Uma publicação — partilhada numa página de apoio ao Presidente do Chega, André Ventura, na rede social Facebook — alega que a atual ministra da Saúde, Ana Paula Martins, fazia parte da administração do Hospital de Santa Maria aquando do caso do alegado favorecimento no tratamento de duas crianças luso-brasileiras (no acesso a um fármaco para a atrofia muscular espinhal) e que foi precisamente esse o motivo da renúncia ao cargo por parte da recém-empossada ministra da Saúde. “Aqui temos a nova ministra da Saúde…senhora que fazia parte da administração do Santa Maria, aquele hospital que teve o caso das gémeas luso-brasileiras…esta senhora resignou-se do cargo que tinha devido ao dito escândalo”. Será verdade?

O caso que envolveu as gémeas luso-brasileiras, que vieram a Portugal com o objetivo de lhes ser administrado um medicamento com um custo de cerca de 1,9 milhões de euros (o Zolgensma, para o tratamento da atrofia muscular espinhal), decorreu entre os anos de 2019 e 2020.

O email enviado por Nuno Rebelo de Sousa, em que este alertava o pai, o atual Presidente da República, para o caso das gémeas e para a necessidade de serem tratadas em Portugal, data de 21 de outubro de 2019. Depois de algumas diligências, tanto da Presidência da República, como dos gabinetes do primeiro-ministro e do Ministério da Saúde, as crianças acabariam por aterrar em Portugal em dezembro do mesmo ano e seriam vistas em consulta, na Unidade de Neuropediatria do Hospital de Santa Maria, no início de janeiro de 2020. Em junho de 2020, estavam a ser tratadas com o Zolgensma, à época o medicamento mais caro do mundo.

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O caso, que configura um alegado favorecimento às crianças, aconteceu durante a presidência do administrador hospitalar Daniel Ferro, que assumiu os comandos do Centro Hospitalar e Universitário de Lisboa Norte (que, para além do Santa Maria, integrava o Hospital Pulido Valente) em maio de 2019. Para além do Presidente do Conselho de Administração, o Ministério da Saúde nomeou ainda os administradores Maria de Lourdes Bastos e Pedro Pinto dos Reis, que exerciam funções à data dos factos. A equipa acabaria por permanecer em funções até ao início de 2023, quando foi anunciada a nomeação de Ana Paula Martins para o cargo de presidente do Conselho de Administração do hospital.

À TVI — canal que revelou em novembro o alegado benefício concedido às crianças no acesso ao Zolgensma –, Daniel Ferro referiu que as gémeas “cumpriam todos os critérios clínicos” para serem tratados com o fármaco e garantiu não ter falado nem com “o Governo, nem com a Presidência” acerca do caso.

Lacerda Sales, Santa Maria e Infarmed beneficiaram gémeas luso-brasileiras. Três pontos essenciais do relatório da IGAS

Um relatório da Inspeção-geral das Atividades em Saúde sobre este caso, divulgado na semana passada, aponta irregularidades cometidas pelo então secretário de Estado da Saúde, Lacerda Sales, além do próprio Hospital de Santa Maria e da autoridade para o medicamento, o Infarmed. Também se referia aos obstáculos à investigação criados pela Presidência da República, pela demora em disponibilizar o acesso a documentos e correspondência trocada a propósito do chamado caso das gémeas (uma demora que Belém justificou com o facto de o processo se encontrar em segredo de justiça). Ainda assim, acrescentava o mesmo relatório, essa demora não impediu a investigação de concluir o processo.

Conclusão

Ana Paula Martins não era administradora do Santa Maria quando o hospital recebeu e tratou as gémeas luso-brasileiras com Zolgensma. A agora ministra da Saúde só assumiu a presidência daquela unidade hospitalar no início de 2023, renunciando ao cargo, em dezembro do mesmo ano, por discordar da inclusão dos hospitais universitários nas Unidades Locais de Saúde — reforma levada a cabo pela Direção Executiva do SNS.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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