894kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

i

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Mariana Vieira da Silva. "Miguel Albuquerque? PSD diz o exato contrário sem o mínimo de pudor"

A ainda número dois de António Costa no Governo acusa PSD de não ter qualquer "coerência" quando fala dos casos de Justiça que afetam o PS e do processo que levou à queda de Albuquerque na Madeira.

Mariana Vieira da Silva considera que Luís Montenegro está a utilizar a Justiça para atacar politicamente os socialistas, aplicando um critério totalmente diferente para avaliar o caso que culminou na queda de Miguel Albuquerque, presidente do Governo Regional da Madeira. “O que se pede neste momento é coerência. A partir do momento em que sobre cada caso digo o que digo conforme a proximidade que tenho ou deixo de ter à pessoa que é alvo daquela investigação, aí é que deixamos de poder ter um debate.”

Em entrevista ao Observador, no programa Vichyssoise, a ainda ministra da Presidência e número dois de António Costa, explica que precisou de “tempo” para reorganizar as ideias depois da demissão surpreendente do primeiro-ministro e recusa ter ficado neutral na disputa entre Pedro Nuno Santos e José Luís Carneiro por uma questão meramente tática. Agora, diz confiar no novo secretário-geral do partido e rejeita a ideia de que os erros que Pedro Nuno cometeu o venham a prejudicar. “O próprio já reconheceu esses erros. E aquilo que é preciso é a capacidade de os ultrapassar”, diz.

A ministra, que será cabeça de lista do PS por Lisboa, não resiste a responder a Aníbal Cavaco Silva, que, em dois artigos de opinião publicados no Observador, argumentou que o seu governo tinha sido capaz de fazer muito mais do que o atual. “Não surpreende ninguém que alguém que tinha este nível de azedume face ao resto do mundo enquanto era responsável político agora também o tenha.”

[Ouça aqui a Vichyssoise com Mariana Vieira da Silva]

Ciclone madeirense, equipa Pedro Nuno e fórmula AD

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“Neutralidade não foi uma questão tática”

Não apoiou nenhum candidato à liderança do PS por causa da “vinculação e dedicação” ao atual programa. Um mês depois já é cabeça de lista por Lisboa do novo PS e integra a direção de Pedro Nuno Santos. Já está convencida com as ideias do agora secretário-geral do PS?
O que aconteceu a muitos portugueses, mas naturalmente a mim de forma bastante intensa, foi que na sequência daquele dia 7 de novembro, a velocidade a que consegui processar aquilo que aconteceu não era compatível com os tempos que um partido tem de usar para se reorganizar. Nunca fez parte dos meus objetivos deixar de fazer parte da vida política do PS ou deixar de ter participação política. Mas quase nove anos da minha vida depois, naquele momento e perante uma reflexão que tinha que fazer, o sentimento que tive foi aquele que expressei publicamente. Agora creio que é o tempo de todos trabalharmos para o PS apresentar o melhor programa possível, fazer a melhor campanha possível e conquistar uma vez mais a escolha maioritária dos portugueses.

Portanto, está convencida?
Não era uma questão de convencimento; era mesmo uma questão de tempo. Nós somos seres humanos, não somos máquinas. Um dia acontece uma coisa e no dia seguinte é como se não tivesse acontecido.

Mas não foi estratégico não ter apoiado ninguém, manter-se ali neutra?
Não. Aqueles dias foram passados num processo de pensamento sobre se tinha ou não capacidade de dar aquele passo e senti que não tinha e achei que o devia exprimir. Nunca foi por nenhuma questão tática, aliás, era mais fácil ter assumido do que ter de estar sempre a explicar porque é que não apoiava nenhum candidato. Mas na vida, às vezes, também é preciso seguirmos as nossas convicções e também as nossas emoções. E aquele momento foi um momento particularmente emotivo que não é comum na política.

Não teme que estejam demasiado presentes na cabeça dos eleitores os erros que Pedro Nuno Santos cometeu enquanto ministro? Como é que, enquanto colega do Governo, consegue compreender o que aconteceu com o despacho do novo aeroporto, que depois foi revogado?Pedro Nuno Santos já respondeu por isso e já explicou que considera que foi um erro que cometeu. Foi essa avaliação também que o Governo, na altura, fez sobre aquele momento e a partir do momento em que a situação foi ultrapassada, também foi ultrapassada para mim. Agora é o momento dos partidos falarem com os portugueses sobre as suas propostas e é isso que me parece ser o central que devemos fazer. Tudo o que nós fizemos na vida, de bem e de mal, acompanha-nos sempre e, naturalmente, acompanha também o secretário-geral do PS. Estou convencida de que ele tem a capacidade, e é isso que tem demonstrado, de superar esses problemas e de apresentar ao país um pacote de políticas e uma estratégia que convença os portugueses. É para isso também que ele trabalhará.

“Pedro Nuno já reconheceu erros”

Mas nas eleições, e em particular nas eleições legislativas, também há uma avaliação da personalidade e do currículo de quem se candidata, embora seja uma eleição por partidos. Este episódio do aeroporto, a que se pode somar também a questão da demissão/ indemnização a Alexandra Reis, não demonstra a impreparação de Pedro Nuno Santos para ser candidato a primeiro-ministro ou para ser primeiro-ministro?
No fim de sete anos, que foi o tempo que o Pedro Nuno esteve no Governo, todos cometem erros, o que têm é de saber reconhecê-los e definir uma estratégia para os ultrapassar. Ninguém está isento, quando está na vida política durante um período longo, de fazer coisas de que se arrepende e que procura melhorar. Quando alguém vai a eleições, qualquer pessoa, vai sempre com tudo o que fez, com a sua energia, com os erros que pode ter cometido. E o que importa é mesmo a vontade de os ultrapassar, porque senão, então, ao primeiro erro, qualquer pessoa deixaria de ter qualquer profissão.

Não foram erros menores.
A mim não cabe qualificar, mas o próprio já reconheceu esses erros. E aquilo que é preciso é a capacidade de os ultrapassar e o país tem neste momento um processo em curso para decidir onde será o próximo aeroporto e agora é andar para a frente e construir as melhores soluções. Há uma coisa que sei: não há nenhum candidato a estas eleições que não tenha de prestar contas pela vida e pelas opções políticas que fez. Não é uma especificidade dos candidatos do PS, só porque neste momento está no Governo. Há muitos que têm muito a explicar sobre as suas opções. O presidente do PSD, por exemplo, enquanto líder parlamentar de uma maioria que não deixou saudades aos portugueses. Faz parte da vida.

Luís Montenegro tem sombras maiores do que Pedro Nuno Santos?
É o que têm mostrado os resultados de todas as eleições desde 2015, que os portugueses sabem que o PS tem de estar sempre do lado das melhorias nas suas vidas, apesar das dificuldades. E essa não é a avaliação que as pessoas fazem, nem das propostas do PSD, nem dos seus portugueses.

Concorda com a desaceleração do ritmo de redução da dívida pública defendida por Pedro Nuno Santos? E com o fim da ideia do Fundo Medina para guardar o excedente desse exercício?
Temos um caminho que o país tem feito de redução da dívida. Era um caminho que vinha a ser feito até à pandemia e depois a economia sofreu os efeitos da pandemia, a dívida voltou a aumentar e foi preciso retomar esse caminho de redução. E chegaremos ao fim deste ano com níveis de dívida que não serão mais altos. Em cada momento devemos olhar para a situação do país e definir os objetivos que devemos ter para
a dívida, que nunca são independentes da situação económica. Se o ano 2024, como alguns preveem, for um ano difícil para a economia europeia, naturalmente que o país tem outras prioridades que tem que assumir esse equilíbrio, sendo o objetivo a redução da dívida e ter as contas públicas em ordem, o equilíbrio do grau e do ritmo é um equilíbrio que tem que ser revisto sempre. O PS ainda não apresentou o seu programa e esse é o momento em que essas opções políticas têm que ser demonstradas, mas elas não são teóricas nem são fora do contexto político. É evidente que o caminho que foi possível fazer nestes dois anos torna o caminho que falta fazer mais.

Mas o ritmo tem que ser revisto em relação a que ritmo? Atualmente é acelerado e o país tem alguns problemas em serviços públicos por resolver. É desejável desacelerar o ritmo já para responder a essas urgências?
Não creio que possa ser possível defender que os problemas que o país tem com os serviços públicos dependem do nível de investimento, porque o ritmo a que o investimento público nos serviços públicos tem crescido nos últimos anos é muito maior. Não houve nenhuma redução do investimento, nem do financiamento do SNS, pelo contrário. O que se passa no SNS não pode ter a ver com o nível de investimento que foi feito no SNS, porque o crescimento do investimento feito no SNS nos últimos anos foi muito significativo.

Mas a pergunta aqui é se já estamos na fase de reduzir o ritmo.
Já retomámos aquilo que era o nosso objetivo em 2015, no fundo corrigindo o efeito de subida da dívida pública que existiu na pandemia. E agora é tempo de olhar para esse cenário macroeconómico e ver em que medida é que precisamos de reduzir, mas isso não é independente da situação económica. Ninguém esteve a tentar reduzir a dívida pública durante os dois anos de pandemia. Tivemos a apostar em medidas que permitissem o apoio à nossa economia. E é sempre essas opções que são feitas e esse é o caminho que venceu as eleições no PS e que agora será concretizado.

"Pedro Nuno? Tudo o que nós fizemos na vida, de bem e de mal, acompanha-nos sempre e, naturalmente, acompanha também o secretário-geral do PS. Estou convencida de que ele tem a capacidade, e é isso que tem demonstrado, de superar esses problemas e de apresentar ao país um pacote de políticas e uma estratégia que convença os portugueses. É para isso também que ele trabalhará"

“AD? O estado-maior do passismo, com exceção de Passos, foi chamado a intervir”

Pedro Nuno de Santos foi buscar a número dois de António Costa para a sua direção e para as suas listas de candidatos a deputados. Foi buscar o ministro das Finanças e mais 16 governantes que estão atualmente em funções. O PS tem falta de alternativas para se fazer representar perante os portugueses?
Não creio. Esta conversa sobre a renovação precisa de ser posta em perspetiva porque na convenção da AD nas últimas semanas foi preciso ir buscar ministros do cavaquismo. O próprio Cavaco Silva tem sido chamado sucessivamente a intervir, todo o estado-maior do passismo, com exceção do próprio Passos Coelho, e portanto os partidos têm os seus militantes, têm a sua história, vivem com a sua história, e as listas do PS têm um grande equilíbrio entre renovação e continuidade, como é próprio de um partido. Nunca tinha sido cabeça de lista, é a primeira vez que serei cabeça de lista, metade dos cabeças de lista nunca foi cabeças de lista e a outra metade já foi e isso faz parte de um equilíbrio que pode parecer estranho à direita, mas que sempre existiu no PS.

Não têm, por exemplo, pessoas da sociedade civil que era importante chamar? António Costa em 2015 chamou vários independentes até para cabeças de lista e tinha o grupo de peritos na economia, onde estavam Mário Centeno e João Leão. Pedro Nuno de Santos tem incapacidade de chamar e de atrair essas pessoas da sociedade civil? Está mais fechado sobre o partido?
Nós não podemos comparar umas eleições em que durante um ano António Costa preparou um programa, num momento de viragem de estratégia política e de estratégia económica para o nosso país, com umas eleições que foram surpresa para todos, um momento em que o partido teve que mudar de liderança. Não são dois momentos comparáveis.

Então Luís Montenegro está mais preparado que Pedro Nuno de Santos?
Não. E porquê que não está? Porque aquilo que o PSD devia estar a demonstrar agora, ou a AD – não sei exatamente como é que se apresentarão desse ponto de vista programático – era a proposta de uma alternativa. E quando se constrói uma alternativa, quando se diz “nós vamos fazer completamente diferente”, aí sim é preciso demonstrar que aquela alternativa é fazível. A proposta do PS é de um novo impulso num caminho que está a ser tido. Há diferenças entre chegar e dizer “vamos virar uma página, vamos fazer completamente diferente” ou “vamos dar um novo impulso ao nosso trabalho”. Aquilo que se vê do PSD é que ao fim de oito anos e meio tem a mesma capacidade que teve nestes oito anos e meio de marcar a agenda, que é nula, nenhuma capacidade de apresentar políticas tecnicamente sustentáveis. Ainda nos últimos dias foi apresentado o cenário macroeconómico sem contas sobre as medidas que aumentam mais a despesa, sem nenhuma justificação.

Mas o tal novo impulso não corre o risco de ser um mais do mesmo, na medida em que as pessoas são as mesmas?
O PS está agora a ouvir as pessoas, os independentes e a fazer o seu processo de audição para a construção do programa do Governo e não me cabe a mim, como é evidente, antecipar medidas de um programa que o PS ainda não apresentou.

Portanto, ainda tem esperança de que Pedro Nuno consiga chamar esses independentes?
No congresso do PS houve mais novidade política do que o PSD se foi capaz de mostrar no último mês e meio e isso foi visível, incluindo aqui no Observador, com múltiplos comentários às medidas de política lançadas. Agora, quem chega de novo e diz que a estratégia económica está em perigo, está toda errada, como é o caso da AD, tem de demonstrar que é capaz de fazer. Foi isso que o PS fez em 2015 e todos os números que apresentámos em 2015 têm vindo a bater certo, apesar da pandemia, apesar da inflação. Pedro Nuno e o PS já disseram que é no quadro do programa de estabilidade apresentado que definirão as suas políticas.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

“É mau para o sistema político a ideia de que os dois maiores partidos estão juntos”

A seguir às eleições podemos ter o seguinte cenário: a AD ganha sem maioria, recusa falar com o Chega, que é o que tem dito Luís Montenegro, e André Ventura apresenta uma moção de rejeição. Pedro Nuno de Santos já disse claramente que não viabilizaria um governo minoritário da AD. Isso não é um erro?
Os portugueses vão votar e é em função do peso que cada partido tiver que deve haver uma discussão sobre os cenários eleitorais, porque tudo o resto é condicionar um raciocínio a uma lógica que nós não sabemos se vai verificar-se. Foi isso que aconteceu em 2015.

Então Pedro Nuno de Santos deve dizer que não viabiliza um governo da AD.
Defendo que é mau para o sistema político, e ainda mais no momento que vivemos, a ideia de que os dois maiores partidos estão juntos, porque isso significa um reforço dos extremos que não é desejável em nenhuma democracia. Isso é diferente de pensar como é que podem ser as coligações. Há dois anos esta pergunta podia ter sido feita exatamente como está a ser feita agora, e depois houve uma maioria absoluta. O momento é de dar voz aos portugueses, de eles escolherem as suas políticas, porque qualquer discussão sobre coligações ou acordos parlamentares nasce de quais são as políticas que tiverem mais força. É daí que nasce a discussão sobre os cenários.

Por um princípio de transparência, depois do que aconteceu em 2015, que acabou por surpreender as pessoas, não era mais transparente dizer exatamente ao que vêm?
Não posso aceitar a ideia de que foi surpreendente. Desde o congresso de 2014 que o PS tinha como elemento central da primeira moção do António Costa, depois da agenda para a década, a ideia do fim do arco de governação.

Mas daí a entender-se com o PCP e o Bloco de Esquerda vai um caminho grande.
E podia não ter havido entendimento. Aliás, as negociações foram muito longas e intensas. E porque é que foi possível o entendimento? Porque os partidos tinham os seus programas e foi possível entenderem-se nos conteúdos dos seus programas.

Um dos cenários é o PS ficar à frente nas eleições, mas existir uma maioria de direita no Parlamento. O país está condenado a ter eleições pouco depois das de março e a andar sempre em mini-ciclos políticos. Perante isto, os dois maiores partidos não deviam arranjar formas de entendimento?
Se há um partido a quem não pode ser colocada essa questão da instabilidade neste momento é o PS, porque havia uma maioria absoluta. A proposta que o PS fez foi com base nessa maioria, para que depois da demissão do primeiro-ministro, que foi uma decisão individual e em nome da sua consciência, se pudesse garantir uma estabilidade. Essa não foi a decisão e agora é o tempo dos portugueses votarem. A minha convicção é que os portugueses vão sabiamente votar no partido que tem sido mais capaz de garantir a estabilidade ao longo das últimas décadas.

“Esquerda? Depois da rutura, termos das negociações não são exatamente os mesmos”

O Bloco de Esquerda tem desafiado o PS a falar claramente sobre se está disponível para um novo acordo à esquerda. Depois do chumbo do orçamento de 2021, há condições para se voltarem a entender? Há essa confiança?
Só foi possível um acordo em 2015 porque foi possível entendermo-nos num conjunto de medidas de política. E por isso, o fundamental é que os partidos apresentem os seus programas. Que os portugueses façam as suas escolhas e que em função do peso que cada partido também tem nas preferências dos portugueses, possam existir essas negociações. Se a pergunta é se partimos para negociações exatamente nos mesmos termos do que acontecia antes de uma rutura, nunca é. Se é impossível, também não é. Depende da capacidade que os partidos tenham de fazer esse diálogo. Há uma coisa fundamental: é que o PS vá a eleições com o seu programa.

Mas em 2019 dizia que uma nova geringonça era possível e desejável, e depois o PS não quis assinar acordo escrito com as condições que o Bloco de Esquerda lhe propôs. Desta vez, um acordo escrito era uma condição para assegurar que uma maioria parlamentar não se desfaz?
Essa é uma visão puramente formal do processo. O que aconteceu não foi isso. O que aconteceu foi que desse acordo escrito constavam prioridades contrárias ao programa do PS, coisa que não aconteceu em 2015 onde também houve um acordo escrito. O voto dos portugueses é feito para se procurar identificar a quem cabe liderar uma estratégia de governação e naturalmente isso não pode ser feito traindo medidas que são fundamentais no programa de um partido.

O Bloco o que tem proposto é precisamente que durante a campanha possam falar de conteúdos, apresentar os programas e falar de conteúdos, para que depois haja uma previsibilidade até para os eleitores sobre se podem chegar a acordo ou não.
Mas este é o momento de falar para os portugueses. Os partidos depois terão que criar as condições.

O PS nesta altura não deve responder, por exemplo, ao desafio do Bloco?
As coligações, ao serem pós-eleitorais, dependem de escolhas dos portugueses que ainda não aconteceram. E nós passámos as últimas eleições todas a fazer cenários que ficaram muito longe daqueles que se verificaram. Não é nos cenários teóricos que discutimos que os portugueses se baseiam, mas na escolha das políticas e dos seus protagonistas.

No Congresso do PS ouvimos António Costa dizer que “melhor do que o PS só o PS”. Esta semana tivemos uma manifestação histórica das forças de segurança, temos evidentes problemas que o PS também reconhece na saúde, nas escolas, no acesso à habitação. Está a faltar ao PS capacidade de autocrítica?
Não julgo que falte. A política, talvez a sua dimensão mais fascinante, para quem a faz e imagino que também para quem enquanto jornalista a acompanha, é esta ideia de que é sempre algo inacabado. Nós temos sempre a capacidade de melhorar aquilo que fizemos. Nenhuma das áreas que referiu, nem a Saúde, nem a Educação, nem as Forças de Segurança, estiveram ausentes das prioridades políticas dos governos do PS. Em todas elas houve recuperação de rendimentos dos seus profissionais, houve uma aposta sem precedentes, por exemplo, na área das infraestruturas e dos equipamentos de segurança. Aquilo que sabemos é que há sempre mais a fazer, ou mais e melhor a fazer.

O PS teve tempo. Na habitação temos manifestações agora que não aconteciam nessa altura. As pessoas parecem sentir mais na pele esses problemas agora, ao fim de oito anos.
Há oito anos o mundo não vivia um problema habitacional como hoje toda a Europa e o mundo vivem. Os problemas também são novos. A minha questão é simples. Ontem, nas últimas horas, o PSD apresentou o seu programa para a Saúde e ele passa, uma vez mais, por apostar em tudo, menos no SNS. E essa é que é a escolha que vamos fazer quando dizemos que “melhor que o PS só o PS”. Significa que entendemos, naturalmente em causa própria, que aquele partido que tem capacidade, que tem tido a capacidade nos últimos anos de superação dos desafios que entretanto aparecem, ou até desafios que já existiam mas que houve outras prioridades, é o PS. E isso tem sido visível. Até nas propostas que uns e outros já apresentaram, ainda que faltem ainda algumas semanas para as eleições.

Mas Pedro Nuno Santos na Comissão Nacional do PS disse que “não está tudo bem”, e que há portugueses que estão descontentes e que estão zangados e aconselhava o PS a ter humildade no discurso. Como é que se faz, ao mesmo tempo, a defesa do legado de António Costa? E isso não pode prejudicar esta reconciliação que Pedro Nuno Santos quer promover com os eleitores?
O PS ganhou as eleições com maioria absoluta quando já existiam muitos descontentes. A maioria é isso mesmo, é uma maioria, não é uma unanimidade e ninguém espera, em política, uma unanimidade, a não ser que esteja preparado para grandes desilusões. Aquilo que se passa é, nós temos de conciliar o reconhecimento do legado com aquilo que há para melhorar, mesmo em áreas onde o PS já trabalhou e com medidas de política novas que um novo líder sempre aprendeu. E é isso que demonstram listas em que metade das pessoas já lá estavam e a outra metade são novas e é isso que demonstra também um discurso político que identifica os problemas novos e as soluções novas que trará e que apresentará aos portugueses no início do mês de fevereiro.

"Aquilo que se vê do PSD é que ao fim de oito anos e meio tem a mesma capacidade que teve nestes oito anos e meio de marcar a agenda, que é nula, nenhuma capacidade de apresentar políticas tecnicamente sustentáveis. Ainda nos últimos dias foi apresentado o cenário macroeconómico sem contas sobre as medidas que aumentam mais a despesa, sem nenhuma justificação"

“Quedas de Costa e de Albuquerque? PSD tem disse exatamente o contrário”

Dentro do PS há quem defenda que o Ministério Público está a ganhar um peso perigoso sobre as decisões políticas. Concorda com essas críticas? Há um risco de termos uma Procuradoria Geral de República a ditar decisões políticas ou quem está em condições de governar?
Julgo que é visível por todos que é preciso olharmos para a forma como a Justiça tem tido uma implicação direta com o dia-a-dia da política. Não significa isto nenhuma limitação à autonomia, mas sim com a avaliação sobre em que termos é que este impacto tem tido. O impacto não se constrói apenas de um lado. Quando nós vemos, como vimos nas últimas horas [de quinta-feira], um partido político como fez o PSD, que no dia 7 de novembro disse uma coisa sobre um caso de Justiça e ontem disse o seu exato contrário sobre o que se passou na Madeira. Isso é que é uma utilização daquilo que se passa na Justiça para a política e aquilo que se pede neste momento é que a Justiça tenha uma capacidade de fazer as suas decisões. O que se pede neste momento é coerência. Se achamos que existe um debate a fazer sobre a Justiça em Portugal, esse debate tem de partir de uma coerência de posições. A partir do momento em que sobre cada caso digo o que digo conforme a proximidade que tenho ou deixo de ter à pessoa que é alvo daquela investigação, aí é que deixamos de poder ter um debate. Julgo que os últimos tempos têm mostrado que para a Justiça se manter autónoma da vida política, também precisa de ser célere e de dar condições para que os portugueses possam fazer as suas avaliações e isso é urgente, sob pena, de ficar um manto de suspeita que muitas vezes não se concretiza nem numa acusação, apenas numa suspeita, outras vezes numa acusação mas não numa condenação.

E o PS descobriu essa urgência oito anos depois?
Não, não descobriu essa urgência oito anos depois, mas o debate que nós estamos a ter e que vimos nos últimos dias mostra a dificuldade.

Mas porque é que não o fez, quer com uma maioria absoluta em mãos, como teve nos últimos dois anos?
Nunca poderá ser uma reforma feita com base numa maioria absoluta.

Teve um líder da oposição que estava disponível para fazer esse debate com o PSD.
Com certeza, com certeza, e essa é uma avaliação que temos que fazer, agora, a ideia de que é com uma maioria absoluta que se faz uma reforma desta natureza.

Mas também não se vê o PS muito empenhado em manter um diálogo com o PSD ou nesta matéria admitem que deve ser feito esse diálogo.
Mas como é que se pode fazer um diálogo com um partido que há um mês e meio disse uma coisa sobre um caso judicial e ontem disse o seu exato contrário sem o mínimo de pudor.

Rio tinha uma reforma, por exemplo, e o PS não o quis ouvir na mesma.
Com certeza, porque não concordava com a reforma proposta e admito que isso tenha sido algo em que devêssemos ter trabalhado. Aquilo que estou a dizer é que não parece que seja com uma maioria absoluta que este tema se resolve. Isto exige uma reflexão de toda a sociedade, incluindo da comunicação social, pela forma como muitas vezes se noticiam evidências que afinal não o são ou se noticiam casos que afinal não o eram. Aquilo que é fundamental para que esse diálogo possa ser tido é que sejamos todos coerentes nas nossas posições e não façamos como ontem fez o PSD, que é dizer sobre um caso que afeta o seu partido, o exato contrário que disse sobre o caso que levou à admissão dos ministros.

No caso da Madeira, há uma questão também de coerência dos políticos depois daquilo que António Costa fez. Miguel Albuquerque tem condições para continuar como Presidente do Governo Regional ou devia sair?
António Costa tomou uma decisão com base na sua consciência e na relação que entende ter com os seus eleitores e com os portugueses. É uma decisão individual que eu respeito e admiro. Não me leva a esperar de outros o mesmo que espero do António Costa.

Acha que ele não devia sair?
Não, esse não é o ponto. Eu não acho que alguém, por ter sido constituído arguido, tenha que se demitir. É uma avaliação que cada um faz e que não tem a ver com o estatuto de arguido. Ou de suspeito. Ou com as notícias que saíram. Tem a ver com uma avaliação individual. Aquilo que critico é a falta de coerência daqueles que nessa manhã de 7 de novembro exigiam uma demissão e que ontem disseram o seu contrário. A questão individual da tomada de decisão é distinta, agora a posição política carece de coerência e o PSD não a teve.

“Eventual instabilidade? Presidente da República tem de assumir responsabilidade”

A estabilidade para executar o plano de recuperação e resiliência foi um argumento utilizado pelo Presidente da República para formalizar a dissolução mais tarde e aprovar o Orçamento do Estado. Este argumento devia ter sido considerado por Marcelo para não dissolver de todo e manter a maioria socialista que existia no Parlamento?
Essa decisão, havendo uma maioria absoluta no Parlamento que demonstrava a sua capacidade, que nunca demonstrou nenhuma fragilidade interna, não tem a ver com o PRR.

Nunca demonstrou nenhuma fragilidade interna?
Não. Qual foi a votação em que o PS se dividiu e que pôs em causa a estabilidade política.

Mas não havia estabilidade no Governo.
Não, não. A estabilidade da maioria absoluta nunca esteve em causa e eu não me parece que o PRR seja um motivo por si só. Era o que faltava, que os fundos europeus agora pusessem em causa decisões democráticas. A razão pela qual o PS defendia que a maioria devia poder continuar tem a ver com o facto de ela ser a vontade do povo. O povo votou maioritariamente pela não existência de eleições e quando nós agora olhamos para o cenário que vocês há pouco me colocaram, de ciclos curtos, isto significa que vamos seguir um caminho completamente contrário àquilo que era a vontade dos portugueses.

É responsabilidade do Presidente da República?
O Presidente da República decidiu algo que tinha toda a legitimidade para decidir e quando assim é, naturalmente, as consequências e as responsabilidades são de quem tomou a decisão.

O PSD tem acusado o Governo de Estado de utilizar o PRR para resolver o investimento público que não fez nos últimos anos. O Conselho de Finanças Públicas tem apontado esse fraco nível de investimento público de forma recorrente. É caso para dizer que Montenegro acertou nesta análise?
Não, porque é caso para dizer que nós talvez não tínhamos percebido a dificuldade que ia ser, depois de uma quebra total de investimento público, retomar níveis de investimento público significativos. É muito visível, enfim, qualquer pessoa que tenha precisado de fazer uma pequena obra sabe isto, mas ainda mais níveis elevados de investimento público, que as empresas da construção civil tinham ficado numa situação de enorme fragilidade, os profissionais da área, especialmente os profissionais altamente especializados na área da construção, tinham saído do país e foi difícil retomar um nível rápido. Agora, no ano passado utilizámos 5,3 mil milhões de fundos europeus executados. E isso foi muito rápido. Os fundos europeus foram executados no ano de 2023 e com a média que ao longo dos anos o país tem conseguido executar mais que duplicámos e isso é um sinal de grande capacidade. E o investimento público, o que aconteceu foi que demorou a arrancar a seguir a 2017 e agora é preciso que continue a crescer a esta velocidade porque teremos que atingir só investimentos militares.

E esse investimento público foi cortado agora, quando estava em velocidade cruzeiro?
A minha convicção é que o país terá a sabedoria de não perder esta oportunidade. Isto significa que mesmo em gestão há decisões que o governo vai ter que tomar para poder cumprir os compromissos que tem com a UE. Portugal é hoje um dos dois países da União Europeia que já recebeu quatro fatias do PRR, o que significa que já cumpriu quatro etapas. O país saberá entender que, no contexto de maior instabilidade política em que vive, o cumprimento do PRR tem que estar acima dessa instabilidade. Enquanto ministra com responsabilidades nessa área, posso garantir que o governo tudo fará para deixar o quinto pedido de pagamento pronto para ser entregue no devido tempo.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

“Para Cavaco, a única pessoa que está incluída na boa moeda é ele próprio”

O outro grande momento que Portugal teve com a entrada de tantos fundos europeus foi no momento da adesão, com Cavaco Silva a primeiro-ministro. Nas últimas semanas, o antigo primeiro-ministro e Presidente da República tem escrito alguns artigos de opinião a mostrar que fez mais com esses fundos do que este governo. É justa esta comparação?
Não é justa porque os momentos não são comparáveis, porque muitos dos factos que o antigo Presidente da República cita no seu artigo também não correspondem à verdade, alguns de forma bastante evidente, como no caso da barragem do Alqueva. O que queria dizer, e a propósito de renovação, é que sempre que o país se aproxima de uma decisão política o antigo Presidente da República, Cavaco Silva, volta com o mesmo tom, com o que aliás foi primeiro-ministro. Não surpreende ninguém que alguém que tinha este nível de azedume face ao resto do mundo enquanto era responsável político agora também o tenha. É algo a que a os portugueses já estão habituados.

Acha que este Governo não perde no termo de comparação.
Os momentos são completamente distintos. A complexidade de fazer uma obra pública hoje, em relação àquela que existia nos anos 1980, é do dia para a noite. As preocupações ambientais, as regras da contratação pública, são incomparáveis. Estamos habituados. Quando chega a eleições, há sempre dois ou três artigos do ex-presidente da República a demonstrar que a única pessoa que está incluída na boa moeda é ele próprio.

Até mesmo durante a estabilidade da maioria absoluta foram existindo esses artigos.
Certo, faz parte da personalidade. Fez sempre, mesmo enquanto político, tinha uma determinada forma de defender a verdade e a relação com a oposição que permanece a mesma agora, já na idade da reforma.

Estaria disponível para vir a integrar uma lista para o Parlamento Europeu, por exemplo?
Não penso assim na minha vida política. Sou membro deste governo, com muita honra, muito orgulho, e ainda há trabalho a fazer até haver um novo governo. Aceitei pertencer à direção do PS e sou cabeça de lista por Lisboa, com muito orgulho, neste equilíbrio entre defender o nosso legado e propor novas medidas. Aquilo que farei e a forma como participarei nessa equipa, que é sempre assim que me vejo, depende. Há tantas coisas que ainda não vislumbro, que não tenho nenhuma posição sobre o futuro
a não ser estes compromissos que assumi, aos quais me dedico com uma intensidade que me impede de pensar no dia de amanhã.

Portanto, presumimos também que não vai responder se quer voltar ou não a ser ministra.
Não, acho que este não é o momento. Estou muito empenhada ainda no meu trabalho e por ter responsabilidade sobre as matérias de fundos europeus.

Mas reconhece que havia aí uma lógica de continuidade, que poderia ser conveniente a Pedro Nuno Santos, na gestão dos fundos comunitários.
Tenho uma profunda convicção de que quando nós fazemos parte de equipas, isso depende da forma como elas se constituem. Para já, é concentrar-me nas minhas
funções governativas, implementar e executar os fundos europeus e, naturalmente, fazer as outras dimensões em que há menos urgências do meu trabalho e, enquanto candidata do PS, contribuir para uma grande vitória no dia 10 de março.

"Quando chega a eleições, há sempre dois ou três artigos do ex-Presidente da República a demonstrar que a única pessoa que está incluída na boa moeda é ele próprio. Faz parte da personalidade. Fez sempre, mesmo enquanto político, tinha uma determinada forma de defender a verdade e a relação com a oposição que permanece a mesma agora, já na idade da reforma"

“Tanto o país como a Europa beneficiarão muito do talento de António Costa”

Vamos avançar para o segundo segmento do nosso programa, o Bloco Carne ou Peixe, em que o convidado tem de escolher uma de duas opções. Preferia ter um governo da AD, mas já na nova sede, ou que a transferência para um novo edifício nunca acontecesse e o PS mantivesse no poder?
Julgo que o que é melhor para o país é o PS permanecer no poder. Mas vou dizer que é uma área de grande consenso. Os diferentes governos procuraram sempre um sítio onde se pudessem reunir todos os ministérios.

Isso vai correr bem? Todos os dias juntos?
Julgo que sim. Cabe ao futuro ministro da Presidência saber agregar essas equipas.

Preferia ter o Presidente da República todos os dias, mas mesmo todos os dias, da sua vida a pedir-lhe resultados no PRR ou voltar a ter de fazer conferências de imprensa sobre a pandemia?
Vou escolher a primeira, porque isso significaria que a nível europeu se tinha encontrado uma forma de ter instrumentos de reforma como são o PRR. De resto, a democracia trataria que não fosse sempre eu.

É uma nadadora exímia. Estava na água e via Luís Montenegro e André Ventura em dificuldades. Quem é que salvava primeiro? Se quiser salvar…
Salvaria sempre. Espero que soubesse avaliar quem é que estava em maiores dificuldades…

Quem é que acha que pode estar em maiores dificuldades?
Nunca os vi a nadar.

Mais depressa ia jantar com António Costa num restaurante em Bruxelas ou com Pedro Nuno no Il Matriciano, o restaurante italiano em frente à Assembleia da República?
Já jantei com os dois em ambos esses sítios e aí não vou mesmo escolher. Espero que no futuro seja possível fazer as duas coisas.

Sentar todos à mesma mesa.
Isso é muito frequente. Essa visão de que nos partidos políticos quem discorda politicamente não tem capacidade de diálogo é falsa e, como o Pedro Nuno explicou no seu primeiro jantar enquanto Secretário-geral do PS, António Costa, Pedro Nuno Santos e eu fizemos parte de uma equipa que almoçava, jantava com muita frequência e da qual creio que os três temos saudades.

Continua a achar que ainda pode ir ter com António Costa a Bruxelas…
Julgo que tanto o país como a Europa beneficiarão muito do talento, da capacidade, da criatividade política que o António Costa sempre nos trouxe e espero que nos continue a trazer.

Até podia ser uma maioria, um Governo e um Presidente.
Não é o PS que tem essa obsessão. Mas convenhamos que tem estado mais próximo desses bons resultados.

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça até artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.