Apesar de divergirem no posicionamento do Ministério Público (MP) face ao Poder Judicial, os constitucionalistas Teresa Violante e Pedro Trovão do Rosário concordam que a lei permite que a procuradora-geral da República, Lucília Gago, esclareça os deputados sobre matérias relacionadas com a actividade do titular da ação penal, nomeadamente sobre a Operação Influencer.

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Mas com uma ressalva: “Os deputados não podem fazer perguntas sobre matérias em segredo de justiça“, afirma Teresa Violante no programa “Justiça Cega” da Rádio Observador.

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“A única posição oficial que costumamos ter sistematicamente por parte do MP vem apenas por parte do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público e isto não é próprio do Estado de Direito. O MP, que não beneficia da prerrogativa da independência como beneficia o poder judicial, está numa circunstância institucional em que, paradoxalmente, não tem sido sujeito ao escrutínio e ao accountability que todos os poderes públicos estão vinculados num Estado de Direito Democrático. Isto, de facto, causa perplexidades e suscita interrogações”, afirma a investigadora da Universidade Friedrich-Alexander de Nuremberga.

Apesar de compreender a posição da sua colega jurista, e de entender que o MP não tem “atribuições materialmente jurisdicionais”, Pedro Trovão do Rosário considera que o Estatuto do MP coloca o titular da ação penal como “um órgão do Poder Judicial, participando com autonomia na administração da Justiça”.

Assim, “só por convite é que a sra. procuradora-geral da República poderá ir à Assembleia da República. E nunca a ida lhe poderá ser imposta”, afirma o professor catedrático da Universidade Autónoma de Lisboa.

A aceitação de tal convite poderá ser materializado “com eventuais esclarecimentos presenciais ou por escrito, percebendo que existem limites que resultam do estatuto constitucional e legal do Ministério Público”, defende Pedro Trovão do Rosário.

“Nem é o fim da democracia, nem de um MP autónomo”

O professor de Direito Constitucional diz ainda que era preferível que o escrutínio de Lucília Gago fosse feito através de uma entrevista jornalística, por exemplo. Até porque existe jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos que “valoriza aquilo que é a liberdade da expressão dos magistrados, no sentido da própria proteção do Estado do Direito Democrático”, nomeadamente no que diz respeito à “gravidade de perseguição do poder judicial por parte do poder político”, como na Polónia ou na Hungria.

Finalmente, os dois constitucionalistas defendem que não existe fundamento para um processo de destituição da procuradora-geral da República mas entendem que o próprio processo de exoneração deve ser repensado para estar mais dependente de uma maioria de dois terços do Parlamento e menos da vontade do primeiro-ministro e do Presidente da República.