Quando Rui Rio, Luís Montenegro e Miguel Pinto Luz disputaram a liderança, em 2020, apoiou o último à primeira volta e só entregou o voto ao homem de Espinho à segunda volta porque o adversário era Rui Rio. Dois anos depois, manteve-se equidistante na disputa entre o mesmo Montenegro e Jorge Moreira da Silva, chegando a assumir publicamente que não tinha certezas sobre a preparação de ambos para o cargo. Montenegro venceu, está há um ano no cargo, e Carlos Carreiras dá-lhe, pelo menos, o benefício da dúvida: “Tenho de reconhecer que Montenegro tem feito um esforço, em primeiro lugar para unir o partido, que era a condição essencial, e tem vindo a desenvolver um trabalho para apresentar alternativas”, diz.
Ainda assim, em entrevista ao Observador, no programa “Vichyssoise”, o presidente da Câmara Municipal de Cascais não foge à pergunta mais delicada que se vai fazendo nos corredores do PSD: se Montenegro perder o seu primeiro grande desafio eleitoral, as europeias de 2024, terá condições para se manter à frente do partido? “Não estou a inventar nada que a história já não nos tenha demonstrado. Se não vencer, obviamente que a liderança passa a ser questionada e fica mais fragilizada”, assume.
Sobre futuras e eventuais alianças à direita, o autarca, que assumiu, no passado, que seria muito difícil ao PSD governar sozinho, reforça a sua posição de sempre: um acordo entre PSD e Chega não é negociável. “Não sou favorável, de todo. Sou mesmo contra”, assinala Carlos Carreiras, reconhecendo que Montenegro não foi tão “afirmativo” na definição desse cordão sanitário como seria desejável.
Carreiras fala ainda do alegado sonho europeu de António Costa e do futuro do primeiro-ministro. “Se tiver essa possibilidade, não a irá desperdiçar. Numa linguagem mais popular, está farto daquilo tudo”, atira. Sobre o seu próprio futuro, no entanto, deixa uma novidade: apesar de ter dito várias vezes que poderia deixar Cascais antes de terminar o seu terceiro e último mandato, Carreiras assume agora que pode mesmo ficar até 2025. “Se estiver inclinado [para alguma coisa] é para cumprir o mandato na íntegra.”
[Ouça aqui a Vichyssoise com Carlos Carreiras]
A escapadinha europeia de Costa e as canetas a tremer de Montenegro
“Montenegro tem estado dentro das expectativas”
Durante as eleições diretas do PSD disse ser incapaz de escolher entre Jorge Moreira da Silva e Luís Montenegro. Até dizia: “Encontro defeitos e qualidades que me levam a não ter a garantia que são as pessoas certas para uma solução que o PSD precisava neste momento”. Montenegro venceu e passou um ano desde aí. Já está convencido de que Montenegro é a pessoa certa?
Estou consciente de que a posição de liderar a oposição, seja em que tempo for e seja a pessoa que a corporizar, é sempre de grande dificuldade. Tenho de reconhecer que Montenegro tem feito um esforço para unir o partido, que era a condição essencial, e para desenvolver um trabalho para apresentar alternativas para a hora das eleições, para as vencer e governar.
Mas esse esforço é suficiente? Tem estado à altura das expectativas?
Depende da expectativa de cada um e da análise do momento político. Tem estado dentro das expectativas deste contexto. Ainda há uma margem de progressão grande, mas também ainda falta algum tempo para as eleições.
O que falta a Montenegro para convencer?
O que ainda não foi marcado, as eleições. Quer pela proposta e afirmação que Montenegro, quer pelo demérito do Governo, que apresenta sinais de grande desgaste, esse grande jogo terá forte probabilidade de sorrir a Luís Montenegro.
Houve dois casos que, recentemente, o envolveram diretamente. Primeiro, foi a Operação Tutti-Frutti e o pedido de sindicância interna apresentado pela direção do PSD às escolhas nas autárquicas de Lisboa, em 2017 — altura em que era coordenador autárquico. Não se sentiu colocado em causa?
Não, porque quem poderá fazer essa análise fá-lo por desconhecimento dos estatutos e procedimentos do partido. O processo nem sequer chega ao coordenador autárquico, são as concelhias e distritais [que escolhem os candidatos autárquicos].
Mas concorda, em abstrato, com este inquérito interno?
É uma resposta no sentido de não ficar nenhuma dúvida ou anátema. Temos de tomar medidas que sejam antídotos para uma ou outra situação, que são muito minoritárias e pontuais, mas que não podem infetar todo o corpo do partido.
O outro caso foi o facto de não ter sido convidado para o encontro nacional dos Autarcas Social-Democratas (ASD). O semanário “Sol” escreveu que não tinha gostado de ter sido “esquecido”. Sentiu-se desconsiderado pela direção do PSD?
Não foi a direção do PSD, mas os autarcas sociais-democratas. De facto, não vejo razão para não ter sido convidado. Não faço nenhuma questão de participar enquanto orador. Mas não me afetou, era um sábado, tinha um compromisso familiar.
“Líder do PSD pode não ser candidato do partido a primeiro-ministro”
Depois daquele que deverá ter sido o momento mais baixo do Governo socialista, o PSD, embora tenha encurtado a distância nas sondagens, continua sem disparar nas intenções de voto – é mais o PS que sai penalizado. Isso é um sinal de que Montenegro ainda não é percecionado como alternativa?
Esperemos mesmo que tenha sido o momento mais baixo do Governo, porque o país não aguenta. Ainda assim, considero curiosa a forma como muitas vezes se analisam as sondagens: se é verdade que o PSD tem um acréscimo consistente nas últimas sondagens e comparado com as últimas eleições — não aquele que desejaríamos –, é curioso ninguém analisar a quebra significativa do PS.
Mas Montenegro está ou não com dificuldades em ser identificado como uma alternativa?
Não é só o Montenegro. O próprio secretário-geral do PS, António Costa, também está.
Portanto, Montenegro está com essa dificuldade.
Como António Costa.
António Costa é primeiro-ministro.
Sim, mas nas sondagens já demonstrou que perdeu essa capacidade de se afirmar como líder de um Governo que consiga ter uma sustentação parlamentar.
Numa entrevista recente, Carlos Carreiras dizia que não está escrito em lado nenhum que o presidente do PSD tenha de ser candidato a primeiro-ministro. Montenegro pode cumprir um papel de reabilitação de um partido e não ser candidato a primeiro-ministro?
Quando digo isso — e hoje reafirmo — considero que era uma solução possível. Nunca foi experimentado, mas é uma possibilidade se daí vier uma solução que permita desempatar a situação que hoje temos.
Tem alguém na cabeça para esse lugar?
Terá de ser alguém que, juntamente com o líder do partido, forme uma equipa una e coesa. Daí a dificuldade acrescida. Mas o que disse, e é uma possibilidade por estar prevista nos estatutos do partido, é que o líder do partido não tem necessariamente de ser o presidente do partido.
Mas o que outra pessoa poderia vir trazer ao PSD que Montenegro não está a conseguir?
A questão é que se há este empate e não se consegue descortinar forma de encontrar a tal solução alternativa… Então há que experimentar outras soluções.
“Frase de Montenegro sobre possível derrota nas europeias foi muito infeliz”
Também disse que o PSD não conseguiria voltar a governar sozinho. Uma aliança com o Chega seria incontornável?
Devemos ter sempre a ambição de conquistar uma maioria absoluta. Rejeitei sempre fazer coligações diferentes [com o Chega] e tive o melhor resultado.
Uma aliança com o Chega é incontornável para formar governo?
Não sou favorável, de todo. Sou mesmo contra.
E Montenegro já foi claro?
Tentou ser claro. Eu teria sido mais afirmativo.
Montenegro veio dizer que uma derrota por dois ou três pontos percentuais nas europeias não seria um mau resultado. Este é um bom prenúncio?
Não, acho que foi uma afirmação muito infeliz. Mas nós todos temos os nossos melhores dias e outros não assim tão bons. O PSD vais às eleições europeias, como irá a todas as próximas, numa perspetiva de vitória.
E tem obrigação de as vencer?
Todos temos. Quem está à frente de um partido como o PSD, com o seu histórico e com aquilo que representa, tem sempre obrigação de as vencer.
Para ficar como líder?
Se as vencer, claro que fica como líder.
E se perder por dois ou três pontos?
Não estou a inventar nada que a história já não nos tenha demonstrado: se não vencer, a liderança vai ser obviamente questionada.
Há quem aposte que, nessa altura, os apelos ao regresso de Pedro Passos Coelho também se vão intensificar. Nesse cenário, é um regresso incontornável?
Há um eleitorado próximo do PSD que gostaria de ver um regresso a uma liderança anterior do partido. Mas não podemos andar com sebastianismos. Isso depende muito da vontade e da disponibilidade de cada um. Também já deixei claro que, se em algum dia for essa a vontade e disponibilidade de Pedro Passos Coelho, estarei sentado na primeira fila. Mas não serei eu a empurrar seja quem for.
“António Costa está farto daquilo tudo”
Depois do que assistiu na comissão de inquérito à TAP, em particular com a não demissão de João Galamba, o Governo está em condições de aguentar até ao final da legislatura?
Não faço a mínima ideia. A análise que faço é que António Costa está a castigar o cidadão Galamba.
Porquê?
Viu-se isso no último 10 de Junho. Aquele homem, aquele cidadão, estava a ser castigado porque quis sair, apresentou a demissão e foi o primeiro-ministro que não a aceitou e que voltou a dar-lhe confiança para o manter no cargo. Isso só pode ser entendido como um castigo, ninguém merece aquilo. Não há lugar onde vá que não seja questionado.
De outra forma: acredita que o Governo vai conseguir aguentar até ao final da legislatura?
Se fizer uma análise fria, estou mais inclinado para dizer que o Governo vai ter muitas dificuldades para conseguir concluir a legislatura. Mas não é isso que eu desejo enquanto cidadão e português; o Governo tem é de governar.
É autarca, tem trabalhado diretamente com os ministros, tinha assumidamente uma boa relação com Pedro Nuno Santos. João Galamba, por aquilo que pretende dizer, pode ser levado a sério como ministro?
Não há uma alternativa, trabalhei bem com Pedro Nuno Santos, como trabalho bem com Galamba.
Foi notícia a escala de António Costa na Hungria para assistir à final da Liga Europa ao lado do primeiro-ministro húngaro. Acredita que foi mais uma operação de charme e que António Costa está a tentado a sair para abraçar um cargo europeu?
Não faço a mínima ideia se foi uma operação de charme ou não. Não tenho qualquer dúvida que António Costa tem razões para estar tentado a sair do Governo. Acredito que se ele se puder ver livre e partir para uma outra solução certamente o fará. Se tiver essa possibilidade, não a irá desperdiçar. Numa linguagem mais popular, está farto daquilo tudo. Mas nós, portugueses, não devemos ser afetados por esse estado de alma do primeiro-ministro.
“Estou inclinado para cumprir mandato na íntegra”
Sobre o seu futuro, já assumiu publicamente a possibilidade de deixar a autarquia antes do final do mandato, embora não se tenha comprometido com uma data. Já resolveu isso na sua cabeça?
Ainda não resolvi. E, neste momento, se estiver inclinado [para alguma coisa] é para cumprir o mandato na íntegra.
Ainda assim, Miguel Pinto Luz é o seu sucessor natural?
Nunca acreditei em alguém que faça sucessores. Sou republicano e não acredito que se deva aplicar na República procedimentos que são próprios da monarquia. Portanto, não há um sucessor. O que há é o reconhecimento da competência desses quadros, e poderia acrescentar mais. Mas não é novidade para ninguém que Miguel Pinto Luz tem sido aquele que tem estado mais próximo [de mim] e há mais tempo na autarquia enquanto vice-presidente. Não será surpresa para ninguém que, se for essa a vontade dele — e, ao que sei, é –, terá naturalmente todo o meu apoio.
Rejeita por completo um novo desafio ligado à política? Não ambiciona ir para o Parlamento Europeu?
Para o Parlamento Europeu diria já que não. Sobre o resto, diria o que já disse no passado: para mim, funções executivas são autárquicas e em Cascais — e essas estão a terminar. Quanto ao mais, já vimos que dizer “nunca” em política é algo que normalmente se vira contra nós. Mas, neste momento, não estaria disponível para funções executivas a nível político. Estes últimos tempos têm sido de um desgaste extraordinário. Tenho direito a algumas férias da política executiva também a nível a nacional.
Só para ser claro: o Parlamento Europeu não o seduz?
Não. Nem o Parlamento nacional.
Vamos avançar para o segundo segmento do nosso programa, o bloco “Carne ou Peixe”. Quem convidaria para assistir ao Estoril Open ao seu lado: Carlos Moedas ou António Capucho?
Já se verificou, já tive Carlos Moedas ao meu lado.
Ao lado de quem aceitaria fazer uma arruada durante uma campanha presidencial: Pedro Santana Lopes ou Luís Marques Mendes?
Ficaria satisfeito com os dois. Mas seria difícil até porque numa arruada de campanha vai muita gente ao lado de muita gente. Optaria por levar os dois ao meu lado.
Com quem gostaria de assistir a um jogo do Sporting: Pedro Marques ou João Galamba?Preferiria João Galamba mesmo que ele fosse benfiquista. Não reconheço nenhuma capacidade a Pedro Marques para desempenhar as funções que desempenhou e, mais do que isso, [não lhe desculpo] a atitude que teve de prejudicar o concelho de Cascais.
A quem compraria um carro em segunda mão: Pedro Nuno Santos ou Fernando Medina?
A acreditar nas notícias que saíram penso que Pedro Nuno Santos tinha um excelente carro. Não sendo eu um especialista em automóveis, compraria um a Pedro Nuno Santos.