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Fernando Araújo, Ana Jorge, João Dias e Filipe Santos Costa. Todos estes nomes fizeram notícia nos últimos dois meses. Em comum? Abandonaram os cargos que tinham nos primeiros sessenta dias do Governo. Fazem parte de uma lista com mais de 20 dirigentes, entre gestores públicos, diretores e presidentes e vogais de institutos públicos, que tende a crescer e representam áreas que vão da saúde à economia, da administração pública à segurança social.
Uns foram destituídos, outros alvo de dissolução, há demissões por conveniência e demissões dos próprios, ainda que de alguma forma empurrados por ministros a quem têm de responder. Algumas das saídas poderiam, nos termos da lei aplicável a empresas públicas e cargos dirigentes, implicar o pagamento de indemnizações, no entanto, esse risco parece ter sido acautelado com demissões antes do prazo que estabelece essa obrigação.
O Ministério do Trabalho e Segurança Social é o que tem até agora protagonizado mais chicotadas psicológicas. As últimas mexidas conhecidas envolvem o IEFP e a nomeação do agora ex-vice-presidente para diretor de um programa para o emprego jovem.
Há ainda o caso do diretor nacional da PSP, Barros Correia, substituído depois de ter recusado um outro cargo e optado pela pré-aposentação, segundo a versão dada pela ministra da Administração Interna, Margarida Blasco.
Que fundamentos e explicações deu o Governo para afastar estes dirigentes? Houve saneamentos políticos como acusa a oposição (sobretudo o PS, já que as pessoas demitidas foram nomeadas por um governo socialista)? Está o Executivo a aproveitar para colocar quadros que lhe são próximos em cargos relevantes, num contexto parlamentar que lhe dificulta a execução de outras decisões políticas?
Santa Casa. A exoneração mais “rude”
A pasta que no Governo é dirigida por Rosário Palma Ramalho foi palco da destituição mais “rude”, assim a descreveu a visada, com acusações de “atuação gravemente negligente”, fundamentadas na ausência de um plano de reestruturação financeira para responder ao desequilíbrio das contas, e ainda na não entrega de informações essenciais à tutela.
O fundamento da destituição da provedora Ana Jorge da mesa da Santa Casa (num total de seis membros) segue o guião dos estatutos da instituição, segundo os quais o mandato pode cessar por despacho conjunto do primeiro-ministro e do membro do Governo que exerce a tutela “fundamentado na não realização dos objetivos previstos, na não prestação de informações essenciais ao exercício da tutela ou na sequência de atuações culposas ou gravemente negligentes que afetem a gestão ou o bom nome da SCML (Santa Casa da Misericórdia de Lisboa)”.
A ministra foi mais agressiva nas intervenções públicas, chegando a insinuar que a mesa teria decidido em benefício próprio, nomeadamente aumentando vencimentos. Declarações prontamente desmentidas por Ana Jorge que, em conjunto com os restantes membros da mesa, está a avaliar a possibilidade de avançar com uma ação judicial contra o Estado para defender o seu bom nome. Mas o facto desta contestação ter de ser apresentada nos tribunais administrativos, conhecidos pelo excesso de processos e lentidão de resultados, tem um efeito dissuasor. Outra gestora afastada pelo Governo da TAP, Christine Ourmières Widener, optou pelos tribunais cíveis para pedir uma indemnização, ainda sem desfecho.
Rosário Ramalho e Ana Jorge foram ouvidas no Parlamento e as contradições sobre a atuação e os resultados da administração afastada deram impulso a três propostas de criação de uma comissão parlamentar de inquérito que deverá ser viabilizada pelos socialistas. O futuro inquérito irá também investigar a expansão no Brasil e a gestão interna da perda de receitas e a falta de controlo nos custos, podendo recuar mais de dez anos e apanhar governações socialistas e do PSD/CDS.
A ministra da Segurança Social aproveitou a sua última resposta aos deputados para revelar o nome do novo provedor, que rompe com uma certa tradição de nomear provedores com um passado político.
[Já saiu o quarto episódio de “Matar o Papa”, o novo podcast Plus do Observador que recua a 1982 para contar a história da tentativa de assassinato de João Paulo II em Fátima por um padre conservador espanhol. Ouça aqui o primeiro episódio, aqui o segundo episódio e aqui o terceiro episódio]
Apesar de ter desempenhado várias funções no setor da saúde ao social, e desde a Santa Casa até à Cruz Vermelha, Ana Jorge era mais conhecida como ex-ministra da Saúde num governo socialista. Paulo Alexandre Sousa também estava na Cruz Vermelha, mas encaixa mais no perfil financeiro definido como critério para a nova gestão da Santa Casa pela ministra e tem um passado profissional ligado à banca. Ainda assim, não faltam figuras com lastro político na composição da nova mesa.
Para além de um ex-consultor da Câmara de Lisboa — cumprindo uma regra não escrita de que a mesa tem um representante que faça a ligação com a autarquia, foram nomeadas duas pessoas com ligações ao PSD, ainda que com carreiras no setor público e social. A advogada Ângela Guerra foi deputada na legislatura que se iniciou em 2011 e chegou a ser candidata à distrital de Guarda. Com uma carreira no setor da saúde, André Brandão de Almeida foi deputado social-democrata em 2005.
A demissão “por conveniência” da Aicep e uma indemnização que ficou por dias
Conhecida no início da semana, a dissolução da administração da Aicep (cinco membros executivos) foi feita ao abrigo do estatuto do gestor público que permite que os órgãos sociais de uma empresa pública possam “ser livremente dissolvidos, ou o gestor público livremente demitido, conforme os casos, independentemente dos fundamentos constantes dos artigos anteriores”.
A dissolução e demissão “por mera conveniência” prevê que a “cessação de funções” possa ter lugar a qualquer altura. E só para os gestores que contem com pelo menos “12 meses seguidos de exercício de funções”, é que existe o “direito a uma indemnização correspondente ao vencimento de base que auferiria até ao final do respetivo mandato, com o limite de 12 meses”. O que não era o caso dos cinco administradores da Aicep, mas por poucos dias. A administração cessante da Aicep, liderada por Filipe Santos Costa, tinha sido nomeada por despacho a 16 de junho de 2023 e a resolução de conselho de ministros que a dissolve tem a data de 3 de junho de 2024.
O Governo invoca o artigo 25 do estatuto do gestor público, segundo o qual, “o conselho de administração e a comissão executiva podem ser livremente dissolvidos.” Uma formulação que permite substituir dirigentes sem dar grandes explicações.
A tutela da Aicep é do Ministério da Economia, liderado por Pedro Reis, mas a resolução é assinada pelo primeiro-ministro e estabelece como fundamentos para a demissão o cumprimento do programa do Governo e a necessidade de dotar a agência para o investimento de um “conselho de administração com o perfil que responda aos desígnios consagrados, dissolvendo-se o atual órgão e nomeando um novo conselho de administração.”
Entre os desígnios já fixados pelo Governo à nova gestão está a revisão dos estatutos da Aicep e a definição de um novo modelo de financiamento para dar sustentabilidade, estabilidade e previsibilidade à gestão da Agência, bem como assegurar os recursos necessários à reorganização e reforço da sua rede externa e do regime contratual de investimento. A pressa levou o Governo a nomear uma nova administração antes do parecer da comissão de recrutamento do Estado que só confirmou a adequação dos nomeados três dias depois.
Para presidir à Aicep, o Governo foi buscar o professor universitário Ricardo Arroja, que é também uma presença comum no espaço mediático como comentador de economia de orientação liberal. Aliás, a ligação política mais conhecida do novo presidente é a Iniciativa Liberal, pela qual foi candidato nas últimas eleições europeias em 2019, sem ter sido eleito.
Mas se a ligação política à AD não é evidente na presidência, há noutros membros administração sinais mais claros de envolvimento com os partidos do Governo. Paulo Rios de Oliveira fez grande parte da sua carreira no Parlamento, tendo sido deputado por mais de dez anos até à última legislatura. E foi enquanto deputado que foi coordenador de comissões parlamentar e vice-presidente da banca social-democrata na liderança de Rui Rio. É ainda advogado e consultor.
Também Francisco Catalão pode ser associado ao PSD, apesar de não ter pertencido a órgãos do partido. Foi um dos coordenadores para a área de economia e empresas do Conselho Estratégico Nacional (CEN), um órgão que reúne vários especialistas para ajudar a elaborar e fundamentar propostas temáticas do partido. Entrou no CEN no tempo de Rui Rio quando este conselho era presidido por Joaquim Miranda Sarmento. O agora ministro das Finanças escolheu-o para o pelouro financeiro da Aicep.
Até à data, Francisco Catalão era diretor de tesouraria da Nova Base, tendo passado por vários cargos em consultoras fiscais e pelo IGCP.
Governo exonera direção da AMA para “imprimir nova orientação”
O governo exonerou o conselho diretivo de três membros da Agência para a Modernização Administrativa (AMA) e, segundo noticiou o Observador, na origem da decisão esteve o “incumprimento de 70% das metas e marcos intermédios previstos no PRR para 2023, em particular, na abertura de novas Lojas e Espaços do Cidadão, com potencial impacto nas metas de desembolso previstas para 2026”; o “incumprimento de outras atividades previstas no Plano de Atividades para 2023”, uma “danosa gestão de recursos humanos que originou a saída de quase 80 trabalhadores da AMA, alguns em posições de chefia com impacto direto na organização” e a “falta de articulação com a tutela para intervenções de natureza pública e representação institucional”.
Governo exonera Conselho Diretivo da AMA alegando “incumprimento de 70% das metas” do PRR
O despacho de dissolução, porém, não menciona estas questões e justifica a decisão com os compromissos do programa do Governo, aponta a “premente necessidade de acelerar o cumprimento atempado dos compromissos assumidos” no âmbito do PRR e diz que “para implementar os compromissos assumidos pelo Governo é imperativa a mudança de orientação à gestão” da entidade.
O despacho fala na necessidade de “imprimir uma nova orientação à gestão” e, segundo a lei quadro dos institutos públicos, quando a cessação do mandato se fundamenta neste argumento, há lugar ao pagamento de indemnização quando tiverem passado mais de 12 meses do exercício de funções. Tanto João Dias (presidente), como Elsa Castro (vogal), foram nomeados primeiro via regime de substituição em setembro de 2022, mas após concursos da Cresap ficaram em comissão de serviço com efeitos a janeiro de 2023. Ou seja, os 12 meses já passaram.
Ao Eco, o presidente destituído João Dias — que se disse “surpreendido” com o comportamento da ministra — admitiu contestar por via judicial a demissão. O Observador tentou contactar João Dias e Elsa Castro (vogal também destituída) para perceber como vão proceder, sem sucesso. Também perguntou ao Ministério da Juventude e da Modernização se entende que há lugar a indemnização, mas não obteve resposta.
Segundo João Dias, o conselho diretivo da AMA “só teve duas reuniões com a ministra de cinco minutos cada” nas quais a ministra Margarida Balseiro Lopes terá feito um “grande pedido de informação” que garante ter entregado. A decisão de exoneração foi anunciada numa reunião que, diz, demorou cinco minutos. “Não apresentou uma fundamentação objetiva para tal decisão, apenas um conjunto de argumentos que não correspondem à realidade e verdade”, defendeu, numa publicação no LinkedIn, onde acusou a ministra de “muito pouca ética, condenável do ponto de vista humano, e com total desrespeito institucional pela agência”.
João Dias foi, então, exonerado, dando lugar a Sofia Mota. A diretora do TicAPP – Centro de Competências Digitais da Administração Pública é a escolha da ministra para nova diretora da AMA. O despacho com as nomeações em regime de substituição foi publicado esta sexta-feira e indica ainda Mónica Pinheiro Letra, que já era diretora na agência, e João Roque Fernandes, que esteve envolvido no projeto para o cartão de cidadão e que, tal como a nova presidente, passou pela empresa tecnológica Glintt.
João Dias tinha sido nomeado para presidente da AMA primeiro em setembro de 2022, em regime de substituição, e em janeiro de 2023, após concurso da Cresap, em comissão de serviço, depois de o anterior governo ter anulado o concurso feito pela comissão que pré-seleciona os altos dirigentes do Estado. Essa anulação aconteceu após o Executivo de então conhecer a shortlist com os três candidatos que aquela comissão considera os mais adequados, alegando que era preciso “atualizar” os critérios de seleção, perante uma “nova orientação” da entidade, que tinha mudado de tutela, tendo em conta o programa do Governo e o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
João Dias foi, então, exonerado, dando lugar a Sofia Mota, diretora do TicAPP – Centro de Competências Digitais da Administração Pública é a escolha da ministra para nova diretora da AMA. O despacho com as nomeações em regime de substituição foi publicado esta sexta-feira e indica ainda Mónica Pinheiro Letra, que já era diretora na agência, e João Roque Fernandes que esteve envolvido no projeto para o cartão de cidadão e que, tal como a nova presidente passou pela empresa tecnológica Glintt.
Vice do IEFP afastado, mas Governo diz que o nomeou para outro cargo
O vice-presidente do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) foi afastado pelo Governo, segundo avançou o Negócios na terça-feira e confirmou o Observador junto de uma fonte daquela entidade. Bernardo Santos e Sousa foi entretanto nomeado para gerir o plano Garantia Jovem. Este é um programa de apoio aos jovens na procura de emprego que funciona no quadro do próprio instituto, o que pode ser visto como uma despromoção na hierarquia do IEFP. Esta mudança levou ainda à cessação de funções da anterior diretora deste programa, Sara Ramos.
Governo coloca vice-presidente do IEFP (que sai do cargo) na direção da Garantia Jovem
Bernardo Santos e Sousa foi designado em comissão de serviço pelo período de cinco anos, com efeitos a 12 de junho de 2023 após concurso feito pela Cresap, ou seja, estava prestes a completar um ano no cargo. O facto de ainda não ter cumprido esse prazo pode desobrigar o Governo ao pagamento de uma indemnização. É que o estatuto do pessoal dirigente determina que “quando a cessação da comissão de serviço se fundamente na extinção ou reorganização da unidade orgânica ou na necessidade de imprimir nova orientação à gestão dos serviços, os dirigentes têm direito a uma indemnização desde que contem, pelo menos, 12 meses seguidos de exercício de funções“. Neste caso, como os 12 meses não foram cumpridos, poderá ficar afastada a possibilidade de indemnização.
O atual presidente do IEFP é Domingos Lopes, que assumiu funções em setembro de 2022, após concurso da Cresap. O Governo não disse ainda o que vai fazer ao restante conselho diretivo, que além de Domingos Lopes e Bernardo Sousa é constituída por Ana Elisa Santos (cuja comissão de serviço de cinco anos se iniciou em maio de 2023) e Glória Pinto (no cargo desde 12 de junho de 2023 mas em regime de substituição)
O dirigente já tinha sido vogal do mesmo instituto, mas foi afastado pelo então ministro do Trabalho, Vieira da Silva, no final de 2015, por via de um despacho que justificava a dissolução de todo o conselho diretivo com a necessidade de “adotar uma nova abordagem no desempenho das competências e atribuições” do instituto, “com vista a ser atingido um elevado grau de eficácia e eficiência, nomeadamente através da imposição de um novo ritmo na gestão dos recursos e do aumento da capacidade de resposta aos exigentes desafios que se colocam ao país”.
Governo justifica mudanças na direção do IEFP. Nova orientação, novo ritmo
Tal como na Segurança Social, mudanças no IEFP não são caso único quando o Governo muda. Vieira da Silva exonerou a direção do IEFP dois meses depois de tomar posse, em janeiro de 2016, assim como mais de 80 dirigentes intermédios e regionais daquela entidade, justificando com a necessidade de imprimir nova orientação estratégica aos serviços.
Segurança Social perde dirigente que alegou falta de confiança
Ana Vasques apresentou a demissão da presidência do Instituto da Segurança Social (ISS) alegando que o Governo mostrou falta de confiança política. Na carta de demissão, a dirigente — que tinha sido nomeada pelo anterior governo em julho do ano passado e que tinha mandato até 2028 — relacionou a decisão de sair com a posição pública assumida pela tutela a propósito dos acertos na retenção na fonte de IRS das pensões que foram feitos após as eleições, em abril e maio.
O caso foi noticiado pelo Negócios: em janeiro, as pensões foram pagas com uma “tabela provisória” de retenção na fonte, uma vez que a final não foi publicada a tempo do processamento das pensões desse mês. Essa tabela levou a que 184 mil pensionistas recebessem menos do que o suposto e 143,8 mil tivessem recebido mais. Em fevereiro, a nova tabela já foi aplicada, tendo os acertos de janeiro sido feitos após as eleições, em abril (para o primeiro caso) e em maio (para o segundo).
Perante a notícia, de 28 de abril, o Ministério do Trabalho lançou um comunicado em que criticou que a questão não tivesse sido mencionada por Ana Vasques na primeira reunião com a nova ministra, a 22 de abril, nem pela anterior tutela na reunião de transição. Mais: expressou “estupefação” e acusou o anterior governo de ter dado uma “ideia artificial” de aumento aos pensionistas com menos retenção de IRS.
Na audição no Parlamento, a 9 de maio, Ana Vasques justificou o atraso nesse acerto com questões informáticas, que só ficaram resolvidas após as eleições, e rejeitou ter havido qualquer intervenção da tutela. Na carta de demissão, diz que sentiu do Governo uma assunção de “falta de lealdade” da sua parte e considerou as imputações como “graves”.
A demissão só viria a ser apresentada a 17 de maio, um dia depois de a ministra do Trabalha, Rosário Palma Ramalho, ter ido ao Parlamento prestar esclarecimentos sobre a situação na Santa Casa e onde considerou que a transferência de 34 milhões de euros do ISS por despesas extraordinárias durante a pandemia — que permitiu à entidade liderada por Ana Jorge escapar dos prejuízos em 2023 — não tendo sido ilegal foi “quase imoral”, tendo em conta que a instituição já recebe grande parte da receita com jogos sociais, e é reveladora da “bengala do Estado”.
Segundo uma nota interna do ISS sobre o reembolso, consultada pelo Observador, em julho de 2023, o ISS pediu orientações ao então secretário de Estado da Segurança Social, Gabriel Bastos, sobre como proceder perante o pedido de pagamento da Santa Casa, uma vez que as “despesas excecionais” não se encontravam abrangidas” pelo protocolo entre o ISS e a Santa Casa de 2019. Foi Gabriel Bastos quem indicou ao ISS que elaborasse a adenda que permitisse o reembolso, que foi assinada em 8 de agosto, homologada a 9 de agosto pela então ministra Ana Mendes Godinho, e o pagamento feito a 17.
A carta de demissão de Ana Vasques não refere a transferência para a Santa Casa e associa a decisão de sair aos acertos nas pensões. A dirigente referiu que só tomou a decisão naquela altura por estarem encaminhados “assuntos de maior preocupação”, como as alterações no Complemento Solidário para Idosos (CSI), e para preservar a sua dignidade, bom nome, reputação e bom funcionamento do ISS.
Ana Vasques foi substituída por Octávio Félix de Oliveira, que foi vereador pelo PSD na Câmara de Torres Novas em 2003, além de ter sido secretário de Estado do Emprego entre 2013 e 2015, nos governos de Pedro Passos Coelho. Félix de Oliveira foi nomeado em regime de substituição, tendo-se o Governo comprometido a pedir a abertura do concurso. Ao Observador, a tutela apenas diz que “está a preparar” esse pedido.
As mexidas na Segurança Social quando há troca de tutelas têm precedentes. Meses depois de José Vieira da Silva assumir o ministério da Segurança Social no primeiro governo de António Costa, demitiu todo o conselho diretivo do Instituto da Segurança Social, alegando a necessidade de imprimir uma nova orientação estratégica à gestão dos serviços do organismo, que tinha sido nomeada em julho de 2015 (ou seja, não foram cumpridos os 12 meses).
Fernando Araújo demite-se para não ser “obstáculo” ao Governo
Fernando Araújo demitiu-se da Direção-Executiva do SNS alegando, na altura, que não queria ser um “obstáculo” às políticas que o Ministério da Saúde considerasse necessárias. Ouvido no Parlamento, a 22 de maio, Araújo esclareceu que quando o Governo entrou em funções, a Direção-Executiva já tinha preparado um plano de resposta para os meses de verão e inverno mas “não o quisemos apresentar” porque “não fazia sentido aplicar uma fórmula quando havia vontade de aplicar uma reforma diferente”. A demissão foi acompanhada pelo resto da equipa, num total de seis pessoas.
O Governo já anunciou o substituto. O tenente-coronel António Gandra d’Almeida ainda não foi nomeado porque faltam dois passos: é preciso que se concretize a desvinculação do tenente-coronel dos quadros do Exército para poder remeter o pedido de avaliação à Cresap ao perfil e às competências de Gandra d’Almeida. E isso ainda não aconteceu, mais de duas semanas depois do anúncio público do sucessor de Fernando Araújo.
Na altura em que Fernando Araújo anunciou a demissão, o Observador escreveu que o facto de o Ministério da Saúde ter divulgado publicamente, numa nota enviada às redações, o pedido de prestação de contas feito à sua equipa e que essa divulgação pública tivesse sido feita ao mesmo tempo que o pedido chegava à sede daquele organismo “não caiu bem” a Fernando Araújo e demonstrou “falta de cordialidade”. A relação de Fernando Araújo com Ana Paula Martins também terá “arrefecido” desde o momento em que a Ana Paula Martins decidiu renunciar ao cargo de Presidente do Hospital de Santa Maria, garante fonte próxima do diretor-executivo de saída.
O travão ao aumento de capital que levou o presidente da Águas de Portugal
Outra baixa nos dirigentes escolhidos pelos socialistas aconteceu na administração da Águas de Portugal. Mas, neste caso, a atuação do anterior Governo terá tido um papel no bater de porta do presidente, José Furtado.
O gestor viu-lhe recusado pelo novo Executivo um aumento de capital que teria sido prometido pelo ex-ministro das Finanças. O compromisso de Fernando Medina para injetar 100 milhões de euros na empresa pública seria uma contrapartida pela distribuição antecipada de dividendos extraordinários em 2023, uma operação que ajudou a compor as contas certas pelas quais os socialistas tanto se vangloriaram. Furtado demitiu-se pouco depois da realização da assembleia-geral para a qual chegou a estar previsto o aumento de capital que não se realizou, mas sem associar oficialmente a sua renúncia, que já teria sido pedida, ao episódio.
No mesmo dia foi anunciado o novo presidente para a empresa que está na tutela da ministra do Ambiente e Energia, Maria Graça de Carvalho. Apesar da formação em engenharia, o nome escolhido tem uma antiga conexão ao PSD. Carmona Rodrigues foi ministro das Infraestruturas de Durão Barroso e eleito em 2005 presidente da Câmara de Lisboa pelo mesmo partido, embora como independente.