O mundo das criptomoedas está a viver um momento de depressão. Depois da queda da Terra/Luna e da plataforma Celsius ter deixado de reembolsar os seus clientes, a queda pronunciou-se. Omid Malekan entrou no mundo das criptomoedas em 2013 quando uma amiga lhe pediu para comprar uma bitcoin, o que lhe aguçou o interesse em conhecer mais aquele mundo. “Quanto mais estudava, menos percebia”, revela na pequena autobiografia publicada no seu site, para acrescentar: “E mais acreditava”.
Professor adjunto na Columbia Business School, onde leciona sobre blockchain e criptos, o consultor é já considerado veterano na indústria. “Estive quase uma década confuso sobre as criptos, mas vocês não precisam de ficar”, diz ainda no seu site, onde apresenta os dois livros que escreveu sobre criptomoedas: “The Story of the Blockchain” e o mais recente “Re-Architecting Trust”.
O Observador falou com Omid Malekan neste momento de depressão do mercado das criptos. Admite que havia uma bolha que rebentou, mas não é o fim da linha. A conversa acabou com uma incógnita: “será hoje [17 de junho] que a bitcoin vai descer dos 20 mil dólares?”. A resposta só foi dada no dia seguinte. Nesse fim de semana, a bitcoin acabou mesmo por tocar num valor pouco acima dos 18 mil euros.
Bitcoin abaixo da fasquia dos 20 mil dólares pela primeira vez desde dezembro de 2020
É o fim da linha para as criptos?
Não. As criptomoedas sempre foram muito voláteis, mais do que qualquer outro mercado. E desde o início houve períodos em que há booms, em que as pessoas estão muito otimistas e então os preços atingem níveis elevados. E, depois, há períodos de colapso, em que as pessoas ficam muito pessimistas. Algumas pessoas saem, até, do mercado e muitas falhas são expostas. Mas, habitualmente, há lições importantes nestas alturas de colapso, aprendendo-se a tornar as coisas melhores e a fazê-las evoluir. Assim, a confiança vai voltar.
O mercado está a tornar-se mais profissional? O que se está a passar vai tornar o mundo das criptos mais profissional e transparente?
Espero que sim. A esperança é, sempre, a de que já se tenha profissionalizado, mas depois acontecem estas histórias, como as que vemos agora, das companhias a emprestarem muito dinheiro e estas plataformas que atuam de forma irresponsável com o dinheiro dos clientes. O que significa que ainda há um longo caminho até que se torne totalmente profissional.
Havia uma bolha neste mercado?
Sim.
E rebentou?
Está em processo de rebentamento. Não sou um especialista em finanças… nem sei se alguém é, particularmente nas criptos. Por isso, não sei dizer se já rebentou por completo. Para alguém como eu, que está a seguir este mercado há nove anos, isto parece fazer parte do habitual padrão de uma bolha que rebenta, e que inflige muita dor. Mais tarde, no entanto, o sentimento positivo regressa.
Ao longo desses nove anos em que segue o mercado, houve já vários crashs de bitcoin. Ao ver o atual, acredita que é um crash como os antecedentes ou é diferente desta vez?
Todos os crashs são diferentes, porque cada crash põe a nu alguma fraqueza ou falha na indústria. Os primeiros crashs, que remontam a 2013 e 2014, estavam normalmente relacionados com as plataformas de corretagem serem hackeadas. O que já não acontece tanto porque as corretoras (exchanges) se tornaram muito mais profissionais e estão melhor na proteção dos ativos dos utilizadores. Neste crash atual o tema parece estar nos mecanismos centralizados que as pessoas usam para depositar e obter crédito em criptoativos, como no caso da plataforma Celsius que vemos agora nas notícias, que não foram muito responsáveis e nos quais as pessoas não deviam ter confiado tanto como o fizeram. E, portanto, agora, estamos no processo de ver quão más serão as consequências.
Antecipa que haja um efeito dominó neste caso? E vê alguma relação entre o que se passou com o ecossistema Terra/Luna e com a plataforma Celsius?
Sim, estão definitivamente relacionadas. Temos a Celsius e também, agora, esta companhia asiática, a Three Arrows Capital. E, se verificarmos o início do problema, leva-nos ao que aconteceu à Terra/Luna, ou porque elas próprias perderam muito dinheiro ou porque alguns dos seus clientes perderam muito dinheiro. Porque o que acontece quando o dominó está a cair ou quando há efeito de contágio é que não tem de se preocupar apenas com o seu risco, tem de se preocupar com o risco do seu cliente e com o risco da sua contraparte. Ou seja, até pode estar a fazer tudo certo, mas pode ter dado um empréstimo a outra firma de cripto e essa deu um crédito a um grande cliente e depois esse cliente perdeu todo o dinheiro em Terra e as perdas voltam para trás. E, à medida que as pessoas começam a tirar o dinheiro e tentar desalavancar posições, os preços começam a descer, que é o que estamos a ver agora, e a descida de preços força outras pessoas à liquidação.
Como pode ser combatida a falta de transparência neste mercado? Pode ser endereçada pela regulação ou pela seleção dos protagonistas?
Se calhar por todas elas. Mas penso que há uma dicotomia interessante porque as soluções financeiras verdadeiramente descentralizadas, as verdadeiras criptos DeFi [finanças descentralizadas] estão a correr bem. Nas soluções de crédito, nas corretoras de investimento automatizadas e até nas plataformas de derivados tem havido liquidações, porque as pessoas fazem empréstimos com margens, como acontece em qualquer outro mercado, e os preços caem, mas tem sido muito ordeiro e aí não há surpresas porque, por definição, as DeFi são transparentes. Pode olhar-se para qualquer protocolo, por exemplo um como a Aave [protocolo de empréstimo] , e podemos ver os ativos e os passivos, sei exatamente o capital que eles têm. Já as instituições que estão a cair, como a Celsius, não são DeFi, são CeFi. Celsius é verdadeiramente um banco, só que um banco sem regulação e um banco onde os clientes não têm garantia de depósitos, e a companhia não pode ir ao banco central pedir liquidez ou um resgate. Para mim, o modelo da Celsius é, de certo modo, o pior dos dois mundos. Ou queremos DeFi com a transparência necessária e em que toda a gente sabe os riscos, ou se for um banco centralizado queremos que seja apropriadamente regulado.
E o que aconteceu com a Terra/Luna? O que pode resultar para as stablecoins?
A UST [símbolo da stablecoin Terra] era interessante porque até na indústria de criptos era muito controversa e havia alguns especialistas proeminentes que nunca acreditaram no modelo, incluindo eu, porque o modelo algorítmico nunca fez sentido economicamente, era como se pessoas das cripto tentassem resolver um problema financeiro como se fosse um problema de engenharia. O surpreendente foi o tamanho que conseguiu antes de colapsar.
Não acredita em stablecoins algorítmica ou não acredita em stablecoins?
Eu acredito em stablecoins. Hoje em dia acredito que, além da bitcoin, as stablecoins são as aplicações decisivas da tecnologia de blockchain. E nos próximos cinco anos penso que a maior dos pagamentos acontecerão com stablecoins, não apenas para quem compra e vende criptos, mas para as pessoas que enviam dinheiro internacionalmente, para as empresas pagarem aos seus empregados, para comprar um café. Tecnologicamente são muito melhores do que cartões de crédito ou transferências eletrónicas. No entanto, não acredito no modelo algorítmico. Parte do problema deste modelo é a assunção de que se consegue construir um sistema financeiro de criptos que é completamente independente do sistema financeiro existente. Por isso é que as pessoas queriam tanto que a UST resultasse, porque outras alternativas como a tether ou a USDC [mais duas stablecoins] assentam no sistema bancário, ativos fiduciários, e penso que é assim que tem de ser. No meu entender o mundo dos criptoativos não vai substituir o sistema fiduciário e o sistema bancário tradicional. Penso que os dois vão convergir num só.
E não vão fechar-se no mundo das criptos, como aconteceu com a Terra e a Luna?
Exatamente.
Como é que as stablecoins podem ser um mercado confiável?
Se analisar um emitente de stablecoins, como a Circle que emite USDC [outra stablecoin, ligada ao dólar] — que anunciou que vai lançar uma stablecoin ligada ao euro, o que é interessante — ou a Paxos que emite Binance US stablecoin [cujo símbolo é BUSD] e a sua própria USDP [também ligada ao dólar], o que é relevante ver nestas companhias é que têm gestão profissional, são, em muitas maneiras, reguladas. Muitas até têm licenças bancárias ou licenças especiais de banca ou licenças para fundos. Mantêm as suas reservas em instituições altamente reguladas como bancos ou custodiantes de instrumentos financeiros. São muito transparentes sobre como fazem as coisas. Muitas das pessoas que lá trabalham até têm background do sistema financeiro tradicional. Penso que o modelo é bastante confiável, no que respeita à estabilidade das stablecoins.
E em relação à confiança em plataformas como a Celsius? Têm de ser reguladas?
Pessoalmente nunca as utilizarei. Uso muitas coisas nas criptos e uso as verdadeiras DeFi.
O que considera verdadeiras DeFi?
Se tiver stablecoins e quiser ganhar juros deposito-as num protocolo de empréstimos descentralizado, como a Aave ou Compound. Se tiver criptos e quiser emprestá-las contra dólares uso um banco descentralizado como o Maker. Muitas vezes os centralizados, como a Celsius, pagam elevados juros, é por isso que as pessoas gostam e são mais fáceis de utilizar. Só que isso vem com elevadas contrapartidas.
E riscos…
Sim, e riscos. Há uma lição importante que as pessoas na criptos têm de aprender, é que nada que parece bom demais o é. Dou dois exemplos. O protocolo Anchor para a Terra pagava 20% [de juros] e a Celsius publicitava um rendimento de 17/18%. Ambos numa altura em que as taxas de referência da Reserva Federal estavam próximas de zero, e se púnhamos dinheiro no banco não rendia nada. Era uma bandeira vermelha.
Mas as pessoas não deviam saber já disso pelo que aconteceu em alguns fundos e bancos?
Sim.
Memória curta no mercado ou gente mais jovem?
Tudo verdade. E há uma tendência para se acreditar que nas criptos se pode atingir coisas que no sistema financeiro tradicional não se consegue. Com o que até concordo, e é sobre isso o meu segundo livro, de coisas diferentes que as criptos podem alcançar que o sistema tradicional financeiro não consegue, mas isso leva muito tempo e precisa de muito trabalho e tem muitos solavancos e não se materializa sozinho. O projeto da Terra dizia que em dois anos ia ser a maior stablecoin e vamos pagar 20% de juros e não vamos ter nada que ver com o sistema bancário… [só faltava dizer] vamos curar o cancro e resolver os problemas das mudanças climáticas e outras promessas sem sentido. Os projetos que realmente estão a fazer um bom trabalho, o que têm em comum é que lutam muito, é muito difícil. O exemplo da ethereum que quer mudar para um modelo de prova de participação…. muitas pessoas inteligentes estão a trabalhar nesse plano que tem sido adiado e adiado. Ou alguns dos protocolos DeFi que referi têm problemas de governação, o processo de decisão é difícil, têm custos elevados e estão a subir, nomeadamente, para pagar às pessoas para fazerem diferentes funções. Não é claro qual o caminho correto, mas para mim são indicadores de pessoas genuínas a fazerem o trabalho apropriado, o que no final fará uma grande diferença.
A mudança na ethereum
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A ethereum é, tal como a bitcoin, uma moeda virtual criada através do que se designa proof-of-work (PoW), o mesmo é dizer prova de trabalho. Significa isto que uma nova moeda só é criada quando temos vários computadores a trabalhar para resolver complexas operações e que são verificados pela rede. É preciso muito poder computacional. Mas se até agora a ethereum é uma moeda proof-of-work os seus programadores acordaram passá-la para outra metodologia: proof-of-stake ou seja prova de participação, em que valida as operações os detentores de mais moeda.
A própria rede explica que esta passagem, que se designa por The Merge, vai reduzir o consumo de energia relacionado com a ethereum em 99,95%.
A passagem de uma para a outra tem vindo a ser adiada. A criação de nova moeda passa a depender dos validadores, que têm de trancar pelo menos 32 ETH numa carteira, sem as movimentarem. Antes da passagem foi criado um token para essas moedas trancadas – stETH.
A ethereum é a segunda maior criptomoeda em capitalização, que vai nos 133 mil milhões de dólares. Cada moeda vale pouco mais de mil dólares.
Mas a falta de confiança pode minar estes projetos que considera de verdadeiras DeFi?
Sim, a falta de confiança e a falta de conhecimento, e há muita arrogância. Outra coisa que casos como a Terra ou a Celsius ou até o Three Arrows Capital nos mostram é a existência do culto de personalidade. Do Kwon [fundador do ecossistema Terra] era admirado, como um deus, por algumas pessoas. Tal como Alex Mashinsky [da Celsius] e os dois sócios da Three Arrows [Su Zhu e Kyle Davies]. O que, por regra, não é um bom sinal, especialmente nas criptos, porque é suposto ser descentralizado. E se tivermos milhões de pessoas a dizer que acreditam em alguma coisa porque há uma pessoa inteligente por detrás não é por isso que aqui estamos.
Voltando à regulação, vai haver regulação a breve prazo ou os bancos centrais e os reguladores demoram muito tempo a endereçar estes temas das novas tecnologias?
Eles gostariam de ter regulação no curto prazo. Na Coreia do Sul há muita discussão sobre o que deve ser feito porque houve muita gente no retalho afetada com a queda da Terra/Luna e isso é algo que, por norma, os reguladores desaprovam. É diferente se for um conjunto de instituições ou fundos de alto risco a perder dinheiro, mas sem haver particulares a perder dinheiro. E ainda não se sabe a dimensão dos estragos numa situação com a da Celsius. Mas se houver muitos particulares de diferentes países apanhados, penso que os governos vão aplicar medidas duras. E penso até que poderá haver a possibilidade de algumas ações criminais nestes casos. Mas a esperança é a de que a regulação, ou idealmente novas leis — penso que isto é importante. A regulação só é eficaz com base em legislação existente e penso que o que vamos precisar para os ativos digitais no final são novas leis e há movimentos nesse sentido. O medo é que as leis sejam demasiado restritivas ou que a regulação impeça o progresso. A esperança é que tenham a mente aberta e levem em linha de conta as vantagens únicas da tecnologia por forma a que possa amadurecer mais.
Qual foi, na sua opinião, o papel dos bancos centrais, que despejaram dinheiro nas economias, no processo de criptomania?
O mais óbvio é que muita gente que perdeu dinheiro nestes projetos falhados o fez porque queriam juros. Saímos desta situação estranha em que a inflação em muitos países é 8/9/10% e, no entanto, quando depositamos dinheiro nos bancos recebemos zero de juros. Mesmo agora que a Fed já aumentou os juros de forma mais agressiva do que na Europa, a inflação é 10% e o melhor que se consegue nos depósitos na banca é cerca de 1,5%. Se fizer o que é responsável, que é poupar dinheiro — eu sou imigrante e os meus pais sempre me educaram dizendo que acima de tudo temos de poupar dinheiro e isso não significava investir no mercado de capitais mas por o dinheiro num banco –, mas depois perco 8% de poder de compra por ano… penso que, para muita gente, esse problema levou-as a estas soluções com muito risco ou a tentarem investir muito agressivamente. E isso não se aplica às criptos, vemos também isso no mercado de ações ou no mercado imobiliário em alguns países. Penso que a responsabilidade disso nos leva aos bancos centrais.
Este momento nas criptos tem efeitos semelhantes ao que aconteceu depois da falência do Lehman Brothers em 2008?
De alguma forma. Mas as criptos são, ainda, de uma dimensão menor do que o sistema tradicional era já no tempo do Lehman Brothers. Nessa altura, com o Lehman Brothers, houve a preocupação de contágio e que os grandes bancos, nos quais milhares de milhões de pessoas têm o dinheiro depositado, fossem atingidos e caíssem. Essa não é uma preocupação com as criptos. Outra coisa interessante é que, por ser um mercado eficiente, a funcionar 24/7 [todos os dias a todas as horas] e global, não há resgates e não há bastidores em que o CEO de um banco, o regulador e um congressista negoceiam algo sem que saibamos. Há menos coisas desse género. Mas as coisas movimentam-se muito rapidamente, quer nos altos quer nos baixos. Estes dominós e contágios que, como referiu, estamos a ver, nas criptos acabam por terminar muito antes do que o que aconteceu em 2008, em que anos mais tarde ainda estávamos a sentir as consequências.
É um fã das criptos como investidor?
Invisto, mas é importante ter em conta que esta é uma nova indústria e, para mim, quase todos os projetos de cripto devem de ser olhados como uma startup. E uma coisa que qualquer pessoa que invista em startups, como capitais de risco ou investidor anjo, lhe dirá é que temos de estar preparados para que 90% do investimento se reduza a zero. As cripto são únicas, porque cada token é como se fosse capital de uma startup, mas que tem liquidez e fixação de preço desde o primeiro dia. O que também explica a enorme volatilidade. Se um amigo seu abrir um restaurante e levantar dinheiro junto de amigos e da família, se tiver ações e as negociar seriam tão voláteis como as criptos, se não até mais voláteis, porque cada nova coisa luta contra o tempo. Não sou consultor de investimento e toda a gente que investe em criptos deve ser muito, muito cauteloso e conservador. O único conselho que dou é para que não se endividem. O que vimos em cada ciclo é que houve pessoas que optaram por pedir empréstimos e alavancaram-se e acabaram por perder tudo. Apesar de podermos, em dois, três, cinco anos, concluir que estavam certas em termos de projetarem que uma moeda iria ser bem sucedida ou que um projeto iria ser bem sucedido.
Como comenta as recentes declarações de Bill Gates e as anteriores de Warren Buffett contra as criptos? Bill Gates disse recentemente que as criptos e os NFT eram baseados numa teoria do maior tolo [baseada na ideia de que ativos sobreavaliados podem ser comprados em determinado momento e, ainda assim, é conseguida uma mais-valia futura na sua venda].
Vou discordar, mas concordar ligeiramente. Se reparar, são homens mais velhos e ricos que são muito anti-cripto, e penso que o dizem porque são pessoas que ganharam dinheiro no mundo como ele era antes. Claramente, pouca gente beneficiou mais do que eles e ainda bem para eles, merecem muito do sucesso. No entanto, as cripto ameaçam alterar as coisas de forma significativa. E, por isso, não me surpreende que as pessoas que ganham no mundo antigo sejam naturalmente contra uma potencial nova via. Dito isto, nas criptos há muito baseado na teoria do maior tolo. E vemos isto em alguns dos mais recentes projetos nomeadamente de NFT ou até nesta categoria chamada “X to earn” [X para ganhar] — jogar para ganhar, aprender para ganhar, correr para ganhar, o que for — em que algumas são ideias giras e até pode haver algum valor nessa abordagem de forma a atrair novos utilizadores para uma solução, mas quando depois olho e vejo que um clube de corrida tem uma avaliação de 20 mil milhões totalmente diluída…. que vai ser mais valiosa que a Coinbase, isso é claramente uma teoria do maior tolo.
Também vê a bitcoin como uma startup?
Acho que a bitcoin está quase fora do nível de startup. O que vimos no ciclo anterior foi, de certa forma, a adoção da bitcoin a nível institucional, como por exemplo em empresas. Penso que essa tendência vai continuar. Mas estou curioso para ver, no próximo ciclo, quando ele começar — não faço ideia se será amanhã, ou daqui a um ano –, porque a bitcoin tem um potencial real de adoção a nível soberano.
Como El Salvador?
Como El Salvador, mas a um nível mais proeminente de governos e bancos centrais. Dado o estado do mundo hoje em dia, dado o que aconteceu depois da crise financeira e a resposta dos Estados Unidos à invasão russa da Ucrânia, dada a multipolarização em todo o lado, a redução da globalização, penso que a bitcoin se tornará um plano de salvaguarda para toda a gente e para muitos países — não é adotar a bitcoin para toda a economia, até porque há muitas razões para isso não fazer sentido e ser má ideia — e no caso dos bancos centrais, muitos chegarão à conclusão que devem pôr 1/2/5% das suas reservas em ativos como a bitcoin.
Como o fazem com qualquer outro ativo fiduciário ou obrigações?
Exatamente. E a razão pela qual o farão é porque a bitcoin, por ser descentralizada, ninguém a controla. Um pouco como o ouro. Mas, ao contrário do ouro, a bitcoin tem o sistema nativo de pagamento global 24/7. A combinação desses dois fatores é muito útil para o sistema financeiro ou comercial a nível global.
Lançou recentemente um novo livro “Re-Architecting Trust: The Curse of History and the Crypto Cure for Money, Markets, and Platforms”. Do que trata, já que referiu anteriormente que era um livro um pouco diferente?
É um pouco diferente porque é um livro um pouco mais sobre confiança do que sobre criptos.
Altura certa para falar de confiança…
(Risos) Acredito que sim. Os acontecimentos inspiraram-me a ir por essa abordagem e, penso que, para perceber os benefícios de certos aspetos das criptos, como bitcoin, DeFi, stablecoins, ajuda a olhar para elas sob a lente da confiança e ajuda realmente observar a evolução da confiança em diferentes contextos, como a confiança no dinheiro, a confiança no sistema bancário. Se o livro fizer o seu trabalho, até alguém que seja cético, se olhar para a história de quando a confiança resulta e de quando falha e se considerar as características únicas que oferecem certos aspetos das criptos na construção de uma maior confiança, conseguirá concordar com a minha teoria que acabará por ser uma parte importante de muitas estruturas diferentes de confiança.