Alexandra Leitão, ex-ministra de António Costa e atual coordenadora do programa eleitoral de Pedro Nuno Santos, admite que o novo líder do PS estará de alguma forma condicionado pelas críticas à sua apontada impulsividade e que isso o pode estar a condicionar nos debates televisivos. Sem apontar críticas diretas, a antiga governante não deixa de assumir: “Se calhar, em alguns momentos, eu seria mais assertiva”.
Em entrevista ao Observador, no programa “Vichyssoise”, Alexandra Leitão sugere que a solução nos Açores ainda não está resolvida e que é possível que PSD e Chega ainda se venham a entender. Quanto ao que pode acontecer no continente, a socialista diz não ter razão para duvidar da palavra de Luís Montenegro em relação ao “não é não” a Ventura, mas adianta outro cenário: se o PSD precisar do Chega para governar, vai libertar-se de Montenegro e arranjar outro líder que faça essa aliança.
Quanto a uma das medidas mais polémicas do programa de Pedro Nuno Santos — a ideia de avaliar limites para os médicos que estão no SNS irem para o privado –, Alexandra Leitão recusa as críticas, que chegaram de sindicatos e do ex-ministro da Saúde Adalberto Campos Fernandes e fala numa tentativa de condicionar o novo líder socialista.
“Tem havido – e tenho que dizer isto sobre esta medida, mas em geral – da parte, quer da oposição, quer de muitos políticos, que não têm a mesma visão, quer de muitos comentadores, um permanente atirar de epítetos, como o Plano Quinquenal, como planificação, como sovietização, como stalinização. Que sim, tendem e querem condicionar o secretário-geral. Mas são muito injustos”, diz.
“Há um novo ciclo no PS. Não é preciso mudar de partido para ter um novo ciclo”
Pedro Nuno Santos tem sido muito criticado por estar pouco solto nos debates. Estará a tentar passar a tal imagem de uma pessoa que não é impulsiva? Acredita que tem estado contido, excessivamente contido?
Esse discurso, que foi muitas vezes repetido até na eleição interna do Partido Socialista, obviamente muitas vezes repetido, acaba por condicionar um pouco a pessoa. Nunca achei que fosse impulsividade. Acho que é muita assertividade, muita vontade de fazer coisas e isso permanece lá. Agora, é evidente que, neste momento, é candidato a primeiro-ministro. E isso também implica uma certa postura, que não descarta essa assertividade ou essa capacidade de agir. Se calhar, em alguns momentos, seria mais assertiva. Mas isso sou eu. Mas acho que o que é importante é assertividade, capacidade de ação. E novas ideias. Acho que é muito importante perceber que há novas ideias, de facto. E novas medidas.
Mas as sondagens apontam para uma aparente inversão da tendência nas intenções de voto. O Partido Socialista já percebeu o que está a falhar nesta pré-campanha ou não está a falhar nada?
Não sei se alguma coisa está a falhar. Podem estar a falhar as sondagens. São indicadores importantes. Não as desvalorizo.
Mas reconhece que há uma inversão aparente.
Em 2022 houve até sondagens que deram também essa inversão e depois o resultado em janeiro de 22 foi o que foi – uma maioria absoluta do PS. Portanto, valem o que valem. Naturalmente são acompanhadas.
Mas há um desgaste do Partido Socialista. Consegue reconhecer isso?
É normal. São oito anos de governo. É evidente que tem que haver um desgaste. Agora, também era importante que as pessoas percebessem que há um novo ciclo no PS. Ou seja, não é preciso mudar de partido para que haja um novo ciclo.
As pessoas ainda não perceberam isso?
Não sei se não perceberam. Acho que já perceberam. Mas cumpre-me reafirmar que isto também representa, também no PS, um novo ciclo. Não é preciso mudar de partido para ter um novo ciclo.
As pessoas que ainda não o perceberam é porque a imagem de António Costa ainda está muito presente?
É porque foram oito anos. António Costa é um líder carismático e que fez muito por Portugal. E é normal também que, em debates, o secretário-geral do PS, ou qualquer candidato do Partido Socialista seja confrontado com coisas que o Governo anterior fez. É normal. Isso faz parte da política. Há essa dimensão, naturalmente.
“Pedro Nuno não cometeu erros assim tão grandes”
Mas não teme que estejam demasiado presentes na cabeça dos eleitores os erros que o próprio Pedro Nuno Santos cometeu no Governo?
Nós vivemos com os nossos erros. Ele próprio começou por dizer. Só não erra quem não faz.
Mas há erros e erros.
Não considero que tenha havido um erro assim tão grande. Porque, exatamente nessa linha do há erros e erros, o que verificamos é que todos os erros assacados têm a ver com a TAP. E a TAP hoje é uma empresa que dá lucro, começou a dar lucro antes do período pensado. Uma empresa que teve um projeto ambicioso e muito difícil de implementar — não seriam quaisquer membros do Governo ou políticos que teriam a coragem de implementar o projeto que o Pedro Nuno Santos implementou, aceite e aprovado em Bruxelas. E há uma coisa que queria dizer quanto à TAP – eu que acho que deve permanecer maioritariamente pública: nunca vi, nunca ouvi, nunca ninguém me disse o que é que faria diferente em 2020, em plena pandemia, quando a decisão era binária. Ou se punha dinheiro na TAP ou a TAP caía. E ainda não houve nenhum partido que me dissesse: eu deixava cair, não punha lá um tostão. Acho que nem o Chega disse isto.
Creio que a Iniciativa Liberal terá dito.
Talvez a Iniciativa Liberal tenha dito. Esses erros, que são mais de metodologia ou quase de pequenas situações, não afastam aquilo que é o essencial: a TAP está a dar lucro. Muitas dessas situações são situações que resultaram do facto de o processo da TAP ser provavelmente o mais escrutinado, quase, da vida pública e política.
É verdade que muitos dos erros apontados a Pedro Nuno Santos têm a ver com a TAP. É das pessoas como Pedro Nuno Santos, que acredita que aquela questão do despacho do aeroporto é uma coisa quase favorável para ele?
Não, era melhor que aquilo não tivesse acontecido, mas há uma coisa de que tenho certeza. O mais importante era que já houvesse aeroporto.
Então Pedro Nuno Santos tinha razão nesse confronto que criou com António Costa.
Não, tinha razão em entender, e é isso que está por trás da atuação dele, que havia pressa em resolver esse problema. 14% do PIB português é turismo. Não podemos continuar a viver com o aeroporto de Lisboa que temos. É evidente para toda a gente.
Mas foi o PS também que atrasou essa decisão.
Foram todos os partidos desde há 60 anos e ainda antes da democracia. Muito bem, entendeu-se avançar com uma metodologia de comissão técnica independente, com o acordo do PSD. Se depois de tudo isto, ainda vierem criar mais engulhos e fazer mais atrasos, eu acho que isso deve ser claramente julgado pelos portugueses. Era melhor que aquilo não tivesse acontecido, é evidente. Foi motivado por uma pressa, por uma necessidade de se decidir que efetivamente existe.
António Costa é um dos alvos de Pedro Nuno Santos quando está sempre a falar em deixar de arrastar os pés, já que foi primeiro-ministro durante oito anos?
Acho que ele fala em geral. E precisamos mesmo de uma mudança, esse tal novo ciclo, passará também por mais ação.
“Acordo PSD-Chega vai rebentar depois do dia 10 de março”
As eleições dos Açores parece que vieram provar que a direita consegue governar sem o Chega. O PS perdeu um elemento central da sua narrativa nesta campanha?
Não sabemos se a direita vai conseguir ou não governar sem o Chega, porque ainda não sabemos o que é que vai acontecer nos Açores. Diria até que com grande probabilidade só saberemos depois do dia 10, exatamente para que tudo aquilo que venha a acontecer já não possa ser utilizado como arma eleitoral.
Acha que o PSD está a empurrar uma decisão sobre o Chega para depois das legislativas?
Acho francamente que está. Porque acho que a posição de Montenegro e de Bolieiro sobre essa matéria são diferentes. Não estou a fazer declarações de intenções, mas é o que transparece. Isso vai rebentar depois do dia 10 quando, quando os Açores já não sejam utilizados pelo PSD como arma de arremesso contra o PS.
Ainda esta semana Pedro Nuno Santos dizia que o PSD não leva André Ventura a sério. Assim sendo, porque é que o PS insiste em dizer que Luís Montenegro vai fazer um acordo com o Chega?
Quanto a Luís Montenegro em concreto, não tenho razões para duvidar da palavra dele. Já o disse de tantas formas e feitios que eu diria que vamos acreditar. Não sei é se ele vincula a posição do seu partido, da sua totalidade, e portanto, dependendo da aritmética eleitoral depois do 10 de março, poderemos ter um cenário em que o partido tome uma decisão diferente daquela que tem sido dita por Montenegro. Mas estou apenas a dizer que isso está em aberto. Agora, também digo uma outra coisa. É que, dependendo dessa aritmética, também teremos uma situação em que os acordos que possa haver, designadamente à direita, terão naturalmente que passar pelos candidatos que existem, mas [os partidos] são superiores aos próprios candidatos. Acho que Montenegro é uma coisa, o PSD é outra.
Acha que o PSD se livra de Montenegro se precisar do Chega para chegar a um governo.
Acho.
Sentiu-se de alguma forma traída por ver Francisco Assis a desautorizar publicamente Pedro Nuno Santos sobre a questão da viabilização do governo do PSD nos Açores?
Não, não, de todo. Vão achar que eu estou a dar uma resposta chapa cinco, mas, obviamente, há pluralismo dentro do PS. Eu própria já fui exemplo desse pluralismo, portanto, longe de mim agora pôr em causa o pluralismo.
Mas há formas e formas de expressar essas opiniões divergentes, que são normais.
Certo. Não li exatamente as declarações, mas percebo os argumentos. Tenho uma convicção num determinado sentido, mas percebo os argumentos e não valorizo demasiado.
“Geringonça? Essa é a política num cenário em que possa acontecer”
O PS não deve responder aos desafios que a esquerda lhe tem lançado para falar publicamente num possível novo acordo à esquerda? Não prejudica, de alguma maneira, a mobilização do eleitorado de esquerda, que é o argumento de Mariana Mortágua?
O PS, e designadamente o secretário-geral, sempre foi muito claro quanto à sua política de alianças. Por isso é que o Chega não é uma questão do PS, é uma questão do PSD. E agora vou falar por mim, faço um juízo muito positivo daquele que foi o governo dito da geringonça entre 2015 e 2012, um governo com estabilidade, que durou os quatro anos, que aprovou quatro ou cinco orçamentos. E que tem um juízo de aprovação muito elevado dos portugueses. Portanto, essa é a política num cenário em que isso possa vir a acontecer.
Mas já está suficientemente claro?
Totalmente claro. Agora, fazer acordos pré-eleitorais nunca foi a nossa linha e também não é agora.
Não devia haver bases de entendimento já definidas, em alguns dos temas colocados pela esquerda, como a habitação, a saúde, a educação?
O PS será fiel ao seu programa eleitoral. É isso que depois há de nortear os acordos feitos. Eu sempre disse que, por exemplo, certas diferenças nas relações internacionais nunca impediram o bom funcionamento da geringonça. Diria que é prematuro fazer isso. Vamos lutar pelo melhor resultado possível e depois qualquer acordo que haja a seguir será fiel ao nosso programa eleitoral, dentro daquilo que o acordo tem de ser.
“Acusações de estalinização e sovietização servem para condicionar Pedro Nuno”
Já se arrependeu de terem inscrito no programa eleitoral a possibilidade de um governo do PS avaliar limites para os médicos que estão no SNS irem para o privado?
Como bem disse, a palavra que está lá é uma palavra muito clara – que se tem lido de forma diferente, porque se quer, mas que é uma clara. Esse é o oitavo ou nono ponto ou bullet desse ponto, que começa com valorizar, seja para médicos, seja para enfermeiros.
Mas é como nos contratos, o problema são as letras pequeninas.
Não, mas não estão em letras pequeninas.
Esta medida está lá, é porque o PS acredita nela. Ou na ideia, pelo menos.
O PS acredita que se pode justificar, ou que se pode vir a justificar, avaliar a possibilidade, de uma fixação que pode ser de um ou dois anos – toda a gente começou logo a falar em dez. E que, já agora, e até por imposição legal, mas sempre seria assim, tem que ser feito em negociação com os médicos. Ninguém viu aí a possibilidade do que está em causa ser voluntário. Nós hoje também temos dedicação plena, só adere quem quiser. Pode haver uma medida de exclusividade só para quem quiser, tal como pode haver uma medida de fixação durante um X tempo pré-fixado só para quem quiser.
Mas as reações foram muito vocais. O problema não está no partido que transmite essa ideia? Adalberto Campos Fernandes, que é insuspeito, chamou-lhe uma medida stalinista.
Adalberto Campos Fernandes, por quem tenho muito reconhecimento, não tem a mesma visão do SNS que tem o PS. Pronto. Mas o ponto não é esse.
Apesar de já ter sido Ministro da Saúde.
Apesar de já ter sido ministro. O ponto aqui não é esse. Tem havido – e tenho que dizer isto sobre esta medida, mas em geral – da parte, quer da oposição, quer de muitos políticos, que não têm a mesma visão, quer de muitos comentadores, um permanente atirar de epítetos, como o Plano Quinquenal, como planificação, como sovietização, como stalinização. Que sim, tendem e querem condicionar o secretário-geral. Mas são muito injustos. Nós já vimos partidos dizerem que aquela medida para a economia, que é escolher os sítios onde se valoriza mais a economia, em função daqueles que mais alavancarem a economia, era uma medida soviética. É uma medida aplicada nos países da Europa mais liberais, como a Irlanda e como a Holanda.
Mas deixe-me só focar nesta questão dos médicos. Foram os sindicatos que disseram. Foi um ministro socialista que disse.
O que está lá escrito é avaliar a possibilidade. E essa avaliação é feita por consenso com a negociação, no âmbito de negociação sindical. Naturalmente ninguém achará errado que, se houver consenso e se chegar a uma negociação voluntária…
Este PS concorda com estas duas ideias. Acha que são duas boas ideias.
O que está aí que este PS admite eventualmente avaliar…
Mas se põe a ideia no programa acha que é uma ideia importante.
A ideia está lá, mas não está a dizer que “vamos fazer”. Quando se diz vamos fazer ou vamos avaliar, não é igual. O que está lá é que podemos ir avaliar essa ideia em negociação sindical e podemos também não ir avaliar. Avaliar uma ideia, não se confunde com vamos fazer.
“Privatização maioritária da TAP nunca foi posição de Pedro Nuno”
Noutra área que conhece bem, a Educação, está inscrito no programa a recuperação do tempo dos professores. Pedro Nuno Santos começou por dizer que não dava para fazer tudo numa legislatura. Agora já veio falar numa legislatura.
Bem, depende do que dura a legislatura tendo em conta os tais miniciclos… Mas pronto, eventualmente se calhar era nisso que ele pensava.
No programa não consta nada mais do que já se sabe, que é a vontade de querer repor tudo. Qual é que é o problema em dizerem já o modelo que pretendem?
O modelo é da recuperação numa legislatura. Numa legislatura que dure os quatro anos normais. Esse é o modelo que vamos apresentar. Não é um modelo fechado. Porque senão não valia a pena negociar. Se o subtexto da pergunta é, como eu já vi: “Ah, se calhar vão propor vinte anos”. Não, não vamos propor vinte anos, nem dez, nem seis. É uma legislatura.
O programa que coordenou não tem qualquer referência à TAP. Isto acontece porquê? Pedro Nuno Santos ainda não decidiu o que quer fazer?
Porque apesar da importância enorme que a TAP tem, política e economicamente…
E para Pedro Nuno Santos.
E para Pedro Nuno Santos. Na verdade, o que se segue relativamente à TAP é a visão que se tem para a economia em geral e para as empresas em geral. Ele já foi bastante claro no que disse sobre a TAP, quer sobre a sua privatização ou não quer sobre a sua visão estratégica para a TAP, a integração num grande grupo.
Foi só para não assumir o recuo face à intenção de vender mais de cinquenta por cento?
Não, não. Qual recuo?
O governo queria vender cinquenta por cento ou mais.
Não, mas isso era a posição do governo, que vai ser julgado também nestas eleições, mas nunca foi a posição de Pedro Nuno Santos, que ainda enquanto comentador – antes do 7 de novembro, antes de sermos atirados para esta máquina de lavar – disse que não concordava com uma privatização maioritária. Eu acrescento isto, da minha lavra: até como jurista, tenho muita dificuldade em perceber como é que pode haver uma montagem contratual que garanta o hub sem ser dessa forma. Estou disposta a ser convencida, mas até como jurista, não havendo uma concessão, tenho muita dificuldade em ver como é que isso se assegura.
A questão da privatização pode sair definitivamente de cima da mesa.
Teremos um novo ciclo, mas também sempre disse o secretário-geral que a visão dele sempre foi a de que a TAP, uma vez saneada financeiramente, se integrasse num grande grupo de aviação. Sempre disse isto.
António Costa queixa-se há anos de que o parque habitacional público é de apenas 2%, mas não conseguiu em 8 anos resolver essa questão. Como é que Pedro Nuno Santos, numa legislatura normal, chegará aos 5% de habitação pública?
A habitação é uma dificuldade, porque é demorada, porque as medidas estruturais passam por aumentar o parque de habitação pública – essa é a medida estrutural – e até lá é preciso ir resolvendo os problemas das pessoas. Tem de haver aqui uma aceleração, também com as próprias regras da contratação pública, etc. Não é só uma questão de dinheiro. Terá de haver uma continuação do que já está em obra, que já é muito, e eventualmente uma aceleração. Depende também das condições que o PS enquanto Governo tenha, e refiro-me também a condições de estabilidade, obviamente.
“Programa é possível graças a condições invejáveis conseguidas em parte por Medina”
Pedro Nuno Santos já disse várias vezes que este será um programa seguro, que mantém as contas certas, até teve Fernando Medina na apresentação do programa. Como é que isto se conjuga com o novo impulso que este novo PS quer trazer?
Porque é um programa que assenta num cenário macroeconómico, e em condições que são deixadas por este Governo, e que são ótimas, basta relembrar o excedente, a dívida pública abaixo dos 100%, etc. E que o que vai fazer, e isso foi aliás dito por Fernando Medina, é mantendo um trajetória de redução da dívida essa ser uma trajetória mais gradual e menos intensa, que vai permitir acomodar ao mesmo tempo as medidas e os objetivos de investimento público.
E o próprio Fernando Medina já está convencido disso.
Fernando Medina é um alto quadro, um homem importante do PS, e pôs toda a sua competência, que é muita, e capacidade ao serviço do seu partido, ajudando a construir e criando este cenário, que dá uma liberdade para tomar um conjunto de medidas e para aumentar o investimento público, porque chegámos aqui com condições invejáveis, conseguidas em boa parte por ele também.
Na apresentação do programa eleitoral, Pedro Nuno Santos queixou-se do Ministério das Finanças. Disse: “Quantas vezes o ministro setorial se bate semanas a fio com o Ministério das Finanças para conseguir cumprir o seu programa, e medida vai minguando, depois sai uma medidazinha que é apresentada pelo ministro setorial como se fosse uma grande medida e ele sabe que não é”. Faz sentido, neste cenário, ir buscar o maior responsável por este condicionamento para apresentar o cenário macroeconómico?
Estive seis anos no Governo, dois como ministra, e identifico-me com essa descrição. Os resultados financeiros e orçamentais obtidos são resultados que qualquer ministro das Finanças tem de dividir com os seus colegas, sobretudo com os de pastas setoriais muito intensivas e exigentes em termos orçamentais, como a saúde, como a educação, etc.Nem sempre saem medidazinhas, mas às vezes saem medidazinhas, porque é preciso conjugar duas coisas: a medida grande que o ministro setorial quer fazer e aquilo que cabe na visão orçamental do Ministro das Finanças. Ele também disse, curiosamente, o que se calhar deixou muita gente surpreendida, que Fernando Medina foi o ministro das Finanças com quem se deu melhor. É que Fernando Medina tem uma vantagem relativamente a outros ministros das Finanças: é um político. Dou-vos o exemplo da descentralização, que tutelei durante dois anos, e pouco depois de entrar no Governo, ele fez um acordo com a ANMP, que implicou reforçar as verbas para a descentralização e desbloqueou o processo.
“Cargos no governo? É cedo para isso”
Avançamos agora para o segmento Carne ou Peixe, onde o convidado tem de escolher uma de duas opções. Na última Vichyssoise em que participou escolheu uma opção que implicaria ser governante num Governo de Pedro Nuno Santos. Agora que Pedro Nuno já é candidato a primeiro-ministro, a pergunta é, preferia então ser ministra da Justiça ou da Educação?
Se é entre carne ou peixe, prefiro o prato vegetariano. Acho que é cedo para isso, vamos ver.
Em março, preferia estar ainda a comentar no programa “O Prinícipio da Incerteza” como membro da oposição, estando o PSD no Governo, ou estar fora do programa porque é ministra, mas o Chega era a segunda força no Parlamento?
Quero que o meu partido ganhe as eleições e, portanto, terá que ser a segunda. Sendo Governo, o PS teria, no Parlamento, naturalmente, de fazer tudo para que esse cenário não se viesse depois a repetir. Já disse uma vez que uma das evoluções possíveis para o quadro político-partidário português era um cenário francês, de bipolarização entre um partido de extrema-direita e um partido de centro.
Em parte alimentado pelo Partido Socialista francês.
Não, em parte alimentado pelo partido de Macron, que deixou o Partido Socialista francês completamente nas cordas, não é? Não sei se é assim que vai evoluir, acho que o facto de termos agora eleições vai alterar isso. Tenho a certeza que será o PS a conseguir impedir, ou pelo menos trabalhar para impedir, esse crescimento. Mas sim, preferia ganhar as eleições.
Preferia estar no Parlamento, no dia em que fosse votado o programa de um governo PSD, vencedor das eleições, para ajudar a viabilizá-lo, ou ficar no sofá a fazer uma maratona de uma das suas séries preferidas e não participar numa votação dessas?
Gosto muito de fazer maratonas de séries. Tenho feito pouco disso ultimamente, por razões óbvias, mas gosto muito. Tenho lá muitas atrasadas. Ainda assim, gostaria sempre de estar na bancada a fazer aquilo que o meu partido entendesse que fosse o melhor em cada momento. Que eu não sei se era isso ou não, veremos.
Para terminar, preferia ter de negociar o programa que coordenou e apresentou para incluir medidas apenas do LIVRE ou voltar a um modelo de 2015 e ter de incluir um acordo com o PCP e o Bloco de Esquerda?
Naturalmente o primeiro cenário implicaria uma maioria maior do Partido Socialista, ou não, não sei. Acho que, desde que sendo fiel ao programa eleitoral do Partido Socialista, qualquer das hipóteses é possível.