910kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

Grubb's Pharmacy
i

As vacinas da Johnson & Johnson foram suspensas por precaução nos Estados Unidos e a empresa adiou a entrega na Europa

Tom Williams/CQ-Roll Call, Inc via Getty Imag

As vacinas da Johnson & Johnson foram suspensas por precaução nos Estados Unidos e a empresa adiou a entrega na Europa

Tom Williams/CQ-Roll Call, Inc via Getty Imag

Coágulos. A reação às vacinas já tem nome (chama-se VIPIT) e é menos provável do que ser atingido por um raio

A síndrome extremamente rara pode resultar de uma resposta imunitária que os cientistas não conseguiram explicar porque acontece. EUA suspenderam para já a vacina da J&J e na Europa o uso foi adiado.

    Índice

    Índice

VIPIT. Os efeitos adversos graves desencadeados num número limitado de pessoas depois de terem recebido a vacina da AstraZeneca ou da Johnson & Johnson já têm nome. Pode ser VIPIT, conforme designação usada pelas Nações Unidas ou VITT, na versão de quem descreveu a síndrome. O nome é complexo — trombocitopenia imune protrombótica induzida por vacina —, mas tem uma explicação mais simples: a reação é semelhante aos efeitos secundários descritos para um medicamento, mas tem particularidades que só se verificaram nas pessoas vacinadas contra a Covid-19.

Esta formação de coágulos sanguíneos que pode, eventualmente, levar à morte, fez com que a vacina da AstraZeneca passasse a ser olhada com receio e levou a que muitas pessoas a rejeitassem tomar. Na terça-feira, ficou claro que este efeito secundário grave (mas raro) não era exclusivo da vacina da farmacêutica anglo-sueca — a da Johnson & Johnson também provocou reações idênticas e foi suspensa nos EUA e em vários países europeus — e ficou no ar a possibilidade de que outras vacinas, que usam a mesma tecnologia — como a Sputnik V —, pudessem vir a desencadear o mesmo tipo de reações adversas.

“Embora seja muito cedo para tirar conclusões sólidas, o desenvolvimento [desta síndrome] levanta a possibilidade de que, pelo menos, alguns vetores de adenovírus, sozinhos ou em combinação com o gene da proteína spike do SARS-CoV-2, possam causar esta reação idiossincrática numa proporção muito pequena de indivíduos.”
Adam Finn, professor de Pediatria na Universidade de Bristol

Esta conjugação de coágulos e baixas plaquetas não é um fenómeno desconhecido, mas ainda não foi possível explicar porque acontece nestes casos. Nem sequer se pode confirmar porque é que, não tendo sido identificado um risco associado à idade ou sexo, foram registados mais casos entre mulheres jovens. Os benefícios superam os riscos, dizem as farmacêuticas, mas não da mesma maneira nem para todas as idades. Estes são alguns dos aspetos em investigação pelas autoridades de saúde que prometem mais informações para breve.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Quão frequente é a ocorrência de VIPIT após vacinação?

A Agência Europeia do Medicamento (EMA), a FDA (regulador americano do medicamento) e os Centros de Controlo e Prevenção da Doença vão continuar a investigar os casos reportados, mas mantêm que os benefícios da vacinação na prevenção da morte por Covid-19 (ou desenvolvimento de doença grave) superam os riscos de vir a sofrer efeitos secundários graves, extremamente raros, na sequência da vacinação. Isto, porque há muito mais doses administradas do que casos de efeitos adversos desta natureza reportados.

Quais os efeitos secundários? Há contraindicações? E se correr mal? 25 perguntas e respostas sobre a vacina contra a Covid-19

“É preciso destacar que tudo indica que estes eventos são incrivelmente raros. No caso da vacina da J&J a hipótese é de um num milhão [seis casos em 6,8 milhões de doses dadas], com base no que sabemos até o momento. Para colocar isto em perspetiva: é semelhante à hipótese de ser atingido por um raio, num determinado ano, no Reino Unido”, disse Ian Douglas, professor de Farmacoepidemiologia da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres.

Na Europa há, pelo menos, 222 casos suspeitos, mas mais de 34 milhões de doses da AstraZeneca dadas — seria mais provável ganhar a lotaria de Natal espanhola do que vir a sofrer estes efeitos secundários depois de vacinado, ilustrou o jornal El Español.

AstraZeneca. Que impacto terá a limitação por idades? E porque se escolheram os 60 anos?

Ainda assim, a relação risco-benefício varia consoante as idades e o nível de risco de infeção a que as pessoas estão expostas e deve ser avaliada no contexto de cada país. Por exemplo, o risco de VIPIT nas pessoas com mais de 80 anos é mais baixo e é dentro deste grupo que se regista a maior mortalidade, logo o benefício é muito superior ao risco. No caso de adultos em idade ativa, por exemplo entre os 40 e os 60 anos, se o risco de exposição ao vírus for muito alto, os benefícios dados pela vacina também superam os riscos de efeitos secundários.

Abaixo dos 30 anos, mesmo em situações de elevada probabilidade de contágio, os benefícios são mais limitados, segundo os gráficos do Centro Winton de Comunicação de Risco e Evidência da Universidade de Cambridge. Foi precisamente abaixo desta idade que o Reino Unido abriu a possibilidade de as pessoas pedirem para ser vacinadas com outra vacina que não a da AstraZeneca.

3 fotos

Em que situações se pode verificar a ocorrência de coágulos sanguíneos ao mesmo tempo que um baixo número de plaquetas?

A primeira reação dos médicos perante estes dois eventos juntos, em pessoas vacinadas, foi de surpresa. As plaquetas ajudam na formação de coágulos sanguíneos, por isso um número baixo de plaquetas leva, normalmente, a sangramento, não a coagulação, como explicou à Science Magazine Sabine Eichinger, a hematologista da Universidade Médica de Viena que avaliou o primeiro caso, a 27 de fevereiro.

No caso de uma infeção grave ou cancro podem formar-se tantos coágulos que esgotam a reserva de plaquetas, mas não era a situação daquela mulher de 49 anos, até então considerada saudável — nem tem sido referido para outros doentes que desenvolveram VIPIT.

A combinação dos dois sintomas — formação generalizada de coágulos e baixos níveis de plaquetas, às vezes com hemorragia — é muito rara, mas apresenta semelhanças com um dos efeitos secundários do uso da heparina, conforme descrito pela equipa de Sabine Eichinger e Andreas Greinacher, investigador no Instituto de Imunologia e Medicina Transfusional da Universidade de Greifswald (Alemanha), num artigo publicado na revista científica The New England Journal of Medicine. A questão aqui é que nenhum dos doentes estudados tinha tomado heparina antes de desenvolver os sintomas, mas todos tinham sido vacinados contra a Covid-19 nas duas semanas anteriores.

Reações semelhantes às que são induzidas pela heparina em alguns doentes também já foram identificadas após o uso de outros medicamentos ou mesmo depois de infeções virais ou bacterianas. Estes vários cenários clínicos desencadeados, aparentemente, por gatilhos não farmacológicos têm sido classificados como uma trombocitopenia autoimune — isto é, resulta da resposta do sistema imunitário —, escreveram os autores do artigo. Mas a forma como as plaquetas são ativadas após a administração da vacina — ou seja, que mecanismos justificam os acontecimentos —, o papel que desempenham os anticorpos ou mesmo o papel dos adenovírus nesta ativação, continuam por explicar.

“Ao contrário das situações clássicas de trombocitopenia induzida pela heparina, os doentes com [este tipo de] trombocitopenia autoimune, apresentam uma trombocitopenia invulgarmente grave, um aumento na frequência coágulos intravascular disseminados e eventos trombóticos atípicos.”
Greinacher et al. (2021) NEJM

Quais são os tratamentos possíveis nestes casos?

Numa situação vulgar de coágulos sanguíneos, a heparina seria o medicamento a usar. É um anticoagulante que evita o aumento do número de coágulos, promove a sua destruição e torna o sangue mais fluido. Mas, por aumentar a fluidez do sangue, a heparina não é recomendada nos casos de trombocitopenia — baixa contagem de plaquetas, que têm como função facilitar a cicatrização —, porque pode aumentar o risco de uma hemorragia.

Nestes casos, em que os coágulos sanguíneos surgem ao mesmo tempo que os baixos níveis de plaquetas, torna-se inviável usar este tipo de tratamento. A primeira mulher que apresentou coágulos sanguíneos depois da vacinação, na Áustria, quando nada se sabia sobre esta condição rara, foi tratada com heparina e o tratamento teve de ser interrompido devido a hemorragias dispersas no sistema digestivo. A enfermeira de 49 anos acabou por morrer.

Casos de coágulos após vacinação. Estados Unidos suspendem vacina e Johnson & Johnson adia entrega na Europa

É por isso importante que os profissionais de saúde sejam capazes de identificar esta síndrome de ocorrência extremamente rara. Foi com o objetivo de os preparar e de elaborar recomendações nesse sentido que a FDA e o CDC suspenderam temporariamente o uso da vacina da Johnson & Johnson. A boa notícia é que a conjugação dos coágulos sanguíneos com poucas plaquetas pode ser identificada, desde que os médicos estejam despertos para o problema, e pode ser tratada, como sugere a equipa de Andreas Greinacher.

No artigo publicado na NEJM, a equipa deixa um esquema potencial para o diagnóstico e tratamento de casos suspeitos de VITT (trombocitopenia trombótica imune induzida por vacina), como lhe chamaram os autores (ou VIPIT, como já foi referido). Caso não se confirme a suspeita, a pessoa pode ser tratada normalmente com heparina, mas se se confirmar esta síndrome devem usar-se alternativas como imunoglobolinas (anticorpos não específicos que travam a ativação das plaquetas), anticoagulantes (que não a heparina), para destruir os coágulos, e, se e só se houver hemorragia, transfusões de plaquetas.

Porque é que estes eventos raros estão associados a duas vacinas baseadas em adenovírus?

A quebra brusca do número de plaquetas depois da sua ativação parece, de facto, semelhante ao que acontece nas pessoas com reações adversas à heparina, disse à Agência Sinc Vicente Vicente, chefe do Serviço de Hematologia do Hospital Universitário Morales Meseguer de Murcia. “Parece que pode ser [algo semelhante], mas ainda existem reservas e, sem dúvida, faltam pormenores, como quais são os potenciadores da ativação plaquetária.”

Uma das hipóteses parece estar relacionada com o tipo de vacinas — baseadas em vetores virais no caso da AstraZeneca e Johnson & Johnson —, visto que não existem relatos deste tipo de síndrome nas pessoas que receberam as vacinas da Pfizer/BioNTech e Moderna, ambas baseadas em ARN mensageiro.

Pfizer provoca mais reações adversas, mas a AstraZeneca tem mais casos sérios. O que dizem os relatórios sobre os efeitos das vacinas

As vacinas da AstraZeneca e Johnson & Johnson usam adenovírus modificados (ainda que de origens diferentes). Ou seja, pegaram em vírus conhecidos por causarem constipações, logo capazes de infetar as células humanas, e modificaram-nos de forma a funcionarem como um veículo que leva algo para dentro das células. Neste caso, o que é levado é uma molécula de ADN que contém a mensagem para fabricar a proteína spike do SARS-CoV-2.

Uma das hipóteses é que a reação verificada na VIPIT possa estar relacionada com o próprio adenovírus que, por uma razão ainda desconhecida, leva o sistema imunitário a produzir anticorpos que depois ativam as plaquetas. Outra hipótese é que as moléculas de ADN transportadas pelos adenovírus possam sair, ficar nos espaços entre as células e ligar-se a uma molécula relacionada com as plaquetas. A formação deste aglomerado é identificada como um corpo estranho e leva a uma reação imunitária, com produção de anticorpos contra a molécula e/ou contra as plaquetas.

Seria importante perceber se outras vacinas baseadas em adenovírus, como a Sputnik V, desenvolvida na Rússia, ou a vacina da farmacêutica chinesa CanSino, também desencadearam este tipo de síndrome. Até ao momento não existem relatos nesse sentido, mas os dados sobre estas vacinas têm sido escassos e não se sabe sequer se os reguladores nestes países estão a fazer um levantamento das reações adversas (como acontece na Europa e Estados Unidos), disse à Science Magazine Peter Hotez, virologista na Baylor College of Medicine e, ele próprio, a desenvolver uma vacina contra a Covid-19.

Covid-19. Agência Europeia do Medicamento vai investigar se ensaios da Sputnik V respeitaram padrões

Porque é que a maior parte dos casos reportados são mulheres jovens?

A EMA reconheceu que a maior parte dos casos conhecidos são de mulheres com menos de 60 anos, mas o comité de segurança da agência (PRAC) não encontrou fatores de risco associados ao surgimento destes casos invulgares, nem relacionados com a idade, nem com o sexo, nem com outros fatores como doença prévia ou medicamentos. A razão principal pode ser tão simples como: a maior parte das pessoas que receberam a vacina da AstraZeneca na Europa eram mulheres em idade ativa, disse Sabine Straus, representante do PRAC, durante a conferência de imprensa.

Quando a vacina foi aprovada na Europa, a escassez de dados em faixas etárias mais velhas fez com que vários países preferissem usar a vacina nos mais novos — inicialmente, Portugal recomendou dar a pessoas com menos de 65 anos. E, entre os prioritários que fossem mais jovens, estavam os profissionais de saúde e professores na generalidade dos países da União Europeia, que são grupos compostos maioritariamente por mulheres.

Na Noruega, por exemplo, 78% das pessoas que receberam a vacina da AstraZeneca até ao final de março eram mulheres, disse à Science Magazine Sara Viksmoen Watle, médica sénior no Instituto Nacional de Saúde da Noruega. Por outro lado, no Reino Unido, apesar de ter administrado mais doses da AstraZeneca que qualquer outro país, a prioridade tem sido os mais velhos, o que pode justificar que tenham proporcionalmente menos casos.

Agência Europeia do Medicamento assume ligação entre vacina da AstraZeneca e coágulos sanguíneos

Se a VIPIT for uma reação exacerbada do sistema imunitário também se torna mais fácil perceber porque é que as pessoas mais velhas não apresentam tantas queixas deste tipo, nem nos ensaios clínicos, nem em contexto real. De forma geral, o sistema imunitário torna-se menos eficaz, menos capaz de responder, com a idade.

Por outro lado, as mulheres jovens têm sistemas imunitários mais ativos e, também por isso, as doenças autoimunes são mais frequentes nas mulheres do que nos homens, especialmente quando são mais novas, explicou ao jornal El País Rodrigo Rial, porta-voz da Sociedade Espanhola de Cirurgia Vascular.

Há outro fator de risco que também é quase exclusivo das mulheres: o uso da pílula contracetiva, que também pode justificar a formação de coágulos sanguíneos — com um risco de uma em cada mil mulheres que tomam a pílula. Ainda assim, não foi identificado que tomar a pílula seja um fator de risco para desenvolver VIPIT, até porque também houve casos entre homens e entre pessoas mais velhas que não estariam a usar estes comprimidos.

Quais os riscos para as campanhas de vacinação a nível mundial?

A vacina da AstraZeneca pelo baixo custo e facilidade de armazenamento e a da Johnson & Johnson, que a isso junta o facto de ser dada numa única dose, estão, neste momento, entre as melhores opções de vacinas contra a Covid-19 para serem distribuídas nos países de baixos rendimentos.

Se na Europa e Estados Unidos uma suspensão ou atraso nestas vacinas terá um impacto ligeiro nas campanhas de vacinação, visto que com as vacinas da Pfizer/BioNTech e da Moderna continuam com os esquemas de vacinação normais, nos países com menos recursos isso pode significar ter de esperar ainda mais tempo até conseguirem ter um nível de proteção adequado.

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça até artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.