Uma publicação feita a 24 de julho de 2020, no Facebook, garantia que o governo argentino tinha bloqueado todas as contas bancárias dos cidadãos. A mensagem tem sido usada para criticar o socialismo — o governo da Argentina é de centro-esquerda — e foi partilhada quase 600 vezes na rede social. Mas é falsa: na verdade, apenas algumas contas foram bloqueadas após terem sido detetados “movimentos não habituais”.

Esses bloqueios foram noticiados pela imprensa argentina. A 13 de julho, o jornal diário Clarín — o de maior circulação no país — relatou como os bancos estavam a bloquear algumas contas, nos canais digitais, de proprietários que usavam as quotas de compra de dólares de outras pessoas para ultrapassar o limite mensal de 200 dólares (USD) por pessoa permitidos por lei.

Os argentinos têm o hábito de comprar dólares porque o peso (a moeda oficial da Argentina) tende a sofrer grandes desvalorizações. A 3 de agosto, por exemplo, um dólar equivalia a 72,45 pesos argentinos. Perante a desconfiança e incerteza na banca e na moeda nacional, os cidadãos convertem o que ganham em dólares, o que aprofunda ainda mais a desvalorização do peso.

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Por isso é que, desde o início do ano passado, o banco central da Argentina anunciou medidas que têm por objetivo preservar as reservas do país em dólares. Uma delas, foi limitar a quantidade de dólares que cada cidadão pode adquirir mensalmente: 200 USD.

Em declarações ao jornal Clarín, uma fonte da banca explicou que “não estamos a falar de duas transferências de familiares num mês”, “falamos de contas que recebem, por exemplo, vinte transferências de vinte pessoas diferentes”. E acrescenta: “Se uma pessoa faz 20 transferências para 20 pessoas diferentes no mesmo dia, e depois recebe 20 transferências e retira os dólares, claramente, não abriu a conta para o propósito que declarou.” Nestes casos, “temos de agir”.

O tema foi abordado, nesse mesmo dia, por outro jornal argentino, o La Nación, cujo artigo explicava que os bancos estavam a enviar mensagens aos clientes a informar do bloqueio das respetivas contas, caso reparassem em movimentos não habituais. A mensagem diz o seguinte:

“Prezado cliente, queremos informar que registamos movimentos incomuns na sua conta poupança em dólares e, para garantir a segurança do seu dinheiro, desativamos a visualização e as operações dessa conta nos canais digitais”.

Ainda assim, o dinheiro continua disponível para ser utilizado pelo cliente através de outras vias que não o homebanking, como explica ainda a mensagem enviada aos clientes bancários:

“Esclarecemos que, se necessário, o seu dinheiro está disponível na íntegra para que possa retirá-lo aos balcões de qualquer agência, sem a necessidade de marcar uma visita.”

Após essas transferências serem devidamente explicadas e normalizadas, as contas voltam a ficar disponíveis. Ou seja, é verdade que a banca argentina tem bloqueado as contas poupança em dólares de alguns cidadãos, mas apenas nos casos em que são detetados movimentos “incomuns”, que possam indiciar uma utilização abusiva, nomeadamente a utilização indevida das quotas mensais impostas para a compra de dólares.

Conclusão

O post, que afirma que o “governo argentino bloqueia todas as contas bancárias dos cidadãos”, manipula uma notícia de meados de julho, que, na verdade, esclarecia que os bancos na Argentina estão a bloquear apenas as contas bancárias onde se registam “movimentos incomuns”, que indiciam a compra abusiva de dólares por outras pessoas, não cumprindo o limite mensal de compra de dólares imposto no país.

Acresce que, ao contrário do que é sugerido pela publicação em causa, a decisão de bloquear essas contas não é do governo argentino (ocupado pelo Partido Justicialista, antigo Partido Peronista, de centro-esquerda) mas sim do Banco Central da República Argentina, que faz cumprir estas regras em nome da estabilidade da moeda no país, o peso argentino.

Nem todas as contas bancárias são bloqueadas: apenas as que registem movimentos suspeitos. De resto, o dinheiro continua disponível, podendo ser levantado diretamente numa agência bancária.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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