O regulador do medicamento norte-americano (FDA, Food and Drug Administration) e os Centros para o Controlo e Prevenção da Doença (CDC) recomendaram a suspensão temporária do uso da vacina da Johnson & Johnson contra a Covi-19 em todos os estabelecimentos de saúde federais e aconselharam os estados a fazerem o mesmo, noticiou o jornal The New York Times. A farmacêutica optou por atrasar as entregas na Europa, conforme comunicado de imprensa divulgado esta terça-feira.

Em causa está a ocorrência de casos de trombose do seio venoso cerebral (coágulos sanguíneos no cérebro) em conjunto com trombocitopenia (redução do número de plaquetas no sangue) em seis pessoas, nos Estados Unidos, nas duas semanas após a administração da vacina de dose única.

Agência Europeia do Medicamento assume ligação entre vacina da AstraZeneca e coágulos sanguíneos

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A situação, apesar de extremamente rara, apresentava semelhanças com o que se passou com a vacina da AstraZeneca na Europa — outra vacina que também é baseada em adenovírus.

Os adenovírus modificados funcionam como uma encomenda entregue diretamente em nossa casa — leia-se, dentro das células. Lá dentro, o material genético do coronavírus que contém as instruções para fabricar a proteína spike, contra a qual se espera que o organismo produza anticorpos. A vacina não tem o coronavírus completo, nem a pessoa fica infetada.

O que se suspeita que aconteça nos casos de efeitos adversos graves é que a resposta imunitária da pessoa vacinada provoque uma ativação anormal das plaquetas que levam à formação de coágulos, mas por enquanto foram registados muito poucos casos para se ter a certeza, disse Peter Marks, diretor do Centro de Avaliação Biológica e Investigação da FDA, numa conferência de imprensa da agência, que decorreu esta terça-feira.

A FDA e os CDC recomendaram a suspensão temporária por uma questão de precaução, enquanto analisam os dados e preparam as recomendações para médicos e utentes sob como proceder no caso de se verificarem estes efeitos adversos. O Comité de Aconselhamento sobre Práticas de Imunização dos CDC vai reunir esta quarta-feira para analisar a situação.

Uma das maiores dificuldades no tratamento destes casos de coágulos sanguíneos invulgares é que não podem receber o mesmo tratamento que outros casos de coágulos, alertou Peter Marks, responsável da FDA.

A heparina [normalmente usada no tratamento de coágulos sanguíneos] pode ser perigosa”, para estes doentes, disse Peter Marks.

A heparina usada como anticoagulante nos casos de coágulos sanguíneos pode ter como efeito secundário a diminuição do número de plaquetas. É por isso que, nestes casos raros de conjugação dos dois eventos, não se deve usar heparina porque agrava a situação do doente.

Covid-19. Regulador avalia casos de coágulos antes de vacina da Johnson&Johnson chegar à União Europeia

Os primeiros casos reportados nos Estados Unidos já estavam a ser investigados pela Agência Europeia do Medicamento (EMA), mesmo antes da vacina começar a ser distribuída na Europa, em conjunto com a farmacêutica. A Johnson & Johnson optou por atrasar a entrega na Europa, sem especificar por quanto tempo. Fica assim adiada também a entrega das primeiras 30 mil doses em Portugal previstas para esta semana, como confirmou o Infarmed que, entretanto, foi informado oficialmente pela EMA.

A EMA disse, esta terça-feira, que ainda está “a investigar” os casos de tromboembolismo detetados após a administração da vacina da Johnson & Johnson nos Estados Unidos, alertando que, “para já, não se sabe se há relação causa-efeito”. Uma eventual medida de regulação só será decidida quando houver conclusões científicas, explicou uma porta-voz da agência, citada pela Lusa.

No caso da AstraZeneca, a EMA não fez qualquer recomendação do limite de idades — não se sabe o que fará neste caso —, mas vários países optaram por só dar a vacina a pessoas mais velhas para as quais o risco de morte por Covid-19 é maior. Tendo em conta a avaliação de risco-benefício — risco de efeitos secundários causados pela vacina contra o benefício da prevenção da mortalidade por Covid-19 —, Anne Schuchat, vice-diretora principal dos CDC, não descarta a possibilidade de as orientações poderem ser diferentes consoante os grupos etários em questão.

A vacina da Johnson & Johnson, como a da AstraZeneca, desencadeou efeitos secundários graves em mulheres jovens — ainda que não tenha sido confirmada uma associação à idade ou sexo. Os seis casos nos Estados Unidos são de mulheres entre os 18 e os 48 anos, uma delas morreu e outra foi internada em estado grave.

Primeiras 30 mil doses da vacina da Janssen chegam a Portugal na quarta-feira

Que riscos corre quem já tomou a vacina da Johnson & Johnson?

Para as pessoas que já tomaram a vacina há um mês ou mais, dificilmente haverá razões de preocupação, tranquilizou Anne Schuchat, vice-diretora principal dos Centros de Controlo e Prevenção da Doença (CDC).

Já para quem tomou a vacina há cerca de duas ou três semanas, deverá ter atenção a alguns sintomas como dor de cabeça forte, dor abdominal, dores nas pernas ou falta de ar. Nestes casos, deverá procurar cuidados médicos.

Estes sintomas são diferentes dos sintomas semelhantes aos da gripe, como febre, que muitas pessoas têm nos primeiros dias depois da vacinação, disse Anne Schuchat, durante a conferência de imprensa.

A vice-diretora principal dos CDC disse que as outras duas vacinas disponíveis nos Estados Unidos (Pfizer/BioNTech e Moderna) não causam este tipo de efeitos adversos e que as pessoas podem continuar a tomar estas vacinas sem receios. Dos 180 milhões de doses das vacinas da Pfizer/BioNTech e Moderna já administradas nos Estados Unidos, não foi reportado nenhum caso de trombose do seio venoso cerebral (coágulos sanguíneos no cérebro) conjungado com trombocitopenia (redução do número de plaquetas no sangue), disse Peter Marks, diretor do Centro de Avaliação Biológica e Investigação da FDA.

Em relação às pessoas que deviam tomar a vacina da Johnson & Johnson, serão reagendadas para tomar outra vacina. Ainda assim, os reguladores reforçam que os efeitos secundários são extremamente raros: seis num total de 6,8 milhões de doses dadas nos Estados Unidos.

Comissão Europeia confirma que a distribuição da vacina na Europa está em pausa

A Agência Europeia do Medicamento está a “acompanhar de perto” os desenvolvimentos relacionados com a vacina contra covid-19 de dose única da Johnson & Johnson, informou, esta terça-feira, a Comissão Europeia, confirmando o impacto na vacinação na União Europeia (UE).

“Os desenvolvimentos de hoje [terça-feira] com a vacina J&J nos EUA estão a ser acompanhados de perto pela EMA e pelos seus organismos de farmacovigilância, em cooperação com a FDA [agência federal do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos] e outros reguladores internacionais”, disse a comissária europeia da Saúde, Stella Kyriakides.

Através de uma publicação na rede social Twitter, a responsável confirmou que a administração na UE “foi colocada em pausa pela empresa”, após a própria farmacêutica Johnson & Johnson ter informado que tomou a decisão de atrasar a distribuição para a Europa.

“A segurança da vacina é sempre primordial”, adiantou Stella Kyriakides na mensagem sobre esta polémica, que se junta a outras na UE como atrasos na entrega de vacinas contra a Covid-19 por parte da farmacêutica da AstraZeneca e dos efeitos secundários do seu fármaco, também com uma possível ligação a casos de formação de coágulos sanguíneos, ainda que raros.

Atualizado com a conferência de imprensa da FDA e CDC e com o comunicado de imprensa da Johnson & Johnson
Atualizado com declarações de Stella Kyriakides