estar centradas nele.
Preferia que em vez de Miguel Albuquerque estivesse já Pedro Calado a ser o candidato do PSD?
É uma pergunta absurda. O líder é o Miguel Albuquerque. Está muito mais bem consolidado do que há quatro anos. Hoje, já não se põe a questão da liderança.
Calado pode esperar.
Pode esperar e é um bom sucessor. Os senhores [jornalistas] têm sempre a mania de irem muito depressa. Vejo pelas eleições presidenciais: todos os dias aparecem novos candidatos.
Circulou um vídeo em que estavam a passar um papel a Miguel Albuquerque e surgiram boatos [sobre consumo de droga]. Como é que leu isso?
É uma sacanice que estão a fazer a Miguel Albuquerque. Quantas e quantas vezes estava no meio de inaugurações e havia um senhor ou uma senhora que vinham com um papelinho para não me esquecer disto e daquilo? É tradicional na Madeira. Não tem nada de especial. É uma oposição sem imaginação. Aqui na Madeira é um tipo de coisas que não pega. Vocês lá do politicamente correto de Marrocos de cima ligam a essas coisas. Nós não.
“Se Montenegro não ganhar as Europeias tem de se demitir. Evidentemente”
Há dois anos, a propósito do 10 de Junho, quando o entrevistámos pela última vez, perguntámos sobre Montenegro e respondeu assim: “Desculpe, mas não sou da maçonaria”. Já mudou de opinião?
Mudei. Ouvi diretamente da boca dele que já não tinha a ver com isso e não tenho razões para duvidar. Estou descansado.
E acha que vai chegar a primeiro-ministro?
Ainda há dias dizia a um colega vosso jornalista o seguinte: o PSD foi um sucesso com Sá Carneiro, com Balsemão, Cavaco Silva e também com o Durão Barroso porquê? Porque o PSD era um partido popular, de massas, tinha um discurso para o povo e para os problemas concretos. Desde que [Fernando] Nogueira tomou conta do partido e, sobretudo, com a liderança de Pedro Passos Coelho, o PSD foi-se tornando um partido de média e alta burguesia. Não vejo o povo nas coisas. E depois o discurso é politicamente correto. Por exemplo: o Chega é uma criação do Costa para andar a perturbar os que não são socialistas e para atrapalhar o PSD; quando Montenegro tomou posse, disse-lhe pessoalmente: “Você não se ponha a dar trela quando falarem do Chega. Diga só que é um problema do Costa. Ele é o que criou”. Agora, Montenegro não se pode abster numa censura contra este Governo caótico só porque vem do Chega; é tudo uma tontice.
Devia ter votado a favor?
Tinha de votar a favor, explicando porquê e desmarcando-se daqueles senhores. Ainda há dias, no Porto Santo, disse ao Montenegro: “Você tem que ter um estilo assertivo, agressivo, do Ventura. Não pode é dizer as mesmas asneiras”. E eles andam ali no politicamente correto. Olhem para a Festa do Pontal e outras manifestações. Onde está o povo? Estão ali os meninos queques e os gajos bem vestidos que tiraram a gravata para fingir. O PSD precisa de reorganizar as massas. Precisa de ter os melhores quadros em todos os distritos.
Consegue dizer três deputados do PSD?
Eu tive uma equipa de ouro: Guilherme Silva, o Correia de Jesus e o Veloso.
Mas sem ser da Madeira. Miranda Sarmento tem estofo para líder parlamentar?
Miranda Sarmento é um tipo politicamente válido. É um belo cérebro e dará um belo ministro das Finanças. Mas não é um líder da bancada parlamentar. É preciso outro estilo. Está mal empregue. Devia ser mais utilizado para desmontar todas as asneiradas socialistas. Mas não é em debates parlamentares.
Se o PSD não ganhar as eleições europeias, Montenegro tem de ir à vida dele?
Evidentemente.
Tem de se demitir?
Tem de se demitir.
“Era lamentável se o PSD tivesse um candidato como Rui Moreira”
Ainda sobre europeias. Está a ver alguém que seria um bom cabeça de lista?
Não sou o serviço regional de emprego para andar à procura de candidatos.
Rui Moreira?
Qual Moreira?
O Rui Moreira, o do Porto.
Que eu saiba, não é do PSD. Nem sequer gosta daquela estátua giríssima do Camilo Castelo Branco com uma rapariga tão bonita, como é que vai pôr o gajo a candidato? Não goze.
Era um gozo ter Rui Moreira como candidato do PSD?
Era lamentável porque dava a impressão que o PSD não tinha ninguém para ser cabeça de lista.
Poiares Maduro, Aguiar Branco… Poderiam ser?
Não entro nessas especulações. O que quero é que o PSD volte a ser um partido de massas, que não seja politicamente correto, que não esteja feito com Costa para contrariar a regionalização.
Falávamos da hipótese de o PSD não ganhar as europeias…
Se o PSD ganhar as europeias, é um excelente passo de consolidação de Montenegro para se começar a ser primeiro-ministro de Portugal. Mas tem de passar o teste das europeias. Não vale a pena insistirem.
Mas e se perder?
E não caiam nas tontices que Rui Rio caiu: basta falar no Chega e parece que o PSD treme todo. O PSD não tem nada a ver com o Chega. Só tem de dizer que o Chega é uma criação do senhor António Costa para perturbar o setor não socialista.
“Costa é de caras melhor primeiro-ministro do que Passos Coelho”
Se Luís Montenegro perder e sair, não vem Pedro Passos Coelho?
Quem?
Passos Coelho.
Passos Coelho?
Há um movimento no PSD em que se defende que pode estar na reserva se as europeias correrem mal a Montenegro.
É a primeira vez que ouço isso. Mas se puserem lá Passos Coelho, obviamente que sou oposição a isso. Esse homem traiu a Madeira e traiu-me a mim.
Acha que o PSD tem quadros de futuro?
Deus me livre se não tivesse. O problema do PSD foi os que entraram lá a ver o que pingaram de tacho. Mas tem gente boa.
Gosta de Carlos Moedas?
Gosto muito dele.
Tinha estofo?
Deixem o Carlos Moedas quieto. Está trabalhando bem. Não metam o Carlos Moedas nas lengalengas e nas histórias de comadres da formosa estrebaria.
Há dois anos, disse-nos que Pedro Passos Coelho foi o pior primeiro-ministro de Portugal.
E foi. Não se recupera disso.
António Costa foi melhor do que ele?
Sim! De caras. Costa é melhor primeiro-ministro e mais esperto do que ele. Passos Coelho fez uma coisa única: recupera-se uma economia tirando moeda de circulação. Se um aluno de economia política disser isso num exame, chumba. Recupera-se economia pondo moeda em circulação com as devidas cautelas para não provocar inflação. Fez tudo ao contrário. Costa, que não é um homem de Estado mas é um homem esperto, quando viu o que Passos Coelho fez ao país, um autêntico genocídio social, a primeira coisa que fez foi pôr moeda em circulação.
Costa aguenta-se até 2026 ou vai para a Europa?
Isto está muito mau. Não sei o que vai suceder. Nunca tivemos um PS tão à esquerda. Temos um PS que têm uma série de tipos que gostam de ter cargos do Estado, mas qual é a ideologia do PS? Mário Soares era mais social-democrata do que socialista. Mário Soares deve dar três pulos quando vê a atual política do PS ter como a ideologia do Bloco de Esquerda. Eles [PS] não têm nada na cabeça. A ideologia do PS e naquela instituição que se diz trabalhar para o PS, o ISCTE. O PS está condenado a espalhar-se. Não tem a prática do Bloco de Esquerda, mas tem a ideologia do Bloco de Esquerda. Mas são mais simpáticos do que a Mortágua. A Mortágua assusta e incomoda qualquer homem normal — agora vão dizer que isto é machismo; o outro que deu um beijo à espanhola é machista…
“Agora é a minha vez de dizer: ‘Marcelo já se devia ter ido embora’”
Isto de não demitir o Galamba e de ficar em silêncio no Conselho de Estado foi António Costa a humilhar Marcelo Rebelo de Sousa?
Quando vejo uma capoeira e vejo os galos e as galinhas a brigar, não me meto e ponho-me a observar, gozando. É a única coisa que eu tenho a dizer sobre a sua pergunta.
Balsemão dizia que o Marcelo era o escorpião que picava a rã. Acha que ainda vai dar a picada?
Isso são guerras deles. São guerras da formosa estrebaria.
Mas acha que Marcelo Rebelo de Sousa ainda arranjará uma forma de se vingar de António Costa?
Queria era que eles fossem todos embora mais cedo.
Inclusivamente o Marcelo?
Todos mais cedo. Marcelo com mais razão. Eu estive 37 e tal anos no governo. Nos últimos meus anos de governo, Marcelo ia para a SIC dizer que já me devia ter ido embora. Agora é a minha vez de dizer que ele também já se devia ter ido embora.
Mas não está a gostar do segundo mandato dele?
Mesmo que queira disfarçar, ele não endireita.
Disse-nos há dois anos que ele gostava de andar com o Costa ao colo. Acha que ainda gosta?
Ele agora já tem um carrinho de bebé, para não lhe pesar tanto.
Há pouco estava a falar de um assunto das tais historietas da estrebaria que não gosta de falar…
Não digam estrebaria só. Formosa estrebaria, que eu gosto muito de Lisboa.
Aquela declaração do Marcelo, que chamou, entre aspas, gorda a uma senhora e depois comentou um decote… Isso não o choca?
A mim não choca nada. É dos momentos felizes de Marcelo. Se olhar para uns peitinhos bem feitos de uma senhora bonita, eu sou não sei o quê; mas se uma lésbica dá um beijo noutra em plena rua, está tudo muito certo. Isto é o movimento woke a ganhar pernas em Portugal e não estou para aturar patetas.
Há pouco estava a falar das presidenciais e dizia que, em Lisboa, nós gostamos muito de pôr a carroça à frente dos bois…
Pois. Não vão longe…
Marques Mendes e Paulo Portas, nomes à direita…
Não comento nomes nenhuns.
Nem o vice-almirante, que veio aqui tratar do barco…?
Isso faz parte tudo da liturgia política portuguesa, que faz de Portugal um país pouco civilizado.
Mas não acha que Mendes…
Não acho nada. Estamos tanto tempo a falar disto e daquilo. Tudo se esgota, não embarco nisso.
Vamos falar da Madeira. Miguel Albuquerque fez bem em dizer que se demitia se não tivesse maioria?
Se é essa a posição dele, acho muito bem. Eu também tinha essa posição.
E se ele ficar com 23 e a Iniciativa Liberal tiver 1, não devia tentar negociar com eles? Não é o Chega.
Isso deixo à consciência do Miguel. O problema aqui na Madeira é que os senhores que estão hoje à frente da IL, um foi secretário-geral do PS-Madeira, o outro também foi do PS-Madeira. Outros andaram na UDP, no PS, no CDS.
O Morna era do CDS.
O Morna foi primeiro um aguerrido, nos tempos revolucionários. Um aguerrido militante de extrema-esquerda. Depois acho que já andou no PS. No PSD ele não entrou, que não deixei.
Tentou?
Não sei se tentou. Falaram-me uma vez e disse: “Nem pensar.”
Mas não era tão grave fazer uma coligação com a IL do que com o Chega?
Não. Isso não era tão grave. Mas eu não estou a ver o Morna metido num governo do PSD. É deprimente para a coligação. Desculpem, nem sequer ponho essa hipótese pelo seguinte: primeiro, se fosse só uma sondagem a dizer que o PSD ia ter um bom resultado, muito bem; mas é um conjunto de sondagens, algumas das empresas de sondagens têm provas dadas no país, de maneira que…
Mas o Albuquerque está com medo que as pessoas não vão votar…
Esse é o risco e estamos todos a fazer um esforço. O que ando esta semana a fazer por toda a ilha é mandar as pessoas irem votar. Não é mandar, é pedir, porque o madeirense gosta muito de festas e é muito expansivo, mas se der uma chuvinha “isto já está ganho, para que é que hei-de levar uma molha”. De maneira que cuidado com as sondagens. Olhe, no meu tempo tinha sondagens de 60 e muito por cento e depois era 50 e tal por cento.
Mas já tem os autocarros para ir buscar as pessoas?
Quais autocarros?
Não costumam fazer isso?
Costumava pôr os carros, mas iam buscar as pessoas a sítios que ainda tinham dificuldade. Traziam pessoas de idade que têm tanto direito de votar como os outros e ninguém lhes em quem votar. É uma hipocrisia estar a atacar esses métodos. O que interessa é pôr as pessoas a votar.
Mas deviam fazer isso agora para todos, não é?
Mas é para todos. O carro que vai buscar gente é ao sítio tal e tanto vem no carro o que vota PS ou que vota UDP – que acho que já não existe.
Agora é o Bloco de Esquerda.
Se aquilo é de esquerda, eu sou anarquista. A oposição na Madeira peca pela falta de inteligência. Ao fim de 50 anos não perceberam que, numa terra que é autónoma, não se pode ser contra a autonomia e ser o eco de Lisboa. Estes gajos não são inteligentes.
Como é que explica este crescimento do Chega?
Não é nenhum crescimento do Chega. São as bases do CDS, que nunca foram democratas-cristãs. Quando houve um partido mais à direita ainda que o CDS foram para o Chega. Isto não tem ciência nenhuma, o Chega tem a hipótese de meter dois deputados ou três deputados. É o que o CDS metia no meu tempo. O CDS acabou. Hoje, há o Chega e as pessoas mais à direita vão para o Chega. Não se pode continuar um CDS que só tem quadros e alguns deles muitos bons, mas não tem bases, é impossível continuar um partido assim. O PSD tem uns estatutos onde está previsto o direito de tendência. Só podemos reforçar o centro e o centro-direita se fizermos um grande partido com o CDS, com o PSD e com aqueles que não estão na política. Fazer um grande partido que trave todas as organizações socialistas. Essa malta, os quadros bons que hoje o CDS tem, deveriam estabelecer-se como tendência democrata-cristã, ou chamem-lhe o nome que quiserem, dentro do PSD.
Portanto, o CDS devia ser absorvido pelo PSD?
Absorvido é uma palavra feia. Integrado.
Mas muitos não fugiram já para a IL?
Se eles foram para a IL e se julgam liberais, então não são democratas-cristãos. As insígnias da Santa Madre Igreja condenam o liberalismo, tal como condenam o comunismo.
“Aprecio a IL a nível nacional”
Disse há pouco que o PSD devia ter votado a moção de censura do Chega a favor. A IL votou a favor.
Votou e fez muito bem.
Mas gosta das atitudes da IL a nível nacional?
Aprecio a IL a nível nacional. Aqui, começou bem, com bons quadros, e de repente aparecem estes transfegas de outros partidos e pessoas sem crédito social no nosso meio.
Rui Rocha está a conseguir aguentar a parada que João Cotrim Figueiredo deixou?
Isso não tenho seguido. O que me parece é que tanto Cotrim como Rocha não perceberam bem o que é que se está passando no Funchal.
Há pouco estava a criticar Mariana Mortágua. Acha que é pior líder que a Catarina Martins?
Costumo ir buscar histórias de miúdos aos quadradinhos para definir as duas. A Catarina era a boneca má dos filmes de terror; a Mortágua parece mais a Maga Patalójika dos desenhos do Walt Disney.
“O Sérgio Gonçalves é do PSD”
Porque é que acha que Paulo Cafôfo não se recandidatou desta vez, já que esteve tão perto há quatro anos?
Paulo Cafôfo é bom homem, como o Sérgio é bom homem, tenho consideração pelos dois. Se querem ganhar ao PSD têm que ser autonomistas, deixem-se de conversas. Estão muito amarrados ao que as bases querem e não querem, quando na Madeira o PS é um albergue espanhol. E há ali dentro uma luta de classes: há aqueles tipos que são radicais só que não são comunistas, porque têm vergonha de ser comunistas; e depois há ali uma elite da alta burguesia, a chamada esquerda-caviar, que são uns gajos muito finos, que nem se misturam com os outros, que dizem mal dos outros e que se calhar nem votam socialista, mas estão lá dentro porque é fino parecer que é de esquerda em certos meios.
Disse uma vez que das 4 mil e tal obras que inaugurou, houve uma que correu mal, que era a Marina do Lugar de Baixo. Qual é que correu mal ao Miguel Albuquerque? Ele diz que não se lembra de nenhuma.
Tem corrido tudo bem. Não vejo nada também nada que lhe tenha corrido mal. Miguel Albuquerque é um homem de sorte, não tem comunicação social contra, teve mais dinheiro que eu tive, tem sorte na vida. Eu tive mais dificuldades na política.
Também esteve mais anos.
Estive mais anos e tive melhores resultados. O melhor resultado do Miguel Albuquerque está abaixo do meu pior resultado. Mas agora ele vai ter um bom, estou convencido.
Estava a falar do Sérgio Gonçalves. Conhece-o?
Costumo brincar, e ele fica louco se eu disser isto, mas acho que o Sérgio Gonçalves é do PSD. É o drama do Sérgio Gonçalves, que é ideologicamente PSD, foi ver-se a liderar um PS, que ainda por cima na Madeira, que é um albergue espanhol.
A Madeira tem turismo a mais, como diz a esquerda?
Deixe-me mastigar bem o que vou dizer. Tenho receio de que se entre em depressão económica quando se diz a partir de agora não se faz mais isto e não se faz mais aquilo. A economia tem de manter a sua dinâmica. Mas o que só autorizaria hotéis de quatro e cinco estrelas. Esta enchente de…
Alojamento Local.
Alojamento local já não me apanhou. Não tenho nada contra Alojamento Local. O Turismo deve ser para gerar empregos, para dinamizar a economia e para criar bem-estar à população. Ora, se o turismo for de um tipo de cliente que vai ao supermercado, tal como vai o residente, comprar coisas, este tipo não está a criar uma mais valia na economia. Pode até estar a pressionar a contribuir para a inflação. Há técnicas para ir controlando o fluxo turístico sem ser necessário planos rígidos e normas rígidas e eu tenho horror à economia planificada.
E a questão da droga, do Bloom. Como é que se trava?
De certeza que não é com as leis socialistas que se vai travar a droga. De certeza que não é com o sistema judicial que temos em Portugal, que permite que os tipos sejam apanhados e continuem a andar aqui à solta. Tenho pena da PSP, que apanha delinquentes e os leva a tribunal. A culpa não é dos juízes também. A culpa é dos legisladores, que estão a dizer “patachadas” lá para a Assembleia da República, mas que não fazem leis como deve ser. Temos a ideologia relativista. Deixou-se de lutar por causas e passou-se a lutar por interesses pessoais e, por outro lado, estão a perder-se as referências – é o movimento woke e o politicamente correto, o relativismo e o pós-modernismo, e é tudo uma asneirada pegada. Se a gente não subscreve publicamente essas asneiradas, somos logo racistas ou somos reacionários ou somos sexistas.
Miguel Albuquerque estava a dizer que um dia falou com o Felipe González que lhe disse que os ex-presidentes eram como os jarrões chineses, que eram muito bonitos, mas que ninguém sabia o que fazer com eles. E que, portanto, ele não sabia o que ia fazer depois de ser Presidente do Governo Regional. Está contente com esta vida que tem tido?
Eu já sabia o que ia fazer. Saí quando me apeteceu e quando entendi, optei pela vida que hoje faço, olho com muita felicidade para trás. Adorei ser presidente do governo, mas também adorei saber sair e agora adoro a vida que faço hoje. Ainda hoje nadei, ainda hoje andei uma hora.
Não lhe digo que está em forma, porque não lhe posso dizer isso…
Não me pode dizer isso porque não dorme comigo… Adiante.
A última questão tem a ver com a autonomia, porque sabemos que é uma questão que lhe é muito cara. Até onde é que a autonomia deve ir?
A questão não é cara nem deixa de ser cara. A questão é um direito natural do povo madeirense. E sendo um direito natural do povo madeirense, não admito, e um verdadeiro autonomista não admite, que um Estado reacionário como é o Estado português, amarrado à sua cultura colonialista, esteja sempre com desconfianças, esteja sempre a passar-nos rasteiras e que vá dando dinheiro de graça às antigas colónias.
Não teme que exista uma descaracterização do madeirense tipo com a imigração? E que deixe de existir uma cultura madeirense?
A cultura madeirense é demasiado sólida. É uma cultura de seis séculos e é demasiado sólida para se perder. Pelo contrário. A há 200 e tal anos que se faz turismo da Madeira. Como qualquer cultura de qualquer parte do mundo, a cultura madeirense recebeu também contributos de outras culturas, muitas estrangeiras.
Principalmente a inglesa?
Principalmente a inglesa. Hoje os ingleses não contam aqui, têm bons grupos, é verdade, muitos já não têm, outros passaram a ser madeirenses.