Insiste que o PSD nunca abdicará dos seus “valores e princípios”, nega qualquer tipo de ambiguidade, mas continua sem dar uma resposta cabal sobre alianças com o Chega. Sublinha que a vitória nas europeias é um objetivo mínimo, mas não se compromete com o futuro de Luís Montenegro caso o partido perca essa corrida às urnas. Critica António Costa e reitera o que o líder social-democrata já tinha dito: se nada mudar, o PSD vai exigir a Marcelo Rebelo de Sousa que convoque eleições antecipadas.
Em entrevista ao Observador, no programa Vichyssoise, Margarida Balseiro Lopes, atual vice-presidente social-democrata, defende que “há já muita gente que está arrependida de ter votado no PS” e que os portugueses saberão que o PSD é o único partido capaz de oferecer uma alternativa. Quando a questão se colocar, sugere, os sociais-democratas vão pedir a maioria. “O PSD já foi governo sozinho. É para aí que deve caminhar”, diz.
Quanto aos professores, dossiê que tem acompanhado de perto, a antiga líder da JSD, que esteve sempre desalinhada com Rui Rio, não se compromete com uma solução fechada, mas pressiona o Governo a reconsiderar a questão do tempo de carreira congelado dos professores. “É uma questão da mais elementar justiça social.”
[Ouça aqui a Vichyssoise com Margarida Balseiro Lopes]
“Não há ambiguidade em relação ao Chega”
No último fim de semana, decorreu a Convenção do Chega e André Ventura disse, com clareza, que só apoiará um governo do PSD se fizer parte desse mesmo governo. O PSD admite entregar pastas ministeriais ao Chega?
Queria fazer três comentários: não temos no horizonte próximo eleições legislativas, é uma questão extemporânea; em segundo lugar, o PSD está empenhado em ganhar a confiança das pessoas e em afirmar-se como alternativa ao PS; e, para contrariar a ideia de que há alguma ambiguidade relativamente àquelas que são as linhas vermelhas do PSD, Luís Montenegro já foi muito claro em dizer que nunca nos vamos associar a qualquer tipo de políticas racistas ou xenófobas, que não vamos claudicar naquilo que são os nossos princípios e valores. E disse mais: se o partido, como organização, aceitasse isso para chegar ao poder, que ele não seria líder do governo, nem líder do partido. É uma posição muito clara.
Dito isso, o PSD aceita ou não integrar um governo com o Chega?
Já dei a resposta a essa pergunta.
Se não há ambiguidade, parece.
Não há ambiguidade. Não há eleições no horizonte, nem sequer sabemos quais é que serão os resultados, nem as configurações que vão permitir. As nossas linhas vermelhas são claras: a nossa história, princípio e valores. Não falharemos.
Ninguém está a dizer para mudarem princípios e valores. Para o PSD, associar-se ao Chega é mudar valores e princípios?
Temos o nosso caminho alternativo. O PSD já foi governo, até foi governo sozinho. É para aí que deve caminhar. Mais: por muito que seja interessante do ponto de vista político, isto diz zero às pessoas, que estão a passar dificuldades brutais.
O PS teve maioria absoluta nas últimas eleições com o PSD com um discurso ambíguo sobre o Chega. Segundo alguns analistas, isso pode ter influenciado o voto dos eleitores. É assim uma coisa tão de somenos?
Há já muita gente que está arrependida de ter votado no PS porque está a ver qual é que foi o resultado.
Se André Ventura lançou um repto a Luís Montenegro, tornou-se necessariamente um assunto político. A nossa pergunta é: o PSD admite ou não integrar um governo com o Chega.
Já respondi a essa pergunta. Podem ensaiar a mesma forma de perguntar a mesma coisa de várias formas que a minha resposta não vai ser diferente.
Paulo Rangel já disse que nunca contará com o Chega. Miguel Pinto Luz já admitiu que as alianças são possíveis. A Margarida Balseiro Lopes é igualmente vice-presidente do PSD. Qual é a sua posição sobre possíveis alianças com André Ventura?
Mal seria que o PSD estivesse agora preocupado com esse tipo de aritmética, quando aquilo em que tem de estar concentrado é em ter uma alternativa, em ganhar as eleições, formar governo e oferecer um caminho diferente às pessoas.
Numa entrevista recente ao Observador, o eurodeputado José Manuel Fernandes foi cristalino: “O PSD não deve fazer nenhum acordo com o Chega”. Porque é que a direção nacional não consegue ser tão clara?
Já respondi a essa pergunta e a minha resposta não vai ser diferente. A preocupação do PSD tem de ser falar para as pessoas, ganhar a sua confiança, para poder formar governo. E já fomos capazes de formar governo sozinhos no passado e estou certa que também podemos fazê-lo no futuro.
“Montenegro assumirá as consequências do resultado das europeias”
Vamos falar em eleições europeias. Admite ser candidata em maio de 2024?
Não é uma questão que se coloque, é extemporâneo. A seu tempo, o PSD há-de apresentar os seus candidatos e o seu programa.
Há quem aposte em si para cabeça de lista.
Será uma boa oportunidade para mostrarmos que estamos a ser bem sucedidos nesse caminho.
Luís Montenegro está obrigado a vencer essas eleições?
O nosso objetivo, como é evidente, é ganhar as eleições. Ter mais votos que o PS.
Se perder, a liderança fica em risco?
Ainda no último Conselho Nacional, Luís Montenegro foi muito livre e desprendido: o nosso objetivo é ganhar e assumirá as consequências do resultado que vier a acontecer nessas eleições.
Basta ganhar em termos de percentagem de votos ou é preciso aumentar o número de eurodeputados em relação às últimas eleições?
O nosso objetivo é ter mais votos, ganhar as eleições. Se isso implicar um reforço do número de deputados ao Parlamento Europeu, tanto melhor.
Será muito difícil justificar a continuidade de um líder que sempre acusou Rui Rio de ter resultados eleitorais fracos.
Por isso é que respondi que o objetivo é ganhar as eleições. É esse o nosso caminho e meta.
Portanto, é um risco para a liderança de Montenegro se não tiver um bom resultado nas europeias.
Umas eleições nunca são um risco. É a democracia a funcionar.
Luís Montenegro não tem de fazer contas à vida nessa altura?
Será bom para o país se [na altura] já houver sinais de que as pessoas percecionam o PSD como um caminho de esperança e de futuro.
“É de elementar justiça considerar tempo de carreira dos professores”
No Parlamento, o PSD apresentou um projeto de resolução onde defende “um processo negocial com as organizações representantes dos docentes para que seja recuperado o tempo de serviço em falta”. Tem noção de quanto custaria?
O Governo veio dizer que seriam cerca de 300 milhões de euros. O que defendemos é que essa é uma matéria que deve estar na mesa das negociações. Depois os termos — se é faseado ou não, para efeitos de aposentação ou não — são uma competência do Governo. Foi para isso que foi eleito há um ano. Deve fazer opções.
Mas o valor para o PSD seria comportável?
O que achamos é que questão do tempo deve ser considerada.
Até quanto? Em que medida?
O Governo tem esses números, coisa que não temos. Seria irresponsável da nossa parte defendermos uma solução fechada. É uma questão que deve estar em cima da mesa e, neste momento, não está. Rigorosamente nada. Estamos muito preocupados com os impactos que isto tem para as crianças e jovens. Tivemos a pandemia, há três anos que a escola não está a funcionar como normalidade, tivemos aprendizagens que foram perdidas, que não estão a ser recuperadas, e isto socialmente é muito grave. Porque quem tem dinheiro encontrará sempre forma de compensar. Quem fica mais vulnerável são as crianças de contexto mais desfavorecidos.
O PSD tem solução para isso?
Este Governo está há sete anos em funções. Este ministro foi secretário de Estado. Porque é que só agora é que foram apresentadas medidas?
São medidas que vinham no último programa eleitoral do PS.
Mas isto acontece há anos e anos e não fizeram nada.
Numa recente entrevista, Luís Montenegro defendeu que que “era desejável recuperar o máximo tempo possível, dentro de um critério de equilíbrio da administração pública e, naturalmente, também das consequências financeiras”. Como é que isso se faz exatamente? O PSD não devia saber mais nesta altura do campeonato?
Não, não devia. A responsabilidade de governar é do Governo. A responsabilidade é deles. Porque é que só agora, com as escolas fechadas, greves e manifestações, é que vieram apresentar esta intenção de apresentar soluções? Começámos o ano letivo com mais de 60 mil alunos sem professores pelo menos a uma disciplina. Isto tem um impacto brutal no sistema educativo. Temos 47 mil professores que se vão aposentar até 2030, vamos precisar de 34 mil professores. O que é que o Governo está a pensar fazer sobre isso? Como é que os vais recrutar? Como é que vai tornar a carreira mais atrativa?
O PSD sabe como?
Por exemplo, não podemos exigir a um professor contratado, colocado em Lisboa e que vai ganhar 800 ou 1000 euros, que consiga fazer face às despesas brutais que vai encontrar.
Qual é a solução do PSD?
Há soluções, até em parceria com os municípios, de modo a encontrar respostas, contratualizando [ofertas de habitação]. Como aliás foi anunciado para os médicos há muito pouco tempo. Queremos que o Governo e os sindicatos cheguem a acordo, que as escolas estejam a funcionar com normalidade, que os alunos recuperam a aprendizagem.
E para isso deve ceder nesta questão a contagem do tempo congelado?
Devem encontrar uma solução equilibrada que garanta a sustentabilidade das contas públicas mas sobretudo que seja rápida, esta solução tem de ser rápida porque isto é insustentável para o sistema educativo.
A solução do Governo para garantir a sustentabilidade das contas públicas é a que está em cima da mesa. É o limite. O PSD acredita que se pode ir além disto?
Claro que sim.
Quantos anos, quantos meses e quantos dias a mais?
Já respondi a essa pergunta: há muitos dados que não temos e seria irresponsável da nossa parte dizer que esta deve ser a solução.
Mas que dados têm então para dizerem que se pode avançar em alguma medida?
Há uma questão de princípio que é: este tempo não deve ser deitado para o caixote do lixo. Acho que é um princípio da mais elementar justiça social. A nossa preocupação — e estamos solidários com algumas reivindicações dos professores — é que a solução seja rápida para que os alunos voltem a ter aulas, para que a escola possa funcionar com normalidade. Não é normal que os colégios privados já tenham as vagas esgotadas para o próximo ano letivo. Isto é o maior sinal de que a escola tem problemas graves. Não se está a pensar sequer no futuro destas crianças. Quem tem dinheiro arranjará sempre solução. O problema são as crianças de contextos sociais. Os mais desfavorecidos.
Uma das críticas feitas ao PSD é não apresentar uma alternativa concreta ao PS. Mas no caso do novo aeroporto, o PSD não tem uma resposta concreta, na TAP também não e agora no descongelamento pelos vistos também não. Não era de esperar que tivesse coisas concretas para dizer já nesta altura?
Relativamente à TAP não percebo qual a dúvida. O PSD privatizou a TAP. Muitas vezes o PS pergunta o que o PSD defendia, isso é de um profunda desonestidade intelectual. O PSD nunca tinha renacionalizado a companhia. Aquilo foi dinheiro que foi mal investido. Não havia razão nenhuma para a renacionalização. Em relação à alternativa, temos muitas outras matérias. Quando a inflação começou a provocar os primeiros impactos na vida das pessoas, foi o PSD que veio apresentar um programa de emergência social em agosto, depois o Governo reagiu a reboque. Isto é apresentar alternativas. Outro exemplo, no crédito à habitação: o Governo não fez nada, disse aos bancos para irem renegociar com os clientes e a outra medida foi alterar a retenção na fonte — que é um embuste, porque as pessoas o que não tiverem retido agora ou recebem menos reembolso ou vão ter de pagar mais. As propostas do PSD eram para mitigar [esse impatco], por exemplo, através do aumento da dedução das despesas com a habitação para os contratos celebrados depois de 2011.
“Montenegro não vai fazer números no Parlamento”
Durante o debate sobre a moção de censura, a direção do PSD defendeu a abstenção porque o país não podia ir a votos. Dias depois, Luís Montenegro veio ameaçar ir a Belém pedir eleições se nada mudar. Isto não é uma contradição?
Antes pelo contrário. O que o PSD disse foi que o Governo ainda não tinha feito um ano e as pessoas não queriam eleições. O que Montenegro disse foi que, no dia em que o PSD achar que o Governo não tem condições políticas, não vai fazer números no Parlamento a apresentar moções — que não vão ter sucesso tendo em conta a maioria absoluta. Vai a Belém dizer que quer eleições.
André Coelho Lima e Carlos Eduardo Reis, dois homens importantes da era de Rui Rio, chamaram-lhe um sinal de tibieza.
Fui deputada e nem sempre me revi em posições do grupo parlamentar ou da liderança, faz parte. O PSD é um partido livre.
Há pouco falou na necessidade de dar tempo ao Governo. O PSD tem algum prazo na cabeça? Quer ir a votos depois das europeias?
À partida as eleições serão depois de 2026.
Mas se houver falta de condições podem ser antes. Qual o limite para a falta de condições?
O limite é o Governo estar esgotado. Não passou nem um ano nem da entrada em funções deste Governo. Será no momento em que o PSD achar que é altura de chamar as pessoas a pronunciarem-se novamente sobre aquele que é o futuro e o destino do país.
Passamos agora para a fase do Carne ou Peixe, onde só pode escolher uma de duas opções. Preferia ir jantar fora com Rui Rio ou António Costa?
Com Rui Rio. Qual é a dúvida?
Preferia deixar a sua cadela, a Jota, ao cuidado de André Ventura ou Catarina Martins?
Está com os meus pais neste momento e está muito bem.
Gosta muito dos Açores. Só podia escolher um companheiro de viagem. Levava Luís Marques Mendes ou Pedro Passos Coelho?
Não é fácil, sou amiga e gosto muito dos dois. Portanto, não consigo escolher. Gosto mesmo muito dos dois.
Pode ter de vir a escolher quando se colocar a questão das presidenciais.
Nesse aspecto posso já dizer que não tenho dúvidas nenhumas: qualquer um deles será uma opção muito melhor do que Santos Silva.