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Maria Clara Figueiredo tem 54 anos, é juíza desembargadora e secretária de Estado Adjunta e da Justiça desde abril de 2024
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Maria Clara Figueiredo tem 54 anos, é juíza desembargadora e secretária de Estado Adjunta e da Justiça desde abril de 2024

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Maria Clara Figueiredo tem 54 anos, é juíza desembargadora e secretária de Estado Adjunta e da Justiça desde abril de 2024

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Secretária de Estado Adjunta e da Justiça: "Houve falta de comando e de cumprimento das regras de segurança em Vale de Judeus"

Secretária de Estado explica as novas regras no acesso ao Centro de Estudos Judiciários, diz o que vai mudar com a tramitação eletrónica do processo penal e o que aconteceu em Vale de Judeus.

    Índice

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Os últimos dias têm sido dias cheios no Ministério da Justiça liderado por Rita Alarcão Júdice. A portaria da tramitação eletrónica do processo penal avançou para entrar em vigor a 3 de dezembro, as novas regras para o acesso ao Centro de Estudos Judiciários (CEJ) acabaram de ser aprovadas em Conselho de Ministros, foram instaurados processos disciplinares ao ex-diretor da prisão de Vale de Judeus e a oito guardas prisionais e o fugitivo Fábio Loureiro, detido em Marrocos, aceitou a extradição para Portugal.

Novas regras no CEJ. “Temos falta de magistrados”

Em entrevista ao programa “Justiça Cega” da Rádio Observador, a secretária de Estado Adjunta e da Justiça explica as razões que levaram o Ministério da Justiça a avançar com nove processos disciplinares a responsáveis e guardas prisionais de Vale de Judeus e diz claramente que houve “falta de comando na garantia do cumprimento das regras em vigor.”

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Maria Clara Figueiredo recusa ainda as críticas de facilitismo que têm sido às novas regras de acesso ao CEJ, diz que a intenção foi simplificar as regras dos exames (cujo excesso de complexidade já tinha sido criticada pelo presidente do Supremo Tribunal de Justiça ao Observador), unificar procedimentos e permitir que quem tenha apenas a parte de curricular do mestrado se possa candidatar. Tudo para alargar a base de recrutamento para as magistraturas. “Já temos falta de juízes e procuradores”, alerta.

A secretária de Estado explica ainda as diferentes fase de implementação da tramitação eletrónica do processo penal e diz que está a trabalhar para que o Tribunal Constitucional, cujos juízes conselheiros estão a resistir à mudança, tenha também essa mudança estrutural.

O Relatório do Serviço de Auditoria e Inspeção, conhecido esta segunda-feira, aponta responsabilidades individuais em falhas de segurança que poderão ter facilitado a fuga dos cinco reclusos perigosos da prisão de Vale de Judeus no passado dia 7 de setembro. Foram instaurados nove procedimentos disciplinares, incluindo ao ex-diretor da cadeia. É um primeiro passo para a reposição da autoridade do Estado, que sofreu um dano considerável?
É um passo importante, mas não é o primeiro. É o passo subsequente às decisões tomadas e anunciadas 72 horas depois da evasão, com a determinação de auditorias e inspeções, com a aceitação das demissões do diretor-geral [Rui Abrunhosa Gonçalves] e subdiretor geral [Pedro Veiga Santos]. Este apuramento da responsabilidade disciplinar individual vêm no seguimento do que decidimos fazer logo em setembro.

Qual o timing para a conclusão dos processos disciplinares?
Já foi nomeado um instrutor para fazer a instrução dos procedimentos, que seguem as regras dos procedimentos disciplinares laborais, com a elaboração de notas de culpa, dando-se, subsequentemente, a cada visado, a oportunidade para responder aos factos que lhe forem imputados.

[Já saiu o quarto episódio de “A Grande Provocadora”, o novo podcast Plus do Observador que conta a história de Vera Lagoa, a mulher que afrontou Salazar, desafiou os militares de Abril e ridicularizou os que se achavam donos do país. Pode ouvir aqui, no Observador, e também na Apple Podcasts e no Spotify. E pode ouvir aqui o primeiro episódio, aqui o segundo e aqui o terceiro.]

Qual a conclusão mais grave que detetou no relatório dos serviços de auditoria e inspeção? O comunicado do Ministério da Justiça diz que os sete guardas prisionais, por exemplo, não respeitaram a “escrupulosa vigilância presencial e videovigilância, o que facilitou a fuga dos reclusos e impediu a sua deteção atempada.”
Dos factos que podem ser tornados públicos, podemos concluir terem existido falhas na elaboração das escalas, deficiente cumprimento das regras que regulam a monitorização das imagens de videovigilância, incumprimento de instruções escritas sobre a vigilância dos pátios e falta de comando na garantia do cumprimento das regras em vigor.

"Dos factos que podem ser tornados públicos [sobre a fuga de prisão de Vale de Judeus], podemos concluir terem existido falhas na elaboração das escalas, deficiente cumprimento das regras que regulam a monotorização das imagens de videovigilância, incumprimento de instruções escritas sobre a vigilância dos pátios e falta de comando na garantia do cumprimento das regras em vigor."
Maria Clara Figueiredo, secretária de Estado Adjunta e da Justiça

A diretora-geral Isabel Leitão, que substituiu em setembro Rui Abrunhosa Gonçalves, já foi nomeada a nível definitivo ou não está previsto que o venha a ser?
A dra. Isabel Leitão foi nomeada em regime de substituição. A decisão sobre a nomeação definitiva do diretor-geral será tomada em breve.

Como estão a correr os trabalhos sobre a auditoria urgente aos sistemas de segurança de todos os 49 estabelecimentos prisionais do país? A ministra da Justiça prometeu um relatório até ao final do ano
Essa auditoria está no bom caminho, os trabalhos decorrem como previsto. Já tivemos um reporte intercalar. A meio de outubro, a Inspeção já tinha visitado 22 dos 49 estabelecimentos prisionais de todo o país. Estamos certas de que até ao final do ano teremos a auditoria completa.

“Já temos hoje falta de juízes e procuradores. Temos de amplificar a base de recrutamento”

O Governo aprovou no último Conselho de Ministros as novas regras de acesso ao Centro de Estudos Judiciários (CEJ). O que é que vai mudar?
Em primeiro lugar, pretendemos amplificar a base de recrutamento. Vivemos tempos difíceis a esse nível, precisamos de magistrados, precisamos de bons magistrados.

Podemos ter falta de magistrados a curto prazo.
Já temos hoje falta de magistrados. Já é acentuada a falta de magistrados judiciais e do Ministério Público, e o que se antecipa nos próximos anos é que essa falta de magistrados se acentue. Era urgente alterar as regras de acesso ao CEJ, porquanto o que se tem verificado nos últimos anos é uma dificuldade de recrutar.

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Não há candidatos, não tem nada a ver com o tempo que a senhora, que é juíza desembargadora, se quer ainda estou a assentar os centros judiciários.
Nada a ver. Estamos a falar de 500 candidatos no último concurso contra, por exemplo, no seu tempo, se calhar, 2.500, 3.000. Milhares. O que de facto mudou, a realidade mudou, a sociedade evolui, é uma questão também geracional. Portanto, havia que fazer aqui alguma coisa para tentarmos ampliar esta base de recrutamento e, essencialmente, tornar mais atrativa esta carreira, a carreira da magistratura e o ingresso nos centros judiciários.

O que vai mudar?
Alterámos os requisitos de habilitação. Para quem se quiser candidatar ao CEJ, deixa de ser obrigatório possuir a licenciatura pós-Bolonha — dos tempos atuais — e o mestrado concluído. Poderá candidatar-se ao CEJ se tiver apenas a licenciatura atual, pós-Bolonha, e a parte curricular do mestrado.

A par disso, mantivemos como requisito habilitante a licenciatura pré-Bolonha e a licenciatura pós-Bolonha, sem parte curricular do mestrado, mas acompanhada de 5 anos de experiência.

Isso vai permitir encurtar o tempo entre o fim da licenciatura e a candidatura ao CEJ?
Precisamente. Para evitar que jovens de muito valor enveredem por outras carreiras financeiramente mais atrativas no imediato. A esse nível pensamos que conseguiremos ampliar a base de recrutamento.

Que outras mudanças ocorreram? Por exemplo, o polo do Centro de Estudos Judiciários será aberto em Vila do Conde. Isso já está devidamente previsto e calendarizado?
A sra. ministra da Justiça já teve ocasião de anunciar que pretendemos abrir no novo concurso para o CEJ mais 60 vagas — que serão as vagas correspondentes ao polo de Vila do Conde.

"Para quem se quiser candidatar ao CEJ - Centro de Estudos Judiciários, deixa de ser obrigatório possuir o mestrado concluído. Poderá candidatar-se ao CEJ se tiver apenas a licenciatura atual, pós-Bolonha, e a parte curricular do mestrado. A par disso, mantivemos como requisito habilitante a licenciatura pré-Bolonha e a licenciatura pós-Bolonha, sem parte curricular do mestrado, mas acompanhada de 5 anos de experiência."

Já no próximo concurso?
Sim. Portanto, para os auditores que começarão em setembro de 2025. Estamos a calcular que assim aconteça, com instalações adequadas, para que possam funcionar, com simultaneidade, em Lisboa e em Vila do Conde.

Na entrevista que fizemos ao presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o conselheiro Cura Mariano falou precisamente do elevado número e complexidade das provas exigidas para entrar no CEJ. Vai ser simplificado?
Essa será outra das alterações que entendemos fazer. Alterámos o tipo de provas que obrigatoriamente têm de ser realizadas, designadamente a questão do sorteio. No regime atual sabia-se muito em cima da prestação da prova qual o tema que o candidato teria que debater. Fizemos alterações a esse nível. Reduzimos também um pouco a amplitude dos temas a tratar.

A amplitude era, de facto, extraordinariamente complexa. Não tinha consciência até à conversa com o conselheiro Cura Mariano.
Exato. Isso também podia ser um fator de desinteresse para os candidatos. Queria ainda sinalizar uma outra alteração: ao nível dos critérios de avaliação para o ingresso, tivemos a preocupação de uniformizar. Deixamos de prever provas diferenciadas para a chamada via académica e para a via profissional.

Era isso que lhe ia perguntar. Mantém-se essa via de acesso profissional e os advogados vão poder concorrer ao CEJ?
Claramente, tal como já podiam antes. Como disse há pouco, um dos critérios habilitantes é ter a licenciatura pré-Bolonha ou pós-Bolonha, sem a parte curricular do mestrado, mas com 5 anos de experiência em área relevante do direito — onde se incluem, naturalmente, os advogados. A diferença é que deixamos de prever provas, júris e formas de avaliação diferentes. Unificámos todos os candidatos habilitados, com os requisitos prévios.

"Os advogados vão poder continuar a candidatar-se ao Centro de Estudos Judiciários. A diferença é que deixamos de prever provas, júris e formas de avaliação diferentes. Unificámos todos os candidatos habilitados, com os requisitos prévios, e simplificamos o processo."

Simplificaram
Simplificámos, sem dúvida, e tornamos uniforme. O critério é o mesmo para todos.

Com estas medidas, o Governo tem a convicção de que vai conseguir estancar esse problema — que já disse que é atual — da falta de mestrados que existe no país?
O Governo tem a forte convicção de que estas medidas vão ajudar a resolver este problema.

“A tramitação eletrónica encurtou para metade o tempo da investigação criminal”

O Governo aprovou recentemente uma portaria que estabelece regras para a tramitação eletrónica na jurisdição penal. Aquela imagem das secretarias judiciais com volumes em papel, do chão até quase ao teto, vai deixar de existir?
Queremos de facto que essa imagem deixe de existir. Porém, queria ressalvar que o papel não vai deixar de existir por causa da recomendação constante desta portaria. O que esta portaria faz é reduzir o papel e os custos respetivos. Mas essencialmente aumentar a eficiência e o tempo da prática dos atos. Como compreenderá, a tramitação eletrónica agiliza os procedimentos.

É assim em toda a administração pública.
Precisamente. É assim também já na fase judicial do processo penal e nos restantes processos, como o processo civil. Queremos alargar à fase da investigação criminal.

Quando ocorreu a tramitação dos recursos sobre as decisões da fase de instrução criminal para o Tribunal da Relação de Lisboa, os portugueses viram na televisão as imagens das carrinhas a transportarem centenas de volumes em papel, muitos milhares de páginas em papel. Explique-nos mais em pormenor como é que se vai processar esta mudança do papel para o digital. É uma mudança por fases?
Sim, é uma mudança por fases. Esta portaria entra em vigor em 3 de dezembro de 2024. Há fases subsequentes importantes, designadamente a que tem a ver com a apresentação dos autos de notícia pelos órgãos de polícia criminal — que não está ainda em condições de entrar em vigor já em dezembro deste ano, porquanto implica a interoperabilidade entre os sistemas dos órgãos de polícia criminal e o sistema dos tribunais.

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Era uma das perguntas que lhe ia fazer. São sistemas informáticos diferentes que não comunicam entre si.
São sistemas diferentes. Temos nos tribunais o Citius — que é uma plataforma que tem provas dadas da sua eficácia. O Citius é a plataforma que vai sustentar a tramitação eletrónica na fase de investigação.

O Citius será a plataforma através do qual o Ministério Público vai comunicar com os órgãos de polícia criminal.
Isso mesmo. Portanto, vamos alargar a aplicação desta plataforma Citius também à fase de investigação. Perguntava-me se era por fases. Sim, a aplicação desta tramitação eletrónica começa em 3 de dezembro. Reservamos para um momento subsequente, pelas razões que expliquei, a entrega dos autos.

Será em 2025.
Sim, em 2025. De todo modo, vamos já sentir as enormes vantagens. Por exemplo, os senhores advogados poderão entregar na fase de inquérito os seus requerimentos através da plataforma Citius, tal como fazem já na fase judicial, o que facilitará o seu trabalho. Os senhores funcionários judiciais, por seu lado, poderão praticar os seus atos no Citius. E os magistrados também poderão praticar os seus actos e consultar os autos na mesma plataforma informática.

Houve um projeto piloto, vários projetos pilotos, aliás. Quais foram os resultados dessas experiências em termos de promoção de uma maior eficiência processual?
Houve projetos pilotos em várias comarcas, em Lisboa, no Porto, Portalegre, Castelo Branco, Setúbal, sem preocupação de exaustão na enunciação. Por exemplo, na primeira secção do DIAP da Moita, um inquérito que em média poderia demorar 300 dias, passou a demorar 150 dias. Portanto, reduziu-se para metade o tempo de duração da investigação. Esses projetos pilotos dão-nos conta, de facto, do acerto desta decisão e dos benefícios das novas regras para a investigação.

"A aplicação da tramitação eletrónica ao processo penal começa a 3 de dezembro. Os senhores advogados poderão entregar na fase de inquérito os seus requerimentos através da plataforma Citius, tal como fazem já na fase judicial. Os senhores funcionários judiciais poderão praticar os seus atos no Citius. E os magistrados também poderão praticar os seus actos e consultar os autos na mesma plataforma informática."

Deixe-me fazer uma pergunta sobre a discrepância que existe entre os processos de criminalidade comum — cuja resolução varia entre 1 a 2 anos — e os processos do crime económico — cujo prazo de conclusão é de 8 a 9 anos. É uma diferença muito grande. A fase de recursos costuma ser a mais morosa e, muitas vezes, os recursos que chegam ao Tribunal Constitucional demoram, após uma decisão, 2 a 3 meses a descer até à primeira instância. Esta tramitação eletrónica vai permitir reduzir esse tempo?
Esta tramitação permite reduzir todos os tempos em qualquer fase do processo onde anteriormente não tínhamos a ajuda do digital e da tramitação eletrónica. Ainda não temos esta tramitação eletrónica no Tribunal Constitucional. Há trabalho em curso também nessa matéria.

Não está previsto para já?
No imediato o que lhe posso dizer é que tenho uma reunião agendada para breve com o Tribunal Constitucional. Portanto é uma matéria que está em análise. Mas estas regras agilizarão todas as fases, incluindo a fase de recurso, sem dúvida.

Disse há pouco que o papel não vai acabar. Esta é uma forma de reduzir a utilização do papel?
Não podemos apontar aqui nenhuma data que simbolize o fim do papel no processo penal. Nem esta portaria tem esse objetivo. Os processos continuarão a existir fisicamente, o processo físico não termina. O que acontecerá é que do processo físico constarão apenas os atos e os despachos, e as decisões que se entenderem que são os mais importantes.

Depois do fim do inquérito e da consequente fim do Segredo de Justiça, será possível a consulta exclusivamente eletrónica pelos advogados de outros setores pessoais?
Tivemos a preocupação de criar uma forma de poderem ser consultados apenas determinados documentos, determinados atos, e não o processo integral, precisamente para acautelarmos as preocupações de confidencialidade que estão inerentes a muitos atos na investigação.

"Não podemos apontar nenhuma data que simbolize o fim do papel no processo penal. Os processos continuarão a existir fisicamente, o processo físico não termina. O que acontecerá é que do processo físico constarão apenas os atos e os despachos, e as decisões que se entenderem que são os mais importantes."

Houve alguma preocupação para reforçar a capacidade do sistema informático? Costumamos ouvir queixas dos oficiais de justiça sobre a fiabilidade da própria plataforma informática.
O IGFEJ tem estado a trabalhar para que possamos concretizar estas medidas, não só ao nível das interoperabilidades, mas também na própria concretização da tramitação. Não lhe falarei tanto no reforço financeiro, mas no trabalho que tem sido feito especificamente com vista à concretização prática destas novas regras. É normal que o sistema vai ter mais coisas para processar, vai ter maior pressão, é normal que haja também uma maior preocupação sobre a sua fiabilidade.

“Vão acabar as injustiças na remuneração dos advogados oficiosos”

O Governo ganhou a guerra contra a Ordem dos Advogados na questão das escaladas dos advogados oficiosos?
O Governo não está nem nunca esteve em guerra contra a Ordem dos Advogados. O Governo quis, e quer, apenas defender o interesse público. Esse foi, e continua a ser, o nosso propósito exclusivo. Eu penso que está a reportar-se à portaria que o Governo…

Também ao facto da Ordem dos Advogados ter recuado e desconvocou o referido protesto que parece que não correu muito bem.
A Ordem dos Advogados entendeu desconvocar o bloqueio, o protesto, não sei bem como chamar. Foi uma opção da ordem dos advogados e da senhora bastonária. O que posso dizer é que aquilo que moveu o Governo foi a defesa do sistema de acesso ao direito e na garantia de que, em qualquer circunstância, qualquer cidadão que precise de um advogado, nas situações de defesa obrigatória e de assistência judiciária obrigatória, não deixará de o ter. Porque o sistema instituído de elaboração das escalas pela Ordem dos Advogados não funciona. A portaria não resultou do protesto, a portaria não visou responder ao protesto.

O protesto serviu apenas para nos alertar que as normas vigentes não cobriam todas as situações e que, de facto, podiam existir situações em que um tribunal se confrontava com a necessidade de realizar um ato com assistência obrigatória, que tivesse ao seu lado um advogado e que não tinha uma norma habilitante para nomear um advogado.

E que agora passou a ter.
O que fizemos foi consagrar essa norma que só deverá ser aplicada, que só existe para situações absolutamente excecionais de falibilidade do sistema instituído.

Ficou satisfeita com a proposta de revisão para esta matéria das oficiosas apresentada pelo Grupo de Trabalho? E o Governo já tem previsto a aprovação dessa proposta?
Este Grupo de Trabalho foi criado por mim, do qual nunca me distanciei. Acompanhei todo o trabalho de muito perto e, portanto, quando a proposta me foi formalmente apresentada eu já a conhecia e, portanto, validei-a. Sim, considero que é uma proposta muito boa. Já tivemos a ocasião de a apresentar à Ordem dos Advogados. Está marcada uma reunião a breve prazo com o grupo de trabalho, onde será integrada a Ordem dos Advogados com os representantes que entender trazer para esse efeito. Mas considero que é uma proposta muito boa que traz um incremento na remuneração dos atos.

Era isso que eu lhe ia perguntar a seguir, mas antes disso deixa-me só uma pergunta muito rápida. Prevê-se que até o final do ano esse processo legislativo esteja concluído?
Sim, é essa a nossa intenção.

Além de rever os valores pagos, revê-se também o tipo de atos que estão pagos. Eliminando uns e alargando o pagamento de outros. Porquê?
Porque esta portaria que regulamenta a remuneração dos atos praticados pelos defensores nomeados no sistema de acesso ao direito é muito antiga, tem 20 anos, e a realidade processual mudou, a realidade social e económica também mudou. Os processos evoluíram e os atos que estavam especificados na portaria que agora estamos a rever, encontravam-se um pouco desfasados do que é a realidade processual e substantiva dos dias de hoje. Era urgente rever a portaria — não só no que diz respeito à remuneração dos actos, mas também no que diz respeito à sua especificação. Havia actos que estavam previstos com remuneração que consideramos que não era adequada, havia atos que não estavam sequer especificados e que se incluíam em grandes bolsas sem nenhuma preocupação de rigor na sua identificação e que geravam injustiças na remuneração dos actos.

"O que moveu o Governo foi a defesa do sistema de acesso ao direito e na garantia de que, em qualquer circunstância, qualquer cidadão que precise de um advogado, nas situações de defesa obrigatória e de assistência judiciária obrigatória, não deixará de o ter. Porque o sistema instituído de elaboração das escalas pela Ordem dos Advogados não funciona."

Isso vai acabar?
Sim, isso vai acabar. Privilegiamos a valorização do trabalho efetivamente prestado pelo advogado, ao nível das complexidades, do tempo dispendido na elaboração das suas peças, no desenvolvimento do seu trabalho. Remunerámos melhor o que é mais complexo, o que leva mais tempo. E não aumentamos na mesma medida os atos que entendemos que não têm essa complexidade.

“O Governo não pondera, neste momento, agir contra a prolixidade da Justiça”

O presidente do Supremo Tribunal de Justiça, conselheiro Cura Mariano, tem dito desde a sua tomada de posse que é fundamental simplificar a linguagem que os magistrados e advogados usam nas peças processuais — até se referiu ao que entende ser uma linguagem barroca. Já houve até um abaixo-destinado contra a prolixidade da linguagem da Justiça. Os tribunais da União Europeia, por exemplo, têm um número limite de caracteres para as peças processuais. O Governo pensa tomar medidas sobre esta área?
De facto, é verdade que temos sentenças, temos acórdãos, peças processuais muitas vezes demasiado longos, prolixos — é verdade, reconheço isso. Tem a ver também com a nossa cultura jurídica.

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Dos magistrados e dos advogados.
Sim, de todos os operadores judiciários. Muitas vezes tem a ver com a preocupação de rigor e a preocupação de cobrir toda a fundamentação. Muitas vezes os magistrados e os advogados enveredam por todo o tipo de fundamentação possível, de forma exaustiva. O que acaba por levar a essa prolixidade que queremos combater. Penso que é mais uma questão de alteração do paradigma, das mentalidades — mais do que uma imposição normativa sobre a qual, efetivamente, o governo não pondera, no momento atual, agir.

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