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TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

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Regressar a casa depois de um AVC. O projeto pioneiro de Coimbra que ajuda os doentes à distância

No SNS há um problema de falta de acompanhamento de doentes quando regressam a casa depois de um AVC. Este projeto em Coimbra não resolve todos os males. Mas ajuda. Basta um telemóvel.

Dois meses e três semanas separam o dia em que Ana Vieira foi internada na Unidade de AVC dos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC) e o encontro com os jornalistas na sua casa, em Carcavelos, Cascais. Aos 53 anos, Ana é uma de entre os 918 utentes inscritos na plataforma digital NORA e seguidos no HARMONICS, um projeto centrado no acompanhamento de doentes com AVC após alta hospitalar, que chegou aos HUC, em 2023.

A fase de transição para casa está associada a internamentos hospitalares mais prolongados e piores resultados na evolução do doente por falta de cuidados adequados. E é, simultaneamente, um dos principais motivos de insatisfação nos serviços de saúde. “O que se pretende com o HARMONICS é preencher uma lacuna que existe no seguimento do doente, sobretudo após a alta hospitalar”, explica João Sargento Freitas, neurologista e coordenador do projeto nos HUC.

Embora não tenha tido um AVC, mas sim um acidente isquémico transitório (AIT), um bloqueio temporário e de curta duração do fluxo sanguíneo do cérebro – ou melhor, dois, como viria a descobrir mais tarde –, Ana Vieira integrou a iniciativa que, a nível nacional, só decorre naquela instituição.

Há uns meses, este seria provavelmente um assunto que estaria longe das preocupações de Ana, mas hoje a história é diferente. No dia em que devia estar a celebrar em família o aniversário do pai, que a fez viajar de Carcavelos até Viseu naquele fim de semana, estava longe de imaginar que iria ser internada. E há pormenores que a memória insiste em manter.  Às seis da manhã de 18 de fevereiro de 2024 chegou aos HUC, depois de ser transferida das urgências do Hospital São Teotónio, em Viseu, onde foi vista por um neurologista e submetida a alguns exames. Entre eles, uma ressonância magnética ao cérebro.

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O facto de durante a noite se ter sentido mal, de deixar de conseguir falar e de mexer um dos lados do corpo por alguns minutos não tornou o diagnóstico menos surpreendente. Tinha tido dois AIT e a ressonância magnética revelava três coágulos, um na artéria carótida do lado esquerdo (uma das principais artérias do pescoço, que parte do coração e fornece ao cérebro sangue rico em oxigénio) e dois no cérebro que, entretanto, acabaram por se diluir por si mesmo. “Foi totalmente inesperado para mim”, recorda. “Estava longe de que algo grave pudesse estar a acontecer-me.”

Como havia o risco de o coágulo que se encontrava na carótida se deslocar até ao cérebro, causando um AVC, foi encaminhada para os HUC para que pudesse ser acompanhada por médicos especializados no tratamento do Acidente Vascular Cerebral.

Depois de regressar a casa, o doente é acompanhado em tempo real através de uma app que alerta a equipa caso algo não esteja a correr bem

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Uma semana depois teve alta e regressou à casa dos pais, em Trancoso, na Guarda, onde ficou a recuperar durante cerca de um mês e meio. Mas não voltou sozinha. No telemóvel levava uma aplicação que pretende ajudar os doentes com AVC na fase pós internamento e através da qual tem acesso a uma equipa com profissionais de várias áreas. “É uma ferramenta que tem sido muito útil desde que saí do hospital”, diz enquanto mexe na aplicação. “Além disso, dá-me segurança, pois sei que se precisar, tenho alguém do outro lado que me vai ajudar.”

O objetivo do HARMONICS é simples: garantir o mesmo tipo de monitorização, acompanhamento e proximidade que os doentes tinham no hospital, mas agora em casa – ou, se se justificar, em unidades de convalescença ou de média duração e reabilitação da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados. Para isso, só precisam de ter um telemóvel e instalar a aplicação Nora Bio (disponível para iOS e Android, com download gratuito) e, durante um ano, terão um acompanhamento contínuo e individualizado. É através desta app que vão vigiando a tensão arterial, a glicemia, os batimentos cardíacos, e podem contactar diretamente com os profissionais de saúde sempre que necessitarem.

Em alternativa à modalidade de monitorização pela aplicação digital é possível fazer o seguimento do doente através de chamadas telefónicas. Afinal, nem todas as pessoas têm acesso a um telemóvel, sabem como utilizá-lo ou têm familiares disponíveis para assumir a tarefa. “O projeto pretende melhorar a experiência do doente no regresso a casa após a alta hospitalar, envolvendo-o e aproximando-o, bem como os seus familiares e cuidadores, a todos os profissionais de saúde”, diz João Sargento Freitas.

O regresso a casa é um período complicado no acompanhamento dos doentes. “Portugal tem uma rede pré-hospitalar e hospitalar bem implementada, de cuidados para doentes com AVC, mas não temos a mesma eficácia no acompanhamento do doente após a alta do hospital”, admite o neurologista. Este projeto pretende preencher essa falha.

Muitos pacientes, ao regressarem a casa depois de um internamento por causa de um AVC, sentem-se "perdidos" e com falta de acompanhamento. “O que se pretende com o HARMONICS é preencher uma lacuna que existe no seguimento do doente, sobretudo após a alta hospitalar”, diz o neurologista João Sargento Freitas.

Após deixarem o hospital, a falta de acompanhamento dos sobreviventes de AVC por equipas multidisciplinares – compostas por profissionais de várias áreas, desde médicos, a enfermeiros, psicólogos, terapeutas, fisioterapeutas, entre outros – e  o acesso aos cuidados de reabilitação necessários em tempo útil são duas das lacunas encontradas nesta fase. Este é um período particularmente delicado em que “surgem muitas dúvidas e incertezas, e em que algumas pessoas ainda não têm as doenças totalmente estáveis. Depois da alta, torna-se difícil o contacto com os profissionais de saúde para esclarecer essas questões, que nalguns casos são muito importantes”,  diz o neurologista.

A este, junta-se outro problema. Se um doente de AVC não tiver acesso aos cuidados de reabilitação adequados, “a possibilidade de conseguir recuperar totalmente é menor, o que leva a uma pior qualidade de vida e a eventuais custos na sociedade”, diz a fisiatra Ana Margarida Esteves, que integra o HARMONICS. Com este projeto, a equipa procura colmatar essas falhas, oferecendo uma resposta “harmonizada” para todas as dificuldades.

O dia de regresso a casa

No momento da alta hospitalar é proposto a todos os sobreviventes de AVC acompanhados no Serviço de Neurologia dos HUC o seguimento no projeto HARMONICS. São cerca de mil doentes por ano. Nem todos aceitam a proposta, mas os que concordam iniciam nesse mesmo dia o seguimento na aplicação digital, que não substitui o acompanhamento normal do doente no Serviço Nacional de Saúde. Foi o que aconteceu com Ana Vieira. “Quando me apresentaram o projeto e explicaram o tipo de acompanhamento prestado, não pensei duas vezes. Achei que ia ser o suporte ideal para o meu regresso a casa.”

Mas, antes, era preciso saber como é que a app funciona. Quem dá essa mini-formação aos doentes é Sara Castro, gestora de caso do HARMONICS. É ela a intermediária de comunicação com os doentes e com a equipa do projeto, formada por neurologistas, especialistas de Medicina Física e Reabilitação, psiquiatras, enfermeiros, entre outros. No total, são mais de trinta profissionais, incluindo das áreas de Serviço Social e de cuidados de saúde primários.

“A NORA é uma plataforma digital bipartida, na qual há um nível de acesso para o doente ou o seu cuidador e um nível de acesso hospitalar”, diz a investigadora. Ou seja, enquanto os doentes usam a aplicação digital, os profissionais de saúde têm acesso à plataforma NORA profissional. Uma solução desenvolvida por programadores do Vall d’Hebron Research Institute, do Hospital Vall d’Hebron, em Barcelona, que, em conjunto com a equipa dos HUC, criaram o projeto.

João Sargento Freitas é neurologista o coordenador de uma equipa de várias áreas que integra o projeto HARMONICS, que permite acompanhar sobreviventes de AVC após alta hospitalar

SÉRGIO AZENHA/OBSERVADOR

Os dois hospitais mantêm uma estreita colaboração há algum tempo. A justificação é simples. “Ambos têm uma longa história de envolvimento em investigação pioneira e participam em pesquisa clínica e translacional [aplicação dos conhecimentos científicos no “mundo real”], procurando uma melhor compreensão dos mecanismos ligados ao AVC e otimizar as abordagens de tratamento”, diz João Sargento Freitas.

Depois de entrar na aplicação com o código e a senha gerada previamente por Sara Castro na plataforma, o utilizador tem acesso a um menu com todos os recursos. Há um módulo chamado “fatores de risco” onde os doentes registam os valores da tensão arterial, da glicemia ou da frequência cardíaca, por exemplo. Mas para fazerem essa vigilância, precisam de ter em casa os equipamentos adequados ou dirigirem-se a uma farmácia.

A medição diária não é obrigatória, mas é uma recomendação, sobretudo no primeiro mês após o AVC e para aqueles que têm de fazer o controlo dos fatores de risco, nomeadamente da tensão arterial. Quando o doente insere esses dados na app, o gestor de caso que recebe essa informação vê os valores em tempo real e pode acompanhar o padrão de medições do doente.

Dos 918 doentes atualmente inseridos na plataforma Nora, 45% dos utilizadores são os próprios doentes e 55% são cuidadores. Com uma média de idades de 77 anos, o doente mais novo inscrito na plataforma tem 22 anos. O mais velho tem 99.

No primeiro mês, Ana Vieira fazia esse registo duas vezes por dia. Uma de manhã e outra à noite. Depois do episódio dos dois AIT, a tensão arterial ficou mais alta do que o habitual e, como a medicação ainda não tinha sido ajustada, Ana tinha medo de que algo pudesse acontecer novamente. “Introduzia logo os valores na aplicação porque sabia que no dia que a tensão estivesse fora de controlo tinha imediatamente alguém a ligar-me ou a enviar uma mensagem para saber o que se estava a passar”, conta, sentada à mesa da sala de estar de sua casa.

E é assim que tudo se processa. “Se o doente inserir os valores da tensão arterial todos os dias, eu posso ver um esquema das diferentes medições e recebo um alarme se o resultado estiver acima do normal”, explica Sara Castro. O valor pode mudar, dependendo da pessoa, mas se receber dois alarmes seguidos, o contacto é imediatamente colocado em ação. “Perguntamos como é que se sente e como é que tem feito as medições até porque pode não estar a fazê-las de forma correta.”

Na maioria das vezes, não existem sintomas que indiquem que os valores estão acima do que é considerado normal, mas quando surgem, podem verificar-se dores de cabeça, tonturas, palpitações, cansaço ou falta de ar, por exemplo. Esta situação é particularmente perigosa porque pode levar a um novo AVC ou a doenças cardíacas, como o enfarte agudo do miocárdio.

Abordagem centrada no doente

O chat é “um dos melhores recursos que o utilizador tem através da aplicação”, assegura Sara Castro. Através dele, os doentes podem comunicar com a equipa médica sempre que necessitarem. Quando surge uma pergunta, a gestora direciona a informação para o elemento da equipa que está mais capacitado para ajudar o doente. “Eu procuro responder o mais rapidamente possível.” No entanto, o doente sabe que se se tratar de algum sinal alarmante, como voltar a ter um dos três F que constituem os principais sintomas do AVC – dificuldade em falar, boca ao lado (face) ou falta de força num membro do corpo -, deverá ligar de imediato para o 112 para ser acionada a Via Verde AVC.

A investigadora costuma ser contactada duas a três vezes por semana por cada doente através do chat, embora este número possa variar. “Costumamos ter mais contactos durante as três primeiras semanas após a alta, que é quando surgem mais dúvidas.” No total, entre mensagens na aplicação e telefonemas, recebe diariamente cerca de dez contactos.

Após deixarem o hospital, a falta de acompanhamento dos sobreviventes de AVC e o acesso aos cuidados de reabilitação necessários em tempo útil são dois problemas comuns. Este projeto surgiu para colmatar estas falhas.

Os doentes ou os cuidadores também podem encontrar na app vídeos com atividades e informações relacionadas com a reabilitação e de educação para a saúde. “Têm acesso a vídeos sobre o que pode fazer para prevenir um novo AVC, porque é que sente tanto cansaço ou como é o sono e a vida após o primeiro evento”, diz Sara Castro.

Mas nem todos acedem aos mesmos conteúdos. “Os vídeos são disponibilizados na aplicação de forma personalizada, consoante o caso de cada doente”. O mesmo acontece se o utilizador da app for um familiar ou cuidador. Nesse caso, “se o doente sai do hospital acamado ou com alguma perda de autonomia, por exemplo, os familiares recebem conteúdos com exercícios de mobilidade que podem ajudá-lo a fazer, com recomendações para auxiliar no autocuidado ou sobre a gestão da medicação”, acrescenta a investigadora.

Os utilizadores têm ainda acesso a um sistema de alarmes, que permite recordar a toma da medicação diária até o doente adquirir esse hábito, e à área de inquéritos. Aqui podem responder a um conjunto de perguntas que vão ajudar os profissionais de saúde a analisar alguns aspetos, como a aptidão física, a fadiga, a dor, a depressão, a ansiedade e a qualidade de vida do doente.

Esta avaliação é feita de forma crescente: ao sétimo dia, no primeiro mês após o regresso a casa, aos três meses, aos seis e quando o doente cumpre um ano de projeto. “A recolha destes dados permite-nos saber o que o doente valoriza no seu estado de saúde, mas também a perceber como é que podemos melhorar o circuito de assistência ao doente, de forma a prestar melhores cuidados, com os menores custos possíveis”, diz o coordenador do projeto, João Sargento Freitas.

A app Nora Bio permite um acompanhamento contínuo e individualizado durante um ano e está disponível de forma gratuita para download em iOS e Android.

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Falando sobre a forma como as pessoas vão interagindo com a aplicação, Sara Castro refere que a maior dificuldade é o uso a longo prazo. “À medida que vão recuperando, os utilizadores deixam de recorrer tanto à app porque sentem que não necessitam de ter uma monitorização de forma tão regular.”

A gestão do impacto emocional

Para além de ser uma das principais causas de incapacidade em todo o mundo e de estar associado a elevados custos de saúde, o AVC é “por definição, um evento potencialmente modificador de vida”, salienta o psiquiatra Miguel Bajouco, responsável por coordenar o módulo de saúde mental da aplicação. E reforça: “Quando uma pessoa se vê confrontada com uma doença que poderia ter causado a sua morte ou provocado algum tipo de incapacidade ou perda de autonomia, como acontece em muitos casos, a sua vida muda inevitavelmente.”

Sobretudo nos primeiros dois meses, é comum surgirem sintomas psicológicos e emocionais, como depressão, ansiedade ou alterações no sono e na saúde sexual, como parte do processo de adaptação do doente. Por exemplo, “a depressão pós-AVC tem uma prevalência de cerca de 15% a 30%. Cerca de 25% dos doentes tem ansiedade moderada a grave, nos dois meses seguintes, e 70% apresenta alterações do ciclo de sono-vigília, desenvolvendo problemas como insónia ou hipersónia (sonolência excessiva)”, diz o psiquiatra.

“À medida que vão recuperando, os utilizadores deixam de recorrer tanto à app porque sentem que não necessitam de ter uma monitorização de forma tão regular", diz Sara Castro, gestora do projeto, referindo-se à menor adesão a longo prazo.

Apesar de não ter ficado com sequelas físicas, o regresso a casa revelou-se mais complicado do que Ana esperava. “Nunca pensei passar por uma situação como a que vivi, sobretudo sem qualquer sinal prévio”. Só quando voltou do hospital é que teve noção do que realmente lhe aconteceu. “É assustador perceber como, de um momento para o outro, podemos ficar numa cadeira de rodas ou com qualquer outro tipo de limitação ou dependência.”

Ainda assim, Ana tem lidado com alguns desafios. Começou a ver pior, agora usa óculos e o discurso também sofreu alguns atropelos, como aconteceu em duas ou três ocasiões durante a conversa com os jornalistas. “No início baralhava as palavras e ficava muito ansiosa e frustrada por não conseguir dizer o que queria.” De vez em quando tem “brancas” na memória e no raciocínio e gagueja em algumas situações. Mas “nada grave e que exija reabilitação”, partilha.

A maior exigência tem sido lidar com a ansiedade e os ataques de pânico que passou a ter. Estes episódios têm sido tão impactantes que levaram Ana a deixar de trabalhar na área de consultoria imobiliária, por dez dias, em abril deste ano. “Foi o tempo necessário para me adaptar aos novos ajustes da medicação.”

São mais de 30, os profissionais de várias áreas, que integram o Harmonics. e que ajudam os sobreviventes de AVC a readaptarem-se à realidade com maior qualidade de vida

SÉRGIO AZENHA/OBSERVADOR

Constituído por quatro áreas temáticas (depressão, ansiedade, sono e saúde sexual), explica Miguel Bajouco, “o objetivo do módulo de saúde mental consiste em fornecer informação que ajude os doentes e os seus familiares a perceberem o que podem estar a sentir e como poderão procurar ajuda para tratar esses sintomas.” Estes recursos, a par do apoio prestado através do chat, foram particularmente importantes nos momentos em que Ana se sentia mais ansiosa ou tinha ataques de pânico, ajudando-a a entender o que se estava a passar consigo e a acalmar-se. Entretanto, regressou ao trabalho há algumas semanas e sem estes sintomas no horizonte.

A importância da Medicina Física e de Reabilitação

Dependendo da zona do cérebro afetada pelo AVC, é preciso trabalhar na recuperação das consequências. “Depois do tratamento da fase aguda, em que é crucial tratar o AVC, o doente deve ser avaliado pelo fisiatra, que estabelece um programa de reabilitação com base nos seus problemas”, explica Ana Margarida Esteves, fisiatra do Serviço de Medicina Física e Reabilitação.

Graças ao projeto HARMONICS e à monitorização do doente através da aplicação, os profissionais de saúde conseguem ter mais noção do que acontece ao doente depois da alta hospitalar, o que antes não acontecia. “Conseguimos perceber se o doente está a fazer a reabilitação em regime de ambulatório na área de residência, se está a cumprir o programa estabelecido e como está a evoluir. Se está a ter ganhos como expectável, se houve alguma intercorrência, se há a necessidade de o reavaliarmos mais cedo”, enumera a fisiatra. E isto acontece através da partilha do doente com os profissionais de saúde através desta app.

Se um doente de AVC não tiver acesso aos cuidados de reabilitação adequados, “a possibilidade de recuperar totalmente é menor, o que leva a uma pior qualidade de vida e a eventuais custos na sociedade”, diz a fisiatra Ana Margarida Esteves.

Quem também tem uma intervenção fundamental na transição do doente para casa e na sua reabilitação são os enfermeiros. “A vida destes doentes não é só sobreviver ao AVC. É preciso pensar como é que esta nova fase vai acontecer e como é que doentes, familiares e cuidadores vão viver a sua vida daqui por diante, e da melhor forma possível”, realça a enfermeira Catarina Fernandes, que trabalha na Unidade de AVC.

É esse o papel da enfermagem junto dos sobreviventes: ajudá-los – e aos cuidadores – a  readaptarem-se à nova realidade. Ensinam-lhes como devem ser prestados os cuidados de higiene, como se deve vestir o doente, como deve ser a sua alimentação e a melhor forma para alimentá-lo, como devem movimentar o doente de um lado para o outro, entre outras aprendizagens. “Com o HARMONICS, temos a vantagem de, além de fazermos essa preparação de forma presencial enquanto o doente está no hospital, disponibilizarmos esses recursos sob a forma de vídeo”, explica a enfermeira.

Um projeto para manter

Financiado pela União Europeia no âmbito do European Institute of Innovation and Technology (EIT-Health), o HARMONICS começou por ser implementado nos Hospitais da Universidade de Coimbra e no Hospital Vall d’Hebron, em Barcelona. Entretanto, já foi replicado em outras instituições no País Basco e na Bélgica.

Três meses depois do internamento, Ana Vieira tem precisado de ajuda a combater a ansiedade e os ataques de pânico, sinais que são frequentes após um internamento. Foto da esquerda: Arquivo pessoal

Apesar de ainda não terem dados definitivos, este projeto tem revelado “uma melhoria na qualidade de vida dos doentes, na sua recuperação a longo-prazo e na eficácia da assistência que lhes é dada”, diz João Sargento Freitas. Motivos mais do que suficientes para dar continuidade ao HARMONICS, na ULS de Coimbra, quando o financiamento da Comissão Europeia – de aproximadamente 150 mil euros – terminar no final do ano.

“Queremos manter o projeto, mas ainda não sabemos em que moldes. Apenas sabemos que queremos continuar a prestar o mesmo nível de cuidados, pois este tipo de seguimento tem ajudado os doentes após o regresso a casa”, conclui. Que o diga Ana Vieira.

Arterial é uma secção do Observador dedicada exclusivamente a temas relacionados com doenças cérebro-cardiovasculares. Resulta de uma parceria com a Novartis e tem a colaboração da Associação de Apoio aos Doentes com Insuficiência Cardíaca, da Fundação Portuguesa de Cardiologia, da Portugal AVC, da Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral, da Sociedade Portuguesa de Aterosclerose e da Sociedade Portuguesa de Cardiologia. É um conteúdo editorial completamente independente.

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Com a colaboração de:

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